Uma equipe internacional de astrônomos, liderada pela Universidade de Southampton, usou câmaras de última geração para criar um filme com alta taxa de quadros de um sistema com um buraco negro em crescimento e a um nível de detalhe nunca antes visto.
© John Paice (ilustração do buraco negro)
No processo, descobriram novas pistas para a compreensão dos arredores imediatos destes objetos enigmáticos.
Os buracos negros podem alimentar-se de uma estrela próxima e criar vastos discos de acreção de material. Aqui, o efeito da forte gravidade do buraco negro e o próprio campo magnético do material pode emitir níveis de radiação em rápida mudança do sistema como um todo.
Esta radiação foi detectada no visível pelo instrumento HiPERCAM acoplado ao GTC (Gran Telescopio Canarias) em La Palma, Ilhas Canárias, e em raios X pelo observatório NICER da NASA a bordo da Estação Espacial Internacional.
O buraco negro estudado tem o nome MAXI J1820+070 e foi descoberto no início de 2018. Fica a apenas 10.000 anos-luz de distância, na nossa própria Via Láctea. Tem uma massa equivalente a mais ou menos 7 sóis, que colapsou numa região do espaço inferior à cidade de Londres.
O estudo destes sistemas geralmente é muito difícil, pois as suas distâncias tornam-nos demasiado tênues e pequenos para serem observados, nem mesmo com o EHT (Event Horizon Telescope), que recentemente obteve a primeira fotografia do buraco negro no centro da galáxia M87. Os instrumentos HiPERCAM e NICER, no entanto, permitem o registro da luz do sistema a mais de 300 fps ("frames per second", quadros por segundo), capturando "crepitações" violentas e "surtos" de luz visível e raios X.
John Paice, estudante na Universidade de Southampton e do Centro Interuniversitário de Astronomia e Astrofísica, na Índia, foi o autor principal do estudo que apresentou estes resultados e também o artista que criou o filme. Ele explicou o trabalho da seguinte forma: "O filme foi feito usando dados reais, mas diminui para 1/10 da velocidade real para permitir que os surtos mais rápidos fossem discernidos pelo olho humano. Podemos ver que o material ao redor do buraco negro é tão brilhante que ofusca a estrela que está consumindo, e as oscilações mais rápidas duram apenas alguns milissegundos, é o 'output' de mais de cem sóis emitido num piscar de olhos."
Os cientistas também descobriram que quedas nos níveis de raios X são acompanhadas por um aumento da luz visível (e vice-versa). E que os flashes mais rápidos no visível emergiram uma fração de segundo após os raios X. Tais padrões revelam indiretamente a presença de plasma distinto, material extremamente quente onde os elétrons são despojados dos átomos, em estruturas profundas no abraço da gravidade do buraco negro, de outra forma pequenas demais para serem resolvidas.
Não é a primeira vez que isto é encontrado; uma diferença de fração de segundo entre a luz raios X e visível já foi observada em outros dois sistemas que hospedam buracos negros, mas nunca com este nível de detalhe. Os membros desta equipe internacional estiveram na vanguarda deste campo ao longo da última década. O Dr. Poshak Gandhi, igualmente de Southampton, também encontrou as mesmas assinaturas temporárias nos dois sistemas anteriores.
Ele comentou acerca da importância destas descobertas: "O fato de vermos isto agora em três sistemas reforça a ideia de que é uma característica unificadora de tais buracos negros em crescimento. A ser verdade, deve estar nos dizendo algo fundamental sobre como o fluxo de plasma em torno dos buracos negro opera."
"As nossas melhores ideias invocam uma ligação profunda entre os fluxos de plasma, para dentro e para fora. Mas estas são condições físicas extremas que não podemos replicar nos laboratórios da Terra e não entendemos como a natureza gere isto. Estes dados serão cruciais para acertar na teoria correta."
Um artigo foi publicado na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.
Fonte: Royal Astronomical Society
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