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sexta-feira, 15 de março de 2024

Explicando o "colar de pérolas" de uma supernova

Os físicos recorrem frequentemente à instabilidade de Rayleigh-Taylor para explicar a formação de estruturas fluidas nos plasmas, mas essa pode não ser a história completa no que se refere ao anel de aglomerados de hidrogênio em torno da supernova SN 1987A.

© Webb (SN 1987A)

Num estudo, efetuado na Universidade de Michigan, pesquisadores argumentam que a instabilidade de Crow explica melhor o "colar de pérolas" que rodeia o remanescente estelar, lançando luz sobre um mistério astrofísico de longa data. 

A parte fascinante disto é que o mesmo mecanismo que desfaz os rastos dos aviões pode estar aqui em jogo. Nos rastos de condensação dos aviões, a instabilidade Crow cria rupturas na linha suave das nuvens devido ao fluxo de ar em espiral que sai da extremidade de cada asa, conhecido como vórtices de ponta de asa. Estes vórtices fluem uns para os outros, criando lacunas, algo que podemos ver devido ao vapor de água nos gases de escape. E a instabilidade de Crow pode fazer algo que a instabilidade de Rayleigh-Taylor não conseguiu: prever o número de aglomerados observados em torno do remanescente.

A supernova SN 1987A está entre as mais famosas explosões estelares porque fica relativamente perto da Terra, a 163.000 anos-luz de distância, e a sua luz chegou à Terra num momento em que existiam observatórios sofisticados para testemunhar a sua evolução. É a primeira supernova visível a olho nu desde a supernova de Kepler do ano de 1604, o que faz dela um acontecimento astrofísico incrivelmente raro que desempenhou um papel importante na compreensão da evolução estelar. 

Embora ainda se desconheça muito sobre a estrela que explodiu, pensa-se que o anel de gás que a rodeava antes da explosão provém da fusão de duas estrelas. Essas estrelas "derramaram" hidrogênio no espaço ao seu redor quando se tornaram gigantes azuis dezenas de milhares de anos antes da supernova. Essa nuvem de gás em forma de anel foi então fustigada pelo fluxo de partículas carregadas altamente velozes que se desprendiam da gigante azul, conhecido como vento estelar. 

Pensa-se que os aglomerados se formaram antes da explosão da estrela. Os pesquisadores simularam a forma como o vento empurrava a nuvem para fora, ao mesmo tempo que arrastava a superfície, com a parte superior e inferior da nuvem a serem empurradas para fora mais rapidamente do que o centro. Isto fez com que a nuvem se enrolasse sobre si própria, o que desencadeou a instabilidade de Crow e fez com que se separasse em aglomerados bastante uniformes que se tornaram no colar de pérolas. A previsão de 32 está muito próxima dos 30 a 40 aglomerados observados em torno do remanescente da SN 1987A.

A equipe viu indícios de que a instabilidade Crow poderia prever a formação de mais anéis de contas em torno da estrela, mais afastados do anel que aparece mais brilhante nas imagens telescópicas. Ficaram satisfeitos por ver que mais aglomerados parecem surgir na imagem do instrumento NIRCam (Near Infrared Camera) do telescópio espacial James Webb, publicada em agosto do ano passado. Foi sugerido também que a instabilidade de Crow pode estar em jogo quando a poeira em volta de uma estrela se transforma em planetas, embora seja necessária mais análise para explorar esta possibilidade.

Um artigo foi publicado no periódico Physical Review Letters.

Fonte: University of Michigan

sábado, 2 de março de 2024

Encontrada estrela de nêutrons no núcleo de remanescente de supernova

Utilizando as capacidades sem precedentes do telescópio espacial James Webb, astrônomos obtiveram as primeiras observações espectroscópicas das galáxias mais tênues durante os primeiros bilhões de anos do Universo.

© STScI (Aglomerado de Pandora)

Estas descobertas ajudam a responder a uma questão de longa data: que fontes causaram a reionização do Universo? 

Ainda há muito por compreender sobre o período, no início da história do Universo, conhecido como a era da reionização. Foi um período de escuridão sem estrelas ou galáxias, preenchido por uma densa névoa de hidrogênio gasoso, até que as primeiras estrelas ionizaram o gás à sua volta e a luz começou a viajar. 

Os astrônomos passaram décadas tentando identificar as fontes que emitiam radiação suficientemente poderosa para dissipar gradualmente este nevoeiro de hidrogênio que cobria o Universo primitivo. O programa UNCOVER (Ultradeep NIRSpec and NIRCam ObserVations before the Epoch of Reionization) consiste em observações espectroscópicas e de imagem do aglomerado Abell 2744. Uma equipe internacional de astrônomos utilizou a lente gravitacional deste alvo, também conhecido como Aglomerado de Pandora, para investigar as fontes do período de reionização do Universo.

As lentes gravitacionais ampliam e distorcem o aspecto de galáxias ainda mais distantes, pelo que têm uma aparência muito diferente das que se encontram em primeiro plano. A "lente" deste aglomerado massivo de galáxias deforma o tecido do próprio espaço de tal modo que a luz de galáxias distantes são desviadas. O efeito de ampliação permitiu o estudo de fontes muito distantes de luz para além de Abell 2744, revelando oito galáxias extremamente tênues que, de outra forma, seriam indetectáveis, até para o Webb. 

Foi descoberto que estas galáxias tênues são produtoras de imensa luz ultravioleta, a níveis quatro vezes superiores ao que se supunha anteriormente. Isto significa que a maior parte dos fótons que reionizaram o Universo provém provavelmente destas galáxias anãs. Esta descoberta revela o papel crucial desempenhado pelas galáxias ultrafracas na evolução inicial do Universo. Produzem fótons ionizantes que transformam o hidrogênio neutro em plasma ionizado durante a reionização cósmica. Isto realça a importância de compreender o papel das galáxias de baixa massa na história do Universo. 

Apesar do seu tamanho minúsculo, estas galáxias de baixa massa são produtoras prolíficas de radiação energética, e a sua abundância durante este período é tão substancial que a sua influência coletiva pode transformar todo o estado do Universo. Para chegar a esta conclusão, a equipe começou por combinar dados extremamente sensíveis de imagem do Webb com imagens de Abell 2744 obtidas pelo telescópio espacial Hubble para selecionar galáxias candidatas extremamente tênues na época da reionização. 

Esta é a primeira vez que os cientistas estimam a frequência das galáxias tênues. Os resultados confirmam que são o tipo de galáxias mais abundante durante a época da reionização. É também a primeira vez que se mede o poder de ionização destas galáxias, o que permite aos astrônomos determinar que estão produzindo radiação energética suficiente para ionizar o Universo primitivo.

Num próximo programa de observação do Webb, denominado GLIMPSE, os cientistas obterão as observações mais sensíveis alguma vez efetuadas do céu. Ao apontar para outro aglomerado de galáxias, chamado Abell S1063, serão identificadas galáxias ainda mais fracas durante a época da reionização. Isto permitirá aos cientistas verificar se as galáxias anãs do estudo atual são típicas da distribuição galáctica em larga escala. Uma vez que estes novos resultados se baseiam em observações obtidas num único campo, a equipe salienta que as propriedades ionizantes das galáxias fracas podem ser diferentes se estas residirem em regiões mais densas. Consequentemente, observações adicionais num campo diferente fornecerão novos conhecimentos e ajudarão a verificar estas conclusões. As observações do programa GLIMPSE também ajudarão na investigação do período conhecido como "amanhecer cósmico", quando o Universo tinha apenas alguns milhões de anos, para melhorar a nossa compreensão do aparecimento das primeiras galáxias.

Estes resultados foram publicados na revista Nature.

Fonte: ESA

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

Uma estrela de nêutrons na supernova 1987A

A supernova 1987A deixou para trás uma estrela de nêutrons, de acordo com novas observações do telescópio espacial James Webb (JWST).

© Hubble / Webb (SN 1987A e fonte compacta de argônio)

A imagem acima é uma combinação obtida pelo telescópio espacial Hubble de SN 1987A e da fonte compacta de argônio. A fonte azul fraca no centro é a emissão da fonte compacta detectada com o instrumento NIRSpec do JWST. Do lado de fora estão os detritos estelares, contendo a maior parte da massa, expandindo-se a milhares de km/s. O brilhante “colar de pérolas” interno é o gás das camadas externas da estrela que foi expelido cerca de 20.000 anos antes da explosão final. É que os detritos rápidos estão agora colidindo com o anel, explicando os pontos brilhantes. Fora do anel interno estão dois anéis externos, presumivelmente produzidos pelo mesmo processo que formou o anel interno. As estrelas brilhantes à esquerda e à direita do anel interno não têm relação com a supernova.

A explosão estelar foi observada pela primeira vez em 23 de fevereiro de 1987. No entanto, as evidências conclusivas da existência da estrela de nêutrons revelaram-se ilusórias. Agora, uma equipe liderada por Claes Fransson (Universidade de Estocolmo) afirma ter resolvido o caso. 

Uma estrela massiva que fica sem combustível nuclear lança as suas camadas exteriores para o espaço, formando um remanescente de supernova em expansão. Mas o núcleo da estrela entra em colapso. Dependendo da massa do núcleo, isto leva a um buraco negro ou a uma estrela de nêutrons, ou seja, uma esfera superdensa de partículas nucleares mais massiva que o Sol, mas não maior do que cerca de 25 quilômetros de diâmetro. 

A uma distância de cerca de 168.000 anos-luz, a SN1987A foi a supernova mais próxima observada na história recente. A detecção de neutrinos produzidos pela explosão sugeriu a formação de uma estrela de nêutrons, mas o objeto ultracompacto permanece escondido por gás e poeira nas partes internas do remanescente da supernova.

A poeira absorve grande parte da radiação. No entanto, o JWST observa no infravermelho, onde a absorção pela poeira é mínima. Os sensíveis espectrógrafos de infravermelho médio e próximo de Webb detectaram agora linhas de emissão de átomos de argônio e enxofre altamente ionizados (átomos que perderam até cinco elétrons) bem no centro do remanescente, indicando a presença de uma fonte energética próxima de raios X. A única fonte possível é uma estrela de nêutrons jovem e quente, que tem uma temperatura superficial de 2 milhões a 3 milhões de graus e irradia raios X de alta energia. 

Curiosamente, os resultados do JWST podem indicar que a estrela de nêutrons está percorrendo o espaço a uma velocidade de algumas centenas de quilômetros por segundo, uma vez que a região de emissão de argônio e enxofre está ligeiramente deslocada do centro original da explosão. As linhas de emissão estão desviadas para o azul, indicando que está se movendo em nossa direção. Essas velocidades natais são um fenômeno bem conhecido das estrelas de nêutrons, resultantes de uma ligeira assimetria da explosão da supernova.

A evidência da existência de uma estrela de nêutrons foi aumentando lentamente. Em 2019, observações do Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), no Chile, revelaram uma bolha de poeira quente, possivelmente aquecida por uma estrela de nêutrons. Dois anos mais tarde, uma equipe liderada por Emanuele Greco (Universidade de Palermo, Itália) encontrou evidências em raios X de uma nebulosa de vento pulsar, um fluxo de partículas carregadas, aceleradas pelo poderoso campo magnético de uma estrela de nêutrons em rápida rotação. No entanto, não puderam excluir uma explicação alternativa: os raios X que observaram também poderiam ser produzidos por choques no anel brilhante de gás que rodeia a estrela que explodiu. 

Graças à alta resolução angular do JWST, a equipe tem agora a certeza de que esses raios X ionizantes devem ter origem muito perto do local da explosão. No entanto, ainda não conseguem distinguir se os raios X vêm da superfície da própria estrela de nêutrons ou de uma nebulosa de vento pulsar em torno da estrela. Uma prova direta envolveria a detecção de pulsações de rádio ou raios X da estrela de nêutrons, ou a observação de uma fonte pontual de raios X.

Os resultados aparecem numa artigo da revista Science.

Fonte: Sky & Telescope

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

O que alimenta o poderoso motor das fusões de estrelas de nêutrons?

A fusão e a colisão de estrelas de nêutrons produzem poderosas explosões de quilonova e erupções de raios gama.

© ESO / M. Garlick (ilustração de duas estrelas de nêutrons em fusão)

Há muito que os cientistas suspeitam que um campo magnético grande e ultraforte é o motor por detrás destes fenômenos altamente energéticos. No entanto, o processo que gera este campo magnético tem sido um mistério até agora. 

Os pesquisadores do Instituto Max Planck de Física Gravitacional e das universidades de Quioto e Toho revelaram o mecanismo subjacente graças a uma simulação computacional de alta resolução que considera toda a física fundamental. Os cientistas mostraram que as estrelas de nêutrons altamente magnetizadas, também conhecidas como magnetares, causam explosões de quilonova muito brilhantes.

Observações telescópicas poderão testar esta previsão no futuro. As estrelas de nêutrons são remanescentes compactos de explosões de supernova e são constituídas por matéria extremamente densa. Têm cerca de 20 quilômetros de diâmetro e até duas vezes a massa do nosso Sol, ou quase 700.000 vezes a massa da nossa Terra. 

No dia 17 de agosto de 2017, os astrônomos observaram pela primeira vez ondas gravitacionais, luz e raios gama da fusão de duas estrelas de nêutrons. Este evento marcou o início de um novo tipo de astronomia, combinando observações de ondas gravitacionais e eletromagnéticas. As observações das ondas gravitacionais e da explosão de raios gama emitidos durante a fusão revelaram que as fusões de estrelas de nêutrons binárias são a origem de, pelo menos, uma parte das explosões de raios gama de curta duração e dos elementos pesados.

Somente através de uma simulação numérica que considera todos os efeitos físicos fundamentais nas fusões de estrelas de nêutrons binárias é possível compreender o processo completo e os mecanismos subjacentes. A simulação numérica da fusãoaplicou a teoria da relatividade de Einstein com uma resolução espacial mais de dez vezes superior a qualquer simulação anterior.

Os fenômenos altamente energéticos associados às fusões de estrelas de nêutrons, como as explosões de quilonova e as erupções de raios gama, são muito provavelmente impulsionados pela magnetohidrodinâmica, ou seja, a interação entre campos magnéticos e fluidos. Isto implica que um remanescente da fusão de estrelas de nêutrons binárias deve gerar um campo magnético forte e em larga escala através de um mecanismo de dínamo.

Parte deste mecanismo é o mesmo que impulsiona o campo magnético do nosso Sol. Numa fusão de estrelas de nêutrons, o campo magnético de larga escala surge devido a instabilidades e vórtices na superfície onde as duas estrelas de nêutrons chocam uma contra a outra.

Existem duas fases de amplificação do campo magnético: numa primeira fase, a instabilidade Kelvin-Helmholtz amplifica rapidamente a energia do campo magnético por um fator de vários milhares em poucos milissegundos após a fusão. No entanto, este campo magnético amplificado continua sendo um campo de pequena escala. Mas após alguns milissegundos, há uma segunda fase de amplificação do campo magnético devido a outra instabilidade, a instabilidade magnetorotacional. Esta instabilidade amplifica ainda mais o campo de pequena escala e atua como um dínamo no campo de larga escala, o mesmo mecanismo que no Sol.

A estrela de nêutrons altamente magnetizada, que resulta da colisão, é hipoteticamente proposta como um magnetar. Cerca de 40 milissegundos após a fusão, os campos magnéticos "levantam" um forte vento de partículas para velocidades relativistas a partir dos polos do magnetar. Este vento forma um jato que está relacionado com os fenômenos altamente energéticos observados. Os pesquisadores mostram, pela primeira vez, que esta hipótese é viável. A simulação sugere que o motor do magnetar gera explosões de quilonova muito brilhantes. Esta previsão poderá ser testada através de observações num futuro próximo.

Um artigo foi publicado na revista Nature Astronomy.

Fonte: Max Planck Institute for Gravitational Physics

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

"Pesando" um buraco negro no Universo primordial

Com o atualizado instrumento GRAVITY do VLTI (Very Large Telescope Interferometer) do ESO, uma equipe de astrônomos liderada pelo Instituto Max Planck de Física Extraterrestre determinou a massa de um buraco negro numa galáxia apenas 2 bilhões de anos após o Big Bang.

© Cosmonovas (ilustração de um buraco negro)

Com 300 milhões de massas solares, o buraco negro é pouco massivo em comparação com a massa da sua galáxia hospedeira. 

No Universo mais local, os astrônomos observaram relações íntimas entre as propriedades das galáxias e a massa dos buracos negros supermassivos que residem nos seus centros, sugerindo que as galáxias e os buracos negros coevoluem. Um teste crucial seria sondar esta relação nos primeiros tempos do cosmos, mas para estas galáxias longínquas os tradicionais métodos diretos de medição da massa do buraco negro são impossíveis ou extremamente difíceis. 

Apesar destas galáxias brilharem frequentemente com muita intensidade, denominadas quasares quando descobertas na década de 1950, estão tão distantes que não podem ser detectadas pela maioria dos telescópios.

Em 2018, foram efetuadas as primeiras medições inovadoras da massa de um buraco negro de um quasar com o GRAVITY. No entanto, este quasar estava muito próximo. Agora, foi atingido um desvio para o vermelho de 2,3, o que corresponde a observar 11 bilhões de anos para trás no tempo. O GRAVITY+ abre agora um caminho novo e preciso para estudar o crescimento dos buracos negros nesta época crítica, frequentemente designada por "meio-dia cósmico", quando tanto os buracos negros como as galáxias estavam crescendo rapidamente. 

Atulamente é possível obter imagens de buracos negros no Universo inicial, 40 vezes mais nítidas do que é obtido com o telescópio espacial James Webb. O GRAVITY combina interferometricamente os quatro telescópios de 8 metros do VLT do ESO, criando essencialmente um telescópio virtual gigante com um diâmetro de 130 metros. 

A equipa foi capaz de resolver espacialmente o movimento das nuvens de gás em torno do buraco negro central da galáxia SDSS J092034.17+065718.0, à medida que giram num disco espesso. Isto permite uma medição direta da massa do buraco negro. Com 320 milhões de massas solares, a massa do buraco negro é inferior à da galáxia que o acolhe, que tem uma massa de cerca de 600 bilhões de massas solares. Este fato sugere que a galáxia hospedeira cresceu mais depressa do que o buraco negro supermassivo, indicando, em alguns sistemas, um atraso entre o crescimento da galáxia e o do buraco negro.

O cenário provável para a evolução desta galáxia parece ser uma forte atividade de supernova, no qual estas explosões estelares expulsam o gás das regiões centrais antes que este possa atingir o buraco negro no centro galáctico. O buraco negro só pode começar a crescer rapidamente e a acompanhar o crescimento global da galáxia quando a galáxia se tiver tornado suficientemente massiva para reter um reservatório de gás nas suas regiões centrais, mesmo contra a atividade de supernova.

Para determinar se este cenário é também o modo dominante da coevolução de outras galáxias e dos seus buracos negros centrais, a equipe vai fazer um acompanhamento com mais medições altamente precisas da massa de buracos negros no Universo primitivo.

Um artigo foi publicado na revista Nature

Fonte: Max Planck Institute for Extraterrestrial Physics

terça-feira, 16 de janeiro de 2024

Supernovas revelam detalhes sobre a expansão do Universo

Em 1998, os astrofísicos descobriram que o Universo está se expandindo a um ritmo acelerado, atribuído a uma entidade misteriosa chamada energia escura, que constitui cerca de 70% do cosmo.

© Cosmonovas (ilustração de uma supernova)

Embora prenunciada por medições anteriores, a descoberta foi uma surpresa; na época, os astrofísicos concordavam que a expansão do Universo deveria estar desacelerando por causa da gravidade. Esta descoberta revolucionária, que os astrofísicos alcançaram com observações de tipos específicos de estrelas em explosão, chamadas supernovas do tipo Ia foi reconhecida com o Prêmio Nobel da Física em 2011. 

Agora, 25 anos após a descoberta inicial, os cientistas que trabalham no Dark Energy Survey (DES) divulgaram os resultados de uma análise sem precedentes usando a mesma técnica para investigar ainda mais os mistérios da energia escura e da expansão do Universo. 

Foram colocadas restrições mais fortes à expansão do Universo já obtidas com o levantamento de supernovas do DES. Em uma apresentação na 243ª reunião da Sociedade Astronômica Americana em 8 de janeiro, os astrofísicos do DES relataram resultados que são consistentes com o modelo cosmológico padrão de um Universo em expansão acelerada. No entanto, as descobertas não são definitivas o suficiente para descartar um modelo possivelmente mais complexo. 

O DES mapeou uma área de quase um oitavo de todo o céu usando a Dark Energy Camera, uma câmera digital de 570 megapixels construída pelo Fermi National Accelerator Laboratory (Fermilab). Foi montado no Telescópio Víctor M. Blanco no Observatório Interamericano Cerro Tololo, um programa do National Optical-Infrared Astronomy Research Laboratory (NOIRLab), em 2012. 

Os cientistas do DES recolheram dados de 758 noites ao longo de seis anos. Para compreender a natureza da energia escura e medir a taxa de expansão do Universo, efetuando análises com quatro técnicas diferentes, incluindo a técnica de supernova usada em 1998. Esta técnica requer dados de supernovas do tipo Ia, que ocorrem quando uma estrela morta extremamente densa, conhecida como anã branca, atinge uma massa crítica e explode. 

Como a massa crítica é quase a mesma para todas as anãs brancas, todas as supernovas do tipo Ia têm aproximadamente o mesmo brilho real e quaisquer variações restantes podem ser calibradas. Assim, quando os astrofísicos comparam o brilho aparente de duas supernovas do tipo Ia vistas da Terra, podem determinar as suas distâncias relativas de nós. Os astrofísicos traçam a história da expansão cósmica com grandes amostras de supernovas abrangendo uma ampla gama de distâncias. Para cada supernova, combinam a sua distância com uma medição do seu desvio para o vermelho, ou seja, a rapidez com que se afasta da Terra devido à expansão do Universo. Este histórico é usado para determinar se a densidade da energia escura permaneceu constante ou mudou ao longo do tempo. À medida que o Universo se expande, a densidade da matéria diminui. Mas se a densidade da energia escura for constante, isso significa que a proporção total de energia escura deve aumentar à medida que o volume aumenta.

O modelo cosmológico padrão é o ΛCDM (Lambda Cold Dark Matter), um modelo baseado na densidade da energia escura sendo constante ao longo do tempo cósmico. Diz-nos como o Universo evolui, usando apenas algumas características, como a densidade da matéria, o tipo de matéria e o comportamento da energia escura. 

O método da supernova restringe muito bem duas dessas características: a densidade da matéria e uma quantidade chamada w, que indica se a densidade da energia escura é constante ou não. De acordo com o modelo cosmológico padrão, a densidade da energia escura no Universo é constante, o que significa que ela não se dilui à medida que o Universo se expande. Se isso for verdade, o parâmetro representado pela letra w deverá ser igual a –1.

Os resultados encontraram w = –0,80 +/- 0,18 usando apenas supernovas. Combinado com dados complementares do telescópio Planck da ESA (Agência Espacial Europeia), onde w atinge –1 dentro da margem de erro. 

Esta análise final de supernovas do DES trouxe muitas melhorias em relação ao primeiro resultado de supernova do DES, lançado em 2018, que utilizou apenas 207 supernovas e três anos de dados. Para a análise de 2018, os cientistas do DES combinaram dados sobre o espectro de cada supernova para determinar os seus desvios para o vermelho e classificá-las como tipo Ia ou não. Eles então usaram imagens tiradas com diferentes filtros para identificar o fluxo no pico da curva de luz, um método chamado fotometria. Mas os espectros são difíceis de adquirir, exigindo muito tempo de observação nos maiores telescópios, o que será impraticável para futuras pesquisas de energia escura, como o Legacy Survey of Space and Time, LSST, a ser conduzido no Observatório Vera C. Rubin. 

A espectroscopia de acompanhamento da galáxia hospedeira com o telescópio Anglo-Australiano forneceu desvios para o vermelho precisos para cada supernova. A utilização de filtros adicionais também permitiu obter dados mais precisos do que os levantamentos anteriores e representa um grande avanço em comparação com as amostras de supernovas anteriores, que utilizaram apenas um ou dois filtros. 

Os pesquisadores do DES usaram técnicas avançadas de aprendizado de máquina para auxiliar na classificação de supernovas. Entre os dados de cerca de dois milhões de galáxias distantes observadas, o DES encontrou vários milhares de supernovas. No final das contas, os cientistas usaram 1.499 supernovas do tipo Ia com dados de alta qualidade, tornando-a a maior e mais profunda amostra de supernovas já compilada por um único telescópio. Em 1998, os astrônomos utilizaram apenas 52 supernovas para determinar que o Universo  está se expandindo a um ritmo acelerado. 

Existem pequenas desvantagens da nova abordagem fotométrica em comparação com a espectroscopia: como as supernovas não possuem espectros, há maior incerteza na classificação. No entanto, o tamanho da amostra muito maior possibilitado pela abordagem fotométrica compensa a pesquisa. As técnicas inovadoras em que o DES foi pioneiro irão moldar e impulsionar futuras análises astrofísicas. Projetos como o LSST de Rubin e o telescópio espacial Nancy Grace Roman da NASA continuarão de onde o DES parou.

Mesmo com experiências mais avançadas sobre energia escura, os cientistas do DES enfatizaram a importância de ter modelos teóricos para explicar a energia escura, além das suas observações experimentais. Os cientistas do DES continuam a usar os resultados das supernovas em mais análises, integrando-os com os resultados obtidos com outras técnicas do DES. 

Um modelo mais complexo pode ser necessário. A energia escura pode de fato variar com o tempo. Para chegar a uma conclusão definitiva, os cientistas precisarão de mais dados. A energia escura ainda está por aí para ser descoberta.

O Dark Energy Survey é uma colaboração internacional que compreende mais de 400 astrofísicos, astrônomos e cosmólogos de mais de 25 instituições, inclusive do Brasil, lideradas por membros do Laboratório Nacional do Acelerador Fermi do Departamento de Energia dos EUA. 

Um artigo foi submetido ao periódico Astrophysical Journal

Fonte: Fermi National Accelerator Laboratory

Estrela altera seu brilho a cada quatro anos

Doze anos de observações em uma região obscura da constelação de Escorpião, vizinha do centro da Via Láctea, levaram à descoberta de um objeto celeste envolto em um contexto singular.

© Vista (estrela central iluminando nebulosa)

Imagem em falsa cor mostra a estrela central (dentro do círculo cinza) que ilumina parte da nebulosa (rosa), enquanto outra região fica escurecida (azul).

Uma equipe internacional de astrônomos identificou uma jovem estrela variável, que muda de brilho ao longo do tempo, imersa em uma nebulosa, uma nuvem de gás e poeira cósmica, que também altera periodicamente sua luminosidade.

“A cada quatro anos, aproximadamente, a estrela pisca e diminui por um certo tempo o seu brilho. Uma região da nebulosa pisca em sincronia com ela, enquanto outra parte se comporta de maneira inversa”, diz o astrofísico Roberto Saito, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), autor principal que estuda o exótico objeto celeste. 

Esse padrão de variação da luminosidade foi observado durante três ciclos completos de quatro anos. O jogo de pisca e apaga da estrela e da nebulosa é atribuído a um fenômeno ondulatório denominado eco luminoso, similar ao que ocorre com a reverberação produzida pelo som. A estrela emite uma luz que, quando encontra a nebulosa, é refletida de volta e ilumina a nuvem de gás e poeira. Devido à velocidade finita da luz e ao grande tamanho da nebulosa, suas diferentes regiões são, do ponto de vista de um observador externo, iluminadas pela estrela central em momentos distintos. A estrela emite luz em todas as direções. A parte da luz que vem diretamente para a Terra ilumina a região da nuvem mais próxima de nós. Já a luz emitida na direção oposta demora mais para chegar aqui porque tem de ir até a porção mais distante da nebulosa antes de ser refletida de volta em direção à Terra. Quando isso ocorre, a estrela já escureceu de novo. 

No espaço, ecos de luz são comumente observados em novas e supernovas. A nova é a explosão brilhante produzida quando uma enorme massa de gás é transferida de uma estrela grande e relativamente fria para outra, pequena, mas muito quente, em um sistema binário. Quando estrelas gigantes chegam ao final de seu ciclo de vida e sofrem uma violenta explosão nuclear, esse jorro de luz e energia é denominado supernova. 

Em uma estrela variável, ecos de luz nunca tinham sido registrados. Por não se parecer com nenhum tipo de estrela presente nos catálogos de objetos astronômicos, o astro da constelação de Escorpião recebeu o nome de WIT-12. As letras remetem à pergunta, em inglês, “what is this?”, usada para indicar corpos celestes que não se encaixam em nenhuma classe conhecida de objetos e são agrupados em uma categoria à parte. O numeral indica que a estrela é o décimo segundo corpo celeste a ser considerado um WIT, nomenclatura adotada pelo projeto Vista Variables in the Via Lactea (VVV). 

Saito também participou da descoberta de outros WIT a partir de dados do VVV. Desde 2010, essa iniciativa mapeou, em frequências do infravermelho próximo, cerca de 1 bilhão de estrelas no plano da Via Láctea com o telescópio Vista, do Observatório Europeu do Sul (ESO), localizado em Cerro Paranal, no Chile. As observações do Vista usaram diferentes filtros de cor ao longo do tempo e possibilitaram identificar, inicialmente, a existência de uma nebulosa cujo brilho se alterava periodicamente. Em seguida, foi possível associar a mudança de luminosidade da nuvem de gás e poeira a uma fonte de brilho, também variável, situada em seu centro, provavelmente uma estrela. 

Para determinar as características desse objeto celeste, os autores do trabalho tiveram de recorrer aos serviços de outro telescópio situado no Chile. Usaram o Soar, – que tem como um de seus sócios o Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) – para obter o espectro da estrela. 

Esse tipo de registro decompõe a luz emitida por um astro em suas cores constituintes (diferentes comprimentos de onda) a partir dos quais se pode inferir alguns parâmetros, como sua composição química, temperatura e luminosidade intrínseca. A análise do espectro no infravermelho próximo permitiu classificar a fonte de luz no interior da nebulosa como um objeto estelar jovem (YSO, young stellar object). 

Os dados disponíveis sugerem que se trata de uma estrela vermelha jovem. Esse tipo de corpo celeste, que está nos primórdios de sua existência, costuma ser relativamente frio, com massa não muito maior do que a do Sol, e ter sido formado há apenas alguns milhões de anos. Também é comum que um YSO ainda esteja circundado por uma nuvem de gás e poeira. 

Para o astrofísico Augusto Damineli, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP), que não está envolvido nos estudos com a estrela e a nuvem de gás e poeira, os resultados apresentados são o começo, e não o fim, dos trabalhos com WIT-12. “Sabemos que se trata de uma estrela variável que emite ecos luminosos para a nebulosa que a cerca”, pondera Damineli. “Foi preciso um investimento observacional significativo para se poder fazer essa afirmação. Ainda assim, ela é completamente insuficiente para responder à pergunta ‘o que é isso?’.” Ele espera que o emprego de novos métodos de análise, possivelmente com ajuda da inteligência artificial, e a entrada em operação de instrumentos de observação mais potentes possam jogar uma luz sobre a natureza de estrelas fora do padrão. Até porque objetos misteriosos como os WIT devem ser registrados com mais constância à medida que novos telescópios, como o Observatório Vera Rubin, no Chile, comecem a funcionar.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: Revista FAPESP

quinta-feira, 11 de janeiro de 2024

Encontrado elo perdido: Supernovas dão origem a buracos negros

Os astrônomos descobriram uma ligação direta entre as mortes explosivas de estrelas de grande massa e a formação dos objetos mais compactos e enigmáticos do Universo: buracos negros e estrelas de nêutrons.

© ESO / L. Calçada (ilustração de uma explosão de supernova)

Com o auxílio do Very Large Telescope (VLT) e do New Technology Telescope (NTT), ambos do Observatório Europeu do Sul (ESO), duas equipes de pesquisadores conseguiram observar o resultado de uma explosão de supernova numa galáxia próxima, encontrando assim evidências de um misterioso objeto compacto deixado para trás. 

Quando chegam ao final das suas vidas, as estrelas de grande massa colapsam sob a sua própria gravidade tão rapidamente que o resultado é uma violenta explosão conhecida por supernova. Acredita-se que, depois da toda a excitação da explosão, o que resta é um núcleo extremamente denso ou um resto compacto da estrela. Dependendo da massa da estrela que explode, o resto compacto tanto pode ser uma estrela de nêutrons, um objeto tão denso que uma colher de chá do seu material pesaria cerca de um trilhão de quilogramas na Terra; ou um buraco negro. 

Os astrônomos encontraram no passado muitos indícios que apontam para esta cadeia de eventos, tais como a descoberta de uma estrela de nêutrons no seio da Nebulosa do Caranguejo, a nuvem de gás que resultou da explosão de uma estrela que ocorreu há quase mil anos atrás. No entanto, nunca este processo foi observado em tempo real, o que significa que evidências diretas de uma supernova deixando para trás um resto compacto têm permanecido elusivas.

Em Maio de 2022, o astrônomo amador da África do Sul, Berto Monard, descobriu a supernova SN 2022jli no braço em espiral da galáxia próxima NGC 157, situada a cerca de 75 milhões de anos-luz de distância da Terra. Duas equipes separadas estudaram o resultado da explosão, descobrindo que esta apresentava um comportamento peculiar. Depois da explosão, o brilho da maioria das supernovas simplesmente desvanece com o tempo; foi observado um declínio suave e gradual na “curva de luz” da explosão. 

Contudo, o comportamento da SN 2022jli era deveras particular: apesar do brilho total se ir desvanecendo, isso não acontecia de forma suave, apresentando antes oscilações para cima e para baixo, mais ou menos a cada 12 dias.

Especula-se que a presença de mais de uma estrela no sistema SN 2022jli pode explicar este comportamento. Realmente, não é incomum que as estrelas de grande massa partilhem a sua órbita com uma estrela companheira, no que é chamado um sistema binário, e a estrela que deu origem à SN 2022jli não é exceção. No entanto, o que é notável neste sistema é que a estrela companheira parece ter sobrevivido à morte violenta da sua parceira e os dois objetos, o resto compacto e a estrela companheira, muito provavelmente continuaram em órbita um do outro. 

Foi descoberto também movimentos periódicos de hidrogênio gasoso e explosões de raios gama no sistema. As observações foram realizadas com um complemento de instrumentos no solo e no espaço, incluindo o instrumento X-shooter montado no VLT do ESO, no Chile. Juntando todas as informações, há concordância de que quando a estrela companheira interagiu com o material lançado durante a explosão de supernova, a sua atmosfera rica em hidrogênio tornou-se mais inchada do que o habitual. Depois, quando o objeto compacto deixado pela explosão passa, ao descrever a sua órbita, pela atmosfera da companheira, vai retirando hidrogênio gasoso e formando um disco quente de matéria ao seu redor. Esta subtração periódica de matéria, ou acreção, produz imensa energia que foi vista nas observações como variações regulares de brilho.

Apesar de não ter sido observada luz vinda do objeto compacto propriamente dito, foi concluído que este roubo energético só pode ser devido a uma estrela de nêutrons invisível, ou possivelmente a um buraco negro, que retira matéria à atmosfera acrescentada da estrela companheira. 

O estudo foi apresentado no 243º Encontro da Sociedade Astronômica Americana em New Orleans, EUA. Um artigo foi publicado no ano passado no periódico The Astrophysical Journal e outro ontem na revista Nature.

Fonte: ESO

terça-feira, 9 de janeiro de 2024

Revendo a Nebulosa Capacete de Thor

Thor não só tem seu próprio dia (quinta-feira), mas também um capacete nos céus.

© Ritesh Biswas (Nebulosa Capacete de Thor)

Popularmente chamado de Capacete de Thor, NGC 2359 é uma nuvem cósmica em forma de chapéu com apêndices semelhantes a asas. Com tamanho heróico até mesmo para um deus nórdico, a Nebulosa Capacete de Thor tem cerca de 30 anos-luz de diâmetro. 

Realmente, a cobertura cósmica da cabeça é mais parecida com uma bolha interestelar, soprada por um vento rápido de uma estrela massiva e brilhante perto do centro da bolha. Conhecida como estrela Wolf-Rayet, a estrela central é uma gigante extremamente quente que se acredita estar em um breve estágio de evolução pré-supernova. 

A NGC 2359 está localizada a cerca de 15.000 anos-luz de distância, em direção à constelação do Grande Overdog. Esta imagem notavelmente nítida é uma mistura de dados provenientes de filtros de banda estreita, captando não apenas estrelas de aspecto natural, mas também detalhes das estruturas filamentares da nebulosa. Espera-se que a estrela no centro do Capacete de Thor exploda em uma supernova espetacular em algum momento nos próximos milhares de anos. 

Fonte: NASA

terça-feira, 26 de dezembro de 2023

A mina de ouro que é uma colisão de estrelas de nêutrons

As estrelas de nêutrons são o produto final de estrelas massivas e reúnem uma grande parte da massa estelar original numa estrela superdensa com um diâmetro de apenas cerca de dez quilômetros.

© I. Markin (simulação da fusão de duas estrelas de nêutrons)

A imagem mostra a simulação numérica do material ejetado resultante de duas estrelas de nêutrons em fusão. As cores vermelhas referem-se ao material ejetado com uma alta fração de nêutrons, que parecerá tipicamente mais vermelho do que o material azul que contém uma fração maior de prótons.

No dia 17 de agosto de 2017, os pesquisadores observaram pela primeira vez as várias assinaturas de uma fusão explosiva de duas estrelas de nêutrons que se orbitavam uma à outra: ondas gravitacionais e enormes surtos de radiação, incluindo uma explosão de raios gama. Astrônomos desenvolveram um método para modelar simultaneamente estes sinais observáveis de uma quilonova. Isto permite-lhes descrever com precisão o que acontece exatamente durante uma fusão, como a matéria nuclear se comporta em condições extremas e porque é que o ouro na Terra deve ter sido criado em tais eventos. 

Utilizando uma nova ferramenta de software, uma equipe do Instituto Max Planck de Física Gravitacional e da Universidade de Potsdam conseguiu interpretar simultaneamente os vários tipos de dados astrofísicos de uma quilonova. Além disso, podem ser utilizados dados de observações de rádio e raios X de outras estrelas de nêutrons, cálculos de física nuclear e até dados de experiências de colisão de íons pesados em aceleradores terrestres. Até agora, as várias fontes de dados têm sido analisadas separadamente e, em alguns casos, os dados têm sido interpretados utilizando modelos físicos diferentes.

Uma estrela de nêutrons é um objeto astrofísico superdenso formado no final da vida de uma estrela massiva numa explosão de supernova. Tal como outros objetos compactos, algumas estrelas de nêutrons orbitam-se umas às outras em sistemas binários. Perdem energia através da emissão constante de ondas gravitacionais, ou seja, pequenas ondulações no tecido do espaço-tempo, e acabam por colidir. 

Estas fusões permitem estudar princípios físicos sob as condições mais extremas do Universo. Por exemplo, as condições destas colisões altamente energéticas levam à formação de elementos pesados como o ouro. Realmente, as estrelas de nêutrons em fusão são objetos únicos para estudar as propriedades da matéria a densidades muito superiores às encontradas nos núcleos atômicos. 

O novo método foi aplicado à primeira e até agora única observação de fusões de estrelas de neutrões binárias. Neste evento os últimos milhares de órbitas das estrelas em torno uma da outra tinham deformado o espaço-tempo o suficiente para criar ondas gravitacionais, que foram detectadas pelos observatórios terrestres de ondas gravitacionais Advanced LIGO e Advanced Virgo. 

Quando as duas estrelas se fundiram, foram ejetados elementos pesados recém-formados. Alguns destes elementos decaíram radioativamente, provocando o aumento da temperatura. Desencadeado por esta radiação térmica, foi detectado um sinal eletromagnético no visível, no infravermelho e no ultravioleta até duas semanas após a colisão. Uma explosão de raios gama, também causada pela fusão da estrela de nêutrons, ejetou material adicional. A reação da matéria da estrela de nêutrons com o meio circundante produziu raios X e emissões de rádio que puderam ser monitoradas em escalas de tempo que vão de dias a anos. 

Os detectores de ondas gravitacionais estão atualmente na sua quarta série de observações. A próxima detecção de uma fusão de estrelas de nêutrons pode surgir a qualquer momento propiciando novas informações de sua evolução.

Um artigo foi publicado na revista Nature Communications

Fonte: Max Planck Institute

Detectada segunda supernova numa galáxia distante

No passado mês de novembro, o telescópio espacial James Webb da NASA observou um enorme aglomerado de galáxias chamado MACS J0138.0-2155.

© Webb (supernova na galáxia MRG-M0138)

Através do efeito de lente gravitacional, previsto pela primeira vez por Albert Einstein, uma galáxia distante de nome MRG-M0138 aparece deformada pela poderosa gravidade do aglomerado de galáxias interveniente. Além de deformar e ampliar a galáxia distante, o efeito de lente gravitacional causado pelo aglomerado de galáxias MACS J0138 produz cinco imagens diferentes de MRG-M0138. 

Em 2019, os astrônomos anunciaram a surpreendente descoberta de que uma explosão estelar, ou supernova, tinha ocorrido dentro de MRG-M0138, vistas em imagens obtidas em 2016 pelo telescópio espacial Hubble. Veja detalhes em: Explosão de supernova esperada para 2037.

Quando um outro grupo de astrônomos examinou as imagens do Webb de 2023, ficou espantado ao descobrir que, sete anos mais tarde, a mesma galáxia abrigava uma segunda supernova. 

Quando uma supernova explode por trás de uma lente gravitacional, a sua luz chega à Terra por vários percursos diferentes. Podemos comparar esses percursos a vários comboios que saem de uma estação ao mesmo tempo, todos viajando à mesma velocidade e com destino ao mesmo local. Cada comboio faz um percurso diferente e, devido às diferenças na duração da viagem e no terreno, os comboios não chegam ao seu destino ao mesmo tempo. Do mesmo modo, as imagens de supernovas que sofrem o efeito de lente gravitacional aparecem ao longo de dias, semanas ou mesmo anos. Ao medir as diferenças nos tempos em que as imagens das supernovas aparecem, podemos medir a história do ritmo de expansão do Universo, conhecida como a constante de Hubble, que é um grande desafio na cosmologia atual. 

O problema é que estas supernovas com imagens múltiplas são extremamente raras: até agora foram detectadas menos de uma dúzia. A supernova de 2016 em MRG-M0138, chamada Requiem, destacou-se por várias razões. Em primeiro lugar, estava a 10 bilhões de anos-luz de distância. Em segundo lugar, a supernova era provavelmente do mesmo tipo (Ia) que é usado como "vela padrão" para medir distâncias cósmicas. Em terceiro lugar, os modelos previam que uma das imagens da supernova seria tão atrasada pelo seu trajeto através da gravidade extrema do aglomerado que só apareceria em meados da década de 2030. 

Infelizmente, como Requiem só foi descoberta em 2019, muito depois de ter desaparecido de vista, não foi possível reunir dados suficientes para medir a constante de Hubble nesse momento. Agora através da segunda supernova serão efetuadas medidas para corroborar a constante de Hubble. As supernovas são normalmente imprevisíveis, mas as observações infravermelhas, por volta de 2035, irão captar o seu último suspiro e fornecer uma nova e precisa medição da constante de Hubble.

Fonte: Space Telescope Science Institute

quinta-feira, 14 de dezembro de 2023

Nova observação de alta definição de uma explosão estelar

Como um ornamento redondo e brilhante, pronto a ser colocado numa árvore de Natal, o remanescente de supernova Cassiopeia A (Cas A) brilha numa nova imagem do telescópio espacial James Webb. No entanto, esta cena não é a proverbial noite feliz e nem tudo está calmo.

© Webb / MIRI (Cassiopeia A no infravermelho próximo)

A imagem de Cas A obtida pelo instrumento NIRCam (Near-Infrared Camera) do Webb mostra uma explosão muito violenta com uma resolução anteriormente inalcançável nestes comprimentos de onda. Esta imagem de alta resolução revela pormenores intrincados da concha de material em expansão que embate no gás liberado pela estrela antes desta explodir. 

O Cas A está localizado a 11.000 anos-luz de distância, na direção da constelação de Cassiopeia. Estima-se que tenha explodido há cerca de 340 anos, do nosso ponto de vista.

A supernova Cas A é um dos remanescentes de supernova mais bem estudados em todo o cosmos. Ao longo dos anos, os observatórios terrestres e espaciais, incluindo o telescópio espacial Hubble, reuniram coletivamente uma imagem de vários comprimentos de onda dos restos esfarrapados do objeto. 

No entanto, os astrônomos entraram agora numa nova era no estudo de Cas A. Em abril de 2023, o MIRI (Mid-Infrared Instrument) do Webb deu início a esta história, revelando características novas e inesperadas no interior da concha interna do remanescente de supernova.

© Webb / MIRI (Cassiopeia A no infravermelho médio)

Mas muitas dessas características são invisíveis na nova imagem do NIRCam. A luz infravermelha é invisível aos nossos olhos, pelo que os processadores de imagem representam estes comprimentos de onda de luz com cores visíveis. Nesta imagem mais recente de Cas A, foram atribuídas cores aos diferentes filtros do NIRCam, e cada uma dessas cores indica uma atividade diferente que ocorre no interior do objeto. À primeira vista, a imagem do NIRCam pode parecer menos colorida do que a imagem MIRI. No entanto, isso não significa que haja menos informação: simplesmente, trata-se dos comprimentos de onda em que o material do objeto está emitindo a sua luz. As cores mais visíveis na imagem são os aglomerados de cor de laranja brilhante e rosa claro que constituem o invólucro interior do remanescente de supernova. 

A visão nítida do Webb consegue detectar os menores nós de gás, compostos por enxofre, oxigênio, argônio e neônio da própria estrela. Neste gás contém uma mistura de poeira e moléculas, que acabarão por ser incorporadas em novas estrelas e sistemas planetários. Alguns filamentos de detritos são demasiado pequenos para serem resolvidos, mesmo pelo Webb, o que significa que são comparáveis ou inferiores a 16 bilhões de quilômetros de diâmetro (cerca de 100 UA). Em comparação, a totalidade de Cassiopeia A estende-se por 10 anos-luz, ou cerca de 9,5x10^13 quilômetros. 

Quando se compara a nova imagem no infravermelho próximo de Cas A pelo Webb com a imagem no infravermelho médio, a sua cavidade interior e a camada mais exterior estão curiosamente desprovidas de cor. Os arredores da camada interior principal, que apareciam como um laranja e vermelho profundos na imagem MIRI, parecem agora a fumaça de uma fogueira. Isto marca o local onde a onda de explosão da supernova está embatendo no material circundante. A poeira no material circunstelar é demasiado fria para ser detectada diretamente nos comprimentos de onda do infravermelho próximo, mas ilumina-se no infravermelho médio. 

Os pesquisadores concluíram que a cor branca é a luz da radiação síncroton, que é emitida em todo o espetro eletromagnético, incluindo no infravermelho próximo. É gerada por partículas carregadas que se deslocam a velocidades extremamente elevadas e que se movimentam em espiral em torno de linhas de campo magnético. A radiação síncroton é também visível nas conchas em forma de bolha na metade inferior da cavidade interna. Igualmente invisível no infravermelho próximo, o "loop" de luz verde na cavidade central de Cas A que brilhava no infravermelho médio. Esta característica foi descrita como "difícil de compreender" pelos investigadores na altura da sua primeira observação. Embora o "verde"  não seja visível no NIRCam, o que resta no infravermelho próximo nessa região pode dar uma ideia do misterioso fenômeno. Os buracos circulares visíveis na imagem MIRI são ligeiramente delineados por emissões brancas e púrpuras na imagem NIRCam, isto representa gás ionizado. Provavelmente, isto se deve aos detritos da supernova empurrarem e esculpirem o gás deixado pela estrela antes desta explodir. 

Existe também uma caraterística fascinante no canto inferior direito do campo de visão da NIRCam. Essa mancha grande e estriada Cas A Bebê, porque parece ser uma "cria" da supernova principal. Isto é um eco de luz. A luz da explosão da estrela há muito tempo atingiu, e está aquecendo, a poeira distante, que brilha à medida que arrefece. A complexidade do padrão de poeira, e a aparente proximidade de Cas A Bebê com a própria Cas A, são particularmente intrigantes. Na realidade, Cas A Bebê está localizada a cerca de 170 anos-luz atrás do remanescente de supernova. Há também vários outros ecos de luz menores espalhados pelo novo retrato do Webb.

Fonte: Space Telescope Science Institute

terça-feira, 7 de novembro de 2023

Quando astrônomos amadores apontam o caminho

Esta imagem mostra a galáxia espiral NGC 941, que fica a cerca de 55 milhões de anos-luz da Terra.

© Hubble (NGC 941)

Os dados usados para esta imagem foram coletados pela Advanced Camera for Surveys (ACS) do Hubble. A bela galáxia NGC 941 é sem dúvida a principal atração desta imagem; no entanto, esta galáxia de aspecto nebuloso não foi a motivação para o recolhimento de dados.

Esta distinção pertence a um evento astronômico que ocorreu na galáxia anos antes: a supernova SN 2005ad. A localização desta supernova desbotada foi observada como parte de um estudo de múltiplas supernovas ricas em hidrogênio, também conhecidas como supernovas do tipo II, a fim de compreender melhor os ambientes em que ocorrem certos tipos de supernovas. 

Embora o estudo tenha sido conduzido por astrônomos profissionais, a SN 2005ad deve a sua descoberta a um distinto astrônomo amador chamado Kōichi Itagaki, que descobriu mais de 170 supernovas. Isto pode levantar a questão de como um astrônomo amador poderia detectar algo como um evento de supernova antes dos astrônomos profissionais, que têm acesso a telescópios como o Hubble. A resposta é, em parte, que a detecção de supernovas é uma mistura de habilidade, facilidades e sorte.

A maioria dos eventos astronômicos acontecem ao longo de períodos de tempo que superam o tempo de vida humano, mas as explosões de supernovas são extraordinariamente rápidas, aparecendo muito repentinamente e depois aumentando e diminuindo o brilho ao longo de um período de dias ou semanas. Outro aspecto é que os astrônomos profissionais muitas vezes não passam muito tempo observando. Há uma grande competição por tempo em telescópios como o Hubble, e então os dados de algumas horas de observações podem levar semanas, meses, ou às vezes até anos, para serem processados e analisados em todo o seu potencial.

Astrônomos amadores podem passar muito mais tempo observando os céus e, às vezes, possuem sistemas extremamente impressionantes de telescópios, computadores e software que podem usar. Tantas supernovas são detectadas por amadores habilidosos como Itagaki que existe na verdade um sistema online configurado para reportá-las o Transient Name Server

Isto é uma grande ajuda para os astrônomos profissionais, porque com eventos de supernova o tempo é verdadeiramente essencial. Depois que a descoberta de SN 2005ab foi relatada, astrônomos profissionais foram capazes de acompanhar estudos espectroscópicos e confirmá-la como uma supernova tipo II, o que eventualmente levou à inclusão de sua localização neste estudo com o Hubble. Tal estudo não seria possível sem uma rica biblioteca de supernovas anteriores, construída com o olhar atento de astrônomos amadores. 

Fonte: ESA