sexta-feira, 15 de março de 2024

Explicando o "colar de pérolas" de uma supernova

Os físicos recorrem frequentemente à instabilidade de Rayleigh-Taylor para explicar a formação de estruturas fluidas nos plasmas, mas essa pode não ser a história completa no que se refere ao anel de aglomerados de hidrogênio em torno da supernova SN 1987A.

© Webb (SN 1987A)

Num estudo, efetuado na Universidade de Michigan, pesquisadores argumentam que a instabilidade de Crow explica melhor o "colar de pérolas" que rodeia o remanescente estelar, lançando luz sobre um mistério astrofísico de longa data. 

A parte fascinante disto é que o mesmo mecanismo que desfaz os rastos dos aviões pode estar aqui em jogo. Nos rastos de condensação dos aviões, a instabilidade Crow cria rupturas na linha suave das nuvens devido ao fluxo de ar em espiral que sai da extremidade de cada asa, conhecido como vórtices de ponta de asa. Estes vórtices fluem uns para os outros, criando lacunas, algo que podemos ver devido ao vapor de água nos gases de escape. E a instabilidade de Crow pode fazer algo que a instabilidade de Rayleigh-Taylor não conseguiu: prever o número de aglomerados observados em torno do remanescente.

A supernova SN 1987A está entre as mais famosas explosões estelares porque fica relativamente perto da Terra, a 163.000 anos-luz de distância, e a sua luz chegou à Terra num momento em que existiam observatórios sofisticados para testemunhar a sua evolução. É a primeira supernova visível a olho nu desde a supernova de Kepler do ano de 1604, o que faz dela um acontecimento astrofísico incrivelmente raro que desempenhou um papel importante na compreensão da evolução estelar. 

Embora ainda se desconheça muito sobre a estrela que explodiu, pensa-se que o anel de gás que a rodeava antes da explosão provém da fusão de duas estrelas. Essas estrelas "derramaram" hidrogênio no espaço ao seu redor quando se tornaram gigantes azuis dezenas de milhares de anos antes da supernova. Essa nuvem de gás em forma de anel foi então fustigada pelo fluxo de partículas carregadas altamente velozes que se desprendiam da gigante azul, conhecido como vento estelar. 

Pensa-se que os aglomerados se formaram antes da explosão da estrela. Os pesquisadores simularam a forma como o vento empurrava a nuvem para fora, ao mesmo tempo que arrastava a superfície, com a parte superior e inferior da nuvem a serem empurradas para fora mais rapidamente do que o centro. Isto fez com que a nuvem se enrolasse sobre si própria, o que desencadeou a instabilidade de Crow e fez com que se separasse em aglomerados bastante uniformes que se tornaram no colar de pérolas. A previsão de 32 está muito próxima dos 30 a 40 aglomerados observados em torno do remanescente da SN 1987A.

A equipe viu indícios de que a instabilidade Crow poderia prever a formação de mais anéis de contas em torno da estrela, mais afastados do anel que aparece mais brilhante nas imagens telescópicas. Ficaram satisfeitos por ver que mais aglomerados parecem surgir na imagem do instrumento NIRCam (Near Infrared Camera) do telescópio espacial James Webb, publicada em agosto do ano passado. Foi sugerido também que a instabilidade de Crow pode estar em jogo quando a poeira em volta de uma estrela se transforma em planetas, embora seja necessária mais análise para explorar esta possibilidade.

Um artigo foi publicado no periódico Physical Review Letters.

Fonte: University of Michigan

Telescópios confirmam o ritmo de expansão do Universo

O ritmo a que o Universo está se expandindo, caracterizada pela constante de Hubble, é um dos parâmetros fundamentais para compreender a evolução e o destino final do cosmos.

© Hubble / Webb (NGC 5468)

Esta imagem da NGC 5468, uma galáxia situada a cerca de 130 milhões de anos-luz da Terra, combina dados dos telescópios espaciais Hubble e James Webb. Esta é a galáxia mais distante em que o Hubble identificou estrelas variáveis Cefeidas.

Atualmente, observa-se uma diferença persistente, designada por Tensão de Hubble, entre o valor da constante medido com uma vasta gama de indicadores de distância independentes e o seu valor previsto a partir do brilho remanescente do Big Bang. 

O telescópio espacial James Webb confirmou que o olhar perspicaz do telescópio espacial Hubble estava certo desde o início, eliminando qualquer dúvida remanescente sobre as medições do Hubble. 

Uma das justificativas científicas para a construção do Hubble foi a utilização do seu poder de observação para fornecer um valor exato para o ritmo de expansão do Universo. Antes do lançamento do Hubble, em 1990, as observações efetuadas por telescópios terrestres apresentavam incertezas enormes. Dependendo dos valores deduzidos para o ritmo de expansão, o Universo poderia ter entre 10 e 20 bilhões de anos. Nos últimos 34 anos, o Hubble reduziu esta medição para uma precisão inferior a um por cento, uma idade de 13,8 bilhões de anos. Isto foi conseguido através do refinamento da chamada "escada de distâncias cósmicas", medindo importantes pontos de referência conhecidos como estrelas variáveis Cefeidas. 

No entanto, o valor do Hubble não está de acordo com outras medições que mostram que o Universo estava se expandindo mais rapidamente após o Big Bang. Estas observações foram feitas pelo satélite Planck da ESA, que mapeou a radiação cósmica de fundo em micro-ondas, sendo um plano de como o Universo evoluiria em termos de estrutura depois do arrefecimento pós-Big Bang. Com o Webb, permitiu aos astrônomos verificar os resultados do Hubble. As imagens infravermelhas das Cefeidas, pelo Webb, concordaram com os dados ópticos do Hubble. 

O resultado final é que a chamada Tensão de Hubble, entre o que acontece no Universo próximo e a expansão do Universo primitivo, continua sendo um enigma para os cosmólogos. Poderá haver algo entrelaçado no tecido do espaço que ainda não compreendemos. Será que para resolver esta discrepância é necessária uma nova física? Ou será o resultado de erros de medição entre os dois diferentes métodos utilizados para determinar o ritmo de expansão do espaço? 

O Hubble e o Webb juntaram-se agora para produzir medições definitivas, reforçando a ideia de que algo mais, e não erros de medição, está influenciando o ritmo de expansão. Como verificação cruzada, uma primeira observação do Webb em 2023 confirmou que as medições do Hubble acerca da expansão do Universo eram exatas. No entanto, na esperança de aliviar a Tensão de Hubble, alguns cientistas especularam que erros invisíveis nas medições podem aumentar e tornar-se visíveis à medida que olhamos mais profundamente para o Universo.

Em particular, a aglomeração estelar poderia afetar de forma sistemática as medições do brilho de estrelas mais distantes. A equipe do levantamento SH0ES (Supernova H0 for the Equation of State of Dark Energy), liderada por Adam Riess, físico da Universidade Johns Hopkins em Baltimore, EUA, obteve observações adicionais com o Webb de objetos que são marcos cósmicos críticos, conhecidos como estrelas variáveis Cefeidas, que podem agora ser correlacionados com os dados do Hubble. 

Os astrônomos utilizam vários métodos para medir as distâncias relativas no Universo, dependendo do objeto que está sendo observado. Coletivamente, estas técnicas são conhecidas como a escada de distâncias cósmicas; cada degrau ou técnica de medição depende do degrau anterior para ser calibrado. Mas alguns astrônomos sugeriram que, avançando ao longo do "segundo degrau", a escada de distâncias cósmicas poderia ficar instável se as medições das Cefeidas se tornassem menos precisas com a distância. Tais imprecisões podem ocorrer porque a luz de uma Cefeida se pode misturar com a de uma estrela adjacente, um efeito que se pode tornar mais pronunciado com a distância, à medida que as estrelas se aglomeram no céu e se tornam mais difíceis de distinguir umas das outras.

O desafio observacional é o fato das imagens anteriores do Hubble, destas variáveis Cefeidas mais distantes, parecerem mais amontoadas e sobrepostas com estrelas vizinhas a distâncias cada vez maiores entre nós e as suas galáxias hospedeiras, exigindo uma contabilização cuidadosa deste efeito. A existência de poeira interveniente complica ainda mais a certeza das medições no visível. O Webb atravessa a poeira e isola naturalmente as Cefeidas das estrelas vizinhas porque a sua visão é mais nítida do que a do Hubble nos comprimentos de onda infravermelhos.

As novas observações do Webb incluem cinco galáxias hospedeiras de oito supernovas do Tipo Ia, contendo um total de 1.000 Cefeidas, e vão até à galáxia mais distante onde as Cefeidas foram bem medidas, a NGC 5468, a uma distância de 130 milhões de anos-luz.

Em conjunto, a confirmação da Tensão de Hubble pelo Hubble e pelo Webb permite que outros observatórios resolvam o mistério, incluindo o futuro telescópio espacial Nancy Grace Roman da NASA e a missão Euclid recentemente lançada pela ESA. Atualmente, é como se a escada de distâncias observada pelo Hubble e pelo Webb tivesse fixado firmemente um ponto de ancoragem numa das margens de um rio, e o brilho remanescente do Big Bang observado pelo Planck no início do Universo estivesse fixado firmemente na outra margem. A forma como a expansão do Universo se alterou nos bilhões de anos entre estes dois pontos ainda não foi diretamente observada. 

"Precisamos de descobrir se nos está escapando alguma coisa sobre como ligar o início do Universo aos dias de hoje", disse Riess. 

Estas descobertas foram publicadas no periódico The Astrophysical Journal Letters

Fonte: ESA

A maior galáxia conhecida no início do Universo

Os astrônomos estão atualmente desfrutando de um período frutífero de descobertas, investigando os muitos mistérios do Universo primitivo.

© Webb (galáxia Gz9p3)

A imagem à esquerda mostra um núcleo duplo na região central e a imagem à direita evidencia os contornos do perfil de luz que revelam uma estrutura alongada produzida pela fusão de duas galáxias. 

O lançamento bem-sucedido do telescópio espacial James Webb alargou os limites do que podemos ver. As observações estão agora entrando nos primeiros 500 milhões de anos após o Big Bang, quando o Universo tinha menos de cinco por cento da sua idade atual.

No entanto, as galáxias que estão sendo observadas não são certamente infantis, com novas observações que revelam galáxias mais massivas e maduras do que o anteriormente esperado para tempos tão precoces, ajudando a reescrever a compreensão da formação e evolução galáctica. 

Pesquisadores, da qual fazem parte astrônomos da Universidade de Melbourne, fez recentemente observações detalhadas e sem precedentes de uma das mais antigas galáxias conhecidas, designada Gz9p3. O seu nome deriva da colaboração GLASS e do fato de a galáxia se encontrar a um desvio para o vermelho de z=9,3, sendo o desvio para o vermelho uma forma de descrever a distância a um objeto. 

Há apenas alguns anos, a Gz9p3 aparecia como um único ponto de luz através do telescópio espacial Hubble. Mas, utilizando o telescópio espacial James Webb (JWST), podemos observar este objeto tal como era 510 milhões de anos após o Big Bang, há cerca de 13 bilhões de anos.

Os astrônomos descobriram que Gz9p3 era muito mais massiva e madura do que o esperado para um Universo tão jovem, contendo já vários bilhões de estrelas. De longe o objeto mais massivo confirmado desta época, calculou-se que é 10 vezes mais massiva do que qualquer outra galáxia encontrada tão cedo no Universo. Combinados, estes resultados sugerem que, para a galáxia atingir esta dimensão, as estrelas devem ter-se desenvolvido muito mais depressa e eficazmente do que se pensava. Não só é Gz9p3 massiva, como a sua forma complexa a identifica imediatamente como uma das mais antigas fusões de galáxias alguma vez observadas. 

A imagem da galáxia obtida pelo JWST mostra uma morfologia tipicamente associada a duas galáxias em interação. E a fusão também não terminou porque ainda vemos dois componentes. Quando dois objetos massivos se juntam desta forma, atiram fora alguma da sua matéria no processo. Assim, esta matéria descartada sugere que o que observaram é uma das fusões mais distantes jamais vistas. 

O seu estudo observou mais profundamente, para descrever a população de estrelas que compõe as galáxias em fusão. Usando o JWST, foi possível examinar o espetro da galáxia, dividindo a luz da mesma forma que um prisma divide a luz branca num arco-íris. Quando se utiliza apenas imagens, a maioria dos estudos destes objetos muito distantes mostra apenas estrelas muito jovens, porque as estrelas mais jovens são mais brilhantes e, por isso, a sua luz domina os dados de imagem. Por exemplo, uma população jovem e brilhante, que surgiu da fusão de galáxias com menos de alguns milhões de anos, ofusca uma população mais velha, com mais de 100 milhões de anos. 

Utilizando a técnica de espetroscopia, os cientistas podem produzir observações tão pormenorizadas que as duas populações podem ser distinguidas. Não se previa uma população tão madura, tendo em conta o quão cedo as estrelas se teriam formado para terem envelhecido o suficiente neste momento cósmico. A espetroscopia é tão detalhada que podemos ver as características sutis das estrelas antigas que mostram que há mais do que se pensa. 

Elementos específicos detectados no espetro (incluindo silício, carbono e ferro) revelam que esta população mais velha deve existir para enriquecer a galáxia com uma abundância de elementos químicos. Não é apenas o tamanho das galáxias que é surpreendente, mas também a velocidade com que cresceram até um estado quimicamente maduro. Estas observações fornecem evidências de uma acumulação rápida e eficiente de estrelas e metais no período imediatamente a seguir ao Big Bang, associada a fusões de galáxias em curso, demonstrando que galáxias massivas com vários bilhões de estrelas existiram mais cedo do que o esperado. 

As galáxias isoladas constroem a sua população estelar localizada a partir dos seus reservatórios finitos de gás. No entanto, esta pode ser uma forma lenta das galáxias crescerem. As interações entre galáxias podem atrair novos fluxos de gás puro, fornecendo combustível para a rápida formação estelar, e as fusões proporcionam um canal ainda mais acelerado para a acumulação e crescimento de massa. As maiores galáxias do nosso Universo moderno têm todas um aspecto de fusões, incluindo a nossa Via Láctea, que atingiu o seu tamanho atual através de sucessivas fusões com galáxias menores. 

Estas observações de Gz9p3 mostram que as galáxias foram capazes de acumular massa rapidamente no Universo primitivo através de fusões, com taxas de formação estelar superiores às esperadas. As observações de Gz9p3 pelo JWST, e também de outras galáxias, estão levando os astrofísicos a ajustar os seus modelos dos primeiros anos do Universo. A sua cosmologia não está necessariamente errada, mas a compreensão da rapidez com que as galáxias se formaram provavelmente está, porque são mais massivas do que alguma vez pensaram ser possível. 

Estes novos resultados chegam num momento oportuno, quando nos aproximamos da marca dos dois anos de observações científicas efetuadas com o JWST. À medida que o número total de galáxias observadas aumenta, os astrônomos que estudam o Universo primitivo estão fazendo a transição da fase de descoberta para um período em que dispõem de amostras suficientemente grandes para começar a construir e a aperfeiçoar novos modelos. Nunca houve uma época tão excitante para dar sentido aos mistérios do Universo primitivo.

Um artigo foi publicado na revista Nature Astronomy

Fonte: University of Melbourne

Glóbulo Cometário escuro e majestoso

Os astrônomos dão muitas vezes nomes a objetos celestes que podem confundir o público e o glóbulo cometário GN 16.43.7.01 que vemos nesta fotografia não é exceção.

© ESO (glóbulo cometário GN 16.43.7.01)

Os glóbulos cometários não têm nada a ver com cometas, para além da aparência: o seu nome deve-se à cabeça poeirenta e à cauda alongada e escura que apresentam, como podemos ver nesta imagem obtida com o VLT Survey Telescope (VST), instalado no Observatório do Paranal do ESO, no Chile. 

Este glóbulo cometário, denominado Torre Negra, situa-se a cerca de 5.000 anos-luz de distância da Terra, na constelação austral do Escorpião. Este objeto contém aglomerados densos de gás e poeira que estão colapsando e que darão origem a estrelas. 

A forma curiosa deste objeto foi esculpida por radiação muito intensa emitida por um aglomerado de estrelas jovens e brilhantes situado fora do campo, na direção do canto superior esquerdo. Esta radiação varreu e delineou o glóbulo cometário com o caraterístico brilho rosa da matéria quente e excitada.

Fonte: ESO

sexta-feira, 8 de março de 2024

Revelado segredos sobre o nascimento de planetas em torno de estrelas

Numa série de estudos, astrônomos elucidou o processo complexo da formação planetária.

© ESO (disco de formação planetária MWC 758)

Estas imagens extraordinárias, captadas pelo Very Large Telescope (VLT) do Observatório Europeu do Sul (ESO), no Chile, representam um dos maiores rastreios de discos de formação planetária. 

O trabalho de pesquisa reúne observações de mais de 80 estrelas jovens que podem ter planetas se formando em seu redor, fornecendo uma enorme quantidade de dados e conhecimentos únicos sobre a forma como os planetas surgem em diferentes regiões da nossa Galáxia. 

Até à data, foram descobertos mais de 5.000 planetas em órbita de outras estrelas para além do Sol, muitas vezes em sistemas muito diferentes do nosso Sistema Solar. Para compreender onde e como surge esta diversidade, os astrônomos têm de observar os discos ricos em poeira e gás que envolvem as estrelas jovens, os berços da formação planetária.

Estes discos encontram-se mais facilmente nas enormes nuvens de gás onde as próprias estrelas estão se formando. Tal como os sistemas planetários já desenvolvidos, as novas imagens mostram a extraordinária diversidade dos discos de formação de planetas.

© ESO (discos de formação planetária em três nuvens da Via Láctea)

Estas imagens extraordinárias, captadas pelo Very Large Telescope (VLT) do Observatório Europeu do Sul (ESO), no Chile, representam um dos maiores rastreios de discos de formação planetária.

A equipe estudou um total de 86 estrelas em três regiões diferentes de formação estelar da Via Láctea: Touro e Camaleão I, ambas a cerca de 600 anos-luz de distância da Terra, e Órion, uma nuvem rica em gás a cerca de 1.600 anos-luz de nós, que é conhecida por ser o local de nascimento de várias estrelas mais massivas do que o Sol.

A equipe conseguiu retirar várias conclusões importantes do conjunto de dados obtido. Por exemplo, em Órion descobriu-se que as estrelas agrupadas em duas ou mais tinham menos probabilidade de possuir grandes discos de formação planetária. Este é um resultado significativo, dado que, ao contrário do nosso Sol, a maioria das estrelas da nossa Galáxia têm companheiras. O aspecto irregular dos discos nesta região sugere a possibilidade de existirem planetas massivos no seu interior, o que poderá dar origem à deformação e desalinhamento que são observados nestes discos. Embora os discos de formação planetária se possam estender por distâncias centenas de vezes superiores à distância entre a Terra e o Sol, a sua localização a várias centenas de anos-luz de nós faz com que nos pareçam pequenos pontinhos no céu noturno. 

Para observar os discos, a equipe utilizou o instrumento SPHERE (Spectro-Polarimetric High-contrast Exoplanet REsearch) instalado no VLT do ESO. O sistema de óptica adaptativa de última geração do SPHERE corrige os efeitos de turbulência da atmosfera terrestre, fornecendo imagens muito nítidas dos discos. Deste modo, foi possível obter imagens de discos em torno de estrelas com massas tão baixas como metade da massa do Sol, que são normalmente demasiado tênues para a maioria dos outros instrumentos atualmente disponíveis. Foram ainda obtidos dados adicionais para este estudo com o instrumento X-shooter do VLT, o que permitiu aos astrônomos determinar a idade e a massa das estrelas.

Por sua vez, o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), ajudou a compreender melhor a quantidade de poeira que envolve algumas das estrelas. À medida que a tecnologia avança, a equipe espera observar ainda mais profundamente o centro dos sistemas de formação planetária. O enorme espelho de 39 metros do futuro Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, por exemplo, permitirá estudar as regiões mais interiores em torno de estrelas jovens, onde poderão estar se formando planetas rochosos como o nosso. 

Por enquanto, estas imagens revolucionárias fornecem aos pesquisadores uma enorme quantidade de dados que ajudarão a desvendar os mistérios da formação planetária.

Este trabalho de pesquisa foi apresentado em três artigos científicos publicados no periódico Astronomy & Astrophysics

Fonte: ESO

Encontrado o par de buracos negros mais massivo no Universo

Utilizando dados de arquivo do telescópio Gemini Norte, uma equipe de astrônomos mediu o par de buracos negros supermassivos mais pesado alguma vez encontrado.

© NOIRLab (ilustração da fusão de dois buracos negros)

A fusão de dois buracos negros supermassivos é um fenômeno há muito previsto, mas nunca observado. Este par massivo dá pistas sobre a razão pela qual um tal acontecimento parece tão improvável no Universo. 

Quase todas as galáxias massivas abrigam um buraco negro supermassivo no seu centro. Quando duas galáxias se fundem, os seus buracos negros podem formar um par binário, o que significa que se orbitam um ao outro. Teoriza-se que estes binários estão destinados a fundir-se, mas tal nunca foi observado. A questão de saber se tal acontecimento é possível tem sido um tópico de discussão entre os astrônomos durante décadas. 

Astrônomos apresentaram uma nova perspectiva sobre esta questão. Eles utilizaram dados do telescópio Gemini Norte no Havaí, uma metade do Observatório Gemini operado pelo NOIRLab (National Optical-Infrared Astronomy Research Laboratory), para analisar um buraco negro binário supermassivo localizado na galáxia elíptica B2 0402+379.

Este é o único buraco negro binário supermassivo alguma vez resolvido com detalhe suficiente para ver ambos os objetos separadamente (já foram feitas observações anteriores de galáxias contendo dois buracos negros supermassivos, mas nesses casos estão separados por milhares de anos-luz, demasiado longe para se orbitarem um ao outro) e detém o recorde de ter a menor separação alguma vez medida diretamente, apenas 24 anos-luz (existem outras fontes idênticas com, possivelmente, separações menores, mas foram apenas inferidas usando observações indiretas e portanto só podem ser classificados como candidatos a binário). 

Embora esta separação próxima prenuncie uma fusão poderosa, outros estudos revelaram que o par está "parado" a esta distância há mais de três bilhões de anos, o que levanta a questão: porquê a demora? 

Para compreender melhor a dinâmica deste sistema e a sua fusão "interrompida", os astrônomos recorreram a dados de arquivo do instrumento GMOS (Gemini Multi-Object Spectrograph), que lhes permitiu determinar a velocidade das estrelas na vizinhança dos buracos negros e inferir a massa total dos buracos negros que lá residem.

A equipe estima que a massa do binário seja 28 bilhões de vezes superior à do Sol, o que faz do par o buraco negro binário mais massivo alguma vez medido. Esta medição não só fornece um contexto valioso para a formação do sistema binário e para a história da sua galáxia hospedeira, como também apoia a teoria de longa data de que a massa de um buraco negro binário supermassivo desempenha um papel fundamental no bloqueio de uma potencial fusão (esta teoria foi apresentada pela primeira vez em 1980 por Begelman et al. e há muito que se defende a sua ocorrência com base em décadas de observações dos centros das galáxias). 

Compreender como é que este binário se formou pode ajudar a prever se e quando se irá fundir; e algumas pistas apontam para que o par se tenha formado através de múltiplas fusões de galáxias. A primeira é que B2 0402+379 é um "aglomerado fóssil", o que significa que é o resultado da fusão de estrelas e gás de todo um aglomerado de galáxias numa única galáxia massiva. Além disso, a presença de dois buracos negros supermassivos, juntamente com a sua grande massa combinada, sugere que resultaram da fusão de vários buracos negros mmenores de várias galáxias. 

Após uma fusão de galáxias, os buracos negros supermassivos não colidem de frente. Em vez disso, começam a passar uns pelos outros à medida que se estabelecem numa órbita. Com cada passagem que fazem, a energia é transferida dos buracos negros para as estrelas que os rodeiam. À medida que perdem energia, o par é arrastado para cada vez mais perto, até ficarem a apenas alguns anos-luz de distância, momento em que a radiação gravitacional assume o controle e se fundem.

Este processo foi observado diretamente em pares de buracos negros de massa estelar, o primeiro caso registado foi em 2015, através da detecção de ondas gravitacionais, mas nunca num binário da variedade supermassiva. 

Com o novo conhecimento da massa extremamente elevada do sistema, a equipe concluiu que teria sido necessário um número excepcionalmente grande de estrelas para abrandar a órbita do binário o suficiente para os aproximar tanto. No processo, os buracos negros parecem ter expelido quase toda a matéria na sua vizinhança, deixando o núcleo da galáxia sem estrelas e sem gás. Sem mais matéria disponível para abrandar ainda mais a órbita do par, a fusão estagnou na sua fase final.

Normalmente, parece que as galáxias com pares de buracos negros mais leves têm estrelas e massa suficientes para os juntar rapidamente. Uma vez que este par é tão pesado, eram necessárias muitas estrelas e gás para o fazer. Mas o binário retirou essa matéria da galáxia central, deixando-a estagnada.

Ainda não se sabe se o par vai ultrapassar a sua estagnação e acabar por se fundir em escalas de tempo de milhões de anos, ou se vai continuar no limbo orbital para sempre. Se se fundirem, as ondas gravitacionais resultantes serão cem milhões de vezes mais poderosas do que as produzidas pela fusão de buracos negros de massa estelar. É possível que o par conquiste a distância final através de outra fusão de galáxias, que injetaria no sistema material adicional, ou potencialmente um terceiro buraco negro, para abrandar a órbita do par o suficiente para se fundir. 

No entanto, dado o estatuto de B2 0402+379 como aglomerado fóssil, outra fusão de galáxias é improvável. O acompanhamento do núcleo de B2 0402+379 e análise da quantidade de gás presente fornecerá mais informações sobre se os buracos negros supermassivos podem eventualmente fundir-se ou se ficarão presos como binários.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: Gemini Observatory

domingo, 3 de março de 2024

Descoberta nova ligação entre água e formação planetária

Os pesquisadores descobriram vapor de água no disco que rodeia uma estrela jovem, exatamente numa região onde podem estar se formando planetas.

© ALMA (vapor de água ao redor de estrela)

Esta imagem, de novas observações do Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) mostra o vapor de água em tons azulados. Perto do centro do disco, onde reside a estrela jovem, o meio é mais quente e o gás mais brilhante. Os anéis em tons avermelhados são de observações ALMA anteriores e mostram a distribuição da poeira em torno da estrela.

Para além de ser um ingrediente chave para a vida na Terra, pensa-se que a água desempenha também um papel importante na formação planetária. No entanto, até agora, nunca tínhamos conseguido mapear a forma como a água se distribui num disco frio e estável; o tipo de disco que oferece as condições mais favoráveis para a formação de planetas em torno de estrelas.

As observações revelam, pelo menos, três vezes mais água do que em todos os oceanos da Terra, no disco interior de HL Tauri, uma estrela jovem semelhante ao Sol, situada a 450 anos-luz de distância da Terra, na constelação do Touro. As observações do ALMA espacialmente resolvidas permitem aos astrônomos determinar a distribuição da água em diferentes regiões do disco. 

Foi encontrada uma quantidade significativa de água na região onde existe uma lacuna conhecida no disco de HL Tauri. Estas lacunas em forma de anel são “esculpidas” em discos ricos em gás e poeira por corpos jovens semelhantes a planetas, em órbita da estrela progenitora, à medida que estes vão acumulando material e crescendo. As imagens recentes revelam uma quantidade substancial de vapor de água a uma série de distâncias da estrela que incluem um espaço onde um planeta pode estar se formando atualmente.

Observar água com um telescópio colocado no solo não é uma tarefa fácil, uma vez que o vapor de água que existe em abundância na atmosfera terrestre degrada os sinais astronômicos. O ALMA, operado pelo ESO em conjunto com os seus parceiros internacionais, é uma rede de telescópios instalada no deserto chileno do Atacama, a cerca de 5.000 metros de altitude, e que foi construída num ambiente alto e seco especificamente para minimizar esta degradação, proporcionando condições de observação excepcionais. Até agora, o ALMA é a única infraestrutura capaz de resolver espacialmente a água num disco frio de formação planetária.

Os grãos de poeira que compõem um disco são as sementes da formação planetária, colidindo e aglomerando-se em corpos cada vez maiores que orbitam a estrela. Acredita-se que em locais suficientemente frios, onde a água congela nos grãos de poeira, as partículas aderem mais eficientemente, um local ideal para a formação de planetas.

Os resultados mostram como a presença da água pode influenciar o desenvolvimento de um sistema planetário, tal como aconteceu há cerca de 4,5 bilhões de anos no nosso próprio Sistema Solar. 

Com as atualizações que estão decorrendo no ALMA e com o Extremely Large Telescope (ELT) do ESO que entrará em funcionamento antes do final desta década, a formação planetária e a função que a água desempenha nessa formação se tornarão mais evidentes. Em particular, o instrumento METIS (Mid-infrared ELT Imager and Spectrograph), fornecerá uma visão sem igual das regiões internas dos discos de formação planetária, os locais onde se formam planetas como a Terra.

Um artigo foi publicado na revista Nature Astronomy.

Fonte: ESO

Encontradas novas luas em Urano e Netuno

A descoberta de três luas anteriormente desconhecidas de Urano e Netuno mostra que os gigantes gelados, como Júpiter e Saturno, têm famílias de luas distantes formadas pela fragmentação de objetos maiores capturados.

© NASA (Urano e Netuno)

Provavelmente há mais luas por aí, mas precisaríamos enviar uma sonda espacial para vê-las. Dezenas de luas foram descobertas em torno de Júpiter e Saturno nas últimas duas décadas. No entanto, desde 2003, nenhuma nova lua foi descoberta orbitando Urano, e apenas uma nova lua foi oficialmente adicionada para Netuno. 

As novas descobertas elevam o total para 28 para Urano e 16 para Netuno. Estas luas do Sistema Solar exterior são difíceis de encontrar, diz Scott Sheppard (Carnegie Science), porque estes objetos estão no limite da detectabilidade. 

Os cientistas planetários suspeitam que o Sistema Solar exterior pode ser a chave para a compreensão da sua formação e evolução inicial. Por causa disso, a pesquisa decenal divulgada no ano passado pela Academia Nacional de Ciências deu alta prioridade ao lançamento de uma grande missão em meados da década de 2030, chamada Urano Orbiter and Probe. 

O Minor Planet Center da União Astronômica Internacional anunciou as três novas luas em 23 de fevereiro: uma em torno de Urano e duas em torno de Netuno. São as luas mais fracas que os telescópios terrestres já encontraram orbitando os gigantes gelados. 

Aquela que orbita Urano, designada provisoriamente S/2023 U1, é a primeira lua nova descoberta orbitando o gigante gelado em mais de 20 anos. Com apenas 8 quilômetros de diâmetro, é provavelmente a menor lua conhecida do planeta. Tem uma órbita de 680 dias. Sheppard avistou S/2023 U1 pela primeira vez em 4 de novembro de 2023, com o telescópio Magalhães no Observatório Las Campanas, no Chile. Observações de acompanhamento em dezembro confirmaram sua órbita, o que por sua vez ajudou a identificar observações da Lua anteriormente não reconhecidas em 2021 com os telescópios Magalhães e Subaru no Havaí.

As duas novas luas que orbitam Netuno já haviam sido avistadas anteriormente, mas não foram observadas por tempo suficiente para calcular suas órbitas. Sheppard descobriu pela primeira vez o mais brilhante e maior em outubro de 2021 com o telescópio Magalhães, e colaborou em outras observações em 2022 e 2023. Depois de trabalhar com Marina Brozovic e Bob Jacobson (ambos no Laboratório de Propulsão a Jato da NASA) para calcular sua órbita, eles perceberam isso havia sido observado perto de Netuno duas décadas antes.

Designado provisoriamente como S/2002 N5, mede 23 quilômetros de diâmetro e demora nove anos a circundar Netuno. A lua netuniana menor, designada provisoriamente S/2021 N1, tem cerca de 14 km de diâmetro e leva quase 27 anos para orbitar Netuno, a órbita mais longa conhecida para qualquer lua planetária. Sheppard e colegas viram pela primeira vez a lua extremamente tênue com o telescópio Subaru em setembro de 2021. Para fazer as observações necessárias para calcular a órbita desta lua, adicionaram observações do Very Large Telescope (VLT) no Chile e do Gemini North Telescope no Havaí. 

Cada uma das três novas luas tem uma órbita que a agrupa com as órbitas de duas luas maiores. A recém-descoberta S/2023 U1 pertence a um grupo com duas luas maiores e mais conhecidas de Urano, Caliban e Stephano. Em Netuno, as órbitas de Psamathe e Neso são semelhantes às de S/2021 N1, e as órbitas de Sao e Laomedeia são semelhantes às de S/2002 N5. Esses agrupamentos são provavelmente famílias, formadas pelo desmembramento de um objeto maior capturado. 

Encontrar mais luas tão fracas e distantes será difícil. Para encontrar estes três, Sheppard teve que fazer uma série de exposições de cinco minutos para evitar que o movimento da Lua ficasse desfocado em imagens individuais. Sequências de imagens foram tiradas durante um período de até quatro horas, quando as luas permaneciam altas o suficiente no céu para uma boa visualização. Ele também precisava coletar dados durante uma série de noites e, em seguida, empilhar as exposições cuidadosamente para obter imagens profundas o suficiente para mostrar a lua. Esta técnica é poderosa, mas com objetos tão tênues requer muito tempo nos maiores telescópios do mundo. O Urano Orbiter and Probe ofereceria a oportunidade de chegar perto de objetos que são apenas pontos fracos no céu para os maiores e melhores telescópios da Terra. 

Fonte: Sky & Telscope

sábado, 2 de março de 2024

Será que foi encontrada uma descendente direta das primeiras estrelas?

Uma estrela pode descender de apenas uma das primeiras estrelas, o que a tornaria uma poderosa sonda da elusiva primeira geração de estrelas.

© NASA (NGC 6357)

No entanto, uma nova pesquisa descobriu que as suas propriedades são consistentes com uma série de ancestrais estelares. As primeiras estrelas do Universo surgiram em nuvens de gás puro contendo apenas hidrogênio, hélio e uma pequena quantidade de lítio. Este conjunto simples de ingredientes químicos provavelmente permitiu com que a primeira geração de estrelas atingisse massas enormes, embora a distribuição exata das suas massas seja desconhecida. 

Estas estrelas primitivas criaram novos elementos nos seus núcleos e espalharam-nos pelo Universo em grandes nuvens de gás enriquecido com metais. Embora as estrelas massivas desta primeira geração tenham desaparecido há muito da Via Láctea, as suas descendentes podem ainda vaguear pela Galáxia. Encontrar estas descendentes, especialmente aquelas em que podemos rastrear o seu material até um único membro da primeira geração, seria uma forma poderosa de estudar as primeiras estrelas do Universo.

Recentemente, pesquisadores afirmaram ter encontrado uma destas estrelas, de nome J1010+2358. A ausência geral de metais (elementos mais pesados que o hélio) e o curioso padrão de abundância química da estrela sugerem que esta foi criada a partir do gás deixado por uma estrela com 260 massas estelares. A estrela J1010+2358 é especialmente pobre em elementos com números atômicos ímpares, como o sódio, em comparação com os elementos com números atômicos pares. 

Agora, uma equipe liderada por Ioanna Koutsouridou (Universidade de Florença) investigou se J1010+2358 é realmente a descendente de um único e massivo membro da primeira geração de estrelas. A equipe examinou se J1010+2358 contém material herdado de uma única estrela com 260 vezes a massa do Sol, ou se contém material de várias estrelas.

Usando modelos de abundância química, foi descoberto que J1010+2358 pode descender de uma estrela com 260 massas solares, mas também pode ter tido outras progenitoras estelares. Na verdade, sem ser possível medir vários elementos químicos críticos no espectro de J1010+2358, só é possível dizer que o antepassado estelar teorizado contribuiu com pelo menos 10% dos metais de J1010+2358. 

Embora J1010+2358 possa ter mais do que uma progenitora estelar, as suas propriedades podem ainda assim ajudar os pesquisadores a sondar a geração de estrelas que a precedeu. Usando modelos de como o enriquecimento químico da Via Láctea evoluiu ao longo do tempo, os cientistas usaram a não detecção de estrelas enriquecidas por apenas um antepassado estelar para determinar as massas das primeiras estrelas. 

A força da restrição depende da quantidade de material de J1010+2358 que veio do seu antepassado com 260 massas solares; só se mais de 70% dos metais da estrela vierem de um único antepassado é que o seu padrão de abundância química pode restringir a possível distribuição de massa das primeiras estrelas. 

A caça às descendentes das primeiras estrelas prossegue: os levantamentos de alta resolução continuam a descobrir estrelas com apenas um antepassado estelar de primeira geração, e observações futuras poderão preencher as medições de abundância elementar em falta no espectro de J1010+2358 e assim clarificar a sua árvore genealógica.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: American Astronomical Society

Encontrada estrela de nêutrons no núcleo de remanescente de supernova

Utilizando as capacidades sem precedentes do telescópio espacial James Webb, astrônomos obtiveram as primeiras observações espectroscópicas das galáxias mais tênues durante os primeiros bilhões de anos do Universo.

© STScI (Aglomerado de Pandora)

Estas descobertas ajudam a responder a uma questão de longa data: que fontes causaram a reionização do Universo? 

Ainda há muito por compreender sobre o período, no início da história do Universo, conhecido como a era da reionização. Foi um período de escuridão sem estrelas ou galáxias, preenchido por uma densa névoa de hidrogênio gasoso, até que as primeiras estrelas ionizaram o gás à sua volta e a luz começou a viajar. 

Os astrônomos passaram décadas tentando identificar as fontes que emitiam radiação suficientemente poderosa para dissipar gradualmente este nevoeiro de hidrogênio que cobria o Universo primitivo. O programa UNCOVER (Ultradeep NIRSpec and NIRCam ObserVations before the Epoch of Reionization) consiste em observações espectroscópicas e de imagem do aglomerado Abell 2744. Uma equipe internacional de astrônomos utilizou a lente gravitacional deste alvo, também conhecido como Aglomerado de Pandora, para investigar as fontes do período de reionização do Universo.

As lentes gravitacionais ampliam e distorcem o aspecto de galáxias ainda mais distantes, pelo que têm uma aparência muito diferente das que se encontram em primeiro plano. A "lente" deste aglomerado massivo de galáxias deforma o tecido do próprio espaço de tal modo que a luz de galáxias distantes são desviadas. O efeito de ampliação permitiu o estudo de fontes muito distantes de luz para além de Abell 2744, revelando oito galáxias extremamente tênues que, de outra forma, seriam indetectáveis, até para o Webb. 

Foi descoberto que estas galáxias tênues são produtoras de imensa luz ultravioleta, a níveis quatro vezes superiores ao que se supunha anteriormente. Isto significa que a maior parte dos fótons que reionizaram o Universo provém provavelmente destas galáxias anãs. Esta descoberta revela o papel crucial desempenhado pelas galáxias ultrafracas na evolução inicial do Universo. Produzem fótons ionizantes que transformam o hidrogênio neutro em plasma ionizado durante a reionização cósmica. Isto realça a importância de compreender o papel das galáxias de baixa massa na história do Universo. 

Apesar do seu tamanho minúsculo, estas galáxias de baixa massa são produtoras prolíficas de radiação energética, e a sua abundância durante este período é tão substancial que a sua influência coletiva pode transformar todo o estado do Universo. Para chegar a esta conclusão, a equipe começou por combinar dados extremamente sensíveis de imagem do Webb com imagens de Abell 2744 obtidas pelo telescópio espacial Hubble para selecionar galáxias candidatas extremamente tênues na época da reionização. 

Esta é a primeira vez que os cientistas estimam a frequência das galáxias tênues. Os resultados confirmam que são o tipo de galáxias mais abundante durante a época da reionização. É também a primeira vez que se mede o poder de ionização destas galáxias, o que permite aos astrônomos determinar que estão produzindo radiação energética suficiente para ionizar o Universo primitivo.

Num próximo programa de observação do Webb, denominado GLIMPSE, os cientistas obterão as observações mais sensíveis alguma vez efetuadas do céu. Ao apontar para outro aglomerado de galáxias, chamado Abell S1063, serão identificadas galáxias ainda mais fracas durante a época da reionização. Isto permitirá aos cientistas verificar se as galáxias anãs do estudo atual são típicas da distribuição galáctica em larga escala. Uma vez que estes novos resultados se baseiam em observações obtidas num único campo, a equipe salienta que as propriedades ionizantes das galáxias fracas podem ser diferentes se estas residirem em regiões mais densas. Consequentemente, observações adicionais num campo diferente fornecerão novos conhecimentos e ajudarão a verificar estas conclusões. As observações do programa GLIMPSE também ajudarão na investigação do período conhecido como "amanhecer cósmico", quando o Universo tinha apenas alguns milhões de anos, para melhorar a nossa compreensão do aparecimento das primeiras galáxias.

Estes resultados foram publicados na revista Nature.

Fonte: ESA

Encontrada galáxia antiga maior que a Via Láctea

O telescópio espacial James Webb (JWST) encontrou uma galáxia no universo primitivo que é tão massiva que não deveria existir, representando um desafio ao modelo padrão da cosmologia, de acordo com os autores do estudo.

© JWST (galáxia massiva ZF-UDS-7329)

A galáxia, chamada ZF-UDS-7329, contém mais estrelas do que a Via Láctea, apesar de ter se formado apenas 800 milhões de anos nos 13,8 bilhões de anos de existência do Universo. Isto significa que, de alguma forma, nasceram sem a matéria escura semear a sua formação, ao contrário do que sugere o modelo padrão de formação de galáxias. 

Não está claro como isso poderia ter acontecido, mas, assim como as descobertas anteriores do JWST de outras galáxias inexplicavelmente massivas no universo primitivo, ameaçando mudar nossa compreensão de como a primeira matéria no Universo se formou. 

Isto acontece porque as estruturas massivas de matéria escura, que se pensa serem componentes necessários para manter unidas as primeiras galáxias, ainda não tiveram tempo de se formar tão cedo no Universo. A luz viaja a uma velocidade fixa através do vácuo do espaço, portanto, quanto mais fundo olhamos para o Universo, mais distante a luz interceptamos e mais para trás no tempo vemos. Foi isto que permitiu aos pesquisadores usar o JWST para detectar ZF-UDS-7329 há cerca de 11,5 bilhões de anos. 

Ao estudar os espectros de luz provenientes das estrelas desta galáxia extremamente distante, foi descoberto que as estrelas nasceram 1,5 bilhões de anos antes desta observação, ou cerca de 13 bilhões de anos atrás. Os astrônomos não têm a certeza de quando é que os primeiros glóbulos de estrelas começaram a aglomerar-se nas galáxias que vemos hoje, mas os cosmólogos estimaram anteriormente que o processo começou lentamente nas primeiras centenas de milhões de anos após o Big Bang. 

As teorias atuais sugerem que halos de matéria escura (uma substância misteriosa e invisível que se acredita constituir 25% do Universo atual) combinaram-se com gás para formar as primeiras estruturas de galáxias. Após 1 bilhão a 2 bilhões de anos de existência do Universo, as primeiras protogaláxias atingiram a adolescência, formando-se em galáxias anãs que começaram a devorar-se umas às outras para se transformarem em galáxias como a Via Láctea. 

Mas a nova descoberta confundiu esta visão: não só a galáxia cristalizou sem acumular matéria escura suficiente para a semear, mas não muito depois de uma súbita explosão de formação estelar, a galáxia tornou-se abruptamente quiescente, o que significa que a sua formação estelar cessou. 

A questão chave agora é como é que se formam tão rapidamente no início do Universo, e que mecanismos misteriosos levam a impedir a formação de estrelas abruptamente quando o resto do Universo o faz. Os próximos passos dos pesquisadores serão procurar mais galáxias como esta. Se encontrarem alguma, isto poderia contradizer seriamente as ideias anteriores sobre como as galáxias se formaram.

Um artigo foi publicado na revista Nature.

Fonte: Swinburne University of Technology