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sexta-feira, 3 de janeiro de 2025

Um híbrido único entre asteroide e cometa

Embora o nosso Sistema Solar tenha bilhões de anos, só recentemente  conhecemos melhor um dos seus habitantes mais dinâmicos e cativantes, conhecido como (2060) Quíron.

© W. G. Sierra (ilustração do centauro ativo Quíron)

Quíron pertence à classe de objetos chamada "Centauros". Os centauros são objetos espaciais que orbitam o Sol entre Júpiter e Netuno. São semelhantes à criatura mitológica que lhes dá o nome, na medida em que são híbridos, possuindo características tanto de asteroides como de cometas. 

Utilizando o telescópio espacial James Webb, cientistas da UCF (University of Central Florida) lideraram recentemente uma equipe que descobriu, pela primeira vez, que Quíron tem uma química de superfície diferente da dos outros centauros. A sua superfície tem gelo de dióxido de carbono e de monóxido de carbono, bem como dióxido de carbono e metano na sua coma (cabeleira), o invólucro de poeira e gás que o rodeia. 

As observações estão a criando conhecimentos fundamentais para compreender a formação do nosso Sistema Solar, uma vez que estes objetos permaneceram praticamente inalterados desde a formação do Sistema Solar.  Uma vez que Quíron possui características de asteroide e de cometa, é um bom local para estudar muitos processos que podem ajudar a compreendê-los. 

 O que é único acerca de Quíron é o fato de ser possível observar tanto a superfície, onde se encontra a maior parte dos gelos, como a coma, onde estão os gases que têm origem na superfície ou logo abaixo dela. Os objetos transnetunianos não têm este tipo de atividade porque estão muito longe e são muito frios. Os asteroides não têm este tipo de atividade porque não têm gelo. Os cometas, por outro lado, mostram atividade como os centauros, mas são normalmente observados mais perto do Sol e as suas comas são tão espessas que complicam a interpretação das observações dos gelos à superfície. 

Descobrir quais os gases que fazem parte da coma e as suas diferentes relações com os gelos à superfície ajuda-nos a conhecer as propriedades físicas e químicas, tais como a espessura e a porosidade da camada de gelo, a sua composição e a forma como a irradiação a afeta. Os astrônomos analisaram o gás metano da coma e determinaram que o fluxo detectado era consistente com a sua origem numa área de superfície que estava exposta ao maior aquecimento do Sol. 

Quíron, descoberto pela primeira vez em 1977, está muito melhor caracterizado do que a maioria dos centauros. Ele é originário da região dos objetos transnetunianos e tem viajado em torno do Sistema Solar desde a sua formação. A informação recentemente analisada ajuda os cientistas a compreender melhor o processo termofísico que está decorrendo em Quíron e que produz gás metano. Tem períodos em que se comporta como um cometa, tem anéis de material ao seu redor e potencialmente um campo de detritos de pequenas poeiras ou material rochoso orbitando à sua volta. Assim, surgem muitas questões acerca das propriedades de Quíron que permitem estes comportamentos únicos. O estudo também destacou a presença de subprodutos irradiados de metano, monóxido de carbono e dióxido de carbono, que exigirão mais análise. 

As órbitas de Quíron e de muitos outros objetos não planetários de grandes dimensões sofrem ocasionalmente encontros próximos com um dos planetas gigantes, onde a atração gravitacional do planeta altera a órbita do objeto menor, levando-o por todo o Sistema Solar e expondo-o a muitos ambientes diferentes. Sabe-se que foi ejetado da população de objetos transnetunianos e só agora está a transitar pela região dos planetas gigantes, onde não permanecerá por muito tempo. Após cerca de 1 milhão de anos, centauros como Quíron são tipicamente ejetados da região dos planetas gigantes, onde podem terminar as suas vidas como cometas da família de Júpiter ou podem regressar à região dos objetos transnetunianos.

Nota-se a multiplicidade de gelos de Quíron com diferentes volatilidades e os seus processos de formação. Alguns destes gelos, como o metano, o dióxido de carbono e a água, podem ser componentes primordiais de Quíron, herdados da nebulosa pré-solar. Outros, como o acetileno, o propano, o etano e o óxido de carbono, podem ter-se formado à superfície devido a processos de redução e oxidação.

Quíron vai aproximar-se da Terra onde propiciará melhores leituras sobre as quantidades e a natureza dos gelos, silicatos e material orgânico, possibilitando compreender melhor como as variações sazonais da insolação e os diferentes padrões de iluminação podem afetar o seu comportamento e o seu reservatório de gelo.

Os resultados foram recentemente publicados no periódico Astronomy & Astrophysics.

Fonte: University of Central Florida

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2023

Observando o sistema de anéis de Chariklo

Num feito observacional de alta precisão, os cientistas utilizaram uma nova técnica com o telescópio espacial James Webb da NASA para captar as sombras da luz estelar provocadas pelos finos anéis de Chariklo.

© STScI (centauro Chariklo e os seus anéis)

Chariklo é um corpo gelado e pequeno, mas o maior da população conhecida de Centauros, localizado a mais de 3,2 bilhões de quilômetros para além da órbita de Saturno. Chariklo tem apenas 250 quilômetros em diâmetro ou cerca de 51 vezes menor que a Terra, e os seus anéis orbitam a uma distância de cerca de 400 quilômetros do centro do corpo.

Em 2013, Felipe Braga-Ribas e colaboradores, usando telescópios terrestres, descobriram que Chariklo hospeda um sistema de dois anéis finos. Tais anéis eram esperados apenas em torno de grandes planetas como Saturno, Júpiter e Netuno. 

Os astrônomos estavam observando uma estrela quando Chariklo passou à sua frente, bloqueando a luz estelar como tinham previsto, ou seja, um fenômeno de ocultação. Surpreendentemente, a estrela "piscou" duas vezes antes de desaparecer por trás de Chariklo, e "piscou" novamente duas vezes depois da ocultação pelo Centauro. Os piscares foram provocados por dois anéis finos, os primeiros anéis alguma vez detetados em torno de um pequeno objeto do Sistema Solar. 

Esta foi a primeira tentativa de ocultação estelar com o Webb. Muito trabalho árduo foi feito para identificar e refinar as previsões para este acontecimento incomum. No dia 18 de outubro, foi utilizado o instrumento NIRCam (Near-Infrared Camera) do Webb para monitorar atentamente a estrela Gaia DR3 6873519665992128512, e vigiar as quedas de brilho indicando a ocorrência de uma ocultação. 

As sombras produzidas pelos anéis de Chariklo foram claramente detectadas, demonstrando uma nova forma de utilização do Webb para explorar objetos do Sistema Solar. A sombra estelar devido a Chariklo, propriamente dito, foi rastreada fora do alcance do Webb. Este apulso, ou seja, uma passagem próxima sem ocultação, foi exatamente como tinha sido previsto após a última manobra de trajetória do Webb. 

A curva de luz da ocultação do Webb, um gráfico do brilho de um objeto ao longo do tempo, revelou que as observações foram bem-sucedidas! Os anéis foram captados exatamente como previsto. As curvas de luz da ocultação vão fornecer nova ciência para os anéis de Chariklo. 

Os anéis são provavelmente compostos por pequenas partículas de água gelada misturadas com material escuro, detritos de um corpo gelado que colidiu com Chariklo no passado. Chariklo é demasiado pequeno e está muito distante para até o Webb fotografar diretamente os anéis separados do corpo principal, pelo que as ocultações são a única ferramenta que conseguem caracterizar os anéis por si só. 

Pouco depois da ocultação, o Webb visou novamente Chariklo, desta vez para recolher observações da luz solar refletida por Chariklo e pelos seus anéis (programa GTO 1272). O espectro do sistema mostra três bandas de absorção de água gelada no sistema de Chariklo. Os espectros por telescópios terrestres tinham sugerido este gelo, mas a qualidade requintada do espectro obtido pelo Webb revelou pela primeira vez a assinatura clara de gelo cristalino. Dado que as partículas altamente energéticas transformam o gelo de um estado cristalino para um estado amorfo, a detecção de gelo cristalino indica que o sistema de Chariklo sofre microcolisões que ou expõem o material intacto ou desencadeiam processos de cristalização. 

A maior parte da luz refletida no espectro é do próprio Chariklo: os modelos sugerem que a área dos anéis, tal como observada pelo Webb durante estas observações, corresponde provavelmente a um-quinto da área do próprio corpo. 

A observação da curva de luz da ocultação e as observações espectroscópicas abrem a porta para um novo meio de caracterizar objetos pequenos no Sistema Solar distante nos próximos anos. Com a alta sensibilidade e capacidade infravermelha do Webb, os cientistas podem utilizar o retorno científico único fornecido pelas ocultações e melhorar estas medições com espectros quase contemporâneos. Tais ferramentas vão constituir um trunfo tremendo para os cientistas que estudam corpos pequenos e distantes no nosso Sistema Solar. 

Veja mais detalhes em Primeiro sistema de anéis descoberto em torno de um asteroide.

Fonte: Space Telescope Science Institute