terça-feira, 16 de julho de 2024

Uma nova proposta para definição científica de planeta

Cientistas planetários estão propondo uma nova definição de planeta para substituir a que muitos pesquisadores consideram centrada no Sol e desatualizada.

© NASA / JPL (ilustração do Sistema Solar)

A definição atual - estabelecida em 2006 pela International Astronomical Union (IAU), a organização que nomeia oficialmente os objetos astronômicos - especifica que, para se qualificar como planeta, um corpo celeste tem de orbitar o Sol dentro do nosso Sistema Solar.

Mas sabe-se que os corpos celestes que orbitam estrelas para além do nosso Sistema Solar são bastante comuns, e os cientistas argumentam uma nova definição de planeta que inclua o fato de não estar limitado ao nosso Sistema Solar. A proposta também fornece critérios quantitativos para clarificar ainda mais a definição de planeta.

Jean-Luc Margot, autor principal do artigo científico e professor de Ciências da Terra, Planetárias e do Espaço e também de Física e Astronomia na Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), apresentará a nova proposta na Assembleia Geral da IAU em agosto.

De acordo com a definição atual, um planeta é um corpo celeste que orbita o Sol, é suficientemente massivo para que a gravidade o tenha forçado a assumir uma forma esférica e tenha "limpo" outros objetos próximos da sua órbita em torno do Sol. 

Os pesquisadores argumentam que, embora o requisito de orbitar o nosso Sol seja demasiado específico, outros critérios da definição da IAU são demasiado vagos. Por exemplo, diz-se que um planeta "limpou a sua órbita" sem se dizer o que isso significa. A nova definição proposta contém critérios quantificáveis que podem ser aplicados para definir planetas dentro e fora do nosso Sistema Solar. 

Na nova definição, um planeta é um corpo celeste que: 

  • orbita uma ou mais estrelas, anãs marrons ou remanescentes estelares; 
  • tem uma massa superior a 10²³ kg; 
  • tem menos que 13 massas de Júpiter (2,5 x 10³¹ g). 

Os pesquisadores aplicaram um algoritmo matemático às propriedades dos objetos do nosso Sistema Solar para ver que objetos se agrupavam. A análise revelou grupos de qualidades distintas partilhadas pelos planetas do nosso Sistema Solar que podem ser utilizadas como ponto de partida para criar uma taxonomia para os planetas em geral. Por exemplo, se um objeto tem gravidade suficiente para limpar a vizinhança, quer acumulando quer expulsando objetos menores, diz-se que é dinamicamente dominante. Todos os planetas do nosso Sistema Solar são dinamicamente dominantes, mas outros objetos, incluindo planetas anões como Plutão e asteroides, não o são. Por isso, esta propriedade pode ser incluída na definição de planeta. 

O requisito de dominância dinâmica fornece um limite inferior para a massa. Mas os potenciais planetas também podem ser demasiado grandes para se enquadrarem na nova definição. Alguns gigantes gasosos, por exemplo, são tão grandes que ocorre aí a fusão termonuclear do deutério, o objeto torna-se um objeto subestelar chamado anã marrom e, portanto, não é um planeta. Este limite de massa foi determinado em 13 ou mais Júpiteres. 

Por outro lado, o requisito atual de ser esférico é mais problemático. Os planetas distantes raramente podem ser observados com detalhe suficiente para determinar, com exatidão, a sua forma. Os cientistas argumentam que o requisito da forma é tão difícil de implementar que é efetivamente inútil para fins de definição, apesar dos planetas serem geralmente redondos. No Sistema Solar, os corpos celestes com mais de 10²¹ kg parecem ser redondos. Assim, espera-se que todos os corpos que satisfaçam o limite inferior de massa proposto de 10²³ kg sejam esféricos. Embora qualquer alteração oficial à definição de planeta da IAU esteja provavelmente a alguns anos de distância, Margot e os seus colegas esperam que o seu trabalho inicie uma conversa que resulte numa definição melhorada.

Um artigo será publicado em breve na revista The Planetary Science Journal.

Fonte: University of California

O glóbulo cometário GC 30

Quais são essas estruturas interestelares incomuns?

© Mark Hanson & Martin Pugh (glóbulo cometário CG 30)

Formas fluidas e com bordas brilhantes reúnem-se perto do centro deste rico campo estelar em direção às fronteiras das constelações náuticas do sul Pupis e Vela.

Composto por gás e poeira interestelar, o agrupamento de glóbulos cometários do tamanho de um ano-luz está a cerca de 1.300 anos-luz de distância. A energia ultravioleta emitida por estrelas quentes próximas moldou os glóbulos e ionizou as suas bordas brilhantes. 

Os glóbulos também se afastam do remanescente da supernova Vela, o que pode ter influenciado as suas formas varridas. Dentro deles, núcleos de gás frio e poeira estão provavelmente em colapso para formar estrelas de baixa massa, cuja formação acabará por causar a dispersão dos glóbulos. 

Na verdade, o glóbulo cometário CG 30 (no canto superior esquerdo) apresenta um pequeno brilho avermelhado perto da sua cabeça, um sinal revelador de jatos energéticos vindos de uma estrela nos estágios iniciais de formação.

Fonte: NASA

O pulsar de milissegundo mais próximo

O pulsar de milissegundo mais próximo, PSR J0437-4715, tem um raio de 11,4 quilômetros e uma massa 1,4 vezes superior à do Sol.

© NASA (pulsar de milissegundo PSR J0437-4715)

Imagem do pulsar de milissegundo PSR J0437-4715. À esquerda, como visto da Terra. À direita, como visto do plano equatorial da estrela. A cor púrpura-rosa indica a temperatura das manchas quentes nos polos. O branco é relativamente frio. O roxo é quente. Os polos magnéticos quentes não estão exatamente opostos um ao outro. Como a estrela é muito densa, nota-se também o efeito de curvatura da luz provocado pela gravidade extrema. Por exemplo, os dois polos de rotação da estrela no painel da direita são visíveis simultaneamente.

Estes são os resultados de medições de precisão efetuadas por uma equipe de pesquisadores liderada pela Universidade de Amsterdã (Países Baixos). As medições revelam mais sobre a composição e sobre o campo magnético desta estrela de nêutrons. 

PSR J0437 é um pulsar, uma estrela de nêutrons em rotação que emite radiação eletromagnética. Está localizado a cerca de 510 anos-luz da Terra na direção da constelação austral de Pintor. O pulsar gira 174 vezes por segundo em torno do seu eixo e tem uma anã branca como companheira. 

Como um farol fora de controle, o pulsar envia um feixe de ondas de rádio e raios X em direção à Terra a cada 5,75 milissegundos. Isto torna-o o pulsar de milissegundo mais próximo da Terra. É também, em parte por estar tão perto, o pulsar de milissegundo mais brilhante. E é um relógio mais estável do que os relógios atômicos fabricados pelo homem.

Os cientistas utilizaram dados do telescópio de raios X NICER a bordo da ISS (Estação Espacial Internacional). Combinaram os dados de raios X com uma técnica designada por modelação do perfil dos pulsos. Para tal, trabalharam modelos estatísticos complexos com o supercomputador nacional holandês Snellius. No final, conseguiram calcular o raio da estrela, com a ajuda de medições da massa efetuadas por Daniel Reardon (Universidade de Tecnologia de Swinburne, Austrália) e colegas no PPTA (Parkes Pulsar Timing Array). Também mapearam a distribuição de temperatura dos polos magnéticos. 

As novas medições indicam uma "equação de estado mais suave" do que se pensava anteriormente. Com isso, a massa máxima das estrelas de nêutrons deve ser inferior ao que algumas teorias preveem.

O artigo científico que detalha as descobertas foi aceito para publicação no periódico The Astrophysical Journal Letters e faz parte de um conjunto de artigos sobre pulsares de milissegundo.

Fonte: NOVA

Olimpíada Internacional de Astronomia e Astrofísica

O Brasil vai sediar em agosto de 2024 a 17ª Olimpíada Internacional de Astronomia e Astrofísica (IOAA) e o Observatório Nacional (ON), unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), é a entidade responsável pela coordenação do evento.

© ON (IOAA 2024)

A 17ª IOAA será realizada em Vassouras e Barra do Piraí, interior do estado do Rio de Janeiro, entre os dias 17 e 27 de agosto de 2024. 

A IOAA 2024 do Brasil receberá equipes de estudantes de 57 países. A Olimpíada Internacional de Astronomia e Astrofísica, estabelecida na Tailândia em 2006 é uma competição anual com foco em estudantes do ensino médio e é realizada a cada edição em um país diferente. Participam da IOAA equipes representando seus respectivos países, formadas por até cinco alunos e dois professores. 

O objetivo dessa competição é fomentar o conhecimento e a paixão pela astronomia e astrofísica, bem como promover um intercâmbio cultural entre os estudantes dos mais diversos países. 

O Observatório Nacional, enquanto entidade organizadora do evento, definiu a "sustentabilidade" como mote para a IOAA 2024, uma escolha que representa a crescente preocupação global com o meio ambiente e o papel da ciência na busca por soluções sustentáveis. 

O Brasil participa da IOAA desde 2007. As equipes que representam o Brasil na IOAA e na OLAA (Olimpíada Latino-Americana de Astronomia e Astronáutica) são formadas por meio de um processo seletivo rigoroso e transparente organizado pelo Comitê Organizador da OBA (Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica), envolvendo milhares de estudantes no Brasil inteiro. Um diferencial da equipe brasileira é a presença obrigatória de meninas, formando uma equipe mista. Embora essa não seja uma exigência da IOAA, a OLAA adota essa política, e o Brasil decidiu implementá-la também em sua equipe da IOAA para promover a diversidade e incentivar a participação feminina em Olimpíadas de Conhecimento. 

O Brasil voltará a sediar IOAA após 12 anos. Em 2012, o Observatório Nacional foi um dos organizadores da 6ª IOAA com 28 países participantes, primeira olimpíada internacional de conhecimento realizada no Brasil, e foi uma experiência maravilhosa fazer parte do Comitê Organizador”, destacou a Dra. Josina Nascimento, coordenadora do Comitê Brasileiro da IOAA 2024, gestora da Divisão de Comunicação e Popularização da Ciência do ON e membro da Comissão Organizadora da OBA.

O anúncio do Brasil como país-sede da 17ª IOAA foi feito ao final da cerimônia de encerramento da IOAA 2023, realizada em Chorzów, na Polônia. O anúncio foi recebido com entusiasmo, marcando a concretização da candidatura brasileira para sediar a prestigiosa competição. A escolha do Brasil como anfitrião da IOAA 2024 reflete o compromisso do país com a promoção da ciência e da educação, além de representar uma oportunidade única para destacar o talento e a paixão dos jovens brasileiros pela astronomia e astrofísica em um cenário internacional. 

Na edição da IOAA do ano passado, o Brasil conquistou duas medalhas de ouro, duas medalhas de prata, uma menção honrosa e prêmio pela melhor prova de grupo.

O Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA) estará se unindo ao Observatório Nacional visando promover a competição e fortalecer a astronomia brasileira, inspirando jovens talentos e impulsionando o desenvolvimento científico do país. Fundado em 1985, o LNA é um instituto de pesquisas do MCTI que planeja, desenvolve e coordena os meios e a infraestrutura para a astronomia observacional brasileira. Foi o primeiro dos laboratórios nacionais instalados no Brasil e desempenha um papel fundamental no desenvolvimento científico e tecnológico do país. 

Uma das ações de destaque dessa parceria será a observação remota que o LNA proporcionará aos participantes da IOAA na noite do dia 25 de agosto, a última antes da cerimônia de encerramento. Através do Observatório do Pico dos Dias (OPD), localizado em Brazópolis, Minas Gerais, os jovens astrônomos terão a oportunidade de realizar observações astronômicas virtuais utilizando equipamentos como o maior telescópio em território brasileiro com um espelho de 1,60 metros, expandindo seus conhecimentos e experiências práticas na área.

"Essa é uma oportunidade excelente para os alunos da IOAA vivenciarem como os astrônomos profissionais utilizam instrumentos de alta tecnologia para coletar os dados observacionais que lhe permitirão fazer descobertas científicas que nos permitem compreender melhor o nosso Universo", comenta Wagner Corradi, diretor do LNA.

Fonte: Observatório Nacional

segunda-feira, 15 de julho de 2024

Aproximando de um anel surpreendente

Esta imagem mostra a galáxia distante PJ0116-24, uma galáxia infravermelha hiperluminosa.

© ALMA / VLT (galáxia PJ0116-24)

Estas galáxias são extremamente brilhantes, iluminadas pela formação estelar extremamente rápida que ocorre no seu interior. Mas o que é que provoca este processo? 

Estudos anteriores sugeriram que estas galáxias extremas resultam de fusões de galáxias. Pensa-se que estas colisões entre galáxias criam regiões de gás denso nas quais se desencadeia uma formação estelar muito rápida. No entanto, também galáxias isoladas se podem transformar em galáxias infravermelhas hiperluminosas apenas por processos internos, se o gás utilizado na formação estelar for rapidamente canalizado para o centro da galáxia. 

Num novo estudo liderado por Daizhong Liu (Instituto Max Planck de Física Extraterrestre, Alemanha), combinaram-se observações obtidas pelo Very Large Telescope (VLT) do ESO e pelo o Atacama Large Millimetre/submillimetre Array (ALMA) com o intuito de estudar os movimentos do gás no interior de PJ0116-24. 

O ALMA detecta o gás frio (em azul), enquanto o VLT, com o seu novo instrumento ERIS (Enhanced Resolution Imager and Spectrograph), detecta o gás quente (em vermelho). Graças a estas observações detalhadas, os astrônomos descobriram que o gás nesta galáxia extrema está rodando de modo organizado, em vez da maneira caótica que se esperava após uma colisão galáctica, um resultado surpreendente!

Este fato demonstra de forma convincente que nem sempre são necessárias fusões para que uma galáxia se torne uma galáxia infravermelha hiperluminosa. A PJ0116-24 está tão longe que a sua luz demorou cerca de 10 bilhões de anos a chegar até nós. Felizmente, uma galáxia situada em primeiro plano (que não vemos aqui) atuou como uma lente gravitacional, curvando e ampliando a luz emitida pela PJ0116-24, que se encontra por detrás, e formando o anel de Einstein que aqui observamos. Este tipo de alinhamento cósmico bem preciso permite realizar zoom em objetos muito distantes e observá-los com um nível de detalhe que, de outra forma, seria muito difícil de obter.

Fonte: ESO

Montando as maiores galáxias

A imagem obtida pelo telescópio espacial Hubble é a galáxia anã irregular NGC 5238, localizada a 14,5 milhões de anos-luz da Terra, na constelação de Canes Venatici.

© Hubble (NGC 5238)

A sua aparência nada excitante, semelhante a uma bolha, assemelhando-se mais a um enorme aglomerado estelar do que a uma galáxia, desmente uma estrutura complicada que tem sido objeto de muita investigação por parte dos astrônomos. 

Aqui, o telescópio espacial Hubble é capaz de identificar as inúmeras estrelas da galáxia, bem como os aglomerados globulares associados, os pontos brilhantes dentro e ao redor da galáxia que estão repletos de ainda mais estrelas. 

Acredita-se que a galáxia NGC 5238 tenha surgida recentemente, ou seja, não mais do que um bilhão de anos atrás! Ela teve um encontro próximo com outra galáxia. A prova disto são as distorções de maré na forma da NGC 5238, o tipo produzido por duas galáxias que se puxam uma contra a outra à medida que interagem. Não há nenhuma galáxia próxima que possa ter causado esta perturbação, então a hipótese é que seja uma galáxia satélite menor que foi devorada pela NGC 5238. 

Vestígios da antiga galáxia podem ser encontrados examinando de perto a população de estrelas na NGC 5238, uma tarefa para a qual o telescópio espacial Hubble é a melhor ferramenta. Dois sinais reveladores seriam grupos de estrelas com propriedades que parecem deslocadas em comparação com a maioria das outras estrelas da galáxia, indicando que elas foram originalmente formadas em uma galáxia separada, ou estrelas que parecem ter se formado abruptamente em torno do mesmo tempo, o que ocorreria durante uma fusão galáctica. 

Os dados usados ​​para fazer esta imagem serão utilizados para testar essas previsões. Apesar do seu pequeno tamanho e aparência normal, não é incomum que galáxias anãs como a NGC 5238 conduzam a nossa compreensão da formação e evolução das galáxias. Uma teoria principal da evolução das galáxias é que as galáxias se formaram "de baixo para cima" de forma hierárquica: aglomerados de estrelas e pequenas galáxias foram os primeiros a se formar a partir de gás e matéria escura, e gradualmente foram reunidos pela gravidade em aglomerados de galáxias e superaglomerados, explicando a forma das maiores estruturas do Universo hoje. Uma galáxia anã irregular como NGC 5238 fundindo-se com uma companheira ainda menor é exatamente o tipo de evento que pode ter iniciado este processo de montagem de galáxias no Universo primordial. Acontece que esta pequena galáxia pode servir como um teste para algumas das previsões mais fundamentais da astrofísica!

 Fonte: ESA

sábado, 13 de julho de 2024

Um anel adornado com joias

Esta nova imagem obtida pelo telescópio espacial James Webb mostra as lentes gravitacionais do quasar conhecido como RX J1131-1231, localizado a cerca de seis bilhões de anos-luz da Terra, na constelação da Crater, a Taça.

© JWST (quasar RX J1131-1231)

É considerado um dos quasares com melhor lente gravitacional descobertos até hoje, já que a galáxia em primeiro plano mancha a imagem do quasar de fundo num arco brilhante e cria quatro imagens do objeto. 

As lentes gravitacionais, previstas pela primeira vez por Albert Einstein, oferecem uma rara oportunidade de estudar regiões próximas do buraco negro em quasares distantes, atuando como um telescópio natural e ampliando a luz destas fontes. Toda a matéria no Universo deforma o espaço à sua volta, com massas maiores produzindo um efeito mais forte. Em torno de objetos muito massivos, como galáxias, a luz que passa por perto segue este espaço distorcido, parecendo desviar-se do seu caminho original numa quantidade claramente visível. Uma das consequências das lentes gravitacionais é que podem ampliar objetos astronômicos distantes, permitindo o estudo de objetos que, de outra forma, seriam demasiado tênues. 

As medições da emissão de raios X dos quasares podem fornecer uma indicação da rapidez com que o buraco negro central gira e isto fornece aos astrônomos pistas importantes sobre como os buracos negros crescem ao longo do tempo. Por exemplo, se um buraco negro cresce principalmente a partir de colisões e fusões entre galáxias, deverá acumular material num disco estável, e o fornecimento constante de novo material a partir do disco deverá conduzir a um buraco negro com rotação rápida. Por outro lado, se o buraco negro crescesse através de muitos pequenos episódios de acreção, acumularia material em direções aleatórias. 

As observações indicaram que o buraco negro neste quasar em particular gira a mais de metade da velocidade da luz, o que sugere que este buraco negro cresceu através de fusões, em vez de puxar material de diferentes direções. 

Esta imagem foi captada com o MIRI (Mid-Infrared Instrument) do Webb como parte de um programa de observação para estudar a matéria escura. A matéria escura é uma forma invisível de matéria que representa a maior parte da massa do Universo. As observações de quasares pelo Webb estão permitindo aos astrônomos explorar a natureza da matéria escura em escalas menores do que nunca.

Fonte: ESA

Uma espantosa fusão entre quasar e galáxia no Universo distante

Um grupo internacional de pesquisa liderado pelo INAF (Istituto Nazionale di Astrofisica), na Itália, e composto por 34 institutos e universidades de todo o mundo, utilizou o instrumento NIRSpec (Near-Infrared Spectrograph) a bordo do telescópio espacial James Webb (JWST) para testemunhar a interação dramática entre um quasar no interior do sistema PJ308-21 e duas massivas galáxias satélites no Universo distante.

© INAF (mapa das linhas de emissão no sistema PJ308-21)

Mapa das linhas de emissão do hidrogênio (em vermelho e azul) e oxigênio (em verde) no sistema PJ308-21, visto depois de ocultar artificialmente a luz do quasar central. As diferentes cores da galáxia hospedeira do quasar e das galáxias companheiras neste mapa revelam as propriedades físicas do gás no seu interior. A descrição 5 kpc é 5 x 10³ parsec (1 pc = 3.086 × 10¹³ km).

As observações, realizadas em setembro de 2022, revelaram detalhes sem precedentes e inspiradores, fornecendo novos conhecimentos sobre o crescimento das galáxias no início do Universo. 

Os resultados foram apresentados durante a reunião da Sociedade Astronômica Europeia (EAS) em Pádua (Itália). As observações deste quasar (já descrito pelos mesmos autores num outro estudo publicado em maio passado), um dos primeiros estudados com o NIRSpec quando o Universo tinha menos de um bilhão de anos (desvio para o vermelho z=6,2342), revelaram dados de qualidade sensacional: o instrumento captou o espectro do quasar com uma incerteza inferior a 1% por pixel. 

A galáxia hospedeira de PJ308-21 apresenta uma elevada metalicidade (que se refere à abundância de elementos químicos mais pesados do que o hidrogênio e o hélio) e condições de fotoionização típicas de um núcleo galáctico ativo (NGA), enquanto uma das galáxias satélite apresenta uma baixa metalicidade e fotoionização induzida pela formação estelar; uma metalicidade mais elevada caracteriza a segunda galáxia satélite, que é parcialmente fotoionizada pelo quasar. 

A descoberta permitiu a determinação da massa do buraco negro supermassivo no centro do sistema (cerca de 2 bilhões de massas solares). Também confirmou que tanto o quasar como as galáxias circundantes são altamente evoluídos em termos de massa e enriquecimento de metais, e estão em constante crescimento. Este fato tem implicações profundas para a nossa compreensão da história cósmica e da evolução química das galáxias, realçando o impacto transformador desta prospecção. 

As observações foram efetuadas no modo de espectroscopia de campo integral: para cada pixel de imagem, pode ser observado o espectro de toda a banda óptica, desviado para o infravermelho devido à expansão do Universo. Isto permite o estudo de vários rastreadores de gás (linhas de emissão) utilizando uma abordagem 3D. Por intermédio desta técnica foram detectadas emissões espacialmente alargadas de diferentes elementos, que foram utilizadas para estudar as propriedades do meio interestelar ionizado, incluindo a fonte e a intensidade do campo de radiação fotoionizante, a metalicidade, o obscurecimento da poeira, a densidade e a temperatura dos elétrons e o ritmo de formação estelar. Além disso, os pesquisadores detectaram marginalmente a emissão de luz estelar associada a fontes companheiras.

Um artigo foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics

Fonte: Istituto Nazionale di Astrofisica

sábado, 6 de julho de 2024

Simulação cósmica revela como os buracos negros crescem e evoluem

Uma equipe de astrofísicos liderada pelo Caltech (Instituto de Tecnologia da Califórnia) conseguiu, pela primeira vez, simular a viagem do gás primordial que data do início do Universo até à fase em que é arrastado para um disco de material que alimenta um único buraco negro supermassivo.

© Caltech (simulação mostra um buraco negro supermassivo)

A nova simulação de computador põe em causa as ideias que os astrônomos tinham sobre esses discos desde a década de 1970 e abre caminho a novas descobertas sobre a forma como os buracos negros e as galáxias crescem e evoluem.

A nova simulação marca o culminar de vários anos de trabalho de duas grandes colaborações iniciadas no Caltech. A primeira colaboração, designada por FIRE (Feedback in Realistic Environments), centrou-se nas maiores escalas do Universo, estudando questões como a formação das galáxias e o que acontece quando estas colidem. A outra, denominada STARFORGE, foi concebida para examinar escalas muito menores, incluindo a maneira como as estrelas se formam em nuvens de gás individuais.

Mas havia uma grande lacuna entre as duas. Para analisar esta diferença, os pesquisadores construíram uma simulação com uma resolução mais de 1.000 vezes superior à melhor neste campo. A simulação revelou que os campos magnéticos desempenham um papel muito mais importante do que se pensava na formação e definição dos enormes discos de material que giram em torno e alimentam os buracos negros supermassivos.

À medida que o gás e a poeira são puxados pela enorme gravidade destes buracos negros, não são imediatamente sugados. Em vez disso, o material forma primeiro um disco que gira rapidamente, chamado disco de acreção. E quando o material está prestes a cair, irradia uma enorme quantidade de energia, brilhando com uma luminosidade extrema no Universo. Mas ainda não se sabe muito sobre estes buracos negros supermassivos ativos, chamados quasares, e como se formam e comportam os discos que os alimentam. Embora os discos em torno de buracos negros supermassivos já tenham sido fotografados anteriormente, o EHT (Event Horizon Telescope) fotografou discos em torno de buracos negros no coração da Via Láctea em 2022 e em Messier 87 em 2019; estes discos estão muito mais próximos e são mais calmos do que os existentes em torno dos quasares. 

Para visualizar o que acontece em volta destes buracos negros mais ativos e distantes, os astrofísicos recorrem a simulações em supercomputadores. Alimentam milhares de processadores que trabalham em paralelo com informações sobre a física que atua nestes cenários galácticos; desde as equações básicas que regem a gravidade até à forma de tratar a matéria escura e as estrelas. Afinal, as estrelas afetam o que as rodeia. Emitem radiação que pode aquecer ou empurrar o gás circundante. Sopram ventos como o vento solar criado pelo nosso próprio Sol, que pode varrer material. Explodem como supernovas, por vezes lançando material para fora das galáxias ou alterando a química do seu ambiente. Assim, os computadores têm de conhecer todos os meandros da evolução estelar, uma vez que regula o número de estrelas que uma galáxia pode efetivamente formar. 

A equipa liderada pelo Caltech utilizou um código a que chamaram GIZMO para os projetos de simulação em grande e pequena escala. O mais importante é que construíram o projeto FIRE de modo a que toda a física que lhe adicionassem pudesse funcionar com o projeto STARFORGE e vice-versa. Isto permitiu aos cientistas simular um buraco negro com uma massa cerca de 10 milhões de vezes superior à do nosso Sol, começando no início do Universo. A simulação aproxima-se desse buraco negro no momento em que um fluxo gigante de material é arrancado de uma nuvem de gás com formação estelar e começa a girar em torno do buraco negro supermassivo. A simulação pode continuar se aproximando, resolvendo uma área mais fina em cada passo, à medida que segue o gás no seu caminho em direção ao buraco negro. 

Em dois influentes artigos científicos da década de 1970, que descreviam os discos de acreção que alimentam os buracos negros supermassivos, os cientistas assumiram que a pressão térmica, a alteração da pressão causada pela mudança de temperatura do gás nos discos, desempenhava o papel dominante na prevenção do colapso desses discos sob a enorme gravidade que sofrem perto do buraco negro. Reconheceram que os campos magnéticos podem ter um papel menor em ajudar a sustentar os discos. Em contrapartida, a nova simulação revelou que a pressão dos campos magnéticos desses discos era 10.000 vezes superior à pressão do calor do gás. Assim, os discos são quase completamente controlados pelos campos magnéticos. 

Os campos magnéticos têm muitas funções, uma das quais é sustentar os discos e tornar o material fofo. Esta constatação altera uma série de previsões que os cientistas podem fazer sobre esses discos de acreção, tais como a sua massa, a densidade e espessura que devem ter, a rapidez com que o material deve ser capaz de se deslocar deles para um buraco negro e até a sua geometria (por exemplo, se os discos podem ter deformações). 

Para o futuro, espera-se que esta nova capacidade de colmatar a lacuna entre as escalas das simulações cosmológicas abra muitas novas vias de investigação. Por exemplo, o que acontece em pormenor quando duas galáxias se fundem? Que tipos de estrelas se formam nas regiões densas das galáxias, onde as condições são diferentes das da vizinhança do nosso Sol? Qual terá sido o aspecto da primeira geração de estrelas no Universo?

Um artigo foi publicado no The Open Journal of Astrophysics.

Fonte: California Institute of Technology

Porque é que parece que estamos sozinhos na Via Láctea?

Uma nova pesquisa sugere uma explicação geológica para o fato de não terem sido encontradas evidências conclusivas da existência de civilizações extraterrestres avançadas, apesar da equação de Drake prever que deveriam existir muitas civilizações deste tipo na nossa Galáxia, capazes de comunicar conosco.

© Copilot Designer (imagem gerada por inteligência artificial de um exoplaneta habitado)

A pesquisa realizada pelo Dr. Robert Stern, geocientista da Universidade do Texas em Dallas, e o Dr. Taras Gerya, professor de Ciências da Terra no ETH (Eidgenössische Technische Hochschule) em Zurique, propõem que, em planetas com vida, é essencial, para a evolução de civilizações ativas e comunicativas, a presença de oceanos e continentes, bem como de placas tectônicas a longo prazo. Os pesquisadores concluem que a provável escassez destes três requisitos, em exoplanetas, diminuiria significativamente o número esperado de civilizações extraterrestres na Via Láctea.

A vida existe na Terra há cerca de 4 bilhões de anos, mas organismos complexos como os animais só apareceram há cerca de 600 milhões de anos, ou seja, pouco tempo depois do início do episódio moderno das placas tectônicas. 

Em 1961, o astrónomo Dr. Frank Drake concebeu uma equação em que vários fatores são multiplicados para estimar o número de civilizações inteligentes na Via Láctea capazes de evidenciar a sua presença aos humanos: 

N = R* x fp x ne x fl x fi x fc x L 

N - o número de civilizações da Via Láctea cujas emissões eletromagnéticas (ondas de rádio, etc.) são detectáveis;

R* - o número de estrelas formadas anualmente;

fp - a fração dessas estrelas com sistemas planetários;

ne - o número de planetas por sistema solar com um ambiente adequado à vida;

fl - a fração de planetas adequados em que a vida realmente aparece;

fi - a fração de planetas com vida em que surge vida inteligente;

fc - a fração de civilizações que desenvolvem uma tecnologia que produz sinais detectáveis da sua existência;

L - o período médio de tempo (anos) em que essas civilizações produzem esses sinais.

A atribuição de valores às sete variáveis tem sido um jogo de adivinhação, levando a previsões de que tais civilizações devem ser comuns. Mas se isso é verdade, porque é que não existem evidências conclusivas da sua existência? Esta contradição é conhecida como o paradoxo de Fermi, nome dado em homenagem ao Dr. Enrico Fermi, físico nuclear e Prêmio Nobel de Física, que colocou informalmente tal questão. 

No seu estudo, Stern e Gerya propõem o aperfeiçoamento de uma das incógnitas da equação de Drake - fi, a fração de planetas com vida em que surge vida inteligente - para ter em conta a necessidade de grandes oceanos e continentes e a existência de placas tectônicas, há mais de 500 milhões de anos, nesses planetas. Na formulação original, pensava-se que esta incógnita era quase 1, ou 100%; isto é, em todos os planetas com vida a evolução avançaria e, com tempo suficiente, se transformaria numa civilização inteligente. 

As placas tectônicas é uma teoria científica formulada no final da década de 1960 que afirma que a crosta e o manto superior da Terra estão divididos em pedaços móveis, ou placas, que se movem muito lentamente. No nosso Sistema Solar, apenas um dos quatro corpos rochosos com deformação da superfície e atividade vulcânica, a Terra, tem placas tectônicas. Três outros corpos: Vênus, Marte e a lua de Júpiter, Io, estão ativamente deformados e têm vulcões jovens, mas não têm placas tectônicas. Dois outros corpos rochosos: Mercúrio e a Lua, não têm essa atividade e estão tectonicamente mortos.

À medida que as placas tectônicas se movem, estas chocam ou afastam-se umas das outras, formando estruturas geológicas como montanhas, vulcões e oceanos, que também permitem o desenvolvimento de padrões meteorológicos e climáticos moderados. Através do intemperismo, os nutrientes são liberados nos oceanos. Ao criar e destruir habitats, as placas tectônicas exercem uma pressão ambiental moderada, mas incessante, sobre as espécies, para que evoluam e se adaptem. 

Os pesquisadores também avaliaram a importância da presença duradoura de grandes massas de terra e de oceanos para a evolução que levou a uma espécie ativa e capaz de comunicar. Eles propuseram uma revisão da equação de Drake que define "fi" como o produto de dois termos: foc, a fração de exoplanetas habitáveis com continentes e oceanos significativos, e fpt, a fração de planetas que tiveram placas tectônicas de longa duração.

Com base na sua análise, a fração de exoplanetas com um volume ideal de água é provavelmente muito pequena. Estimam que o valor de foc varia entre 0,0002 e 0,01. Da mesma forma, as placas tectônicas com uma duração superior a 500 milhões de anos é também altamente incomum, o que leva a uma estimativa de fpt inferior a 0,17. Quando esses fatores são multiplicados, obtem-se uma estimativa refinada de fi que é muito pequena, entre 0,003% e 0,2%, em vez de 100%. Isto explica a extrema raridade de condições planetárias favoráveis ao desenvolvimento de vida inteligente na Via Láctea e possivelmente resolve o paradoxo de Fermi. 

Um artigo foi publicado na edição online da revista Scientific Reports

Fonte: University of Texas