Com o auxílio de observações obtidas com o Very Large Telescope (VLT) do ESO conseguiu-se, pela primeira vez, determinar a taxa de rotação de um exoplaneta.
© ESO/L. Calçada/N. Risinger (ilustração do planeta Beta Pictoris b)
Este novo resultado permite estender aos exoplanetas a relação entre massa e rotação observada no Sistema Solar. Técnicas semelhantes permitirão aos astrônomos mapear exoplanetas com detalhes, no futuro, utilizando o European Extremely Large Telescope (E-ELT).
O exoplaneta Beta Pictoris b orbita a estrela visível a olho nu Beta Pictoris, também denominada HD 39060, SAO 234134 e HIP 27321, que se situa a cerca de 63 anos-luz de distância da Terra na constelação austral do Pintor. Beta Pictoris é um dos melhores exemplos de uma estrela rodeada por um disco de restos de matéria e poeira. Sabe-se que este disco tem uma extensão de cerca de 1000 vezes a distância entre a Terra e o Sol. O exoplaneta Beta Pictoris b foi descoberto há quase seis anos, tendo sido um dos primeiros exoplanetas para o qual se conseguiu obter uma imagem direta. Este objeto orbita a sua estrela a uma distância que é de apenas oito vezes a distância Terra-Sol, o que faz com que seja o exoplaneta mais próximo da sua estrela para o qual se obteve uma imagem direta. As observações usam a técnica de óptica adaptativa, que compensa os efeitos de turbulência da atmosfera terrestre. Este efeito faz com que as imagens obtidas, mesmo nos melhores locais de observação da Terra, fiquem distorcidas. Esta técnica permite obter imagens extremamente nítidas, quase tão boas como as que se obtêm no espaço.
Com o auxílio do instrumento CRIRES montado no VLT, uma equipe de astrônomos holandeses da Universidade de Leiden e do Instituto Holandês de Investigação Espacial (SRON, acrônimo do holandês) descobriram que a velocidade de rotação equatorial do exoplaneta Beta Pictoris b é quase 100.000 quilômetros por hora. Comparativamente, o equador de Júpiter tem uma velocidade de cerca de 47.000 quilômetros por hora, enquanto o da Terra viaja a apenas 1.674,4 quilômetros por hora. Beta Pictoris b é mais de 16 vezes maior que a Terra e possui 3.000 vezes mais massa que o nosso planeta, no entanto um dia neste exoplaneta dura apenas 8 horas, um valor muito menor do que o observado em qualquer planeta no Sistema Solar.
“Não sabemos porque é que alguns planetas giram mais depressa que outros”, diz o co-autor deste trabalho Remco de Kok, “mas esta primeira medição da rotação de um exoplaneta mostra que a tendência observada no Sistema Solar de que os planetas de maior massa giram mais depressa, pode aplicar-se de igual modo aos exoplanetas, o que nos leva a pensar que este efeito deve ser alguma consequência universal do modo como os planetas se formam”.
Beta Pictoris b é um planeta muito jovem, com cerca de 20 milhões de anos (comparativamente, a Terra tem 4,5 bilhões de anos de idade). Com o passar do tempo, espera-se que o exoplaneta arrefeça e encolha, o que fará com que gire ainda mais depressa. Este fato é uma consequência direta da conservação do momento angular e trata-se do mesmo fenômeno que faz com que uma patinadora artística no gelo gire mais depressa sobre si mesma quando junta os braços ao corpo. Por outro lado, outro tipo de processos podem influenciar a variação da rotação de um planeta. Por exemplo, a rotação da Terra está diminuindo com o tempo, em consequência das interações de maré com a nossa Lua.
Os astrônomos usaram uma técnica muito precisa chamada espectroscopia de alta dispersão para separar a luz nas suas cores constituintes, diferentes comprimentos de onda no espectro. O princípio do efeito Doppler permitiu que a equipe utilizasse a variação em comprimento de onda para detectar que as diferentes partes do planeta estavam se movendo a velocidades diferentes e em direções opostas relativamente ao observador. Retirando cuidadosamente os efeitos da estrela progenitora, muito mais brilhante, conseguiram extrair o sinal correspondente à rotação do planeta.
“Medimos os comprimentos de onda da radiação emitida pelo planeta com uma precisão de um sobre cem mil, o que faz com que as medições sejam sensíveis aos efeitos Doppler que nos revelam a velocidade dos objetos emissores”, diz o autor principal Ignas Snellen. “Usando esta técnica descobrimos que as diferentes partes da superfície do planeta se deslocam na nossa direção ou na direção oposta a velocidades diferentes, o que só pode significar que o planeta roda em torno do seu eixo”.
Esta técnica está relacionada com a técnica de obtenção de imagens Doppler, usada já há várias décadas para mapear a superfície das estrelas e, recentemente, a de uma anã marrom, Luhman 16B. A rápida rotação de Beta Pictoris b significa que no futuro será possível fazer um mapa global do planeta, mostrando possíveis padrões de nuvens e tempestades.
“Esta técnica pode ser utilizada numa amostra muito maior de exoplanetas com a excelente resolução e sensibilidade que terá o E-ELT e um espectrógrafo de imagem de alta dispersão. Com o instrumento METIS (Mid-infrared E-ELT Imager and Spectrograph) que está sendo planejado, seremos capazes de fazer mapas globais de exoplanetas e caracterizar planetas muito menores do que Beta Pictoris b”, diz o Investigador Principal do METIS e co-autor do estudo, Bernhard Brandl.
Este trabalho foi descrito no artigo científico “Fast spin of a young extrasolar planet”, de I. Snellen et al., que foi publicado hoje na revista Nature.
Fonte: ESO
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