Com o auxílio dos telescópios do ESO e outras infraestruturas, astrônomos encontraram evidências claras de um planeta orbitando a estrela mais próxima da Terra, Proxima Centauri.
© ESO/M. Kornmesser (ilustração do planeta que orbita Proxima Centauri)
Este mundo há muito procurado, designado por Proxima b, orbita a sua estrela progenitora, vermelha e fria, a cada 11 dias, e possui uma temperatura que permite a existência de água líquida em sua superfície. Este mundo rochoso é um pouco mais massivo que a Terra e trata-se do exoplaneta mais próximo de nós, podendo também ser o mais próximo a abrigar vida fora do Sistema Solar.
A estrela anã vermelha Proxima Centauri situa-se a pouco mais de 4 anos-luz de distância do Sistema Solar, sendo assim a estrela mais próxima da Terra depois do Sol. Esta estrela fria, localizada na constelação do Centauro, é muito fraca para poder ser vista a olho nu, situando-se perto do par de estrelas muito mais brilhante conhecido como Alfa Centauri AB.
Durante a primeira metade de 2016, Proxima Centauri foi regularmente observada com o espectrógrafo HARPS, montado no telescópio de 3,6 metros do ESO, instalado em La Silla, no Chile, e simultaneamente monitorada por outros telescópios em todo o mundo. Tratou-se da campanha Pálido Ponto Vermelho, durante a qual uma equipe de astrônomos liderada por Guillem Anglada, do Queen Mary University of London, procurou uma oscilação minúscula da estrela, que seria causada pela atração gravitacional de um possível planeta que a orbitasse. O nome Pálido Ponto Vermelho reflete a famosa referência de Carl Sagan à Terra como Pálido Ponto Azul. Como Proxima Centauri é uma estrela anã vermelha, banhará o seu planeta com um brilho vermelho pálido.
Uma vez que este é um tópico que gera muito interesse entre o público, de meados de janeiro a abril de 2016 o progresso da campanha foi compartilhado publicamente no website Pálido Ponto Vermelho e nas redes sociais. Relatórios regulares foram acompanhados por diversos artigos de divulgação escritos por especialistas de todo o mundo.
Guillem Anglada contextualiza esta busca única: “Os primeiros indícios da existência de um possível planeta em torno de Proxima Centauri foram observados em 2013, no entanto a detecção não foi convincente. Desde essa época que temos trabalhado arduamente de modo a obter mais observações a partir do solo com a ajuda do ESO e outras instituições. Preparamos a campanha Pálido Ponto Vermelho por cerca de dois anos.”
Os dados do Pálido Ponto Vermelho, quando combinados com observações anteriores obtidas nos observatórios do ESO e outros, revelaram o sinal claro de um resultado verdadeiramente excitante. Em determinadas épocas, Proxima Centauri se aproxima da Terra com uma velocidade de cerca de 5 km/hora, a velocidade normal de caminhada de um ser humano, e em outras se afasta à mesma velocidade. Este padrão regular de variação nas velocidades radiais repete-se com um período de 11,2 dias. Uma análise cuidadosa dos minúsculos desvios Doppler resultantes mostrou que estes desvios indicam a presença de um planeta com uma massa de pelo menos 1,3 vezes a massa da Terra, orbitando a cerca de 7 milhões de km de Proxima Centauri, apenas 5% da distância Terra-Sol.
As anãs vermelhas como Proxima Centauri são estrelas ativas, podendo por isso apresentar variações que reproduzem a presença de um planeta. Para excluir esta possibilidade, a equipe monitorou também de forma cuidadosa a variação do brilho da estrela durante a campanha, com o auxílio do telescópio ASH2, instalado no Observatório de Explorações Celestes de San Pedro de Atacama, no Chile, e da rede de telescópios do Observatório Las Cumbres. Os dados de velocidade radial obtidos nas épocas em que a estrela sofria erupções foram excluídos da análise final.
Embora o planeta Proxima b orbite muito mais próximo da sua estrela do que Mercúrio o faz do Sol no nosso Sistema Solar, a estrela propriamente dita é muito menos brilhante que o Sol, o que faz com que Proxima b se situe bem dentro da zona de habitabilidade da estrela, tendo uma temperatura superficial estimada que permite a presença de água líquida. Apesar da órbita temperada de Proxima b, as condições em sua superfície podem ser fortemente afetadas pelas erupções de raios ultravioleta e de raios X da estrela, que são muito mais intensas que as sentidas na Terra vindas do Sol. A possibilidade deste tipo de planeta ter água e vida do tipo da Terra é assunto de debate intenso mas essencialmente teórico. As principais preocupações contra a presença de vida estão relacionadas com a proximidade da estrela. Por exemplo, forças gravitacionais manterão muito provavelmente o mesmo lado do planeta em luz perpétua, enquanto o outro lado se manterá em noite perpétua. A atmosfera do planeta pode também estar evaporando lentamente ou pode ter uma química mais complexa que a da Terra devido a radiação ultravioleta e raios X muito fortes, principalmente durante o primeiro bilhão de anos de vida da estrela. No entanto, nenhum destes argumentos é determinante, não se podendo tirar nenhuma conclusão sem evidências observacionais diretas e caracterização da atmosfera do planeta.
Dois artigos científicos adicionais discutem a habitabilidade de Proxima b e seu clima. Estes artigos concluem que no momento a existência de água líquida na superfície deste planeta não pode ser descartada. Sendo assim, a água poderia estar presente apenas nas regiões mais iluminadas pela luz de sua estrela, que podem estar no hemisfério do planeta virado para estrela (no caso de rotação síncrona) ou na faixa tropical (no caso de uma ressonância orbital 3:2). A rotação de Proxima b, a forte radiação emitida pela estrela e a história de formação do planeta tornam seu clima bastante diferente do terrestre, e é improvável que Proxima b experimente estações do ano.
Esta descoberta marca o início de observações extensas subsequentes, tanto obtidas com os instrumentos atuais, como com a nova geração de telescópios gigantes tais como o European Extremely Large Telescope (E-ELT). Proxima b será o alvo principal para se procurar evidências de vida em outros locais do Universo. Alguns dos métodos para estudar a atmosfera de um planeta dependem desse planeta passar em frente da sua estrela e a luz estelar passar através da atmosfera no seu percurso até à Terra. Atualmente não temos evidências de que Proxima b transite em frente ao disco da sua estrela progenitora e as hipóteses disso acontecer parecem pequenas, no entanto estão em progresso mais observações para verificar esta possibilidade. Aliás, o sistema de Alfa Centauri é também o alvo da primeira tentativa da humanidade de viajar para outro sistema estelar, o projeto StarShot.
Guillem Anglada conclui: “Muitos exoplanetas já foram descobertos muitos outros ainda o serão, no entanto a procura do mais próximo potencial planeta análogo à Terra e a sua subsequente descoberta constituíram na realidade uma experiência para toda a vida para toda a equipe. A história e esforços de muitas pessoas convergiram nesta descoberta. Este resultado é por isso também um tributo a todos eles. A procura de vida em Proxima b é o passo seguinte...”
Um artigo científico descrevendo esta descoberta marcante foi publicado na revista Nature.
Fonte: ESO
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