Mostrando postagens com marcador Anãs Brancas. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Anãs Brancas. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 8 de setembro de 2021

Anãs brancas queimando hidrogênio e envelhecendo lentamente

Podem as estrelas moribundas deter o segredo da juventude? Novas evidências do telescópio espacial Hubble sugerem que as anãs brancas podem continuar queimando hidrogênio nos estágios finais das suas vidas, fazendo com que pareçam mais jovens do que realmente são.

© Hubble (aglomerados globulares M3 e M13)

Esta descoberta pode ter consequências sobre a medida da idade dos aglomerados estelares. A visão predominante das anãs brancas como estrelas inertes e em arrefecimento foi contestada por observações do telescópio espacial Hubble. Um grupo internacional de astrônomos descobriu a primeira evidência de que as anãs brancas podem diminuir o ritmo do seu envelhecimento queimando hidrogênio na sua superfície.

Isto foi uma grande surpresa, pois está em desacordo com o que geralmente se pensa. As anãs brancas são estrelas em lento arrefecimento que liberaram as suas camadas exteriores durante os últimos estágios das suas vidas. São objetos comuns no cosmos: aproximadamente 98% de todas as estrelas do Universo acabarão por tornar-se anãs brancas, incluindo o nosso próprio Sol. 

O estudo destes estágios de arrefecimento ajuda entender não apenas as anãs brancas, mas também os seus estágios iniciais. Para investigar a física subjacente à evolução das anãs brancas, os astrônomos compararam anãs brancas em duas coleções massivas de estrelas: os aglomerados globulares M3 e M13. Estes dois aglomerados partilham muitas propriedades físicas, como idade e metalicidade (a proporção de outros elementos que não o hidrogênio e hélio). Em particular, as estrelas num estágio evolutivo conhecido como Ramo Horizontal são mais azuis em M13, indicando uma população de estrelas mais quentes. Isto torna M3 e M13, juntas, um laboratório natural perfeito no qual testar como populações diferentes de anãs brancas arrefecem.

Usando o instrumento WFC3 (Wide Field Camera 3) do Hubble, os astrônomos observaram M3 e M13 no ultravioleta próximo, permitindo-lhes comparar mais de 700 anãs brancas nos dois aglomerados. Eles descobriram que o aglomerado M3 contém anãs brancas padrão que são simplesmente núcleos estelares em arrefecimento. O aglomerado M13, por outro lado, contém duas populações de anãs brancas: anãs brancas padrão e aquelas que conseguiram manter um invólucro exterior de hidrogênio, permitindo-lhes realizar fusão nuclear por mais tempo e, portanto, arrefecer mais lentamente. 

Comparando os seus resultados com simulações da evolução estelar em M13, os pesquisadores conseguiram mostrar que cerca de 70% das anãs brancas em M13 estão queimando hidrogênio nas suas superfícies, diminuindo o ritmo a que arrefecem.

Esta descoberta pode ter consequências sobre como os astrônomos medem as idades das estrelas na Via Láctea. A evolução das anãs brancas foi modelada anteriormente como um processo de arrefecimento previsível. Esta relação relativamente direta entre idade e temperatura possibilitou usar o ritmo de arrefecimento das anãs brancas como um relógio natural para determinar as idades dos aglomerados estelares, em particular dos globulares e dos abertos. 

No entanto, as anãs brancas que queimam hidrogênio podem fazer com que estas estimativas de idade sejam imprecisas até um bilhão de anos. Esta descoberta desafia a definição das anãs brancas à medida que seja considerada uma nova perspetiva sobre o modo como as anãs brancas envelhecem. Os pesquisadores estão agora analisando outros aglomerados semelhantes a M13 para restringir ainda mais as condições que levam as estrelas a manter o fino invólucro de hidrogênio que lhes permite envelhecer lentamente.

Um artigo foi publicado na revista Nature Astronomy.

Fonte: ESA

quarta-feira, 18 de agosto de 2021

Tamanho dos buracos negros revelado pelos seus padrões de alimentação

Pesquisadores relatam que os padrões de alimentação dos buracos negros fornecem informações sobre o seu tamanho.

© M. Garlick (animação de um disco de acreção em torno de buraco negro)

Um novo estudo revelou que a oscilação no brilho, observada em buracos negros supermassivos que se alimentam ativamente, está relacionada com a sua massa. 

Os buracos negros supermassivos são milhões a bilhões de vezes mais massivos do que o Sol e geralmente residem no centro de galáxias massivas. Quando estão dormentes, isto é, quando não estão se abastecendo de gás e estrelas ao seu redor, esta região emite muito pouca luz; a única maneira que é possível detectá-los é por meio das suas influências gravitacionais nas estrelas e no gás na sua vizinhança. No entanto, no início do Universo, quando os buracos negros supermassivos cresciam rapidamente, alimentavam-se ativamente de materiais a ritmos intensos e emitiam uma enorme quantidade de radiação, às vezes ofuscando toda a galáxia onde residiam. 

O novo estudo descobriu uma relação definitiva entre a massa dos buracos negros supermassivos que se alimentam ativamente e a escala de tempo característica no padrão oscilante de luz. A luz observada de um buraco negro supermassivo em acreção não é constante. Devido a processos físicos que ainda não são compreendidos, exibe uma oscilação ubíqua em escalas de tempo que variam de horas a décadas.

Muitos estudos exploraram possíveis relações entre a cintilação observada e a massa dos buracos negros supermassivos, mas os resultados foram inconclusivos e às vezes controversos. A equipe compilou um grande conjunto de dados de buracos negros supermassivos em alimentação ativa para estudar o padrão de variabilidade de cintilação. Eles identificaram uma escala de tempo característica, ao longo do qual o padrão muda, que está correlacionado intimamente com a massa do buraco negro supermassivo. 

Os cientistas então compararam os resultados com anãs brancas em acreção, os remanescentes de estrelas como o nosso Sol, e descobriram que a mesma relação escala de tempo-massa se mantém, embora as anãs brancas sejam milhões a bilhões de vezes menos massivas do que os buracos negros supermassivos. 

As oscilações de luz são flutuações aleatórias no processo de alimentação de um buraco negro. Os astrônomos podem quantificar este padrão de oscilação medindo o poder da variabilidade em função das escalas de tempo. Para buracos negros supermassivos em acreção, o padrão de variabilidade muda de escalas de tempo curtas para escalas de tempo longas. Esta transição do padrão de variabilidade acontece numa escala de tempo característica que é mais longa para buracos negros mais massivos.

Estes resultados sugerem que os processos que conduzem a cintilação durante a acreção são universais, seja o objeto central um buraco negro supermassivo ou uma anã branca muito mais leve. 

Os buracos negros têm uma ampla gama de tamanhos e massas. Entre a população de buracos negros de massa estelar, com menos de várias dezenas de vezes a massa do Sol, e os buracos negros supermassivos, existe uma população de buracos negros de massa intermediária com cerca de 100 e 100.000 vezes a massa do Sol. Pensa-se que os buracos negros de massa intermediária se formem em grande número e ao longo da história do Universo, e que possam fornecer as sementes necessárias para se transformarem mais tarde em buracos negros supermassivos. No entanto, observacionalmente, esta população de buracos negros de massa intermediária é surpreendentemente elusiva. Existe apenas um buraco negro de massa intermediária, com mais ou menos 150 vezes a massa do Sol. Mas este buraco negro de massa intermediária foi descoberto por acaso graças à detecção de ondas gravitacionais da fusão de dois buracos negros menos massivos. 

Agora que há uma correlação entre o padrão de oscilação e a massa do objeto central em acreção, é possível usá-la para prever como pode ser o sinal de oscilação de um buraco negro de massa intermediária. 

Os astrônomos de todo o mundo estão à espera do início oficial de uma nova era de levantamentos gigantescos com o objetivo de monitorar o céu dinâmico e variável. O LSST (Legacy Survey of Space and Time) no Observatório Vera C. Rubbin, no Chile, fará um levantamento de todo o céu ao longo de uma década e irá recolher dados da oscilação da luz para bilhões de objetos, começando no final de 2023.

O novo estudo foi publicado na revista Science.

Fonte: University of Illinois

segunda-feira, 19 de julho de 2021

Estrela em forma de lágrima aponta para supernova futura

Os astrônomos fizeram uma rara observação de duas estrelas que espiralam para a sua destruição, avistando sinais reveladores de uma estrela em forma de lágrima.

© U. de Warwick/Mark Garlick (ilustração do sistema HD265435)

A forma trágica é provocada por uma massiva anã branca próxima, que distorce a estrela com a sua intensa gravidade, que também será o catalisador para uma eventual supernova que consumirá ambas.

Descoberto por uma equipe internacional de astrônomos e astrofísicos liderados pela Universidade de Warwick, é um dos poucos sistemas estelares descobertos que um dia verá uma anã branca reacender o seu núcleo. Uma nova pesquisa confirma que as duas estrelas estão nos estágios iniciais de uma espiral que provavelmente terminará numa supernova do Tipo Ia, um tipo que ajuda na determinação do ritmo a que o Universo está se expandindo.

O sistema HD265435 está localizado a cerca de 1.500 anos-luz de distância e consiste de uma sub-anã quente e de uma anã branca que se orbita uma à outra a um ritmo de mais ou menos 100 minutos. As anãs brancas são estrelas "mortas" que queimaram todo o seu combustível e que entraram em colapso, tornando-as pequenas mas extremamente densas. Uma supernova do Tipo Ia geralmente ocorre quando o núcleo de uma anã branca reacende-se, levando a uma explosão termonuclear. 

Existem dois cenários em que isto pode acontecer. No primeiro, a anã branca ganha massa suficiente para atingir 1,4 vezes a massa do nosso Sol, conhecido como limite de Chandrasekhar. HD265435 encaixa-se no segundo cenário, no qual a massa total de um sistema estelar constituído por várias estrelas está próximo ou acima deste limite. Sabemos apenas de um punhado de outros sistemas estelares que vão atingir este limite e resultar numa supernova do Tipo Ia. 

Uma maneira de ocorrer é se a anã branca acumular massa suficiente da sub-anã quente, de modo que à medida que as duas se orbitam uma à outra e se aproximam, a matéria começará a escapar da sub-anã quente e a cair sobre a anã branca. Outra forma é que, por estarem perdendo energia para as emissões de ondas gravitacionais, aproximam-se até se fundirem. Assim que a anã branca ganhar massa suficiente com qualquer um dos métodos, tornar-se-á uma supernova.

Usando dados do TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA, a equipe foi capaz de observar a sub-anã quente, mas não a anã branca já que a primeira é muito mais brilhante. No entanto, este brilho varia ao longo do tempo, o que sugere que a estrela estava sendo distorcida em forma de lágrima por um objeto massivo próximo.

Usando medições de velocidade radial e de velocidade de rotação pelo Observatório Palomar e pelo Observatório W. M. Keck, e modelando o efeito do objeto massivo sobre a sub-anã quente, foi possível confirmar que a anã branca oculta é tão massiva quanto o Sol, mas apenas ligeiramente menor que o raio da Terra. Combinada com a massa da sub-anã quente, que tem pouco mais de 0,6 vezes a massa do nosso Sol, ambas as estrelas têm a massa necessária para desencadear uma supernova do Tipo Ia. Dado que as duas estrelas já estão próximas o suficiente para começarem a espiralar uma em direção à outra, inevitavelmente a anã branca tornar-se-á supernova daqui a cerca de 70 milhões de anos.

Os modelos teóricos produzidos especificamente para este estudo também preveem que a sub-anã quente vai contrair-se para se tornar numa anã branca antes de se fundir com a sua companheira. As supernovas do Tipo Ia são importantes para a cosmologia como "velas padrão". O seu brilho é constante e de um tipo específico de luz, o que significa que os astrônomos podem comparar a luminosidade que deveriam ter com o que observamos na Terra, e a partir daí calcular a que distância estão com um bom grau de precisão. Ao observar supernovas em galáxias distantes, os astrônomos combinam o quão depressa esta galáxia se move com a distância da supernova e calculam a expansão do Universo. 

Há uma discrepância entre a taxa estimada e observada de supernovas galácticas e o número de progenitoras que são vistas. É possível estimar quantas supernovas existirão na nossa Galáxia através da observação de muitas galáxias, ou através do conhecimento da evolução estelar, e este número é consistente. 

Um artigo sobre a observação foi publicado na revista Nature Astronomy.

Fonte: University of Warwick

sexta-feira, 2 de julho de 2021

Uma anã branca vivendo no limite

Os astrônomos descobriram a menor e mais massiva anã branca alguma vez vista. A cinza fumegante, que se formou quando duas anãs brancas menos massivas se fundiram, acumulou uma massa maior do que a do nosso Sol num corpo com aproximadamente o tamanho da nossa Lua.

© Giuseppe Parisi (ilustração de anã branca comparada com a Lua)

A anã branca está ilustrada acima da Lua, e tem aproximadamente 4.300 km de diâmetro, enquanto nossa Lua tem 3.475 km de diâmetro.

As anãs brancas menores são mais massivas. Isto deve-se ao fato de as anãs brancas não possuírem a queima nuclear que contraria a própria gravidade das estrelas normais, e o seu tamanho é regulado pela mecânica quântica.

A descoberta foi feita pelo ZTF (Zwicky Transient Facility), que opera no Observatório Palomar do Caltech; outros dois telescópios no Havaí, o Observatório W. M. Keck em Maunakea e o Pan-STARRS (Panoramic Survey Telescope and Rapid Response System) do Instituto de Astronomia da Universidade do Havaí, ajudaram a caracterizar a estrela moribunda, juntamente com o Telescópio Hale de 200 polegadas em Palomar, o observatório espacial Gaia da ESA e o Observatório Neil Gehrels Swift da NASA.

As anãs brancas são os remanescentes colapsados de estrelas que já tiveram cerca de oito vezes a massa do Sol ou menos. O nosso Sol, por exemplo, depois de inchar pela primeira vez numa gigante vermelha daqui a cerca de 5 bilhões de anos, acabará por desprender as suas camadas externas e encolherá até uma anã branca compacta. Cerca de 97% de todas as estrelas tornam-se anãs brancas. 

Apesar do nosso Sol estar sozinho no espaço sem uma parceira estelar, muitas estrelas orbitam em pares. As estrelas envelhecem juntas, e se ambas tiverem menos de oito massas solares, ambas irão evoluir para anãs brancas. 

A nova descoberta fornece um exemplo do que pode acontecer após esta fase. O par de anãs brancas, que espiralam uma em direção à outra, perde energia na forma de ondas gravitacionais e, por fim, fundem-se. Se as estrelas moribundas tiverem massa suficiente, explodem no que é chamado de supernova do Tipo Ia. Mas se estiverem abaixo de um determinado limite de massa, combinam-se numa nova anã branca que é mais pesada do que qualquer uma das progenitoras. Este processo de fusão aumenta o campo magnético daquela estrela e acelera a sua rotação em comparação com a das progenitoras.

A anã branca minúscula recém-descoberta, denominada ZTF J1901+1458, tomou o segundo percurso de evolução; as suas progenitoras fundiram-se e produziram uma anã branca com 1,35 vezes a massa do nosso Sol. A anã branca tem um campo magnético extremo quase um bilhão de vezes mais forte do que o do nosso Sol e gira em torno de si própria uma vez a cada sete minutos (a anã branca mais rápida conhecida, chamada EPIC 228939929, completa uma rotação a cada 5,3 minutos).

É possível que a anã branca fundida pode ser massiva o suficiente para evoluir para uma estrela moribunda rica em nêutrons, ou estrela de nêutrons, que normalmente se forma quando uma estrela muito mais massiva do que o nosso Sol explode como supernova. Isto é altamente especulativo, mas é possível que a anã branca seja massiva o suficiente para se transformar numa estrela de nêutronsÉ tão massiva e densa que, no seu núcleo, os elétrons estão sendo capturados pelos prótons nos núcleos para formar nêutrons. Dado que a pressão dos elétrons empurra contra a força da gravidade, mantendo a estrela intacta, o núcleo entra em colapso quando um número grande o suficiente de elétrons é removido. Se esta hipótese de formação de estrela de nêutrons estiver correta, pode significar que uma porção significativa de outras estrelas de neutrões é formada desta maneira. 

A proximidade do objeto recém-descoberto (cerca de 130 anos-luz de distância) e a sua tenra idade (100 milhões de anos ou menos) indicam que objetos semelhantes podem ocorrer mais frequentemente na nossa Galáxia.

Dados do Swift, que observa no ultravioleta, ajudaram a definir o tamanho e a massa da anã branca. Com um diâmetro de mais ou menos 4.300 km, ZTF J1901+1458 garante o título de a menor anã branca conhecida, retirando o título às recordistas anteriores, RE J0317-853 e WD 1832+089, cada uma com diâmetros de aproximadamente 5.000 km. 

Há tantas questões a serem respondidas ainda, como por exemplo a taxa de fusões de anãs brancas na Galáxia, e será que esta é suficiente para explicar o número de supernovas do tipo Ia? Como é que um campo magnético é gerado nestes eventos poderosos, e porque é que existe tanta diversidade na intensidade do campo magnético das anãs brancas? A descoberta de uma grande população de anãs brancas nascidas a partir de fusões vai ajudar a responder estas perguntas e a muitas mais.

O novo estudo foi publicado na revista Nature.

Fonte: W. M. Keck Observatory

sexta-feira, 11 de junho de 2021

Uma rara "hélice" magnética num sistema binário

Pesquisadores da Universidade de Notre Dame identificaram a primeira hélice magnética eclipsante num sistema estelar variável cataclísmico.

© M. Garlick (ilustração de anã branca magnética com rápida rotação)

O sistema estelar, conhecido como J0240, é apenas o segundo do seu tipo já registado. Foi identificado em 2020 como uma variável cataclísmica incomum, um sistema binário que consiste de uma estrela anã branca e uma estrela vermelha doadora de massa.

Normalmente, a estrela anã branca compacta recolhe o gás doado e cresce em massa. No entanto, em J0240 a anã branca magnética e de rápida rotação rejeita a doação de gás e impulsiona-o para fora do sistema binário e com um campo magnético forte cria um formato de uma hélice.

As anãs brancas são os remanescentes densos de estrelas de baixa massa como o nosso Sol, que irá evoluir para uma anã branca daqui a aproximadamente cinco bilhões de anos. No entanto, sem uma estrela companheira, o Sol nunca fará parte de um sistema variável cataclísmico. 

A única outra variável cataclísmica semelhante a J0240 é AE Aquarii, um sistema estelar binário conhecido desde a década de 1950 e que se pensa ser também um sistema de hélice magnética. Por outro lado, observa-se que J0240 está perto do plano orbital binário, o que significa que o gás ejetado do sistema é visto em silhueta contra a luz estelar. 

Esta é a primeira evidência direta de que uma hélice magnética ejeta o gás doado pela estrela vermelha. Este gás está bloqueando parte da luz de ambas as estrelas e podemos ver esta absorção diretamente nos nossos dados. Os pesquisadores começaram as observações no LBT (Large Binocular Telescope) no Arizona (EUA), onde foi registrada a ocorrência de proeminências e eclipses que ilustravam a rápida rotação da anã branca, e a atração do campo magnético, que expele influxos gasosos que de outra forma seriam adicionados à estrela, criando assim uma espiral de gás que se expande para longe das duas estrelas.

A equipe recolheu observações em setembro, outubro e novembro de 2020. Os dados obtidos em setembro captaram a primeira metade da órbita de J0240. Em outubro, foi captado a segunda metade. 

As proeminências são pequenas explosões que liberam gás a 1% da velocidade da luz. As erupções desaparecem quando a companheira vermelha fica no caminho durante um eclipse. A partir da duração dos eclipses, foi possível de identificar a localização das proeminências. As erupções vêm de muito perto da companheira compacta, provavelmente da pressão de gás que recebe ao aproximar-se do campo magnético que gira rapidamente. 

Uma das grandes incógnitas é o período de rotação da anã branca, que a equipe não conseguiu determinar. A energia da hélice vem da anã branca giratória, portanto, espera-se que a rotação diminua com o tempo. Quando acabar, a hélice irá parar e o sistema parecerá uma variável cataclísmica comum. É uma fase muito curta em a anã branca magnética gira tão depressa quanto é possível sem realmente se autodestruir. Uma rotação tão elevada, com um campo magnético forte, parece que não pode ser apenas coincidência.

Um artigo será publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: University of Notre Dame

segunda-feira, 15 de março de 2021

Um lampejo de vida

Localizada a cerca de 5.000 anos-luz de distância na constelação de Cygnus (O Cisne), Abell 78 é um tipo incomum de nebulosa planetária.

© Hubble/M. Guerrero/Judy Schmidt (Abell 78)

Depois de exaurir o combustível nuclear em seus núcleos, estrelas com massa em torno de 0,8 a 8 vezes a massa do nosso Sol colapsam para formar estrelas anãs brancas quentes e densas. 

À medida que este processo ocorre, a estrela moribunda se desprende de suas camadas externas de material, formando uma elaborada nuvem de gás e poeira conhecida como nebulosa planetária. 

Este fenômeno não é incomum, e as nebulosas planetárias são um foco popular para astrofotógrafos por causa de suas formas frequentemente belas e complexas. No entanto, algumas como Abell 78 são o resultado de uma estrela “renascida”.

Embora o núcleo da estrela tenha parado de queimar hidrogênio e hélio, uma reação termonuclear em sua superfície ejeta material em alta velocidade. Este material ejetado choca e varre o material da antiga nebulosa, produzindo os filamentos e a casca irregular ao redor da estrela central vista na imagem acima, que apresenta dados da Wide Field Camera 3 do Hubble e PANSTARSS.

Fonte: ESA

sábado, 19 de setembro de 2020

Primeiro planeta "sobrevivente" que orbita uma anã branca

Astrônomos, usando o TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) e o aposentado telescópio espacial Spitzer da NASA, relataram o que pode ser o primeiro planeta intacto encontrado orbitando perto de uma anã branca, o denso remanescente de uma estrela parecida com o Sol, apenas 40% maior do que a Terra.

© Goddard Space Flight Center (ilustração de exoplaneta orbitando anã branca)

O objeto do tamanho de Júpiter, de nome WD 1856 b, é cerca de sete vezes maior do que a anã branca, chamada WD 1856+534. Orbita este remanescente estelar a cada 34 horas, mais de 60 vezes mais depressa do que Mercúrio orbita o nosso Sol. 

O processo de criação da anã branca destrói os planetas próximos, e qualquer coisa que depois chegue demasiado perto é dilacerada pela imensa gravidade da estrela.

O TESS monitora grandes áreas do céu, chamadas setores, durante quase um mês de cada vez. Este longo olhar permite que o satélite encontre exoplanetas, ou mundos para lá do nosso Sistema Solar, captando as mudanças no brilho estelar provocadas pela passagem de um planeta em frente da estrela, fenômeno denominado trânsito.

O satélite avistou WD 1856 b a cerca de 80 anos-luz de distância na direção da constelação de Dragão. Orbita uma anã fria e silenciosa que tem aproximadamente 18.000 km de diâmetro, pode ter até 10 bilhões de anos e é um membro distante de um sistema estelar triplo. 

Quando uma estrela semelhante ao Sol fica sem combustível, aumenta centenas a milhares de vezes o seu tamanho original, formando uma estrela gigante vermelha mais fria. Eventualmente, ejeta as suas camadas externas de gás, perdendo até 80% da sua massa. O núcleo quente restante torna-se uma anã branca. Quaisquer objetos próximos são tipicamente engolidos e incinerados durante este processo, que neste sistema teria incluído WD 1856 b na sua órbita atual. 

Os pesquisadores estimam que o possível planeta deve ter tido origem pelo menos 50 vezes mais longe da sua posição atual. Sabe-se que depois do nascimento das anãs brancas, objetos pequenos e distantes como asteroides e cometas podem espalhar-se para dentro em direção a estas estrelas. Geralmente são separados pela forte gravidade de uma anã branca e transformam-se num disco de detritos.

A equipa sugere vários cenários que poderiam ter empurrado WD 1856 b para uma órbita ao redor da anã branca. O caso mais provável envolve vários outros corpos do tamanho de Júpiter perto da órbita original de WD 1856 b. A influência gravitacional de objetos tão grandes pode facilmente permitir a instabilidade necessária para empurrar um planeta para dentro.

Outros cenários possíveis envolvem a atração gravitacional gradual das outras duas estrelas do sistema, as anãs vermelhas G229-20 A e B, ao longo de bilhões de anos e uma passagem rasante de uma estrela rebelde perturbando o sistema.

Objetos do tamanho de Júpiter podem ocupar uma grande variedade de massas, de planetas apenas algumas vezes mais massivos do que a Terra até estrelas de baixa massa com milhares de vezes a massa da Terra. Outras são anãs marrons, que se situam na linha entre planetas e estrelas. Normalmente, os cientistas recorrem às observações de velocidade radial para medir a massa de um objeto, que pode sugerir a sua composição e natureza. Este método funciona estudando como um objeto em órbita puxa a sua estrela e altera a cor da sua luz. Mas, neste caso, a anã branca é tão velha que a sua luz se tornou demasiado fraca e com tão poucas características para detectar mudanças perceptíveis.

Quando os pesquisadores compararam os dados no infravermelho do telescópio espacial Spitzer com observações de trânsito no visível obtidas com o GTC (Gran Telescopio Canarias), Espanha, não viram nenhuma diferença discernível. Isto, em combinação com a idade da estrela e outras informações sobre o sistema, levou-os a concluir que WD 1856 b é provavelmente um planeta com não mais do que 14 vezes o tamanho de Júpiter.

Atualmente não há evidências que sugerem a existência de outros exoplanetas no sistema, mas é possível que existam planetas adicionais que ainda não foram detectados. Estes podem ter órbitas que excedem o tempo durante o qual o TESS observa um setor ou podem estar inclinados de tal maneira que não são propícios a provocar trânsitos estelares do ponto de vista da Terra. A anã branca também é tão pequena que a possibilidade de captar trânsitos de planetas mais distantes no sistema é muito baixa.

Um artigo sobre o sistema foi publicado na revista NatureOs resultados dos cálculos foram publicados na revista The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: Instituto de Astrofísica de Canarias

segunda-feira, 7 de setembro de 2020

Anã branca completa um giro a cada meio minuto!

O que você poderia fazer em menos de 30 segundos?

© ON/R. Cassaro (anã branca capturando matéria de sua companheira)

Uma equipe de cinco pesquisadores, sendo quatro deles de instituições brasileiras, revelou uma estrela de tamanho similar ao da Terra, de tipo anã branca, que precisa de apenas 29,6 segundos para completar um giro em torno de si. Enquanto a Terra completa o seu giro diário, essa estrela dá quase 3.000 giros e assim detém o recorde de rotação entre todas as anãs brancas conhecidas.

Anã branca é um dos possíveis estágios finais na evolução de uma estrela; é o destino da maioria das estrelas do Universo, como será o do nosso Sol. Uma anã branca tem massa similar à do Sol mas seu volume é equivalente ao da Terra. Portanto, um anã branca é extremamente densa: um volume equivalente ao de uma caixa de fósforo pequena teria aproximadamente 25 toneladas de matéria. Diferente do Sol, essa estrela tem uma companheira da qual captura parte de sua matéria e, juntas, formam um sistema binário chamado CTCV J2056-3014. Essas estrelas movem-se uma em torno da outra como o sistema Terra-Lua, e a distância entre elas, inclusive, é equivalente à distância entre a Terra e a Lua.

CTCV J2056-3014 está a uma distância de 850 anos-luz do Sol, o que é considerado pouco em escalas astronômicas. Assim, pode ser considerado um sistema na vizinhança do Sol. A esta distância nenhum telescópio atual consegue ver as duas estrelas desse sistema separadas, apenas o brilho combinado de ambas. 

O trabalho sobre CTCV J2056-3014 foi baseado em observações em raios X realizadas pelo telescópio espacial XMM-Newton da ESA, e na luz que é visível aos nossos olhos pelo telescópio Zeiss do Observatório do Pico dos Dias (OPD), no estado de Minas Gerais, gerenciado pelo Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA). 

A descoberta da equipe veio de observações que revelaram que a variação do brilho do sistema binário, tanto em raios X quanto na luz visível, se repete a cada 29,6 segundos. Tal variação está associada ao tempo de giro da anã branca. Antes desta descoberta, o período de rotação mais curto conhecido em uma anã branca era de 33 segundos. Existem poucas deste tipo conhecidas com período de rotação inferior a 100 segundos, sendo que o mais comum é a rotação durar de vários minutos a várias horas quando em sistemas binários, e alguns dias em estrelas "isoladas". 

“Investigar fenômenos astrofísicos extremos nos permite fazer avançar a Física sob condições que são difíceis ou mesmo impossíveis de serem produzidas em nossos laboratórios. O estudo de CTCV J2056-3014 tem implicações científicas importantes sobre interação entre matéria e campos magnéticos, que é de grande interesse em Física, e que nesse sistema se dá com matéria caindo sobre uma estrela magnetizada e em rotação elevada. O que foi observado em CTCV J2056-3014 abre horizontes para um melhor entendimento sobre estrutura e evolução estelar, e também sobre a origem de campos magnéticos em estrelas evoluídas,” ressalta o pesquisador Raimundo Lopes de Oliveira Filho, professor da Universidade Federal de Sergipe e do Observatório Nacional, que liderou o estudo. 

O sistema é do tipo polar intermediária, uma subclasse das variáveis cataclísmicas. O estudo mostrou também que CTCV J2056-3014 é um sistema modesto em sua emissão de luz em raios X quando comparado a sistemas de sua classe, e como tal passava sem ser percebido mesmo sendo nosso vizinho: vários desses sistemas devem estar igualmente ocultos. 

Este sistema é membro de um grupo ainda muito pequeno, exatamente por ser formado por sistemas pouco luminosos em raios X. Porém, descobertas recentes apontam que o grupo deve ser muito numeroso e estar entre os principais contribuintes de luz em raios X em nossa galáxia. “Decidimos estudar a CTCV2056 em raios X devido a indícios que obtivemos ao observá-la em luz visível em 2012. Descobrir que sua anã branca tem uma rotação tão rápida foi uma grande surpresa. Com este trabalho, temos uma estratégia para explorar o grupo ao qual pertence CTCV J2056-3014,” afirma Alexandre Soares de Oliveira, da Universidade do Vale do Paraíba, co-autor do trabalho. 

Os autores do estudo apontam uma forte evidência de que a anã branca de CTCV J2056-3014 tem um campo magnético mais fraco do que usualmente é visto em anãs brancas de sistemas do tipo polar intermediária, o que abre janelas para estudos de condições incomuns.

O campo magnético na superfície da anã branca de CTCV J2056-3014 é aproximadamente 1 milhão de vezes mais intenso que o da Terra e isso faz com que a matéria da estrela companheira que cai sobre a anã branca siga estruturas que podemos imaginar como tubos magnéticos. "A região onde essa estrutura magnética encontra a anã branca é onde ocorre a emissão que vemos em raios X e parte da que vemos na luz visível. Essa emissão varia periodicamente devido à rotação da anã branca e pode, assim, ser usada para medir o tempo de rotação," diz Claudia Vilega Rodrigues, pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). A captura de matéria pela anã branca de CTCV J2056-3014 a fez girar mais e mais, até que ela atingiu uma situação de quase equilíbrio. 

“O estudo também é um belo exemplo de sinergia entre instrumentos de grande porte, como o satélite XMM-Newton, e telescópios pequenos, como o Zeiss do Observatório do Pico dos Dias, mostrando que equipamentos modestos tem o seu lugar na pesquisa mesmo na época de telescópios gigantes,” diz Albert Bruch, do Laboratório Nacional de Astrofísica.

O estudo foi publicado na revista The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: Observatório Nacional

quarta-feira, 29 de julho de 2020

Emissão ultravioleta pode explicar como as anãs brancas explodem

Apenas pela segunda vez, os astrofísicos avistaram uma emissão espetacular de luz ultravioleta acompanhando a explosão de uma anã branca.


© ZTF (SN2019yvq)

Composição de SN2019yvq (ponto azul perto no centro da imagem) na galáxia hospedeira NGC 4441 (galáxia amarelada no centro da imagem).

Um tipo extremamente raro de supernova, SN2019yvq, deverá fornecer informações sobre vários mistérios de longa data, incluindo o que faz as anãs brancas explodirem, como a energia escura acelera o cosmos e como o Universo produz metais pesados, como o ferro.

Usando o ZTF (Zwicky Transient Facility) localizado no Observatório Palomar, perto de San Diego, EUA, pesquisadores descobriram pela primeira vez a supernova peculiar em dezembro de 2019, apenas um dia depois de explodir. A supernova SN2019yvq, surgiu numa galáxia relativamente próxima, localizada 140 milhões de anos-luz da Terra, muito perto da cauda da constelação de Dragão.

Em poucas horas, os astrofísicos usaram o Observatório Swift [Neil Gehrels] da NASA para estudar o fenômeno em comprimentos de onda ultravioleta e raios X. Imediatamente classificaram SN2019yvq como uma supernova do tipo Ia, um evento razoavelmente frequente quando uma anã branca explode.

O primeiro caso de emissão ultravioleta, o evento iPTF14atg, foi descoberto pelo iPTF (intermediate Palomar Transient Factory), o antecessor do ZTF. SN2019yvq exibe uma velocidade muito maior do que iPTF14atg, demonstrando que este fenômeno é realmente mais comum do que se pensava originalmente.

O flash raro, que durou alguns dias, indica que algo dentro ou perto da anã branca estava incrivelmente quente. Dado que as anãs brancas se tornam cada vez mais frias à medida que envelhecem, o influxo de calor é intrigante. 

Os cenários possíveis que podem fazer com que uma anã branca gere flash UV são: 
  1. Uma anã branca consome a sua estrela companheira e torna-se tão grande e instável que explode. Os materiais da anã branca e da estrela companheira colidem, provocando um flash de emissão ultravioleta; 
  2. O material radioativo extremamente quente no núcleo da anã branca mistura-se com as suas camadas mais externas, fazendo com que a concha exterior atinja temperaturas mais altas do que o normal; 
  3. Uma camada externa de hélio inflama carbono dentro da anã branca, desencadeando uma explosão dupla extremamente quente e um flash UV; 
  4. Duas anãs brancas fundem-se, provocando uma explosão com material ejetado em colisão que emite radiação ultravioleta.
Como a maior parte do ferro no Universo é produzido por supernovas do tipo Ia, uma melhor compreensão deste fenômeno pode dizer-nos mais sobre o nosso próprio planeta. O ferro das estrelas que explodiram, por exemplo, formou o núcleo de todos os planetas rochosos, incluindo a Terra.

As anãs brancas também já desempenham um papel enorme no entendimento atual da energia escura pelos físicos. Os cientistas preveem que as anãs brancas têm todas o mesmo brilho quando explodem. De modo que as supernovas do tipo Ia são consideradas "velas padrão", permitindo o cálculo exatamente a que distância estão estas explosões da Terra. A utilização de supernovas para medir distâncias levou à descoberta da expansão acelerada do Universo e da energia escura, uma descoberta reconhecida com o Prêmio Nobel da Física em 2011.

A maioria das galáxias estão na verdade a afastar-se de nós. Se existirem explosões de supernovas do tipo Ia em galáxias muito distantes, as suas distâncias e velocidades podem ser inferidas a partir de quão brilhantes essas supernovas parecem ser, vistas a partir da Terra. Foi descoberto que o Universo está se expandindo a um ritmo cada vez mais rápido, e a explicação mais popular é que dois-terços do Universo são constituídos pela misteriosa energia escura.

Ao melhor entender as explosões das anãs brancas, será possível entender a energia escura e a rapidez com que acelera o Universo. 

Um artigo científico foi publicado no periódico The Astrophysical Journal

Fonte: Zwicky Transient Facility

sexta-feira, 17 de julho de 2020

Explosão termonuclear lança sobrevivente de supernova

De acordo com um novo estudo pela Universidade de Warwick, uma estrela anã branca expulsou-se ela própria da sua órbita com outra estrela numa "supernova parcial" e está agora viajando pela nossa Galáxia.


© U. Warwick/Mark Garlick (material expelido pela supernova)

Isto abre a possibilidade de muitos outros sobreviventes de supernovas viajarem sem serem descobertos pela Via Láctea, bem como outros tipos de supernovas que ocorrem em outras galáxias que nunca foram vistas antes.

A pesquisa analisou uma anã branca que se descobriu anteriormente ter uma composição atmosférica incomum. Revela que a estrela pertencia muito provavelmente a um binário e que sobreviveu à sua explosão de supernova, que a enviou e à sua companheira a "voar" pela Via Láctea em direções opostas.

As anãs brancas são os núcleos remanescentes de gigantes vermelhas, depois destas estrelas morrerem e liberarem as suas camadas externas, arrefecendo ao longo de bilhões de anos. A maioria das anãs brancas têm atmosferas compostas quase inteiramente de hidrogênio ou hélio, com evidências ocasionais de carbono ou oxigênio extraídos do núcleo da estrela.

Esta estrela, designada SDSS J1240+6710 e descoberta em 2015, parecia não conter hidrogênio nem hélio, composta ao invés por uma mistura incomum de oxigênio, nêonio, magnésio e silício. Usando o telescópio espacial Hubble, os cientistas também identificaram carbono, sódio e alumínio na atmosfera da estrela, todos produzidos nas primeiras reações termonucleares de uma supernova.

No entanto, há uma clara ausência do que é conhecido como o "grupo de ferro" dos elementos ferro, níquel, cromo e manganês. Estes elementos mais pesados são normalmente gerados por fusão nuclear a partir dos mais leves e são característicos das supernovas termonucleares. A ausência de elementos do grupo de ferro na estrela SDSS J1240+6710 sugere que a estrela passou apenas por uma supernova parcial antes que a queima nuclear terminasse.

Os cientistas foram capazes de medir a velocidade da anã branca e descobriram que viaja a 900.000 km/h. Também possui uma massa particularmente baixa para uma anã branca - apenas 40% da massa do nosso Sol , o que seria consistente com a perda de massa de uma supernova parcial.

O professor Boris Gaensicke, autor principal do artigo científico e do Departamento de Física da Universidade de Warwick, Reino Unido, disse: "Esta estrela é única porque possui todas as principais características de uma anã branca, mas tem uma velocidade muito alta e abundâncias incomuns que não fazem sentido quando combinadas com a sua baixa massa.

"Tem uma composição química que é a impressão digital da queima nuclear, uma massa baixa e uma velocidade muito alta: todos estes fatos implicam que deve ter vindo de algum tipo de sistema binário íntimo e deve ter sido submetida a ignição termonuclear. Teria sido um tipo de supernova, mas um tipo que nunca vimos antes."

Os cientistas teorizam que a supernova perturbou a órbita da anã branca com a sua parceira quando ejetou muito abruptamente uma grande proporção da sua massa. Ambas as estrelas teriam sido transportadas em direções opostas, à sua velocidade orbital. Isto explicaria a alta velocidade da estrela.

As supernovas termonucleares mais bem estudadas são as do "Tipo Ia", que levaram à descoberta da energia escura, e agora são rotineiramente usadas para mapear a estrutura do Universo. Mas existem evidências crescentes de que as supernovas termonucleares podem ocorrer sob condições muito diferentes.

A SDSS J1240+6710 pode ser a sobrevivente de um tipo de supernova que ainda não foi "apanhada em flagrante". Sem o níquel radioativo que alimenta o brilho duradouro das supernovas do Tipo Ia, a explosão que lançou SDSS J1240+6710 pela Galáxia teria sido um breve flash de luz difícil de descobrir.

O professor Gaensicke acrescenta: "O estudo das supernovas termonucleares é um campo imenso e há uma grande quantidade de esforços observacionais para encontrar supernovas em outras galáxias. A dificuldade é que vemos a estrela quando explode, mas é muito difícil conhecer as propriedades da estrela antes de explodir.

"Estamos agora descobrindo que existem diferentes tipos de anãs brancas que sobrevivem às supernovas sob diferentes condições e, usando as composições, massas e velocidades que possuem, podemos descobrir a que tipo de supernova foram submetidas. O estudo das sobreviventes de supernovas na nossa Via Láctea vai ajudar a entender as miríades de supernovas que vemos nas outras galáxias."

O professor Kepler de Souza Oliveira Filho da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil, quem originalmente descobriu esta estrela, disse: "O fato de uma anã branca de baixa massa ter passado por queima de carbono é um testemunho dos efeitos da evolução da interação binária e dos seus efeitos sobre a evolução química do Universo."

O Dr. Robert Raddi, da Universidade Politécnica da Catalunha, Espanha, que realizou a análise cinemática, disse: "Mais uma vez, a sinergia entre a astrometria muito precisa do Gaia e a análise espectroscópica ajudou a restringir as propriedades impressionantes de uma anã branca única, que provavelmente se formou numa supernova termonuclear e foi ejetada a alta velocidade como consequência da explosão."

A pesquisa foi descrita no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: University of Warwick

sexta-feira, 12 de junho de 2020

A pedra angular da Teoria da Relatividade Geral de Einstein

Uma colaboração internacional de cientistas registou a confirmação mais precisa, até agora, de uma das pedras angulares da Teoria da Relatividade Geral de Einstein, "a universalidade da queda livre".


© Guillaume Voisin (ilustração do pulsar com duas anãs brancas)

A nova pesquisa mostra que a teoria é válida para objetos fortemente autogravitantes, como estrelas de nêutrons. Usando um radiotelescópio, os cientistas podem observar com muita precisão o sinal produzido pelos pulsares, um tipo de estrela de nêutrons e testar a validade da teoria da gravidade de Einstein para estes objetos extremos. Em particular, a equipe analisou os sinais de um pulsar chamado PSR J0337+1715 registados pelo grande radiotelescópio de Nançay, localizado no coração de Sologne (França).

A universalidade do princípio de queda livre afirma que dois corpos ao caírem num campo gravitacional sofrem a mesma aceleração independentemente da sua composição. Isto foi demonstrado pela primeira vez por Galileu, que teria largado objetos de diferentes massas do topo da Torre de Pisa para verificar se ambos alcançavam o chão simultaneamente.

Este princípio também está no cerne da teoria da relatividade geral de Einstein. No entanto, algumas dicas, como a inconsistência entre a mecânica quântica e a relatividade geral, ou o enigma do domínio da matéria escura e da energia escura na composição do Universo, levaram muitos físicos a pensar que a relatividade geral pode não ser, afinal, a teoria final da gravidade.

As observações do Pulsar J0337+1715, que é uma estrela de nêutrons com um núcleo estelar que tem 1,44 vezes a massa do Sol e que colapsou numa esfera com apenas 25 km de diâmetro, mostra que orbita duas anãs brancas que são muito mais fracas em termos de campo gravitacional. As descobertas demonstram que a universalidade do princípio da queda livre está correta.

O Dr. Guillaume Voisin, da Universidade de Manchester, que liderou o estudo, disse: "O pulsar emite um feixe de ondas de rádio que varre o espaço. A cada volta, cria um flash de rádio que é registado com alta precisão pelo radiotelescópio de Nançay. À medida que o pulsar se move na sua órbita, o tempo de chegada da luz à Terra muda. É a medição precisa e a modelagem matemática, com uma precisão de nanossegundos, desses tempos de chegada, que permite aos cientistas inferir com precisão requintada o movimento da estrela de nêutrons.

"Acima de tudo, é a configuração única desse sistema, semelhante ao sistema Terra-Lua-Sol, com a presença de uma segunda companheira (desempenhando o papel do Sol) em direção à qual as duas outras estrelas orbitam, que permitiu executar uma versão estelar da famosa experiência de Galileu na Torre de Pisa. Dois corpos de composições diferentes caem com a mesma aceleração no campo gravitacional de um terceiro corpo."

As medições foram obtidas por uma equipe colaborativa da Universidade de Manchester, do Observatório de Paris, do CNRS Francês (Centre National de la Recherche Scientifique), do LPC2E (Laboratoire de Physique et de Chimie de l'Environnement et de l'Espace), e do Instituto Max Planck para Radioastronomia. O pulsar orbita duas anãs brancas, uma das quais orbita o pulsar em apenas 1,6 dias a uma distância cerca de 10 vezes inferior à distância Mercúrio-Sol. Esse sistema binário, um pouco como a Terra e a Lua no Sistema Solar, orbita uma terceira estrela, uma anã branca com 40% da massa do Sol, localizada pouco mais da distância que separa o sistema Terra-Lua do Sol.

No Sistema Solar, a Lunar-laser ranging experiment permitiu verificar que a Lua e a Terra são identicamente afetadas pelo campo de gravidade do Sol, conforme previsto pela universalidade da queda livre (o movimento orbital é uma forma de queda livre). No entanto, sabe-se que alguns desvios à universalidade podem ocorrer apenas para corpos fortemente autogravitantes, como estrelas de nêutrons, que são objetos cuja massa é composta significativamente da sua própria energia gravitacional graças à famosa relação E=mc² de Einstein. A nova experiência de pulsar realizada pela equipe preenche a lacuna deixada pelos testes do Sistema Solar, onde nenhum objeto é fortemente autogravitante, nem mesmo o Sol.

Demonstrou-se que o campo gravitacional extremo do pulsar não pode diferir em mais de 1,8 partes por milhão (com um nível de confiança de 95%) da previsão da relatividade geral. Esse resultado é a confirmação mais precisa de que a universalidade da queda livre é válida mesmo na presença de um objeto cuja massa é em grande parte devida ao seu próprio campo de gravidade, apoiando assim a Teoria da Relatividade Geral de Einstein.

As descobertas foram publicadas no periódico Astronomy & Astrophysics.

Fonte: Max Planck Institute for Radio Astronomy

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

O confronto de duas estrelas

Os astrônomos descobriram uma peculiar nuvem de gás que resultou do confronto entre duas estrelas. Uma das estrelas cresceu tanto que engoliu a outra que, por sua vez, espiralou em direção à sua companheira levando-a a liberar as suas camadas mais exteriores.


© ESO/ALMA (sistema estelar duplo HD101584)

As estrelas modificam-se com a idade, acabando por morrer. No caso do Sol e de outras estrelas como a nossa, esta modificação passa por uma fase em que, depois de queimar todo o hidrogênio em seu núcleo, ela se transforma em uma grande e brilhante estrela gigante vermelha. Eventualmente, a estrela moribunda perde as suas camadas externas, deixando para trás seu núcleo quente e denso ao qual chamamos anã branca.

“O sistema estelar HD101584 é especial no sentido em que o seu ‘processo de morte' terminou prematuramente de forma dramática quando uma companheira de pequena massa bastante próxima se viu engolida pela gigante vermelha,” explica Hans Olofsson da Universidade de Tecnologia Chalmers, na Suécia, que liderou um estudo recente sobre este objeto intrigante.

Graças às novas observações obtidas pelo ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array) e complementadas com dados do APEX (Atacama Pathfinder EXperiment), operado pelo ESO, Olofsson e a sua equipe sabem agora que o que aconteceu ao sistema estelar duplo HD101584 foi semelhante a uma luta estelar. Quando a estrela principal se transformou em uma gigante vermelha, cresceu tanto que acabou por engolir a sua parceira de menor massa. Como resultado, a estrela menor espiralou em direção ao núcleo da gigante, mas não colidiu com ele. Em vez disso, essa manobra desencadeou uma explosão na estrela maior, deixando as suas camadas de gás espalhadas e o seu núcleo exposto.

A equipe diz que a estrutura complexa do gás observada na nebulosa HD101584 se deve a uma estrela pequena espiralando em direção à gigante vermelha, assim como aos jatos que se formaram no processo. Tal como um golpe mortal desferido às camadas de gás já vencidas, estes jatos foram lançados através do material ejetado anteriormente, dando origem aos anéis de gás e às brilhantes bolhas azuladas e avermelhadas que vemos na nebulosa.

Esta colisão possibilita uma compreensão melhor da evolução final de estrelas como o Sol. “Atualmente, conseguimos descrever os processos de morte comuns a muitas estrelas do tipo do Sol, mas não conseguimos explicar o seu porquê ou exatamente como é que acontecem. A HD101584 nos dá pistas importantes para resolver este quebra-cabeça, já que atualmente se encontra em uma curta fase de transição entre estágios evolucionários que conhecemos melhor. Com imagens detalhadas do meio que envolve a HD101584, podemos fazer a ligação entre a gigante vermelha que existia anteriormente e o remanescente estelar que em breve se tornará,” explica Sofia Ramstedt, da Universidade de Uppsala, na Suécia.

Esta imagem extraordinária do meio circunstelar da HD101584 não teria sido possível sem a excelente sensibilidade e resolução angular do ALMA.

Enquanto os telescópios atuais permitem aos astrônomos estudar o gás em torno do binário, as duas estrelas no centro da complexa nebulosa encontram-se muito próximas uma da outra e muito distantes de nós para poderem ser separadas. O Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, atualmente em construção no deserto chileno do Atacama, irá fornecer informação sobre o núcleo do objeto, permitindo que os astrônomos examinem mais de perto o par em colisão.

Esta pesquisa foi publicada na revista Astronomy & Astrophysics.

Fonte: ESO

Estrela binária V Sagittae vai explodir no final do século

Atualmente, a tênue estrela V Sagittae (V Sge) situada na constelação da Flecha, é pouco visível, mesmo através de telescópios de tamanho médio.


© NASA/JPL-Caltech (ilustração do sistema V Sge)

No entanto, por volta do ano 2083, esta estrela explodirá, tornando-se tão brilhante quanto Sirius, a estrela mais brilhante do céu noturno. Durante este período de erupção, V Sge será a estrela mais luminosa da Via Láctea.

Ao longo das próximas décadas, a estrela aumentará de brilho. Por volta do ano 2083, o seu ritmo de acreção subirá catastroficamente, derramando massa a taxas incrivelmente altas sobre a anã branca. Nos últimos dias desta espiral da morte, toda a massa da estrela companheira cairá sobre a anã branca, criando um vento supermassivo da estrela em fusão.

O V Sge é um sistema estelar pertencente a uma classe grande e diversificada chamada Variáveis Cataclísmicas (CVs, sigla inglesa para "Cataclysmic Variables"), que consiste de uma estrela comum numa órbita binária com uma anã branca, onde a massa da estrela normal está colapsando lentamente. As CVs incluem vários tipos de estrelas binárias, geralmente com um comportamento espetacular. A V Sge é a mais extrema de todas as CVs, aproximadamente 100 vezes mais luminosa do que todas as outras CVs conhecidas, e está absorvendo um vento estelar massivo, igual aos ventos das estrelas mais massivas antes da sua morte. Estas duas propriedades extremas são provocadas devido a estrela normal ser 3,9 vezes mais massiva do que a anã branca.

Em todas as outras CVs conhecidas, a anã branca é mais massiva do que a estrela normal em órbita, de modo que V Sge é totalmente única.

Esta constatação veio de medições rotineiras do brilho de V Sge em fotos antigas do céu agora arquivadas no Observatório da Universidade de Harvard, fornecendo uma história detalhada que remonta ao ano de 1890.

Surpreendentemente, V Sge tem vindo a aumentar sistematicamente de brilho por um fator de 10x, 2,5 magnitudes, desde o início da década de 1890 até esta última década. Este comportamento sem precedentes foi confirmado com dados de arquivo recolhidos a partir da base de dados da AAVSO (American Association of Variable Star Observers), dados esses que mostram que o brilho de V Sge subiu desde 1907 até aos últimos anos.

O pico do brilho deste evento explosivo durará mais de um mês, em que as duas estrelas se fundem numa só. O resultado final da fusão produzirá uma única estrela com um núcleo degenerado de anã branca, uma camada que queima hidrogênio, rodeada por um vasto invólucro de gás, principalmente hidrogênio.

Os cálculos indicam que o evento de fusão irá ocorrer por volta do ano 2083. "A incerteza nesta data é ±16 anos, decorrente principalmente da falta de uma medição perfeita da escala de tempo duplicada devido às grandes oscilações intrínsecas de brilho no registo histórico. Portanto, a fusão terá lugar aproximadamente entre 2067 e 2099, provavelmente perto do ponto médio deste intervalo.

A V Sge aparecerá incrivelmente brilhante no céu noturno. Será substancialmente mais brilhante do que a nova mais brilhante de todos os tempos (magnitude -0,5), há pouco mais de um século; e a última vez que uma estrela apareceu mais brilhante foi a Supernova de Kepler em 1604.

Fonte: Astronomy