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segunda-feira, 6 de outubro de 2025

Gaia descobre uma grande onda na Via Láctea

A nossa Galáxia nunca está parada: gira e oscila. E agora, dados do telescópio espacial Gaia da ESA revelam que a Via Láctea também tem uma onda gigante que ondula do seu centro para fora.

© ESA / Gaia (ondulação de lado na Via Láctea)

Há cerca de cem anos que sabemos que as estrelas da Via Láctea giram em torno do seu centro e o Gaia mediu as suas velocidades e movimentos. Desde a década de 1950 que sabemos que o disco da Via Láctea está deformado. Depois, em 2020, o Gaia descobriu que este disco oscila ao longo do tempo, de forma semelhante ao movimento de um pião.

E agora tornou-se claro que uma grande onda agita o movimento das estrelas da Via Láctea ao longo de distâncias de dezenas de milhares de anos-luz do Sol. Tal como uma pedra atirada para um lago, fazendo ondulações para fora, esta onda galáctica de estrelas abrange uma grande parte do disco exterior da Via Láctea.

A inesperada ondulação galáctica é vista com as posições de milhares de estrelas brilhantes que são mostradas em vermelho e azul, sobrepostas nos mapas da Via Láctea pelo Gaia. Mesmo que nenhuma nave espacial possa viajar para além da nossa Galáxia, a visão excepcionalmente precisa do Gaia, nas três direções espaciais (3D) e nas três velocidades (movendo-se em direção a nós e para longe de nós, e pelo céu) está permitindo aos cientistas fazer estes mapas de cima para baixo e de lado. A partir deles, podemos ver que a onda estende-se por uma enorme porção do disco galáctico, afetando estrelas a pelo menos 30 a 65 mil anos-luz de distância do centro da Galáxia (para efeitos de comparação, a Via Láctea tem cerca de 100 mil anos-luz de diâmetro).

Os astrônomos conseguiram descobrir este movimento surpreendente estudando as posições e movimentos pormenorizados de jovens estrelas gigantes e estrelas Cefeidas. Estas últimas são estrelas que variam de brilho de uma forma previsível e que podem ser observadas por telescópios como o Gaia a grandes distâncias. Dado que as jovens estrelas gigantes e as Cefeidas movem-se com a onda, os cientistas pensam que o gás no disco também pode estar participando nesta ondulação em grande escala. É possível que as estrelas jovens retenham a memória da onda a partir do próprio gás no qual nasceram.

Uma colisão passada com uma galáxia anã poderia ser uma explicação possível, mas os cientistas precisam de mais investigações. A grande onda pode também estar relacionada com um movimento ondulatório de menor escala observado a 500 anos-luz do Sol e que se estende por 9.000 anos-luz, a chamada Onda Radcliffe. No entanto, a Onda Radcliffe é um filamento muito menor e está localizada numa parte diferente do disco da Galáxia, em comparação com a onda estudada (muito mais perto do Sol do que a grande onda). As duas ondas podem ou não estar relacionadas. 

O quarto lançamento de dados do Gaia incluirá posições e movimentos ainda melhores das estrelas da Via Láctea, incluindo estrelas variáveis como as Cefeidas. Isto ajudará na obtenção de mapas ainda melhores, avançando assim na compreensão destas características da Via Láctea.

Um artigo foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics.

Fonte: ESA

sexta-feira, 19 de setembro de 2025

Imenso jato estelar na periferia da nossa Via Láctea

Bem longe, no limite da nossa Galáxia, a Via Láctea, uma jovem estrela ainda em formação está enviando um comunicado de nascimento ao Universo sob a forma de um fogo de artifício.

© NASA (Sharpless 2-284)

Os gases sobreaquecidos que caem sobre a estrela massiva são lançados para o espaço ao longo do eixo de rotação da estrela e poderosos campos magnéticos confinam os jatos em feixes estreitos. O telescópio espacial James Webb testemunhou o espetáculo em luz infravermelha. Os jatos estão penetrando na poeira e no gás interestelares, criando detalhes fascinantes captados apenas pelo Webb. 

Estendendo-se por 8 anos-luz, o comprimento da erupção estelar é aproximadamente o dobro da distância entre o nosso Sol e o vizinho sistema Alpha Centauri. Os pesquisadores dizem que o tamanho e a força deste jato estelar em particular, conhecido como Sharpless 2-284 (Sh2-284), qualifica-o como raro. O jato atravessa o espaço a centenas de milhares de quilômetros por hora. A protoestrela central, com uma massa equivalente a dez vezes a massa solar, está localizada a 15.000 anos-luz de distância, nos confins da Via Láctea. 

Esta classe única de fogos de artifício estelares, designada por objetos de Herbig-Haro (HH), são jatos de plasma altamente colimados expelidos por estrelas em formação. Parte do gás em queda, que se acumula em torno da estrela central, é projetado ao longo do eixo de rotação da estrela, provavelmente sob a influência de campos magnéticos. Atualmente, já foram observados mais de 300 objetos de HH, mas principalmente em estrelas de baixa massa. Estes jatos em forma de fuso oferecem pistas sobre a natureza das estrelas em formação. A energia, a pequena espessura e as escalas temporais evolutivas dos objetos de HH servem para restringir os modelos do ambiente e das propriedades físicas do jovem objeto estelar que alimenta o fluxo.

A detecção fornece evidências de que os jatos de HH devem aumentar com a massa da estrela que os alimenta. Quanto mais massivo for o motor estelar que impulsiona o plasma, maior será o tamanho do jato. A detalhada estrutura filamentar do jato, captada pela nítida resolução infravermelha do Webb, é evidência de que o jato está atravessando poeira e gás interestelares. Isto cria nós separados, choques em arco e cadeias lineares. As pontas do jato, situadas em direções opostas, encapsulam a história da formação da estrela.

Originalmente, o material estava perto da estrela, mas ao longo de 100.000 anos as pontas foram-se propagando para fora, e o material por trás é um fluxo mais jovem. A uma distância do Centro Galáctico quase duas vezes superior à do nosso Sol, o protoaglomerado hospedeiro do voraz jato encontra-se na periferia da Via Láctea. No interior do aglomerado ainda estão se formando algumas centenas de estrelas. Estar perto da periferia galáctica significa que as estrelas são deficientes em elementos mais pesados do que o hidrogênio e o hélio. Isto é medido como metalicidade, que aumenta gradualmente ao longo do tempo cósmico, à medida que cada geração estelar expulsa os produtos finais da fusão nuclear através de ventos e supernovas. A baixa metalicidade de Sh2-284 é um reflexo da sua natureza relativamente pristina, tornando-o um análogo local para os ambientes do Universo primitivo que também eram deficientes em elementos mais pesados.

Os jatos estelares, que são alimentados pela energia gravitacional liberada à medida que uma estrela cresce em massa, codificam a história da formação da protoestrela. As novas imagens do Webb dizem-nos que a formação de estrelas massivas nestes ambientes pode ocorrer através de um disco relativamente estável ao redor da estrela, o que é esperado nos modelos teóricos de formação estelar conhecidos como acreção do núcleo.

Há mais de 30 anos que os astrônomos discordam sobre a forma como as estrelas massivas se formam. Alguns pensam que uma estrela massiva requer um processo muito caótico, chamado acreção competitiva. No modelo de acreção competitiva, o material cai de muitas direções diferentes, de modo que a orientação do disco muda ao longo do tempo. O fluxo é lançado perpendicularmente, acima e abaixo do disco, e por isso também parece torcer e girar em direções diferentes. 

Onde há uma estrela massiva, pode haver outras nesta fronteira exterior da Via Láctea. Outras estrelas massivas podem ainda não ter atingido o ponto de disparar fluxos energéticos. Dados do ALMA (Atacama Large Millimeter Array), no Chile, também apresentados neste estudo, encontraram outro núcleo estelar denso que poderá estar numa fase anterior de construção.

Um artigo foi aceito para publicação no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: ESA

segunda-feira, 12 de maio de 2025

A causa de uma fratura num segmento galáctico

Os astrônomos descobriram uma explicação provável para uma fratura num enorme segmento cósmico na Via Láctea, utilizando o observatório de raios X Chandra da NASA e radiotelescópios.

© NASA (pulsar e fratura em estrutura)

O segmento cósmico parece ter sido atingido por uma estrela de nêutrons, ou pulsar, que se move rapidamente e gira a grande velocidade. As estrelas de nêutrons são as estrelas mais densas que se conhecem e formam-se a partir do colapso e explosão de estrelas massivas.

Estas estrelas recebem frequentemente um poderoso "pontapé" destas explosões, que as afasta do local da explosão a grande velocidade. Perto do centro da Via Láctea encontram-se estruturas enormes que se assemelham a ossos ou cobras. Estas formações alongadas são vistas no rádio e estão enlaçadas por campos magnéticos que correm paralelamente a elas.

As ondas de rádio são causadas por partículas energizadas que se movem em espiral ao longo dos campos magnéticos. Esta nova imagem mostra um destes segmentos cósmicos, chamado G359.13142-0.20005 (G359.13 para abreviar), com dados de raios X do Chandra (em azul) e dados de rádio da rede MeerKAT na África do Sul (em cinza). Os pesquisadores também se referem a G359.13 como a Serpente.

A análise desta imagem revela a presença de uma quebra, ou fratura, no segmento contínuo de G359.13 visto na imagem. Os dados combinados de raios X e rádio fornecem pistas para a causa desta fratura. Os astrônomos descobriram agora uma fonte de raios X e de rádio no local da fratura, utilizando os dados do Chandra, do MeerKAT e do VLA (Very Large Array).

O provável pulsar responsável por estes sinais de rádio e raios X está rotulado na imagem. Uma possível fonte extra de raios X localizada perto do pulsar pode vir de elétrons e pósitrons (os equivalentes antimatéria dos elétrons) que foram acelerados com altas energias.

Os cientistas pensam que o pulsar terá causado a fratura ao embater contra G359.13 a uma velocidade entre 1,6 e 3,2 milhões de quilômetros por hora. Esta colisão distorceu o campo magnético do segmento, fazendo com que o sinal de rádio também se deformasse. Com cerca de 230 anos-luz de comprimento, G359.13 é uma das estruturas mais longas e brilhantes do seu gênero na Via Láctea. Para contextualizar, existem mais de 800 estrelas a essa distância da Terra. G359.13 está localizada a cerca de 26.000 anos-luz da Terra, perto do centro da Via Láctea.

O artigo científico que descreve estes resultados foi publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Harvard University

quarta-feira, 23 de abril de 2025

A gêmea mais distante da Via Láctea

Uma equipe internacional liderada pela Universidade de Genebra descobriu a candidata a galáxia espiral mais distante conhecida até à data.

© JWST (galáxia Zhúlóng)

Este sistema ultramassivo existiu apenas um bilhão de anos após o Big Bang e já apresenta uma estrutura notavelmente madura, com um bojo central antigo, um grande disco de formação estelar e braços espirais bem definidos. 

A descoberta foi feita com dados do telescópio espacial James Webb (JWST) e fornece uma perspectiva importante sobre o modo como as galáxias se podem formar e evoluir tão rapidamente no Universo primitivo. 

Espera-se que grandes galáxias espirais como a Via Láctea demorem alguns bilhões de anos para se formar. Durante os primeiros bilhões de anos da história cósmica, pensa-se que as galáxias eram pequenas, caóticas e de forma irregular. No entanto, o telescópio Webb está começando a revelar uma imagem muito diferente. As suas imagens profundas no infravermelho estão mostrando galáxias surpreendentemente massivas e bem estruturadas em épocas muito anteriores ao que se esperava previamente, evidenciando a necessidade de reavaliar como e quando as galáxias tomam forma no Universo primitivo. 

Entre estas novas descobertas encontra-se Zhúlóng, a candidata a galáxia espiral mais distante identificada até o momento, observada num desvio para o vermelho de 5,2. Apesar do período inicial de um bilhão de anos após o Big Bang, a galáxia exibe uma estrutura surpreendentemente madura: um bojo central antigo, um grande disco de formação estelar e braços espirais,- características tipicamente observadas em galáxias próximas.

A galáxia Zhúlóng, que significa "Dragão Flamejante" na mitologia chinesa, que é um poderoso dragão solar vermelho que cria o dia e a noite abrindo e fechando os olhos, simbolizando a luz e o tempo cósmico. O que faz com que Zhúlóng se destaque é o quanto se assemelha à Via Láctea em forma, tamanho e massa estelar. O seu disco estende-se por mais de 60.000 anos-luz, comparável à nossa Galáxia, e contém mais de 100 bilhões de massas solares de estrelas. Isto torna-a um dos análogos mais atraentes da Via Láctea alguma vez encontrados numa época tão precoce, levantando novas questões sobre o modo como galáxias espirais massivas e bem ordenadas se poderiam formar tão cedo após o Big Bang. 

Zhúlóng foi descoberta em imagens profundas do levantamento PANORAMIC do telescópio Webb, um programa extragaláctico de grande extensão. O PANORAMIC explora o modo único de "paralelo puro" do telescópio, uma estratégia eficiente para obter imagens de alta qualidade enquanto o instrumento principal do Webb está recolhendo dados sobre outro alvo. Isto permite ao Webb mapear grandes áreas do céu, o que é essencial para descobrir galáxias massivas, uma vez que são incrivelmente raras. 

Anteriormente, pensava-se que as estruturas em espiral demoravam bilhões de anos para desenvolver-se, e esperava-se que as galáxias massivas existissem só até muito mais tarde no Universo, porque tipicamente se formam depois de galáxias menores se terem fundido ao longo do tempo. 

As futuras observações do Webb e do ALMA (Atacama Large Millimeter Array) ajudarão a confirmar as suas propriedades e a revelar mais sobre a sua história de formação.

Um artigo foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics.

Fonte: Université de Genève

quinta-feira, 17 de abril de 2025

Pequena Nuvem de Magalhães pode estar sendo despedaçada

Uma equipe liderada por Satoya Nakano e Kengo Tachihara da Universidade de Nagoia, no Japão, revelou novas informações sobre o movimento de estrelas massivas na Pequena Nuvem de Magalhães, uma pequena galáxia vizinha da Via Láctea.

© S.Nakano (velocidades de estrelas massivas na Pequena Nuvem de Magalhães)

A imagem mostra as velocidades de candidaturas a estrelas massivas na Pequena Nuvem de Magalhães (PNM), mostradas como vetores. As cores das setas representam a direção do movimento. Em relação à Grande Nuvem de Magalhães (GNM), localizada no canto inferior esquerdo da imagem, a maioria das setas vermelhas mostram movimento em direção à GNM, enquanto a maioria das setas azuis claras mostram movimento para longe da GNM, indicando que estão sendo separadas.

As suas descobertas sugerem que a atração gravitacional da GNM, a companheira maior da PNM, pode estar "rasgando" a menor. Esta descoberta revela um novo padrão no movimento destas estrelas que poderá transformar a nossa compreensão da evolução e das interações entre galáxias.

A PNM continua sendo uma das galáxias mais próximas da Via Láctea. Esta proximidade permitiu identificar e rastrear cerca de 7.000 estrelas massivas no interior da galáxia. Estas estrelas, que têm mais de oito vezes a massa do nosso Sol, sobrevivem normalmente apenas alguns milhões de anos antes de explodirem como supernovas. A sua presença indica regiões ricas em gás hidrogênio, um componente crucial da formação de estrelas.

As estrelas da PNM estavam se movendo em direções opostas em ambos os lados da galáxia, como se estivessem sendo separadas. Algumas destas estrelas estão se aproximando da GNM, enquanto outras afastam-se dela, o que sugere a influência gravitacional da galáxia maior. Este movimento inesperado apoia a hipótese de que a PNM está sendo perturbada pela GNM, levando à sua destruição gradual. 

Outra descoberta surpreendente foi a ausência de movimento de rotação entre as estrelas massivas. Ao contrário do que acontece na Via Láctea, onde o gás interestelar gira juntamente com as estrelas, o estudo revelou um padrão distinto. Normalmente, as estrelas massivas jovens movem-se juntamente com o gás interestelar do qual nasceram, uma vez que ainda não tiveram tempo de se dissociar do seu movimento. No entanto, as estrelas massivas da PNM não seguem um padrão galáctico de rotação, o que indica que o próprio gás interestelar também não está girando.

Se a PNM não estiver de fato a girando, as estimativas anteriores da sua massa e da sua história de interação com a Via Láctea e com a GNM poderão ter de ser revistas. Isto pode mudar a nossa compreensão da história da interação de três corpos entre as duas Nuvens de Magalhães e a Via Láctea.

O estudo tem implicações mais vastas para a compreensão da dinâmica das interações entre galáxias vizinhas, particularmente no início do Universo. Os astrônomos consideram que a PNM é um modelo ideal para estudar a infância do Universo porque partilha muitas condições com as galáxias primordiais, como a baixa metalicidade e o fraco potencial gravitacional. Por conseguinte, as descobertas sobre a interação entre a PNM e a GNM podem assemelhar-se aos processos que moldaram as galáxias há bilhões de anos, fornecendo informações valiosas sobre a sua evolução ao longo do tempo cósmico. As descobertas do grupo podem criar uma nova compreensão destes processos.

Como resultado, a PNM e a GNM são as únicas galáxias em que podemos observar os pormenores do movimento estelar. Esta pesquisa é importante porque permite estudar o processo de formação estelar em ligação com o movimento das estrelas na galáxia.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Supplement Series.

Fonte: Nagoya University

sábado, 18 de janeiro de 2025

Explicando as características incomuns de uma corrente estelar

Físicos propuseram uma solução para um enigma de longa data que envolve a corrente estelar GD-1, uma das correntes mais bem estudadas no interior do halo galáctico da Via Láctea, conhecida pela sua estrutura longa e fina e pelas suas características incomuns.

© Adrian Price-Whelan (corrente estelar GD-1)

A equipe de pesquisadores, liderada por Hai-Bo Yu, da Universidade da Califórnia em Riverside, propôs que um "sub-halo" de matéria escura autointerativa em colapso do núcleo, um halo satélite menor dentro do halo galáctico, é responsável pelas características peculiares em forma de esporão e pelas lacunas observadas na corrente estelar GD-1. A pesquisa poderá ter implicações significativas para a compreensão das propriedades da matéria escura no Universo.

Um fluxo estelar é um grupo de estrelas que se movem coletivamente ao longo de uma trajetória partilhada. Uma lacuna refere-se a uma subdensidade localizada de estrelas ao longo da corrente, enquanto um esporão é uma sobredensidade de estrelas que se estende para fora do corpo principal da corrente. Uma vez que a matéria escura governa o movimento das correntes estelares, será possível usá-las para localizar matéria escura invisível numa galáxia.

O halo galáctico da Via Láctea, uma região aproximadamente esférica que rodeia a Galáxia, contém matéria escura e estende-se para além da orla visível da Galáxia. Os astrônomos descobriram que as características de esporão e a lacuna da corrente estelar GD-1 não podem ser facilmente atribuídas à influência gravitacional de aglomerados globulares conhecidos ou galáxias satélite da Via Láctea.

Estas características podem ser explicadas, no entanto, por um objeto perturbador desconhecido, como um sub-halo. Mas a densidade do objeto teria de ser significativamente mais elevada do que a prevista pelos tradicionais sub-halos de matéria escura fria.

Os sub-halos de matéria escura fria não têm tipicamente a densidade necessária para produzir as características distintivas observadas na corrente GD-1. No entanto, a pesquisa demonstra que um sub-halo de matéria escura autointerativa em colapso do núcleo pode atingir a densidade necessária. Um sub-halo tão compacto seria suficientemente denso para exercer a influência gravitacional necessária para explicar as perturbações observadas na corrente GD-1.

Pensa-se que a matéria escura, que não pode ser vista diretamente, constitui 85% da matéria do Universo. A sua natureza não é bem compreendida. A matéria escura fria, a teoria da matéria escura predominante, assume que as partículas de matéria escura não têm colisões. A matéria escura autointerativa em colapso do núcleo, uma forma teórica de matéria escura, propõe que as partículas de matéria escura interagem entre si através de uma nova força escura.

Neste estudo os pesquisadores utilizaram simulações numéricas com N-corpos para modelar o comportamento de um subhalo de matéria escura autointerativa em colapso do núcleo. A descoberta também fornece informações sobre a natureza da própria matéria escura. Este trabalho abre uma nova e promissora via para a investigação das propriedades de autointeração da matéria escura através de fluxos estelares.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: University of California

terça-feira, 17 de dezembro de 2024

Primeira estrela binária próximo do buraco negro da Via Láctea

Pesquisadores detectaram uma estrela binária próxima de Sagitário A*, o buraco negro supermassivo situado no centro da nossa Galáxia.

© ESO / VLT (localização da estrela binária D9 próxima de Sagitário A*)

Esta imagem mostra a localização da estrela binária D9 recentemente descoberta na órbita de Sagitário A*, o buraco negro supermassivo localizado no centro da Via Láctea.

É a primeira vez que um par de estrelas é encontrado nas vizinhanças de um buraco negro supermassivo. A descoberta, baseada em dados recolhidos pelo Very Large Telescope (VLT) do Observatório Europeu do Sul (ESO), ajuda-nos a compreender melhor como é que as estrelas conseguem sobreviver em ambientes de gravidade extrema e pode abrir caminho à detecção de planetas perto de Sagitário A*.

As estrelas binárias, pares de estrelas que orbitam em torno uma da outra, são muito comuns no Universo, mas até agora nenhuma tinha ainda sido encontrada perto de um buraco negro supermassivo, local onde a gravidade muito extrema pode tornar os sistemas estelares instáveis. Esta nova descoberta mostra que alguns binários podem prosperar durante um curto espaço de tempo em condições destrutivas. 

D9, nome dado à estrela binária recém-descoberta, foi detectada mesmo a tempo: estima-se que tenha apenas 2,7 milhões de anos de idade, e a forte força gravitacional do buraco negro fará com que, muito provavelmente, se funda numa única estrela dentro de apenas um milhão de anos, o que corresponde a um período de tempo muito curto para um sistema tão jovem.

Durante muitos anos, os cientistas também pensaram que o ambiente extremo que existe nas proximidades de um buraco negro supermassivo impedisse a formação de novas estrelas. No entanto, as várias estrelas jovens encontradas nas proximidades de Sagitário A* desmentiram esta suposição. A descoberta desta estrela binária jovem mostra agora que até pares de estrelas têm o potencial de se formar no seio destas condições adversas.

O binário agora descoberto foi encontrado no seio de um denso aglomerado de estrelas e outros objetos que orbita Sagitário A*, o chamado aglomerado S. Os objetos mais enigmáticos neste aglomerado são os chamados objetos G, que se comportam como estrelas mas que mais parecem nuvens de gás e poeira. Foi precisamente durante observações destes objetos misteriosos que foi encontrado um padrão surpreendente em D9. Os dados obtidos com o instrumento ERIS, montado no VLT, combinados com dados de arquivo do instrumento SINFONI, revelaram variações recorrentes na velocidade da estrela, indicando que D9 se tratava de duas estrelas em órbita uma da outra.

A equipe propõe que os misteriosos objetos G possam ser uma combinação de estrelas binárias que ainda não se fundiram com o material que sobrou de estrelas já fundidas. A natureza precisa de muitos dos objetos que orbitam Sagitário A*, bem como a forma como se podem ter formado tão perto do buraco negro supermassivo, continuam sendo um mistério.

Em breve, a atualização GRAVITY+ do Interferômetro do VLT e o instrumento METIS do Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, atualmente em construção no Chile, poderão mudar esta situação. Ambas estas infraestruturas permitirão a realização de observações ainda mais detalhadas do centro da Via Láctea, revelando a natureza de objetos conhecidos e, sem dúvida, descobrindo mais estrelas binárias e sistemas jovens.

Este trabalho foi publicado hoje na revista Nature Communications

Fonte: ESO