sexta-feira, 12 de dezembro de 2025

Medindo o cloro e o potássio no remanescente de uma supernova

Porque é que estamos aqui?

© JAXA (cloro e potássio provêm da explosão de estrelas)

É a questão mais fundamental e persistente da humanidade.

Traçar as origens dos elementos é uma tentativa direta de responder a esta questão ao seu nível mais profundo. Sabemos que muitos elementos são criados no interior de estrelas e supernovas, que depois os lançam no Universo, mas a origem de alguns elementos fundamentais tem permanecido um mistério.

O cloro e o potássio, ambos elementos que possuem um número ímpar de prótons, são essenciais à vida e à formação dos planetas. De acordo com os modelos teóricos atuais, as estrelas produzem apenas cerca de um-décimo da quantidade destes elementos observada no Universo, uma discrepância que há muito intriga os astrofísicos.

Este fato inspirou um grupo de pesquisadores da Universidade de Quioto e da Universidade de Meiji a examinar remanescentes de supernova em busca de vestígios destes elementos. Utilizando o XRISM (X-Ray Imaging and Spectroscopy Mission), um satélite de raios X lançado pela JAXA (Japan Aerospace Exploration Agency) em 2023, a equipe conseguiu realizar observações espectroscópicas de raios X de alta resolução do remanescente de supernova Cassiopeia A na Via Láctea. Os cientistas utilizaram o microcalorímetro Resolve a bordo do XRISM, que proporciona uma resolução, em altas energias, uma ordem de grandeza superior à dos detectores de raios X anteriores, o que lhes permitiu observar tênues linhas de emissão de elementos raros.

Analisaram o espetro de raios X de Cassiopeia A e compararam as abundâncias de cloro e potássio com vários modelos de nucleossíntese de supernova. foram descobertas linhas claras de emissão de raios X de ambos os elementos em abundâncias muito superiores às previstas pelos modelos padrão de supernovas. Isto forneceu a primeira evidência observacional de que uma supernova pode criar cloro e potássio suficientes.

A equipe sugere que a forte mistura no interior de estrelas massivas causada por rotação rápida, interação binária ou eventos de fusão de conchas, pode aumentar significativamente a produção destes elementos.

Estes resultados revelam que os elementos vitais para a vida foram produzidos em ambientes rigorosos e intensos no interior das estrelas, muito longe de qualquer coisa que se assemelhe às condições necessárias para o aparecimento da vida. O estudo também demonstra o poder da espectroscopia de raios X de alta precisão para investigar as origens dos elementos e os processos físicos no interior das estrelas.

A seguir, a equipe planeja observar outros remanescentes de supernova com o XRISM para determinar se a produção acrescida de cloro e potássio é comum entre as estrelas massivas ou exclusiva de Cassiopeia A. Isto ajudará a revelar se tais processos internos de mistura são uma característica universal da evolução estelar.

Um artigo foi publicado na revista Nature Astronomy. Fonte: Kyoto University 

Buraco negro em erupção provoca ventos ultrarrápidos

Os principais telescópios espaciais de raios X, detectaram uma extraordinária erupção de um buraco negro supermassivo.

© Hubble (NGC 3783)

Numa questão de horas, o monstro gravitacional provocou ventos poderosos, lançando material para o espaço a uma velocidade impressionante de 60.000 km/s. O gigantesco buraco negro esconde-se no interior de NGC 3783, uma bela galáxia espiral fotografada recentemente pelo telescópio espacial Hubble

Os astrônomos observaram um clarão brilhante de raios X que irrompeu do buraco negro antes de desvanecer rapidamente. À medida que desvanecia, surgiram ventos velozes, a um-quinto da velocidade da luz.

Para estudar NGC 3783 e o seu buraco negro, foram utilizados simultaneamente o XMM-Newton da ESA e o XRISM (X-Ray Imaging and Spectroscopy Mission), uma missão liderada pela JAXA com a participação da ESA e da NASA.

O buraco negro em questão tem a massa de 30 milhões de sóis. À medida que devora material próximo, alimenta uma região extremamente brilhante e ativa no coração da galáxia espiral. Esta região, conhecida como Núcleo Galáctico Ativo (ou NGA), brilha com todos os tipos de luz e lança poderosos jatos e ventos para o cosmos. Os ventos em torno deste buraco negro parecem ter sido criados quando o campo magnético emaranhado do NGA se "desenrolou" subitamente.

Os ventos do buraco negro assemelham-se a grandes erupções solares de material conhecidas como ejeções de massa coronal, que se formam quando o Sol lança fluxos de material sobreaquecido para o espaço. Desta forma, o estudo mostra que os buracos negros supermassivos agem por vezes como a nossa própria estrela, fazendo com que estes misteriosos objetos pareçam um pouco menos alienígenas. De fato, no passado dia 11 de novembro e na sequência de uma erupção intensa, foi observada no Sol uma ejeção de massa coronal, com os ventos associados a este evento a atingirem velocidades iniciais de 1.500 km/s.

O XMM-Newton é um explorador pioneiro do Universo quente e extremo há mais de 25 anos, enquanto o XRISM tem trabalhado para responder a questões fundamentais em aberto sobre como a matéria e a energia se movem através do cosmos desde o seu lançamento em setembro de 2023. Os dois telescópios espaciais de raios X trabalharam em conjunto para descobrir este acontecimento único e para compreender a erupção e os ventos do buraco negro.

Um artigo foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics.

Fonte: Space Research Organisation Netherlands

Grandes estrelas deixam sua marca

Esta galáxia azul brilhante é uma imagem obtida pelo telescópio espacial Hubble, é uma galáxia anã compacta azul chamada Markarian 178 (Mrk 178).

© Hubble (Markarian 178)

Esta galáxia, substancialmente menor que a nossa Via Láctea, está localizada a 13 milhões de anos-luz de distância, na constelação da Ursa Maior.

A Mrk 178 é uma das mais de 1.500 galáxias Markarian. Essas galáxias receberam esse nome em homenagem ao astrofísico armênio Benjamin Markarian, que compilou uma lista de galáxias surpreendentemente brilhantes na luz ultravioleta.

Embora a maior parte da galáxia seja azul devido à abundância de estrelas jovens e quentes com pouca poeira ao seu redor, Mrk 178 adquire uma tonalidade vermelha devido a uma concentração de estrelas massivas, especialmente na região avermelhada mais brilhante, próxima à borda da galáxia. Essa nuvem azul abriga um grande número de objetos raros chamados estrelas Wolf-Rayet. Estrelas Wolf-Rayet são estrelas massivas que estão expelindo suas atmosferas por meio de ventos estelares poderosos.

Como Mrk 178 contém muitas estrelas Wolf-Rayet, as linhas de emissão brilhantes dos ventos estelares quentes dessas estrelas estão gravadas no espectro da galáxia. Os elementos hidrogênio e oxigênio particularmente ionizados aparecem com uma cor vermelha em Mrk 178 nesta foto, observada usando alguns dos filtros de luz especializados do Hubble.

Estrelas massivas entram na fase Wolf-Rayet pouco antes de colapsarem em buracos negros ou estrelas de nêutrons. Como as estrelas Wolf-Rayet duram apenas alguns milhões de anos, os pesquisadores sabem que algo deve ter desencadeado uma recente explosão de formação estelar em Mrk 178.

À primeira vista, não está claro qual poderia ser a causa, a galáxia Mrk 178 não parece ter vizinhos galácticos próximos que pudessem ter agitado seu gás para formar novas estrelas. Os astrônomos acreditam que o fenômeno foi desencadeado pela interação com um satélite menor, conforme revelado pela presença de estruturas de maré de baixo brilho superficial detectadas ao redor de Mrk 178 em imagens profundas adquiridas com o Telescópio Binocular Grande (LBT). Dados futuros de alta resolução do Hubble serão cruciais para o estudo detalhado da história da formação estelar de Mrk 178.

Fonte: ESA

sábado, 6 de dezembro de 2025

Galáxias na Fornalha

Um exemplo de violência em escala cósmica, a enorme galáxia elíptica NGC 1316 encontra-se a cerca de 75 milhões de anos-luz de distância, na direção de Fornax, a constelação austral da Fornalha.

© ShaRA Team (NGC 1316 & NGC 1317)

Investigando esse fenômeno surpreendente, astrônomos suspeitam que a galáxia gigante tenha colidido com sua vizinha menor, a NGC 1317, vista logo à direita do centro da grande galáxia, produzindo extensos fluxos estelares em forma de laços e conchas.

A luz desse encontro próximo teria chegado à Terra há cerca de 100 milhões de anos. Na nítida imagem telescópica, as regiões centrais da NGC 1316 e da NGC 1317 parecem separadas por mais de 100.000 anos-luz. Complexas faixas de poeira visíveis em seu interior também indicam que a própria NGC 1316 é o resultado de uma fusão de galáxias em um passado remoto.

Localizada na periferia do aglomerado de galáxias de Fornax, a NGC 1316 é conhecida como Fornax A. Uma das galáxias visualmente mais brilhantes do aglomerado de Fornax, é também uma das fontes de rádio celestes mais fortes e extensas, com emissão de rádio que se estende muito além deste campo de visão de um grau de largura.

Fonte: NASA

Os jatos bipolares de KX Andromedae

Expelindo da estrela variável KX Andromedae, localizada na galáxia de Andrômeda, esses exuberantes jatos bipolares.

© Deep Sky Collective (jatos bipolares em KX Andromedae)

Descobertos recentemente, eles são revelados com detalhes sem precedentes nesta imagem telescópica profunda centrada em KX Andromedae e composta por mais de 692 horas de dados de imagem combinados.

Foi descoberto espectroscopicamente que KX Andromedae ​​é um sistema estelar binário interagindo, composto por uma estrela brilhante e quente do tipo B com uma estrela gigante fria e inchada como sua companheira próxima compartilhando a mesma órbita.

O sistema tem apenas cerca de 25 milhões de anos. O par completa uma órbita circular a cada 38,92 dias com uma inclinação de 50°.

O material estelar da estrela gigante fria provavelmente está sendo transferido para a estrela quente do tipo B através de um disco de acreção, com jatos simétricos espetaculares sendo expelidos perpendicularmente ao próprio disco.

A distância conhecida de KX Andromedae, de 2.500 anos-luz, o tamanho angular dos jatos e a inclinação estimada do disco de acreção levam à estimativa do tamanho de cada jato em impressionantes 19 anos-luz.

Fonte: NASA

Fuga de hélio no exoplaneta WASP-107 b

Uma equipe internacional utilizou o telescópio espacial James Webb (JWST) para observar nuvens gigantes de hélio escapando do exoplaneta WASP-107 b.

© T. Roger (ilustração do exoplaneta WASP-107 b)

A análise da pesquisa fornece pistas valiosas para compreender este fenômeno de fuga atmosférica, que influencia a evolução dos exoplanetas e molda algumas das suas características. Por vezes, a atmosfera de um planeta escapa-se para o espaço. É o caso da Terra, que perde irreversivelmente um pouco mais de 3 kg de matéria (sobretudo hidrogênio) por segundo.

Este processo é de particular interesse para os astrônomos no estudo dos exoplanetas situados muito perto da sua estrela, que, aquecidos a temperaturas extremas, estão precisamente sujeitos a este fenômeno.  Desempenha um papel importante na sua evolução.

A equipe conseguiu observar grandes fluxos de gás hélio escapando de WASP-107 b. Este exoplaneta está localizado a mais de 210 anos-luz do nosso Sistema Solar. Esta é a primeira vez que este elemento químico é identificado com o JWST num exoplaneta, permitindo uma descrição detalhada do fenômeno.

Descoberto em 2017, WASP-107 b está localizado sete vezes mais perto da sua estrela do que Mercúrio, o planeta mais próximo do nosso Sol. A sua densidade é muito baixa porque tem o tamanho de Júpiter, mas tem apenas um décimo da sua massa, colocando-o entre os chamados "superinchados", uma categoria de exoplanetas com densidades extremamente baixas.

O vasto fluxo de hélio foi detectado na extensão da sua atmosfera, chamada "exosfera". Esta nuvem bloqueia parcialmente a luz da estrela mesmo antes de o planeta passar à sua frente. Os modelos de escape atmosférico confirmam a presença de fluxos de hélio, tanto à frente como atrás do planeta, que se estendem na direção do seu movimento orbital até cerca de dez vezes o raio do planeta.

Para além do hélio, os astrônomos puderam confirmar a presença de água e de vestígios de misturas químicas (incluindo monóxido de carbono, dióxido de carbono e amoníaco) na atmosfera do planeta, enquanto constataram a ausência de metano, que o JWST é capaz de detectar.

Estas são pistas valiosas para reconstruir a história da formação e migração de WASP-107 b: o planeta formou-se longe da sua órbita atual, depois aproximou-se da sua estrela, o que explicaria a sua atmosfera inchada e a perda de gás. O estudo de WASP-107 b é uma referência fundamental para compreender melhor a evolução e a dinâmica destes mundos distantes.

Na Terra, a fuga atmosférica é demasiado fraca para influenciar drasticamente o nosso planeta. Mas seria responsável pela ausência de água no nosso vizinho próximo, Vênus. É, portanto, essencial compreender os mecanismos deste fenômeno, que poderia desgastar a atmosfera de certos exoplanetas rochosos.

Um artigo foi publicado no periódico Nature Astronomy.

Fonte: Université de Genève