Os astrônomos resolveram um mistério científico de meio século ao identificar estrelas associadas ao fluxo de gás cósmico que emana de um par de galáxias próximas.
© CfA / M. Weiss (fluxo de gás cósmico emanando de um par de galáxias)
Durante quase cinquenta anos, os astrônomos saíram de mãos vazias na sua busca por estrelas dentro da extensa estrutura conhecida como Corrente de Magalhães. Uma colossal faixa de gás, a Corrente de Magalhães abrange quase 300 diâmetros lunares no céu do Hemisfério Sul, seguindo atrás das galáxias da Nuvem de Magalhães, duas das vizinhas cósmicas mais próximas da Via Láctea.
Agora a busca pelas estrelas finalmente acabou. Pesquisadores do Centro de Astrofísica do Harvard & Smithsonian (CfA) e colegas identificaram 13 estrelas cujas distâncias, movimento e composição química as colocam diretamente dentro do fluxo enigmático. A localização destas estrelas permitiu agora determinar a verdadeira distância até à Corrente de Magalhães, revelando que esta se estende de 150.000 anos-luz a mais de 400.000 anos-luz de distância.
As Grandes e Pequenas Nuvens de Magalhães são galáxias anãs satélites da Via Láctea. Visíveis a olho nu como luminâncias transparentes, as Nuvens são conhecidas desde a antiguidade. Com o advento de telescópios cada vez mais poderosos, capazes de perceber fenômenos demasiado tênues para os nossos olhos verem, foi descoberta uma gigantesca pluma de gás hidrogênio aparentemente expelida das Nuvens no início da década de 1970.
Estudos do gás dentro desta Corrente de Magalhães mostraram ainda que a Corrente tem dois filamentos entrelaçados, um originando-se de cada Nuvem. Estas características sugerem que a gravidade da Via Láctea pode ter puxado a Corrente de Magalhães para fora das Nuvens. No entanto, a forma exata como a Corrente se formou continua sendo difícil de determinar, em grande parte devido a sua presumível componente estelar permanecer indiscernível.
As escassas estrelas que pontilham os arredores da Galáxia foram pouco estudadas porque o Sistema Solar está bem no disco estrelado da própria Via Láctea. Porém, ao longo da última década, catálogos de observação profunda compilados por novos instrumentos, especialmente o telescópio espacial Gaia da ESA, começaram a espionar objetos estelares que poderiam ser apenas estas estrelas fronteiriças indescritíveis. Com acesso concedido ao telescópio Magellan Baade de 6,5 m no Observatório Las Campanas, no Chile, através do CfA e do MIT, um projeto foi empreendido para realizar espectroscopia em 200 estrelas distantes da Via Láctea, que quando concluída será a maior amostra deste tipo.
A espectroscopia envolve a coleta de luz suficiente de um objeto para detectar certas assinaturas impressas nas faixas coloridas da luz que, como as impressões digitais, identificam exclusivamente elementos químicos individuais. Estas assinaturas revelam, portanto, a composição química de um objeto, evidenciando sobre suas origens. Além disso, as assinaturas mudam com base na distância até um objeto, permitindo aos astrônomos saber para onde um objeto, como uma estrela, está indo e, correspondentemente, de onde veio.
A abundância química das estrelas identificadas correspondia à das Nuvens de Magalhães, por exemplo, por serem distintamente deficientes nos elementos mais pesados (metais). Ao obter medições sólidas da distância e extensão da Corrente de Magalhães através destas estrelas, os pesquisadores reforçaram a sua história de origem como uma captura gravitacional da Via Láctea. Os pesquisadores também conseguiram calcular a distribuição geral de gás da Corrente de Magalhães com maior confiança em comparação com estimativas anteriores. A distribuição indica que ela é cerca de duas vezes mais massiva do que geralmente se considera.
Este resultado, por sua vez, pressagia um futuro repleto de novas formações estelares na Via Láctea, porque a Corrente está interagindo ativamente na nossa Galáxia. Desta forma, a Corrente de Magalhães serve como principal fornecedor do gás frio e neutro necessário para produzir novas estrelas da Via Láctea.
Estudos adicionais da Corrente de Magalhães também deverão ajudar saber mais sobre a composição da nossa Galáxia. Modelar a evolução da relativamente massiva Grande Nuvem de Magalhães através da corrente estelar melhorará as medições da distribuição de massa da Via Láctea. Grande parte desta massa está na forma de matéria escura. Medir melhor a massa da nossa Galáxia no seu interior distante ajudará a contabilizar a matéria ordinária e escura, restringindo as possíveis propriedades desta última.
O novo estudo relatando a descoberta foi publicado no periódico Astrophysical Journal.
Fonte: Harvard–Smithsonian Center for Astrophysics
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