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quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

Descoberta a estrela de nêutrons mais massiva?

Quando os astrônomos não conseguem explicar algo diretamente, muitas vezes torna-se verdadeiramente excitante.

© D. Futselaar (ilustração de um pulsar e um buraco negro)

Uma equipe internacional liderada por pesquisadores do Instituto Max Planck de Radioastronomia e com a participação do Instituto Max Planck de Física Gravitacional descobriu agora um misterioso par que nunca tinha sido observado antes: um sistema constituído por uma estrela de nêutrons e um objeto que, à primeira vista, nem sequer deveria existir. Mas existem pistas importantes. 

Os pesquisadores da colaboração internacional TRAPUM (Transients and Pulsars with MeerKAT) descobriram um novo sistema constituído por dois objetos, localizado no aglomerado globular NGC 1851, na direção da constelação austral de Columba (Pomba). Os dois objetos têm muito provavelmente uma coisa em comum: ambos devem ter surgido, embora indiretamente, dos remanescentes de estrelas massivas, ou seja, de estrelas de nêutrons ou de buracos negros. 

As estrelas massivas formam-se frequentemente em sistemas estelares múltiplos. E são precisamente estas estrelas que, no final das suas vidas, morrem numa espetacular explosão de supernova. Os remanescentes: buracos negros ou estrelas de nêutrons que se orbitam uns aos outros, caso o sistema tenha sobrevivido à explosão. 

Até agora, só foram detectados pares de buracos negros e estrelas de nêutrons graças às ondas gravitacionais que emitem durante a sua dança íntima. É conhecida a natureza de pelo menos um dos dois objetos. A equipe utilizou o sensível radiotelescópio MeerKAT, na África do Sul, em combinação com poderosos detectores do Instituto Max Planck de Radioastronomia, e registrou pulsos fracos. 

Trata-se de uma estrela de nêutrons com um forte campo magnético que gira muito rapidamente, emitindo ondas de rádio ao longo de cones de luz opostos que varrem o Universo como um farol cósmico. O pulsar recentemente descoberto, de nome PSR J0514-4002E, gira em torno do seu próprio eixo mais de 170 vezes por segundo e a sua luz rádio atinge a Terra com a mesma frequência. A cada rotação, o radiotelescópio regista um pulso, semelhante ao tique-taque de um relógio. O pulsar tem um ritmo extremamente regular. 

Foram utilizados pequenos desvios ou diferenças no ritmo deste "relógio" para obter detalhes sobre uma companheira que orbita num centro de gravidade comum, juntamente com o pulsar. O efeito Doppler faz com que a frequência de rádio do pulsar se altere como resultado do seu movimento orbital, tal como o som da sirene de um carro de bombeiros ao passar pelo observador. Isto também permitiu determinar a órbita do pulsar em torno do objeto misterioso.

A situação é menos clara quando se trata do objeto companheiro que orbita o pulsar. Quando observa-se as imagens de NGC 1851 obtidas pelo telescópio espacial Hubble, não é visto nada nessa posição. Por isso, o objeto em órbita com o pulsar não é uma estrela normal, mas um remanescente extremamente denso de uma estrela colapsada. Se este objeto fosse também uma estrela, emitiria, tal como o Sol, um vento estelar, que o cone de luz rádio do pulsar teria de atravessar antes do radiotelescópio receber um sinal. Neste caso, o vento estelar influenciaria nas frequências do sinal de rádio. No entanto, não há sinais de tal efeito nos dados de rádio. Tudo indica que o misterioso objeto é um remanescente extremamente denso de uma estrela colapsada: um buraco negro ou outra estrela de nêutrons que não emite ondas de rádio. 

A procura por pistas continua: os astrônomos não só deduziram a órbita a partir das medições das diferenças de velocidade do "relógio" do pulsar, como também reduziram a massa do segundo objeto até 2,09 a 2,71 massas solares. Isto significa que a companheira pode ser mais massiva do que as estrelas de nêutrons mais pesadas conhecidas (cerca de duas massas solares) e, ao mesmo tempo, mais leve do que os buracos negros mais leves conhecidos (cerca de cinco massas solares). A razão pela qual ainda não foi encontrado nenhum outro objeto compacto entre duas e cinco massas solares não é totalmente compreendida.

As estrelas de nêutrons, os remanescentes ultradensos das explosões de supernovas, só podem ter até uma determinada massa. Quando ganham demasiada massa, talvez por consumirem outra estrela ou por colidirem com um objeto do mesmo tipo, entram em colapso. Qual exatamente o objeto resultante, após o colapso, é motivo de muita especulação, tendo sido propostos vários cenários de estrelas exóticas. A opinião predominante, no entanto, é que as estrelas de nêutrons colapsam para se tornarem buracos negros, objetos gravitacionalmente tão atrativos que nem a luz lhes consegue escapar. 

A teoria, apoiada pela observação, diz-nos que os buracos negros mais leves que podem ser criados por estrelas colapsadas são cerca de 5 vezes mais massivos do que o Sol. Isto é consideravelmente mais do que as 2,2 massas solares necessárias para o colapso de uma estrela de nêutrons, dando origem ao que é conhecido como a lacuna de massa dos buracos negros. A natureza dos objetos compactos, nesta gama de massas, é desconhecida e o estudo detalhado tem-se revelado até agora um desafio, uma vez que apenas vislumbres fugazes de tais objetos foram captados em observações das ondas gravitacionais produzidas por eventos de fusão no Universo distante. 

Embora a equipe não possa dizer de forma conclusiva se descobriu a estrela de nêutrons mais massiva que se conhece, o buraco negro mais leve que se conhece ou até mesmo uma nova e exótica variante estelar, o que é certo é que descobriu um laboratório único para investigar as propriedades da matéria sob as condições mais extremas do Universo.

Um artigo foi publicado na revista Science.

Fonte: Max Planck Institute for Radio Astronomy

terça-feira, 7 de novembro de 2023

Revelando os “ossos” da Mão Cósmica Fantasmagórica

Em 1895, Wilhelm Röntgen descobriu os raios X e os usou para obter imagens dos ossos da mão de sua esposa, dando início a uma ferramenta revolucionária de diagnóstico para a medicina.

© Chandra / IXPE (pulsar PSR B1509-58)

Agora, dois dos telescópios espaciais de raios X da NASA combinaram os seus poderes de imagem para revelar os "ossos" do campo magnético de uma notável estrutura em forma de mão no espaço. Juntos, estes telescópios revelam o comportamento de uma estrela morta em colapso que sobrevive através de plumas de partículas de matéria energizada e antimatéria. 

Há cerca de 1.500 anos, uma estrela gigante na nossa Galáxia ficou sem combustível nuclear para queimar. Quando isso aconteceu, a estrela entrou em colapso e formou um objeto extremamente denso chamado estrela de nêutrons. Estrelas de nêutrons em rotação com fortes campos magnéticos, ou pulsares, fornecem laboratórios para física extrema, com condições que não podem ser reproduzidas na Terra. 

Pulsares jovens podem criar jatos de matéria e antimatéria afastando-se dos polos do pulsar, junto com um vento intenso, formando uma “nebulosa de vento pulsar”. Em 2001, o observatório de raios X Chandra da NASA observou pela primeira vez o pulsar PSR B1509-58 e revelou que a sua nebulosa de vento pulsar (referida como MSH 15-52) se assemelha a uma mão humana. O pulsar está localizado na base da “palma” da nebulosa. MSH 15-52 está localizada a 16.000 anos-luz da Terra. 

Agora, o mais novo telescópio de raios X da NASA, o Imaging X-ray Polarimetry Explorer (IXPE), observou MSH 15-52 durante cerca de 17 dias, o período mais longo que já observou qualquer objeto desde que foi lançado em dezembro de 2021. 

O IXPE fornece informações sobre a orientação do campo elétrico dos raios X, determinada pelo campo magnético da fonte de raios X, ou seja, a polarização de raios X. Em grandes regiões do MSH 15-52 a quantidade de polarização é notavelmente alta, atingindo o nível máximo esperado do trabalho teórico. Para atingir esta força, o campo magnético deve ser muito retilíneo e uniforme, o que significa que há pouca turbulência nestas regiões da nebulosa do vento pulsar. 

Uma característica particularmente interessante da MSH 15-52 é um jato brilhante de raios X direcionado do pulsar para o “pulso” na parte inferior da imagem. Os novos dados do IXPE revelam que a polarização no início do jato é baixa, provavelmente porque esta é uma região turbulenta com campos magnéticos complexos e emaranhados associados à geração de partículas de alta energia. No final do jato, as linhas do campo magnético parecem endireitar-se e tornar-se muito mais uniformes, fazendo com que a polarização se torne muito maior.

Estes resultados implicam que as partículas recebem um impulso de energia em regiões turbulentas complexas perto do pulsar na base da "palma da mão" e fluem para áreas onde o campo magnético é uniforme ao longo do "pulso, dedos e polegar". 

Esta façanha possibilitou a descoberta da história de vida da matéria superenergética e das partículas de antimatéria em torno do pulsar. Isto nos ensina como os pulsares podem atuar como aceleradores de partículas. O IXPE também detectou campos magnéticos semelhantes para as nebulosas de vento dos pulsares Vela e Caranguejo, o que implica que podem ser surpreendentemente comuns nestes objetos. 

Fonte: Smithsonian Astrophysical Observatory

sexta-feira, 1 de setembro de 2023

Desvendando detalhes dos pulsares

Por meio de uma campanha de observação que envolveu 12 telescópios no solo e no espaço, incluindo três infraestruturas do Observatório Europeu do Sul (ESO), os astrônomos investigaram o estranho comportamento de um pulsar, uma estrela morta com rotação extremamente rápida.

© ESO (ilustração de um pulsar)

Este objeto misterioso é conhecido por alternar entre dois modos de brilho quase constantemente, algo que até à data tem sido um enigma. Os astrônomos descobriram agora que as súbitas ejeções de matéria, lançadas pelo pulsar em períodos muito curtos, são responsáveis por estas mudanças peculiares. 

Um pulsar, ou estrela de nêutrons, trata-se de uma estrela morta, magnética e de rotação rápida, que emite um feixe de radiação eletromagnética para o espaço. À medida que gira, este feixe varre o cosmos, tal como um farol que varre o seu espaço circundante, e é detectado pelos astrônomos quando intercepta a linha de visão da Terra. Este efeito faz com que a estrela pareça pulsar em brilho quando observada a partir do nosso planeta. 

O objeto PSR J1023+0038 (ou J1023 para abreviar) é um tipo especial de pulsar que apresenta um comportamento estranho. Localizado a cerca de 4.500 anos-luz de distância da Terra, na constelação do Sextante, orbita próximo de outra estrela. Durante a última década, o pulsar tem estado ativamente retirando matéria desta companheira, matéria esta que se acumula num disco à volta do pulsar e vai caindo lentamente na sua direção. Desde que este processo de acumulação de matéria começou, o feixe de varrimento praticamente que desapareceu e o pulsar começou a alternar incessantemente entre dois modos. 

No modo "alto", o pulsar emite raios X brilhantes, ultravioleta e luz visível, enquanto no modo "baixo" se torna mais fraco para estas frequências mas emite mais nas ondas rádio. O pulsar pode permanecer em cada modo durante vários segundos ou minutos, mudando depois para o outro modo em apenas alguns segundos. Até agora, esta mudança tem intrigado os astrônomos. 

A campanha de observação incluiu o Very Large Telescope (VLT) e o New Technology Telescope (NTT), ambos do ESO, que detectaram radiação visível e infravermelha próxima, bem como o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), do qual o ESO é um parceiro. Durante duas noites em Junho de 2021, os astrônomos observaram o sistema efetuando mais de 280 mudanças entre os seus modos alto e baixo.

Foi descoberto que a mudança de modo resulta de uma intrincada interação entre o vento do pulsar - um fluxo de partículas de alta energia que se afasta do pulsar - e a matéria que flui em direção ao pulsar. No modo baixo, a matéria que flui em direção ao pulsar é expelida num jato estreito perpendicular ao disco. Gradualmente, esta matéria acumula-se cada vez mais perto do pulsar e começa a ser atingida pelo vento que sopra da estrela pulsante, o que dá origem ao aquecimento da matéria. O sistema fica então no modo alto, brilhando intensamente em raios X, ultravioleta e luz visível. Eventualmente, bolhas desta matéria quente são removidas pelo pulsar através do jato. Com menos matéria quente no disco, o sistema brilha menos, mudando de novo para o modo baixo. 

Apesar desta descoberta ter desvendado o mistério do estranho comportamento de J1023, os astrônomos ainda têm muito a aprender com o estudo deste sistema único. O Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, atualmente em construção no Chile, oferecerá uma visão sem precedentes dos mecanismos de comutação do J1023. O ELT permitirá obter informações essenciais sobre a forma como a abundância, a distribuição, a dinâmica e a energia da matéria que flui em torno do pulsar são afetadas pela comutação de modos.

Este trabalho foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics

Fonte: ESO

sexta-feira, 30 de junho de 2023

Encontradas evidências do fundo estocástico de ondas gravitacionais

Astrofísicos, utilizando grandes radiotelescópios com o objetivo de observar uma coleção de "relógios" cósmicos na nossa Galáxia, encontraram evidências da existência de ondas gravitacionais que oscilam com períodos de anos a décadas.

© NANOGrav (ondulações gravitacionais produzidas por um binário de buraco negro)

O sinal das ondas gravitacionais foi observado em 15 anos de dados obtidos pelo PFC (Physics Frontiers Center) do NANOGrav (North American Nanohertz Observatory for Gravitational Waves), uma colaboração de mais de 190 cientistas dos EUA e do Canadá que utilizam pulsares para procurar ondas gravitacionais. As colaborações internacionais que utilizam telescópios na Europa, Índia, Austrália e China registaram resultados semelhantes de forma independente. 

Embora resultados anteriores do NANOGrav tenham revelado um sinal temporal enigmático comum a todos os pulsares observados, era demasiado tênue para revelar a sua origem. A publicação dos dados de 15 anos demonstra que o sinal é consistente com ondas gravitacionais ondulantes que passam lentamente pela Via Láctea. Esta é uma evidência fundamental da existência de ondas gravitacionais com frequências muito baixas. Ao contrário das fugazes ondas gravitacionais de alta frequência observadas por instrumentos terrestres como o LIGO (Laser Interferometer Gravitational-wave Observatory), este sinal contínuo de baixa frequência só poderia ser percebido com um detector muito maior do que a Terra. 

Para responder a esta necessidade, os astrônomos transformaram o nosso sector da Via Láctea numa enorme antena de ondas gravitacionais, recorrendo a estrelas exóticas chamadas pulsares. O esforço de 15 anos do NANOGrav recolheu dados de 68 pulsares para formar um tipo de detector chamado PTA (Pulsar Timing Array). 

Os pulsares são remanescentes ultradensos do núcleo de uma estrela massiva após a sua morte numa explosão de supernova. Os pulsares giram rapidamente e emitem feixes de ondas de rádio através do espaço, de modo a parecerem "pulsar" quando vistos da Terra. Os objetos mais rápidos, chamados pulsares de milissegundo, giram centenas de vezes por segundo. Os seus pulsos são muito estáveis, o que os torna úteis como relógios cósmicos precisos. 

Ao longo de 15 anos de observações com o Observatório de Arecibo, em Porto Rico, com o GBT (Green Bank Telescope), em Virgínia Ocidental, EUA, e com o VLA (Very Large Array), no Novo México, EUA, o NANOGrav veio aumentando gradualmente o número de pulsares que observa.

A teoria da relatividade geral de Einstein prevê com precisão a forma como as ondas gravitacionais devem afetar os sinais dos pulsares. Ao esticar e comprimir o tecido do espaço, as ondas gravitacionais afetam o tempo de cada pulso de uma forma pequena, mas previsível, atrasando alguns e adiantando outros. Estes desvios estão correlacionados para todos os pares de pulsares de uma forma que depende da distância a que as duas estrelas de nêutrons aparecem no céu.

Em 2004, um pequeno grupo de astrônomos obteve o primeiro conjunto de observações de pulsares que viria a constituir a base deste trabalho. Em 2020, com pouco mais de doze anos de dados, os cientistas do NANOGrav começaram a ver indícios de um sinal, um "zumbido" extra que era comum ao comportamento temporal de todos os pulsares na matriz e que a cuidadosa consideração de possíveis explicações alternativas não conseguiu eliminar. A colaboração sentiu-se confiante de que este sinal era real e que se tornava mais fácil de detectar à medida que mais observações eram incluídas. Mas era ainda demasiado tênue para mostrar a assinatura de ondas gravitacionais prevista pela relatividade geral. 

Agora, estão mostrando as primeiras evidências da presença de ondas gravitacionais, com períodos de anos a décadas. O próximo passo é utilizar as nossas observações para estudar as fontes que produzem este zumbido. Uma possibilidade é que o sinal provenha de pares de buracos negros supermassivos, com massas milhões ou bilhões de vezes superiores à do nosso Sol. À medida que estes gigantescos buracos negros se orbitam, produzem ondas gravitacionais de baixa frequência. Pensa-se que os buracos negros supermassivos residem nos centros das maiores galáxias do Universo. Quando duas galáxias se fundem, os buracos negros de cada uma acabam por se colapsar para o centro, orbitando-se mutuamente como um sistema binário muito depois da fusão inicial das galáxias. Eventualmente, os dois buracos negros fundem-se. 

Entretanto, a sua lenta espiral estica e comprime o tecido do espaço-tempo, gerando ondas gravitacionais que se propagam para longe da galáxia de origem como ondulações num lago, acabando por chegar à nossa. Espera-se que os sinais de ondas gravitacionais destes binários gigantescos se sobreponham, como vozes numa multidão ou instrumentos numa orquestra, produzindo um zumbido geral de fundo que imprime um padrão único nos dados temporais dos pulsares. Este padrão é o que os cientistas do NANOGrav procuram há quase 20 anos. 

O NANOGrav demonstra a evidência deste fundo de ondas gravitacionais. A análise detalhada do zumbido de fundo já está fornecendo informações sobre a forma como os buracos negros supermassivos crescem e se fundem. Tendo em conta a força do sinal que o NANOGrav detecta, a população de buracos negros binários extremamente massivos no Universo deve ser de centenas de milhares, talvez mesmo milhões.

A investigação futura deste sinal contribuirá para que os cientistas compreendam como o Universo evoluiu às maiores escalas, fornecendo informações sobre a frequência com que as galáxias colidem e o que leva os buracos negros a fundirem-se. Além disso, as ondulações gravitacionais do próprio Big Bang podem constituir uma fração do sinal, fornecendo uma visão sobre a formação do próprio Universo. Estes resultados têm até implicações em escalas menores, colocando limites no tipo de partículas exóticas que podem existir no nosso Universo. 

Um conjunto de artigos foram publicados no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: NANOGrav

quarta-feira, 21 de junho de 2023

Descoberta de pulsar de anã branca pode esclarecer a evolução estelar

A descoberta de um tipo raro de sistema estelar, com uma anã branca, permitiu uma nova compreensão da evolução estelar.

© ESO / M. Garlick (ilustração de um pulsar de anã branca)

As anãs brancas são estrelas pequenas e densas, tipicamente do tamanho de um planeta. Formam-se quando uma estrela de baixa massa queima todo o seu combustível, perdendo as suas camadas exteriores. Por vezes referidas como "fósseis estelares", fornecem uma visão sobre diferentes aspetos da formação e evolução das estrelas. 

Um tipo raro de pulsar de anã branca foi descoberto apenas pela segunda vez, numa pesquisa liderada pela Universidade de Warwick. Os pulsares de anãs brancas incluem um remanescente estelar em rápida rotação, de nome anã branca, que atinge a sua vizinha - uma anã vermelha - com poderosos feixes de partículas elétricas e radiação, fazendo com que todo o sistema dramaticamente aumente e diminua de brilho em intervalos regulares. Isto deve-se aos fortes campos magnéticos, mas os cientistas não sabem ao certo o que os provoca. 

Uma teoria chave que explica os fortes campos magnéticos é o "modelo do dínamo", que as anãs brancas têm dínamos (geradores elétricos) no seu núcleo, tal como a Terra, mas muito mais potentes. Mas para que esta teoria pudesse ser testada, os cientistas precisavam de procurar outros pulsares de anãs brancas para ver se as suas previsões se confirmavam.

O pulsar de anã branca recém-detectado, J191213.72-441045.1 (J1912-4410 para abreviar) é apenas o segundo sistema estelar deste gênero que é encontrado, após a descoberta de AR Scorpii (Ar Sco) em 2016. A 773 anos-luz da Terra e girando 300 vezes mais depressa do que o nosso planeta, o pulsar de anã branca tem um tamanho semelhante ao da Terra, mas uma massa pelo menos tão grande quanto o Sol. Isto significa que uma colher de chá de material de uma anã branca pesaria cerca de 15 toneladas. 

As anãs brancas começam as suas vidas com temperaturas extremamente quentes antes de arrefecerem ao longo de bilhões de anos, e a baixa temperatura de J1912-4410 aponta para uma idade avançada. 

A origem dos campos magnéticos é uma grande questão em aberto em muitos domínios da Astronomia, e isto é particularmente verdade para as anãs brancas. Os campos magnéticos das anãs brancas podem ser mais de um milhão de vezes mais fortes do que o campo magnético do Sol e o modelo do dínamo ajuda a explicar porquê. A descoberta de J1912-4410 constituiu um avanço fundamental nesta área. 

Devido à sua idade avançada, as anãs brancas no sistema de pulsares devem ser frias. As suas companheiras devem estar suficientemente próximas para que a atração gravitacional da anã branca tenha sido, no passado, suficientemente forte para capturar massa da companheira, o que faz com que girem rapidamente. Todas estas previsões se aplicam ao novo pulsar encontrado: a temperatura da anã branca é inferior a 13.000 K, gira sobre o seu eixo uma vez a cada cinco minutos e a atração gravitacional da anã branca tem um forte efeito na companheira. 

O objeto foi encontrado no levantamento de raios X de todo o céu realizado com o SRG/eROSITA. A investigação de acompanhamento com o satélite XMM-Newton da ESA revelou as pulsações no regime de raios X altamente energéticos, confirmando assim a natureza incomum do novo objeto e estabelecendo firmemente os pulsares de anãs brancas como uma nova classe.

Um artigo foi publicado na revista Nature Astronomy. Um outro artigo complementar foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics

Fonte: Leibniz Institute for Astrophysics Potsdam

domingo, 12 de março de 2023

Nebulosa de vento de pulsar de Vela

Há cerca de 10.000 anos, a luz da explosão de uma estrela gigante, na direção da constelação de Vela, chegou à Terra. Esta supernova deixou para trás um objeto denso a que chamamos pulsar, que parece aumentar de brilho regularmente à medida que gira, como um farol cósmico.

© IXPE / Chandra / Hubble (nebulosa de vento de pulsar de Vela)

Da superfície deste pulsar surgem ventos de partículas que viajam perto da velocidade da luz, criando uma mistura caótica de partículas carregadas e campos magnéticos que chocam com o gás circundante. Este fenômeno é chamado de nebulosa de vento de pulsar. Nesta nova imagem, o halo azul claro e difuso corresponde aos primeiros dados de polarização de raios X alguma vez obtidos do remanescente de Vela, que provêm do IXPE (Imaging X-ray Polarimetry Explorer) da NASA. Uma linha azulada e tênue, apontando para o canto superior direito, corresponde a um jato de partículas altamente energéticas disparadas do pulsar a cerca de metade da velocidade da luz. Pensa-se que os "arcos" de raios X cor-de-rosa assinalam os cantos das regiões em forma de donut onde o vento de pulsar choca e acelera as partículas altamente energéticas. O próprio pulsar está localizado no círculo branco no centro da imagem. As cores rosa e púrpura correspondem a dados do observatório de raios X Chandra da NASA, que já observou Vela várias vezes. As estrelas douradas em segundo plano foram captadas pelo telescópio espacial Hubble. 

A medição da polarização, que tem a ver com a forma como as ondas eletromagnéticas estão organizadas, fornece uma compreensão sem precedentes de como um objeto cósmico como um pulsar acelera as partículas em altas velocidades. 

Num estudo recente, os cientistas ficaram surpreendidos com o elevado grau de polarização que encontraram nos raios X da nebulosa de vento de pulsar de Vela. A alta polarização significa que os campos eletromagnéticos estão bem organizados; estão alinhados em direções específicas e dependem da sua posição na nebulosa. Além disso, os raios X que o IXPE detecta vêm de elétrons altamente energéticos que espiralam nos campos magnéticos da nebulosa de vento de pulsar, caracterizando a emissão de síncrotron. 

Em contraste com os remanescentes de supernova que têm um invólucro de material à sua volta, a alta polarização dos raios X sugere que os elétrons não foram acelerados pelos choques turbulentos que parecem importantes em outras fontes de raios X. Em vez disso, deve haver algum outro processo envolvido, tal como a reconexão magnética, que envolve a quebra e união de linhas de campo magnético. Esta é uma forma pela qual a energia magnética é convertida em energia de partículas. 

Os dados do IXPE também sugerem que o campo magnético está alinhado como uma estrutura lisa em forma de donut em torno do equador do pulsar. Esta forma está de acordo com as expectativas dos cientistas. Ao mapear com resolução sem precedentes, o IXPE revela o campo magnético na região central, mostrando concordância com os resultados obtidos a partir de imagens na região do rádio da nebulosa exterior. 

O pulsar de Vela, localizado a cerca de 1.000 anos-luz da Terra, tem cerca de 25 quilômetros de diâmetro e gira 11 vezes por segundo, mais depressa do que um rotor de helicóptero. 

Um artigo foi publicado na revista Nature

Fonte: NASA

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2023

Detectados eclipses de raios gama em sistemas estelares

Utilizando dados do telescópio espacial Fermi da NASA, os cientistas descobriram os primeiros eclipses de raios gama de um tipo especial de sistema estelar binário.

© NASA (estrela em órbita eclipsando um pulsar)

Estes chamados sistemas estelares "aranha" contêm cada um deles um pulsar, os remanescentes superdensos e de rotação rápida de uma estrela que explodiu como supernova, que lentamente corrói a sua companheira. 

Astrônomos examinaram mais de uma década de observações do Fermi para encontrar sete sistemas estelares "aranha" que sofrem estes eclipses, que ocorrem quando a estrela companheira de baixa massa passa em frente do pulsar a partir do nosso ponto de vista. 

Os dados permitiram-lhes calcular como os sistemas estão inclinados em relação à nossa linha de visão e outras informações. Um dos objetivos mais importantes do estudo destes sistemas é tentar medir as massas dos pulsares. Os pulsares são basicamente estrutura da matéria mais densa que pode ser medida. A massa máxima que podem atingir limita a física dentro destes ambientes extremos, que não podem ser replicados na Terra. 

Estes sistemas desenvolvem-se porque uma estrela num binário evolui mais rapidamente do que a sua parceira. Quando a estrela massiva se transforma em supernova, deixa para trás um pulsar. Este remanescente estelar emite feixes em vários comprimentos de onda, incluindo raios gama, que entram e saem do nosso ponto de vista, criando pulsos tão regulares que rivalizam a precisão dos relógios atômicos. 

Desde cedo que um pulsar absorve um fluxo de gás. À medida que o sistema evolui, a alimentação cessa quando o pulsar começa a girar mais rapidamente, gerando fluxos de partículas e radiação que sobreaquecem o lado virado para a companheira e a corroem.

Os cientistas dividem os sistemas estelares "aranha" em dois tipos com o nome de espécies de aranhas cujas fêmeas por vezes comem os seus companheiros menores. As viúvas negras contêm companheiras com menos de 5% da massa do Sol. Os sistemas correspondentes às aranhas de "lista vermelha" (o equivalente australiano da viúva negra, as chamadas "redbacks") abrigam companheiras maiores, tanto em tamanho como em massa, tendo entre 10% e 50% da massa do Sol.

Os pesquisadores podem calcular as massas destes sistemas medindo os seus movimentos orbitais. As observações, no visível, podem medir a rapidez com que a companheira está viajando, enquanto as medições no rádio revelam a velocidade do pulsar. Para um sistema visto quase de face, tais alterações são ligeiras e potencialmente confusas. Os mesmos sinais também podem ser produzidos por um sistema diminuto, mais lento, que é visto de lado. 

Para medir as massas, é vital conhecer a inclinação do sistema em relação à nossa linha de visão. O ângulo de inclinação é normalmente medido utilizando luz visível, mas estas medições vêm com algumas potenciais complicações. À medida que a companheira orbita o pulsar, o seu lado superaquecido entra e sai de vista, criando uma flutuação no visível que depende da inclinação. No entanto, os astrônomos ainda estão aprendendo mais sobre o processo de superaquecimento e modelos com padrões diferentes de aquecimento preveem por vezes massas diferentes para os pulsares. 

Os raios gama, porém, são apenas gerados pelo pulsar e têm tanta energia que viajam em linha reta, sem serem afetados pelos detritos, a menos que sejam bloqueados pela companheira. Caso os raios gama desapareçam do conjunto de dados deste sistema, os cientistas podem inferir que a companheira eclipsou o pulsar. A partir daí, podem calcular a inclinação do sistema em relação ao nosso ponto de vista, as velocidades das estrelas e a massa do pulsar. 

O PSR B1957+20 (B1957) foi a primeira viúva negra conhecida, descoberta em 1988. Modelos anteriores para este sistema, construídos a partir de observações ópticas, determinaram que a sua inclinação em relação ao nosso ponto de vista era de cerca de 65 graus e a massa do pulsar era 2,4 vezes superior à do Sol. Isto tornaria B1957 o pulsar mais massivo conhecido, encontrando-se no limite teórico de massa entre os pulsares e os buracos negros. A análise dos dados do Fermi, possibilitou encontrar 15 fótons de raios gama em falta. O "timing" dos pulsos de raios gama destes objetos é tão confiável que 15 fótons em falta, ao longo de uma década, são suficientemente significativos para que seja estabelecido que o sistema está sendo eclipsado. Então, foi calculado que o binário está inclinado 84 graus e que o pulsar tem apenas 1,8 vezes a massa do Sol.

Um artigo foi publicado na revista Nature Astronomy

Fonte: Max Planck Institute for Gravitational Physics

quarta-feira, 2 de novembro de 2022

O fantasma de uma estrela gigante

Uma teia de aranha fantasmagórica, dragões mágicos ou rastros de fantasmas? O que você vê nesta imagem do remanescente de supernova da Vela?

© VLT Survey Telescope (remanescente de supernova da Vela)

Esta bela tapeçaria de cores, que foi captada com grande detalhe pelo VLT Survey Telescope (VST), instalado no Observatório do Paranal do ESO, no Chile, mostra os restos de uma estrela gigantesca. 

Esta fina estrutura de nuvens rosa e laranja é tudo o que resta de uma estrela massiva que terminou a sua vida numa enorme explosão há cerca de 11 mil anos. Quando as estrelas mais massivas chegam ao fim das suas vidas, geralmente explodem violentamente num evento chamado supernova.

Estas explosões provocam ondas de choque que se deslocam pelo gás circundante, comprimindo-o e criando intricadas estruturas filamentares. A energia liberada aquece os tentáculos gasosos, fazendo-os brilhar intensamente. 

Nesta imagem de 554 milhões de pixels, temos uma vista extremamente detalhada do remanescente da supernova da Vela, assim designada pela sua localização na constelação austral da Vela. Caberiam nove luas cheias nesta imagem e a nuvem completa é ainda maior.

Situado a apenas 800 anos-luz de distância da Terra, este remanescente de supernova é um dos mais próximos que conhecemos. Quando explodiu, as camadas mais exteriores da estrela progenitora foram ejetadas no gás circundante, dando origem a estes filamentos.

O que resta da estrela é apenas uma bola ultradensa na qual os prótons e elétrons são forçados a formar nêutrons, ou seja, uma estrela de nêutrons. A estrela de nêutrons do remanescente da Vela, que se encontra ligeiramente fora da imagem no canto superior esquerdo, é um pulsar que gira em seu próprio eixo a uma velocidade incrível de mais de 10 vezes por segundo.

Esta imagem é um mosaico de observações obtidas com a câmara de campo amplo OmegaCAM, montada no VST. A câmara de 268 milhões de pixels pode obter imagens através de vários filtros que deixam passar luz de diferentes cores. Nesta imagem específica do remanescente da Vela foram usados quatro filtros diferentes, representados aqui por uma combinação de magenta, azul, verde e vermelho. O VST pertence ao Instituto Nacional de Astrofísica da Itália, INAF, e com o seu espelho de 2,6 metros é um dos maiores telescópios dedicados ao levantamento do céu noturno no visível. 

Esta imagem é um exemplo de tal levantamento: o VPHAS+ (VST Photometric Hα Survey of the Southern Galactic Plane and Bulge). Durante cerca de sete anos, este rastreio mapeou uma área considerável da nossa Galáxia, permitindo aos astrônomos compreender melhor como é que as estrelas se formam, evoluem e eventualmente morrem. 

Fonte: ESO

sexta-feira, 16 de setembro de 2022

Encontrada uma nova fonte de produção de lítio no Universo

Uma equipe de pesquisadores do IAC (Instituto de Astrofísica das Canárias), da Universidade de Manchester e da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia detectaram uma abundância de lítio anormalmente elevada na atmosfera da estrela companheira de um pulsar binário de milissegundo.

© IAC (ilustração de um pulsar binário de milissegundo)

A abundância de lítio é maior em comparação com estrelas com a mesma temperatura efetiva e estrelas de alta metalicidade, pelo que o estudo fornece evidências inequívocas para a produção de lítio fresco. 

O lítio é um elemento frágil e em estrelas semelhantes ao Sol é gradualmente destruído nos interiores através da queima nuclear a baixa temperatura. Contudo, a abundância de lítio em estrelas jovens de alta metalicidade (População I) é superior ao valor produzido na Nucleossíntese do Big Bang, quando determinados elementos leves, incluindo o lítio, foram formados, o que significa que existem estrelas e mecanismos que produzem e ejetam lítio para o meio interestelar. 

Os binários de raios X são sistemas que emitem radiação intensa de raios X e consistem num objeto compacto, geralmente um buraco negro ou estrelas de nêutrons, e uma estrela companheira. O objeto compacto alimenta-se do material que retira da estrela companheira, um processo conhecido como acreção. 

As condições em torno de objetos compactos são ideais para a produção de lítio através da espalação de núcleos de carbono-nitrogênio-oxigênio (CNO) por nêutrons no fluxo de acreção interior ou na superfície da estrela companheira. Embora a abundância de lítio observada nos binários de raios X seja relativamente elevada, não é superior ao valor Cósmico ou ao das jovens estrelas da População I. 

Agora, foi encontrada uma surpreendente superabundância de lítio num pulsar binário de milissegundo, um tipo de sistema binário constituído por uma estrela companheira de baixa massa e uma estrela de nêutrons ou pulsar com um período de rotação de alguns milissegundos. 

Usando arquivos de espectroscopia de alta resolução obtidos com o VLT (Very Large Telescope) do ESO no Paranal (Chile) e o WHT (William Herschel Telescope) no Observatório Roque de los Muchachos em La Palma (Espanha), os pesquisadores realizaram uma análise da abundância química no pulsar binário de milissegundo PSR J1023+0038.

Neste sistema, a equipe encontrou uma estrela companheira rica em metais com abundâncias de elementos químicos muito diferentes das abundâncias elementares observadas em estrelas companheiras em binários de raios X e em estrelas na vizinhança solar. 

De acordo com o estudo, a emissão pulsada de raios gama que ocorre na maioria dos pulsares binários de milissegundo envolve uma produção copiosa de partículas, algumas das quais acabam como parte do vento magnetizado que emerge do pulsar a alta velocidade. O impacto dos raios gama e do fluxo de partículas relativísticas com a atmosfera da estrela companheira fragmenta os núcleos de carbono, nitrogênio e oxigênio presentes e gera novo lítio, o que leva a uma maior abundância deste elemento químico.

A espalação através de raios gama ou prótons pode levar a um enriquecimento substancial de lítio na atmosfera da estrela secundária, pelo que os pulsares binários de milissegundo podem fornecer locais para a produção de lítio fresco. 

Um artigo foi publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society

Fonte: Instituto de Astrofísica de Canarias

sexta-feira, 19 de agosto de 2022

Destroço estelar como fonte de partículas cósmicas extremas

Os astrônomos há muito que procuram os locais de lançamento de alguns dos prótons mais energéticos da Via Láctea.

© NASA / Fermi (fontes emitindo raios gama)

Esta sequência compara os resultados do Fermi em três gamas de energia. O pulsar J2229+6114 é a fonte brilhante no topo, a ponta norte do remanescente da supernova G106.3+2.7 (delineado em verde). Em cada gama de energia, a sequência mostra primeiro o número de raios gama e depois as quantidades em excesso em comparação com as expectativas de um modelo de fundo. Cores mais brilhantes indicam números maiores de raios gama ou quantidades em excesso. Nas energias mais elevadas, surge uma nova fonte de raios gama, produzida quando os prótons acelerados pela onda de choque da supernova atingem uma nuvem de gás próxima.

Agora, um estudo utilizando 12 anos de dados do telescópio espacial Fermi da NASA confirma um remanescente de supernova que é exatamente um destes locais. O Fermi mostrou que as ondas de choque de estrelas que explodiram impulsionam as partículas a velocidades comparáveis às da luz.

Chamados raios cósmicos, estas partículas assumem principalmente a forma de prótons, mas podem incluir elétrons e núcleos atômicos. Dado que transportam uma carga elétrica, os seus percursos tornam-se confusos à medida que atravessam o campo magnético da nossa Galáxia. 

Uma vez que já não podemos dizer de que direção tiveram origem, isto mascara o seu local de nascimento. Mas quando estas partículas colidem com gás interestelar perto do remanescente de supernova, produzem um brilho em raios gama, a forma mais energética de luz que existe.

Os teóricos pensam que os prótons mais energéticos dos raios cósmicos na Via Láctea atingem 1x10^15 eV (quatrilhões de elétrons-volt). A natureza precisa das fontes PeVatrons, tem sido difícil de localizar. Presas por campos magnéticos caóticos, as partículas atravessam repetidamente a onda de choque da supernova, ganhando velocidade e energia com cada passagem. Eventualmente, o remanescente já não consegue segurá-las e deslocam-se velozmente para o espaço interestelar. Aceleradas até cerca de 10 vezes a energia reunida pelo acelerador de partículas mais poderoso do mundo, o LHC (Large Hadron Collider), os prótons PeV estão à beira de escapar por completo da Via Láctea.

Os astrônomos identificaram alguns PeVatrons suspeitos, incluindo um no centro da nossa Galáxia. Naturalmente, os remanescentes de supernova encabeçam a lista de candidatos. No entanto, dos cerca de 300 remanescentes conhecidos, apenas alguns foram encontrados emitindo raios gama com energias suficientemente elevadas.

O remanescente da supernova G106.3+2.7, é uma nuvem em forma de cometa localizada a cerca de 2.600 anos-luz de distância na direção da constelação de Cefeu. Um pulsar brilhante cobre a extremidade norte do remanescente de supernova e os astrônomos pensam que ambos os objetos se formaram na mesma explosão. 

O LAT (Large Area Telescope) do Fermi, o seu instrumento primário, detectou raios gama na faixa de energias GeV (bilhões de elétrons-volt) oriundos da cauda estendida do remanescente. Para comparação, a energia da luz visível mede entre 2 e 3 elétrons-volt). O VERITAS (Very Energetic Radiation Imaging Telescope Array System) no Observatório Fred Lawrence Whipple registou raios gama ainda mais energéticos da mesma região. E tanto o HAWC (High-Altitude Water Cherenkov Gamma-Ray Observatory) no México como a Tibet AS-Gamma Experiment na China detectaram fótons com energias de 100 TeV (100 trilhões de elétrons-volt) da área estudada pelo Fermi e pelo VERITAS.

O pulsar, J2229+6114, emite os seus próprios raios gama num feixe parecido ao de um farol enquanto gira, e este brilho domina a região a energias de alguns GeV. A maior parte desta emissão ocorre na primeira metade da rotação do pulsar. A equipe efetivamente desligou o pulsar ao analisar apenas os raios gama que chegam da última parte do ciclo. Abaixo dos 10 GeV, não há emissão significativa da cauda do remanescente. Acima desta energia, a interferência do pulsar é insignificante e a fonte adicional torna-se facilmente aparente. 

A análise detalhada da equipe favorece esmagadoramente os prótons PeV como as partículas que conduzem esta emissão de raios gama. Até agora, o G106.3+2.7 é único, mas pode revelar-se o membro mais brilhante de uma nova população de remanescentes de supernova que emitem raios gama e que atingem energias na faixa dos TeV. Fontes adicionais poderão ser reveladas através de observações futuras pelo Fermi e por observatórios de raios gama em energias muito altas.

Um artigo foi publicado no periódico Physical Review Letters

Fonte: Goddard Space Flight Center

sábado, 23 de julho de 2022

Pulsares cintilantes e o misterioso plasma interestelar

Os pulsares são remanescentes estelares com rápida rotação e que piscam como um farol, ocasionalmente mostram variações extremas de luminosidade.

© OzGrav (ilustração de um pulsar)

Os cientistas preveem que estas pequenas explosões de brilho acontecem porque regiões densas de plasma interestelar (o gás quente entre as estrelas) espalham as ondas de rádio emitidas pelo pulsar. No entanto, ainda não sabemos de onde vêm as fontes de energia necessárias para formar e sustentar estas densas regiões de plasma. 

Para melhor compreender estas formações interestelares, precisamos de observações mais detalhadas da sua estrutura em pequena escala e uma via promissora para isso está no cintilar dos pulsares. Quando as ondas de rádio de um pulsar são dispersas pelo plasma interestelar, as ondas separadas interferem e criam um padrão de interferência na Terra. À medida que a Terra, o pulsar e o plasma se movem uns em relação uns aos outros, este padrão é observado como variações de brilho no tempo e na frequência: o espectro dinâmico. 

Graças à natureza pontual dos sinais dos pulsares, a dispersão e a cintilação ocorrem em pequenas regiões do plasma. Após o processamento especializado dos sinais do espectro dinâmico, podemos observar características parabólicas impressionantes conhecidas como arcos de cintilação que estão relacionadas com a imagem da radiação espalhada do pulsar no céu. 

Um pulsar em particular, chamado J1603-7202, passou por uma dispersão extrema em 2006, tornando-o um alvo excitante para a análise destas densas regiões de plasma. No entanto, a trajetória do pulsar ainda não foi determinada, pois orbita outra estrela compacta chamada anã branca numa órbita que é vista de face, em relação ao ponto de vista da Terra, e os cientistas não têm métodos alternativos para a medir nesta situação. 

Felizmente, os arcos de cintilação servem um duplo propósito: as suas curvaturas estão relacionadas com a velocidade do pulsar, assim como a distância ao pulsar e ao plasma. A forma como a velocidade do pulsar muda depende da orientação da órbita no espaço. Portanto, no caso do pulsar J1603-7202, os cientistas calcularam as alterações na curvatura dos arcos ao longo do tempo a fim de determinar a orientação. 

As medições obtidas para a órbita de J1603-7202 são uma melhoria significativa em comparação com análises anteriores. Isto demonstra a viabilidade da cintilação em complementar métodos alternativos. Os astrônomos mediram a distância ao plasma e mostraram que era cerca de três-quartos da distância ao pulsar, visto da Terra. Isto não parece coincidir com as posições de quaisquer estrelas ou nuvens interestelares de gás conhecidas. Os estudos de cintilação pulsar exploram frequentemente estruturas como esta, que de outra forma seriam invisíveis. 

A questão permanece, portanto, em aberto: qual é a fonte do plasma que dispersa a radiação do pulsar? Finalmente, usando a sua medição orbital, foram capazes de estimar a massa da companheira orbital de J1603-7202, que é de cerca de metade da massa do Sol. Quando considerada juntamente com a órbita altamente circular de J1603-7202, isto implica que a companheira é provavelmente um remanescente estelar composto de carbono e oxigênio, um achado mais raro em torno de um pulsar do que os remanescentes mais comuns à base do hélio. 

Dado que os cientistas possuem um modelo quase completo da órbita, é agora possível transformar as observações de cintilação de J1603-7202 em imagens dispersas no céu e mapear o plasma interestelar à escala do Sistema Solar. A criação de imagens das estruturas físicas que causam a dispersão extrema das ondas de rádio pode dar-nos uma melhor compreensão de como se formam regiões tão densas e do papel que o plasma interestelar desempenha na evolução das galáxias. 

Fonte: OzGrav

terça-feira, 21 de junho de 2022

Encontradas evidências do mais poderoso pulsar em galáxia distante

Astrônomos que analisavam dados do VLASS (VLA Sky Survey) descobriram uma das estrelas de nêutrons mais jovens conhecidas, o remanescente superdenso de uma estrela massiva que explodiu como uma supernova.

© NRAO / M. Weiss (ilustração de nebulosa de vento pulsar)

As imagens do VLA (Karl G. Jansky Very Large Array) indicam que a emissão brilhante de rádio alimentada pelo campo magnético do pulsar giratório só recentemente surgiu por detrás de uma densa concha de detritos da explosão de supernova. 

O objeto, chamado VT 1137-0337, encontra-se numa galáxia anã a 395 milhões de anos-luz da Terra. Apareceu pela primeira vez numa imagem VLASS feita em janeiro de 2018. Não apareceu numa imagem da mesma região feita pelo levantamento FIRST do VLA em 1998. Continuou aparecendo em observações VLASS posteriores em 2018, 2019, 2020 e 2022.

Este objeto provavelmente é uma nebulosa de vento pulsar, que é criada quando o poderoso campo magnético de uma estrela de nêutrons em rápida rotação acelera as partículas carregadas ao redor até quase à velocidade da luz.

Os cientistas descobriram o objeto em dados do VLASS, um projeto do NRAO que começou em 2017 para pesquisar todo o céu visível a partir do VLA, cerca de 80% do céu. Ao longo de um período de sete anos, o VLASS está realizando uma varredura completa do céu três vezes, sendo um dos objetivos o de encontrar objetos transitórios.

Os astrônomos encontraram VT 1137-0337 na primeira varredura VLASS de 2018. Comparando esta análise VLASS com dados de um levantamento anterior do VLA, chamado FIRST, revelou 20 objetos transientes particularmente luminosos que poderiam estar associados a galáxias conhecidas.

A galáxia, chamada SDSS J113706.18-033737.1, é uma galáxia anã contendo cerca de 100 milhões de vezes a massa do Sol. Ao estudar as características de VT 1137-0337, os astrônomos consideraram várias explicações possíveis, incluindo uma supernova, um GRB (Gamma Ray Burst) ou um evento de ruptura de maré em que uma estrela é triturada por um buraco negro supermassivo.

Os pesquisadores concluíram que a melhor explicação é uma nebulosa de vento pulsar. Neste cenário, uma estrela muito mais massiva do que o Sol explodiu como supernova, deixando para trás uma estrela de nêutrons. A maior parte da massa da estrela original foi expelida para fora como uma concha de destroços. A estrela de nêutrons gira rapidamente e à medida que o seu poderoso campo magnético varre o espaço circundante, acelera as partículas carregadas, provocando uma forte emissão de rádio. Inicialmente, a emissão de rádio foi bloqueada pela concha de detritos da explosão. À medida que este invólucro se expandia, tornou-se progressivamente menos denso até que eventualmente as ondas de rádio da nebulosa de vento pulsar puderam passar através dele.

O exemplo mais famoso de uma nebulosa de vento pulsar é a Nebulosa do Caranguejo (M1) na direção da constelação de Touro, o resultado de uma supernova que brilhou intensamente no ano 1054. A M1 é facilmente visível hoje em dia através de telescópios pequenos. O objeto que foi encontrado parece ser aproximadamente 10.000 vezes mais energético do que a Nebulosa do Caranguejo, com um campo magnético mais forte. 

É possível que o campo magnético do VT 1137-0337 seja suficientemente forte para que a estrela de nêutrons se qualifique como um magnetar. Os magnetares são um dos principais candidatos à origem dos misteriosos FRBs (Fast Radio Bursts), agora sob intenso estudo.

Verificou-se que alguns FRBs foram associados a fontes de rádio persistentes, cuja natureza também é um mistério. Têm fortes semelhanças, nas suas propriedades, com VT 1137-0337, mas não mostraram evidências de uma forte variabilidade. 

Os astrônomos planejam fazer observações adicionais para aprender mais sobre o objeto e para monitorar o seu comportamento ao longo do tempo. 

Fonte: National Radio Astronomy Observatory