Com auxílio do Very Large Telescope (VLT) do ESO e outros telescópios, uma equipe internacional de astrônomos descobriu um resto fossilizado da Via Láctea primordial, que contém estrelas com idades muito diferentes.
© ESO/F. Ferraro (Terzan 5)
Este sistema estelar é parecido com um aglomerado globular, mas ao mesmo tempo diferente dos outros aglomerados já conhecidos, pois contém estrelas muito similares às estrelas mais antigas da Via Láctea, ajudando-nos a fazer a ponte entre o passado e o presente da nossa Galáxia.
Terzan 5, situado a 19 mil anos-luz de distância na constelação de Sagitário em direção ao centro galáctico, tem sido classificado como um aglomerado globular desde há cerca de 40 anos, quando foi descoberto. No entanto, uma equipe liderada por astrônomos italianos acaba de descobrir que Terzan 5 é diferente de todos os outros aglomerados globulares conhecidos.
A equipe obteve dados com o instrumento Multi-conjugate Adaptive Optics Demonstrator (MAD) instalado no VLT, assim como com uma série de outros telescópios colocados tanto no solo como no espaço. Foram utilizados também dados da Wide Field Camera 3 instalada a bordo do telescópio espacial Hubble e Near-Infrared Camera 2 montada no telescópio W. M. Keck. Os pesquisadores encontraram fortes evidências da existência de dois tipos distintos de estrelas em Terzan 5, as quais não diferem apenas nos elementos que contêm, mas apresentam também uma diferença de idades de cerca de 7 bilhões de anos. As duas populações estelares detectadas têm idades de 12 e 4,5 bilhões de anos, respectivamente.
As idades das duas populações indicam que o processo de formação estelar em Terzan 5 não se processou de forma contínua, tendo sido dominado por dois períodos distintos de formação estelar. “Esta hipótese requer que o antecessor de Terzan 5 tenha tido enormes quantidades de gás para uma segunda geração de estrelas e tenha sido muito massivo, com pelo menos 100 milhões de vezes a massa do Sol,” explica Davide Massari, do Italian National Institute for Astrophysics (INAF), na Itália e da Universidade de Groningen, Holanda.
A suas propriedades incomuns fazem de Terzan 5 o candidato ideal a um fóssil vivo dos primeiros dias da Via Láctea. Teorias atuais de formação galática assumem que vastos acúmulos de gás e estrelas interagiram para formar o bojo primordial da Via Láctea, fundindo-se e dissolvendo-se no processo.
“Pensamos que alguns restos destes acúmulos gasosos poderão ter permanecido relativamente imperturbados e que continuam existindo em nossa Galáxia,” explica Francesco Ferraro da Universidade de Bolonha, Itália, e autor principal do estudo. “Tais fósseis galáticos permitem aos astrônomos reconstruir uma parte importante da história da nossa Via Láctea.”
Apesar das propriedades de Terzan 5 serem incomuns para um aglomerado globular, são no entanto muito semelhantes à população estelar que se encontra no bojo galáctico, a região central altamente compacta da Via Láctea. Estas semelhanças poderão fazer de Terzan 5 uma relíquia fossilizada de formação galáctica, representando um dos mais antigos blocos constituintes da Via Láctea.
Esta suposição é reforçada pela massa original de Terzan 5 necessária à criação de duas populações estelares: uma massa semelhante à dos enormes acúmulos que se pensa terem formado o bojo durante a formação da Galáxia há cerca de 12 bilhões de anos atrás. De algum modo Terzan 5 conseguiu escapar de ser desfigurado por bilhões de anos, tendo sido preservado como um resto do passado distante da Via Láctea.
“Algumas das características apresentadas por Terzan 5 assemelham-se às detectadas nos acúmulos gigantes que observamos em galáxias com formação estelar a elevados desvios para o vermelho, sugerindo que semelhantes processos de formação ocorreram tanto no Universo local como no longínquo durante a época de formação galáctica,” continua Ferraro.
Esta descoberta abre assim o caminho para uma melhor e mais completa compreensão da formação de galáxias. “Terzan 5 poderá representar um elo intrigante entre o Universo local e o longínquo, uma testemunha que sobreviveu ao processo de formação do bojo galáctico,” explica Ferraro ao comentar a importância da descoberta. Este trabalho fornece um possível caminho para que os astrônomos possam deslindar os mistérios da formação galáctica e oferece uma vista sem precedentes da complicada história da Via Láctea.
Este trabalho foi descrito num artigo científico intitulado “The age of the young bulge-like population in the stellar system Terzan 5: linking the Galactic bulge to the high-z Universe” de F. R. Ferraro et al., que será publicado na revista especializada The Astrophysical Journal.
Fonte: ESO
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