domingo, 6 de outubro de 2019

As "sementes" desaparecidas dos buracos negros no jardim cósmico

No vasto jardim do Universo, os buracos negros mais pesados cresceram a partir de sementes.


© NASA (buracos negros supermassivos no núcleo de galáxias em fusão)

Alimentados pelo gás e poeira que consumiram, ou pela fusão com outros objetos densos, estas sementes cresceram em tamanho e massa para formar os centros das galáxias como a nossa Via Láctea. Mas, ao contrário do reino das plantas, as sementes dos buracos negros gigantes devem ter sido buracos negros também. E ninguém encontrou estas sementes, ainda.

Uma ideia é que os buracos negros supermassivos, o equivalente em massa a centenas de milhares a bilhões de sóis, cresceram a partir de uma população de buracos negros menores que nunca foram vistos. Este grupo elusivo, os "buracos negros de massa intermediária", teriam entre 100 e 100.000 vezes a massa do Sol. Entre as centenas de buracos negros encontrados até agora, existem muitos relativamente pequenos, mas nenhum com certeza no "deserto" intermediário da variedade de massas.

Os cientistas estão trabalhando com poderosos telescópios espaciais da NASA, além de outros observatórios, para rastrear objetos distantes que se encaixam na descrição destas entidades exóticas. Já encontraram dezenas de possíveis candidatos e estão analisanso para confirmá-los como buracos negros. Mas, mesmo que o façam, isto abre um novo mistério: como é que os buracos negros de massa intermediária se formaram?

Um buraco negro é um objeto extremamente denso no espaço, do qual nenhuma luz consegue escapar. Quando o material cai num buraco negro, não tem como sair. E quanto mais um buraco negro se abastece, mais cresce em massa e tamanho.

Os buracos negros menores são chamados de "massa estelar", entre 1 e 100 vezes a massa do Sol. Formam-se quando as estrelas explodem em processos violentos chamados supernovas.

Os buracos negros supermassivos, por outro lado, são as âncoras centrais de galáxias grandes, por exemplo, o nosso Sol e todas as outras estrelas da Via Láctea orbitam um buraco negro chamado Sagitário A* com aproximadamente 4,1 milhões de massas solares. Um buraco negro ainda mais massivo, com 6,5 bilhões de vezes a massa do Sol, serve como peça central da galáxia Messier 87 (M87). O buraco negro supermassivo de M87 aparece na famosa imagem do EHT (Event Horizon Telescope), mostrando um buraco negro e a sua "sombra" pela primeira vez. Esta sombra é provocada pelo horizonte de eventos, o ponto de não retorno do buraco negro, curvando e capturando a luz com a sua forte gravidade.

Os buracos negros supermassivos tendem a ter discos de material em seu redor chamados "discos de acreção", feitos de partículas extremamente quentes e altamente energéticas que brilham à medida que se aproximam do horizonte de eventos, a região de não retorno do buraco negro. Aqueles que fazem os seus discos brilhar intensamente, porque comem muito, são chamados "núcleos galácticos ativos".

A densidade de matéria necessária para criar um buraco negro é incompreensível. Para fazer um buraco negro com 50 vezes a massa do Sol, precisaríamos de colocar o equivalente a 50 sóis numa bola com menos de 300 km de diâmetro. Mas, no caso do buraco negro supermassivo de M87, é como se 6,5 bilhões de sóis fossem comprimidos numa bola maior que a órbita de Plutão. Em ambos os casos, a densidade é tão alta que o material original deve desmoronar numa singularidade, um rasgo no tecido do espaço-tempo.

A chave para o mistério das origens dos buracos negros é o limite físico de quão depressa podem crescer. Até os monstros gigantes nos centros das galáxias têm limites, porque uma certa quantidade de material é repelido pela radiação altamente energética proveniente de partículas quentes perto do horizonte de eventos. Por exemplo, só absorvendo material circundante, um buraco negro de baixa massa pode duplicar a sua massa em 30 milhões de anos.

No início da história do Universo, a semente de um buraco negro de massa intermediária pode ter sido formada a partir do colapso de uma grande nuvem de densa de gás ou de uma explosão de supernova. As primeiras estrelas que explodiram no Universo tinham hidrogênio e hélio puros nas suas camadas exteriores, com elementos mais pesados concentrados no núcleo. Esta é uma receita para um buraco negro muito mais massivo do que as estrelas explosivas modernas, que estão "poluídas" com elementos pesados nas suas camadas exteriores e, portanto, perdem mais massa através dos seus ventos estelares.

Uma pista de que os buracos negros de massa intermediária ainda podem realmente estar por aí veio do LIGO (Laser Interferometer Gravitational-Wave Observatory), uma colaboração entre o California Institute of Technology (Caltech) e o Massachusetts Institute of Technology (MIT). Os detectores do LIGO, em combinação com uma instalação europeia chamada Virgo, estão encontrando muitas fusões diferentes de buracos negros através de ondulações no espaço-tempo chamadas ondas gravitacionais.

Em 2016, o LIGO anunciou uma das descobertas científicas mais importantes dos últimos 50 anos: a primeira detecção de ondas gravitacionais. Especificamente, os detectores captaram o sinal de dois buracos negros em fusão. As massas destes buracos negros têm 29 e 36 vezes a massa do Sol.

É complicado procurar buracos negros no "deserto" da massa intermediária porque os próprios buracos negros não emitem luz. No entanto, os cientistas podem procurar sinais indicadores específicos usando telescópios sofisticados e outros instrumentos. Por exemplo, dado que o fluxo de matéria para um buraco negro não é constante, a massa agregada de material consumido provoca certas variações na emissão de luz no ambiente. Tais mudanças podem ser vistas mais rapidamente em buracos negros menores do que em buracos negros maiores.

O candidato mais promissor a buraco negro de massa intermediária tem o nome HLX-1, com uma massa de cerca de 20.000 vezes a do Sol. HLX-1 significa "Hyper-Luminous X-ray source 1" e a sua produção energética é muito maior que a de estrelas parecidas com o Sol. Foi descoberto em 2009 pelo astrônomo australiano Sean Farrell, usando o telescópio espacial XMM-Newton da ESA. Um estudo de 2012, usando os telescópios espaciais Hubble e Swift da NASA, encontrou sugestões de um aglomerado de jovens estrelas azuis em órbita deste objeto. Pode ter sido o centro de uma galáxia anã engolida pela galáxia maior ESO 243-49. Muitos cientistas consideram HLX-1 um buraco negro de massa intermediária já provado.

Objetos menos brilhantes que podem ser buracos negros de massa intermediária são chamadas fontes de raios X ultraluminosas (ULXs). Uma ULX cintilante chamada NGC 5048 X-1 tem sido especialmente interessante para os cientistas que procuram buracos negros de massa intermediária. Mas os observatórios de raios X NuSTAR e Chandra da NASA surpreenderam ao revelar que muitas ULXs não são buracos negros, são pulsares, remanescentes estelares extremamente densos que parecem pulsar como faróis.

M82 X-1, a fonte de raios-X mais brilhante na galáxia M82, é outro objeto muito brilhante que parece piscar em escalas de tempo consistentes com um buraco negro de massa intermediária. Estas mudanças no brilho estão ligadas com a massa do buraco negro e são provocadas por material em órbita perto da região interior do disco de acreção. Um estudo de 2014 analisou variações específicas na luz de raios X e estimou que M82 X-1 tem uma massa equivalente a 400 sóis. Os cientistas usaram dados de arquivo do satélite RXTE (Rossi X-ray Timing Explorer) da NASA para estudar estas variações de brilho em raios X.

Mais recentemente, os cientistas analisaram um grupo maior de possíveis buracos negros de massa intermediária. Em 2018, os pesquisadores descreveram uma amostra de 10 candidatos reanalisando dados ópticos do SDSS (Sloan Digital Sky Survey) e comparando as perspetivas iniciais com dados de raios X do Chandra e do XMM-Newton. Agora estão utilizando telescópios terrestres no Chile e no Arizona. Os pesquisadores argumentam que estes buracos negros se formaram originalmente no colapso de nuvens gigantes, não em explosões estelares.

As galáxias anãs são lugares interessantes para continuar a procura porque sistemas estelares menores podem hospedar buracos negros de massa muito menor do que os encontrados nos centros de galáxias maiores como a nossa.

Os caçadores de buracos negros de massa intermediária aguardam ansiosamente o lançamento do telescópio espacial James Webb da NASA, que estudará as primeiras galáxias da Universo. O Webb vai ajudar a descobrir o que surgiu primeiro, a galáxia ou o seu buraco negro central, e como este buraco negro pode ter sido produzido. Em combinação com observações de raios X, os dados infravermelhos do Webb serão importantes para identificar alguns dos candidatos mais antigos a buraco negro.

Outra nova ferramenta lançada em julho pela agência espacial russa Roscosmos chama-se Spectrum X-Gamma, uma espaçonave que varre o céu em raios X e transporta um instrumento com espelhos desenvolvidos e contruídos em parceria com a NASA. As informações de ondas gravitacionais da colaboração LIGO-Virgo também vão ajudar na busca, assim como a missão planejada LISA (Laser Interferometer Space Antenna) da ESA.

Fonte: NASA

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