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sexta-feira, 7 de julho de 2023

Um planeta que desafia a morte

Quando o nosso Sol chegar ao fim da sua vida, se expandirá até 100 vezes o seu tamanho atual, envolvendo a Terra.

© A. Makarenko (ilustração do sistema Baekdu)

Este é possível cenário em que Baedku que era originalmente um sistema binário composto por uma estrela gigante vermelha em órbita de uma estrela anã branca. A proximidade do par estelar permitiu a transferência de material entre as duas estrelas, levando à sua eventual fusão. O planeta Halla está em primeiro plano, orbitando perigosamente perto, mas suficientemente longe para sobreviver ao impacto da colisão explosiva do par estelar.

Muitos planetas em outros sistemas solares enfrentam um destino semelhante à medida que as suas estrelas hospedeiras envelhecem. Mas nem toda a esperança está perdida: astrônomos do IfA (Institute for Astronomy) da Universidade do Havaí fizeram a notável descoberta da sobrevivência de um planeta após o que deveria ter sido a morte certa devido a sua estrela. 

O planeta semelhante a Júpiter, 8 UMi b, oficialmente chamado Halla, orbita a estrela gigante vermelha Baekdu (8 UMi) a apenas metade da distância que separa a Terra do Sol. Utilizando dois observatórios na ilha do Havaí, o Observatório W. M. Keck e o CFHT (Canada-France-Hawaii Telescope), uma equipe de astrônomos descobriu que Halla persiste apesar da evolução normalmente perigosa de Baekdu. 

Utilizando observações das oscilações estelares de Baekdu feitas pelo TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA, descobriram que a estrela está queimando hélio no seu núcleo, o que indica que já se tinha expandido enormemente até se tornar uma estrela gigante vermelha. A estrela teria inchado até 1,5 vezes a distância orbital do planeta, engolindo-o no processo, antes de encolher para o seu tamanho atual a apenas um-décimo desta distância.

O planeta Halla foi descoberto em 2015 por astrônomos da Coreia do Sul utilizando o método da velocidade radial, que mede o movimento periódico de uma estrela devido à força gravitacional do planeta que a orbita. Após a descoberta de que a estrela deve ter sido, em tempos, maior do que a órbita do planeta, a equipe do IfA realizou observações adicionais entre 2021 e 2022 usando o HIRES (High Resolution Echelle Spectrometer) do Observatório Keck e o instrumento ESPaDOnS (Echelle SpectroPolarimetric Device for the Observation of Stars) do CFHT. 

Estes novos dados confirmaram que a órbita quase circular de 93 dias do planeta permaneceu estável durante mais de uma década e que o movimento para trás e para a frente deve ser devido a um planeta. A uma distância de 0,46 UA (unidades astronômicas, igual a distância Terra-Sol) da sua estrela, o planeta Halla assemelha-se a planetas  "quentes", parecidos a Júpiter, que se pensa terem começado em órbitas maiores antes de migrarem para o interior, perto das suas estrelas. No entanto, face a uma estrela hospedeira em rápida evolução, tal origem torna-se uma via de sobrevivência extremamente improvável para o planeta Halla. 

Outra teoria para a sobrevivência do planeta é o fato de nunca ter enfrentado o perigo de ser engolido. Tal como o famoso planeta Tatooine da saga "Guerra das Estrelas", que orbita dois sóis, a estrela hospedeira Baekdu pode ter sido originalmente duas estrelas, segundo a equipe. A fusão destas duas estrelas pode ter impedido qualquer uma delas de se expandir o suficiente para engolir o planeta. Uma terceira possibilidade é que Halla seja um relativo recém-nascido, que a colisão violenta entre as duas estrelas tenha produzido uma nuvem de gás a partir da qual o planeta se formou. O planeta Halla pode ser um planeta de "segunda geração" nascido recentemente.

Um artigo foi publicado na revista Nature

Fonte: W. M. Keck Observatory

sexta-feira, 30 de junho de 2023

Descoberta surpreendente de composto químico em protoplaneta

Cientistas, recorrendo ao ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array) para estudar o disco protoplanetário em torno de uma estrela jovem, descobriram a evidência química mais convincente até à data da formação de protoplanetas.

© M. Weiss (ilustração de exoplaneta interagindo com gás molecular)

A descoberta irá fornecer aos astrônomos um método alternativo para detectar e caracterizar protoplanetas quando não for possível fazer observações diretas ou obter imagens.

A HD 169142 é uma estrela jovem localizada na direção da constelação de Sagitário, que é de grande interesse devido à presença do seu grande disco circunstelar, rico em poeira e gás, que é visto quase de face. 

Na última década, foram identificados vários candidatos a protoplanetas e, no início deste ano, cientistas da Universidade de Liège e da Universidade Monash confirmaram que um destes candidatos, o HD 169142 b, é um protoplaneta gigante semelhante a Júpiter. As descobertas reveladas numa nova análise de dados de arquivo do ALMA podem agora tornar mais fácil a detecção, confirmação e, finalmente, a caracterização de protoplanetas que se formam em torno de estrelas jovens. 

A equipe focou-se no sistema HD 169142 porque pensavam que a presença do protoplaneta gigante HD 169142 b estaria provavelmente acompanhada por assinaturas químicas detectáveis, e com razão. Foi detectado monóxido de carbono (tanto ¹²CO como o seu isotopólogo ¹³CO) e monóxido de enxofre (SO), que já tinham sido detectados anteriormente e que se pensava estarem associados a protoplanetas em outros discos. Mas, pela primeira vez, também foi detectado monossulfureto de silício (SiS). 

Isto foi uma surpresa porque, para que a emissão de SiS seja detectável pelo ALMA, os silicatos têm de ser liberados de grãos de poeira próximos em ondas de choque massivas causadas por gás viajando com altas velocidades, um comportamento tipicamente resultante de fluxos que são conduzidos por protoplanetas gigantes.

O monossulfureto de silício era uma molécula que nunca tinha sido vista antes num disco protoplanetário, muito menos na vizinhança de um protoplaneta gigante. A detecção da emissão de SiS significa que este protoplaneta deve estar produzindo poderosas ondas de choque no gás circundante.

Com esta nova abordagem química para a detecção de protoplanetas jovens, os cientistas podem estar abrindo uma nova janela para o Universo e aprofundando a sua compreensão dos exoplanetas. Os protoplanetas, especialmente aqueles que ainda estão embebidos nos seus discos circunstelares natais, como é o caso do sistema HD 169142, fornecem uma ligação direta à população de exoplanetas conhecidos.

Há uma enorme diversidade de exoplanetas e, ao usar assinaturas químicas observadas com o ALMA, isto fornece uma nova forma de compreender como diferentes protoplanetas se desenvolvem ao longo do tempo e, em última análise, de relacionar as suas propriedades com as dos sistemas exoplanetários. Para além de fornecer uma nova ferramenta para a caça de planetas com o ALMA, esta descoberta possibilita encontrar outras moléculas interessantes.

Os resultados serão publicados futuramente no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: National Radio Astronomy Observatory

quinta-feira, 22 de junho de 2023

A compreensão da física envolvendo superexplosões estelares

A relação entre as manchas solares e as explosões solares tem sido bastante investigada nos estudos sobre o Sol.

© NASA (estrela com grande cobertura de manchas e superflares)

Até porque essas erupções associadas a ejeções de massa coronal, em que grandes quantidades de energia são liberadas, impactam diretamente nosso planeta, causando maior ocorrência de auroras boreais; blecautes nas comunicações por rádio; incremento do efeito de cintilação nos sinais de GPS; redução nas velocidades e altitudes dos satélites artificiais. 

Para entender a física por trás desses eventos estelares, uma nova pesquisa enfocou um fenômeno ainda mais intenso, denominado superexplosão (superflare, em inglês), com energia de 1.000 a 10.000 vezes maior do que as maiores explosões vistas no Sol. E buscou esse tipo de evento em duas estrelas do tipo K: a Kepler-411 e a Kepler-210. 

Descobriu que, a despeito de essas estrelas serem semelhantes em todos os aspectos, desde as massas até os períodos de rotação e os sistemas planetários, e de ambas exibirem em torno de 100 manchas, a primeira produziu 65 supererupções, enquanto a segunda não produziu nenhuma. “A área das manchas estelares parece não ser a principal responsável pelo desencadeamento das superexplosões. Talvez a explicação deva ser buscada na complexidade magnética das regiões ativas”, diz Alexandre Araújo, pós-doutorando na Escola de Engenharia Mackenzie. Com apoio da FAPESP, o estudo foi conduzido por ele e sua ex-orientadora de doutorado, atual supervisora de pós-doutorado, Adriana Valio, pesquisadora do Centro de Radioastronomia e Astrofísica Mackenzie (CRAAM), da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

As manchas de ambas as estrelas foram caracterizadas com a técnica de mapeamento por trânsito planetário, que fornece a intensidade, temperatura, posição (latitude e longitude) e raio. “Pelo conhecimento que se tinha da literatura, as estrelas com manchas maiores teriam mais chance de produzir superflares, mas não foi isso que observamos. As manchas estelares da Kepler-411 são muito menores do que as da Kepler-210. Teoricamente, seria esta que deveria ter superexplosões, mas isso não acontece. Nossa explicação para a inexistência de superflares na Kepler-210, mesmo com grandes manchas na sua superfície, está na complexidade magnética, na evolução e no tempo de vida das manchas”, afirma Araújo. 

Além de buscar um avanço no conhecimento das atividades estelares, o presente estudo teve uma motivação adicional. A partir da descoberta das primeiras superexplosões em estrelas de tipo solar, a comunidade científica passou a olhar com atenção para tais fenômenos, principalmente para investigar quais seriam as possibilidades de o Sol apresentar uma explosão dessa proporção. Se as erupções de muito menor intensidade já impactam tão fortemente nossa sociedade tecnológica, o que esperar de fenômenos energéticos de tal magnitude? “Certamente os planetas que orbitam estrelas com uma frequência de superflares podem chegar a perder sua atmosfera e, por isso, não desenvolver a vida, pelo menos a vida como a conhecemos”, responde Araújo. 

A estrutura das estrelas de tipo solar 

Para entender tudo isso, é preciso abrir um largo parêntese e recapitular alguns conhecimentos básicos sobre a estrutura das estrelas, obtidos principalmente a partir dos estudos sobre o Sol. Para efeito didático, essa estrutura é dividida em camadas. “O núcleo é a fonte principal da energia da estrela. No Sol, essa região é uma esfera cujo raio corresponde à quinta parte do raio solar, mas com densidade extremamente alta. Nele, a conversão de hidrogênio em hélio, por meio de reações termonucleares, produz temperatura da ordem de 13,6 milhões de kelvin (K)”, informa Valio. 

Em torno do núcleo, fica a zona radiativa, onde a energia é transportada pelos fótons em todas as direções. Os fótons, como se sabe, são as partículas associadas à radiação eletromagnética. E sua velocidade de propagação no vácuo é a maior do universo material. Porém, como a zona radiativa é composta por partículas (prótons, elétrons etc.), a absorção e posterior emissão por estes componentes obstruem enormemente o trânsito dos fótons. De modo que eles levam cerca de 1 milhão de anos para atravessar essa camada e chegar à seguinte, a zona convectiva. “Na zona convectiva, a energia é transportada por meio de correntes de convecção. O material mais quente sobe para a superfície da estrela, enquanto o material mais frio e denso afunda de volta para a camada convectiva. Esse movimento cria células gigantes, que transportam energia e material através da estrela. Na superfície do Sol, elas são conhecidas como os grânulos solares”, explica Valio.

A superfície do Sol é chamada de fotosfera. É nela que aparecem as manchas solares, os grânulos e as erupções, que se estendem por toda a atmosfera solar, composta pela cromosfera e pela coroa. A temperatura média da fotosfera é pouco maior do que 5.700 K, o que faz com que seja relativamente fria em comparação com as camadas internas do Sol ou com as camadas superiores da atmosfera solar. É da fotosfera que sai a maior parte da luz e do calor emitidos por essa estrela. 

“As manchas que aparecem na fotosfera são causadas por campos magnéticos intensos e podem durar de alguns dias a várias semanas antes de desaparecerem. Sua formação começa com um campo magnético gerado pelo movimento de partículas eletricamente carregadas na tacoclina, fina camada compreendida entre as regiões radiativa e convectiva do interior solar. Ao emergirem na superfície do Sol, os tubos de fluxo magnético criam regiões de campo intenso, que bloqueiam a transferência de calor do interior para a superfície. As manchas são escuras porque sua temperatura é 1.000 a 1.500 graus menor do que a temperatura do resto da superfície”, descreve Valio. 

As manchas geralmente têm formatos e tamanhos diferentes, sendo sua complexidade magnética um fator crucial para a produção das maiores explosões solares. Estas são observadas em todo o espectro eletromagnético: rádio, infravermelho, luz visível, ultravioleta, raios X e raios gama. Tais fenômenos transientes acontecem na atmosfera solar, nas regiões de altas concentrações de campo magnético, onde grandes quantidades de energia são liberadas por reconexão magnética. A potência gerada nas maiores explosões solares é de aproximadamente 1.017 a 1.022 quilowatts. 

O método de trânsitos planetários 

O grande desafio para os pesquisadores de superflares é desvendar os mecanismos que originam tais fenômenos. É consensual que essas grandes explosões estejam relacionadas com as manchas estelares. Mas de que forma? “O método de trânsitos planetários é excelente para investigar manchas na superfície de estrelas do tipo solar. Tal método é atualmente o mais robusto para esse tipo de pesquisa. Mas sua aplicação é bastante complicada, principalmente devido à dificuldade de obter estrelas que se encaixem nos critérios de investigação”, comenta Araújo. 

Ele e Valio trabalharam com dados do telescópio Kepler, procurando estrelas que se encaixassem no perfil do estudo. O telescópio espacial Kepler foi projetado pela NASA, a agência espacial norte-americana, com o objetivo de descobrir planetas de tipo terrestre fora do Sistema Solar. Nos quatro anos de sua primeira fase de operação, que se estendeu de 2009 a 2013, ele observou mais de 150 mil estrelas. E, para extrair informações sobre esses objetos, foi utilizado o método de trânsitos planetários, que se baseia na diminuta alteração produzida no brilho da estrela quando um planeta passa na sua frente. Mas encontrar, nessa gigantesca base de dados, os objetos que se adequassem aos seus propósitos foi igual a procurar uma agulha no palheiro. 

“Em primeiro lugar, a estrela devia ter um ou mais planetas. Para que esses exoplanetas pudessem ser detectados, seu ângulo de inclinação em relação à estrela tinha que estar no ângulo de visada do telescópio. Além disso, a estrela precisava apresentar manchas na sua superfície. E o exoplaneta devia transitar nas regiões das manchas. O período orbital do exoplaneta tinha que ser de poucos dias. E seu raio devia ser bem maior do que o da Terra, para que a queda de brilho causada nas curvas de luz da estrela fosse bastante significativa. Finalmente, a estrela precisava apresentar superflares”, disse Araújo. 

O pesquisador afirma que, felizmente, foi possível identificar uma estrela, a Kepler-411, com excelente qualidade de observação. E o melhor: ela possuía um sistema planetário com quatro exoplanetas. Mas, para entender o papel das manchas estelares, era preciso encontrar uma segunda estrela em tudo semelhante, exceto por um aspecto: ela não podia apresentar superflares. “Foi, de certa forma, uma ousadia nossa acreditar que essa segunda estrela existia. E nos sentimos recompensados quando encontramos a Kepler-210, com os parâmetros estelares muito próximos da Kepler-411”, diz Araújo. 

Acredita-se que a detecção de supererupções esteja diretamente ligada à cobertura temporal das manchas na superfície das estrelas. E que, quanto maior a área das manchas estelares, maior o armazenamento de energia magnética para produzir a explosão. “Nossos resultados trouxeram uma perspectiva um pouco diferente. Como já foi dito, na Kepler-411, detectamos 65 superflares, com energias de até 1.035 ergs [1.035 ×107 quilojoules]. Enquanto a Kepler-210 não apresentou nenhuma supererupção, mesmo com o dobro de cobertura temporal, o que nos deu maior probabilidade de observação. E o que mais nos surpreendeu foi o fato de os raios das manchas estelares da Kepler-411 serem muito menores do que os da Kepler-210”, enfatiza Araújo. 

A explicação pode estar no fato de que, embora sejam maiores em área, as manchas da Kepler-210 apresentam uma configuração magnética mais simples. “No Sol, as manchas são classificadas de acordo com o comportamento do campo magnético na área. E classificadas como alfa (α), beta (β), gama (γ) e delta (δ), ou por meio de uma combinação dessas configurações. As manchas deltas são as que apresentam intensa atividade de flares solares. Acreditamos que as manchas da Kepler-210 apresentem uma configuração magnética mais simples, do tipo alfa ou beta. Infelizmente, a confirmação exata dessa hipótese só seria possível por meio de magnetogramas, que são imagens capazes de detectar a localização e a intensidade dos campos magnéticos. Atualmente, só conseguimos observar isso no Sol. Ainda não temos tecnologia para obter magnetogramas de estrelas distantes. De qualquer forma, nosso estudo já nos permite dizer que, em vez de fechar o foco na área das manchas estelares, talvez seja mais produtivo considerar a complexidade magnética das regiões ativas”, conclui Valio. 

Um artigo foi publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society Letters

Fonte: Agência FAPESP

domingo, 18 de junho de 2023

Detectados elementos formadores de rocha na atmosfera de exoplaneta

Astrônomos, recorrendo ao telescópio Gemini North, do Observatório Internacional Gemini operado pelo NOIRLab (National Optical-Infrared Astronomy Research Laboratory), detectaram múltiplos elementos formadores de rocha na atmosfera de um exoplaneta do tamanho de Júpiter, WASP-76b.

© NOIRLab (ilustração do exoplaneta WASP-76b)

O exoplaneta está tão perigosamente perto da sua estrela hospedeira que os elementos formadores de rocha - como o magnésio, o cálcio e o níquel - são vaporizados e dispersos pela sua atmosfera abrasadora. Este perfil químico intrigante fornece novos conhecimentos sobre a formação de sistemas planetários, incluindo o WASP-76b que é um mundo estranho. Localizado a 634 anos-luz da Terra, na direção da constelação de Peixes, o exoplaneta semelhante a Júpiter orbita a sua estrela hospedeira a uma distância excepcionalmente íntima - cerca de 12 vezes mais perto do que Mercúrio está do Sol - o que aquece a sua atmosfera a uns abrasadores 2.000° C. Estas temperaturas extremas "incharam" o planeta, aumentando o seu volume para quase seis vezes o de Júpiter. A temperaturas tão extremas, os elementos formadores de minerais e rochas, que de outra forma permaneceriam escondidos na atmosfera de um planeta gigante gasoso mais frio, podem revelar-se.

Utilizando o telescópio Gemini North, astrônomos detectaram 11 destes elementos formadores de rocha na atmosfera de WASP-76b. A presença e as quantidades relativas destes elementos podem fornecer informações fundamentais sobre a forma exata como os planetas gigantes gasosos se formam, algo que permanece incerto mesmo no nosso próprio Sistema Solar. 

Desde a sua descoberta em 2013, durante o levantamento WASP (Wide Angle Search for Planets), que muitos astrônomos têm vindo a estudar o enigmático WASP-76b. Estes estudos levaram à identificação de vários elementos presentes na atmosfera do exoplaneta quente. Num estudo publicado em março de 2020, uma equipe concluiu que poderia haver chuva de ferro no planeta. Em 2020 e 2021, usando o instrumento MAROON-X do Gemini North, observou-se o planeta à medida que este passava em frente da estrela hospedeira em três ocasiões distintas. Estas novas observações revelaram uma série de elementos formadores de rocha na atmosfera de WASP-76b, incluindo sódio, potássio, lítio, níquel, manganês, crômio, magnésio, vanádio, bário, cálcio e ferro. 

Devido às temperaturas extremas da atmosfera de WASP-76b, os elementos detectados, que normalmente formariam rochas aqui na Terra, são, ao invés, vaporizados e, portanto, presentes na atmosfera nas suas formas gasosas. Embora estes elementos contribuam para a composição dos gigantes gasosos do nosso Sistema Solar, estes planetas são demasiado frios para que os elementos se vaporizem na atmosfera, tornando-os praticamente indetectáveis.

A abundância de muitos destes elementos coincide de perto com as abundâncias encontradas tanto no nosso Sol como na estrela hospedeira do exoplaneta. Isto pode não ser coincidência e fornece mais evidências de que os planetas gigantes gasosos, como Júpiter e Saturno, são formados de modo mais parecido com as estrelas, coalescendo a partir do gás e da poeira de um disco protoplanetário, em vez da gradual acreção e colisão de poeira, rochas e planetesimais, que vão formar planetas rochosos, como Mercúrio, Vênus e a Terra. 

Outro resultado notável do estudo é a primeira detecção inequívoca de óxido de vanádio num exoplaneta. Esta molécula é de grande interesse porque pode ter um grande impacto na estrutura atmosférica dos planetas gigantes quentes. Esta molécula desempenha uma função semelhante ao do ozônio, sendo extremamente eficiente no aquecimento da atmosfera superior da Terra. 

Disponível para os astrônomos de todo o mundo, o Observatório Internacional Gemini continua fornecendo novos conhecimentos que contribuem para a nossa compreensão da estrutura física e química de outros mundos.

Um artigo foi publicado na revista Nature

Fonte: Gemini Observatory

domingo, 11 de junho de 2023

Um-terço dos planetas mais comuns poderão estar na zona habitável

Numa nova análise baseada nos dados telescópicos mais recentes, astrônomas da Universidade da Flórida descobriram que um-terço dos planetas em torno das estrelas mais comuns da Galáxia podem estar numa órbita suficientemente próxima para reter água líquida.

© NASA / JPL-Caltech (exoplaneta orbitando pequena estrela)

Os restantes dois-terços que orbitam estas pequenas estrelas omnipresentes são provavelmente incinerados por marés gravitacionais, esterilizando-os. 

A professora de astronomia Sarah Ballard e a estudante de doutoramento Sheila Sagear estudam os exoplanetas há muito tempo. 

O nosso Sol, quente, amarelo e familiar é uma relativa raridade na Via Láctea. De longe, as estrelas mais comuns são consideravelmente menores e mais frias, com apenas metade da massa do nosso Sol no máximo. Bilhões de planetas orbitam estas estrelas anãs comuns na Via Láctea. Os cientistas pensam que a água líquida é necessária para que a vida evolua em outros planetas, tal como aconteceu na Terra. Uma vez que estas estrelas anãs são mais frias, os planetas teriam de estar muito mais perto da sua estrela para obterem calor suficiente para abrigar água líquida. 

No entanto, estas órbitas próximas deixam os planetas susceptíveis a forças de maré extremas causadas pelo efeito gravitacional da estrela sobre eles. Sagear e Ballard mediram a excentricidade, ou seja, quão oval a órbita é, de uma amostra de mais de 150 planetas em torno destas estrelas anãs, que têm aproximadamente o tamanho de Júpiter. 

Se um planeta orbitar suficientemente perto da sua estrela, mais ou menos à distância que Mercúrio orbita o Sol, uma órbita excêntrica pode sujeitá-lo a um processo conhecido como aquecimento de maré. À medida que o planeta é esticado e deformado pelas forças gravitacionais variáveis na sua órbita irregular, o atrito aquece-o. No extremo, isto pode incinerar o planeta, eliminando qualquer hipótese de água líquida. 

Os dados provêm do telescópio Kepler da NASA, que captou informações sobre exoplanetas à medida que estes se deslocavam em frente das suas estrelas hospedeiras. Para medir as órbitas dos planetas, Ballard e Sagear concentraram-se sobretudo no tempo que os planetas demoravam a fazê-lo. O seu estudo também se baseou em novos dados do telescópio Gaia, que mediu a distância de bilhões de estrelas na Galáxia.

Elas descobriram que as estrelas com múltiplos planetas eram mais propensos de ter o tipo de órbitas circulares que lhes permite reter água líquida. As estrelas com apenas um planeta são as que têm maior probabilidade de registar marés extremas que esterilizariam a superfície. Uma vez que um-terço dos planetas desta pequena amostra tinham órbitas para potencialmente acumular água líquida, isso significa provavelmente que a Via Láctea tem centenas de milhões de alvos promissores para sondar sinais de vida para lá do nosso Sistema Solar. 

Um artigo foi publicado no periódico Proceedings of the National Academy of Sciences.

Fonte: University of Florida

sábado, 3 de junho de 2023

Compreendendo o mecanismo de formação de "super-Terras"

Um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Liège apresenta a detecção de um sistema com dois planetas ligeiramente maiores do que a Terra orbitando uma estrela fria numa dança sincronizada.

© L. Garcia (ilustração do sistema TOI-2096)

Denominado TOI-2096, o sistema está situado a 150 anos-luz da Terra. A descoberta é o resultado de uma estreita colaboração entre universidades europeias e americanas e foi possível graças à missão espacial TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA, que tem por objetivo encontrar planetas que orbitem estrelas brilhantes próximas.

O TESS está realizando um estudo de todo o céu utilizando o método de trânsito, ou seja, monitorando o brilho estelar de milhares de estrelas na procura de uma ligeira diminuição de brilho, que poderia ser provocado por um planeta que passa entre a estrela e o observador. No entanto, apesar do seu poder de detecção de novos exoplanetas, a missão TESS precisa do apoio de telescópios terrestres para confirmar a natureza planetária dos sinais detectados.

Os exoplanetas TOI-2096 b e TOI-2096 c foram observados com uma rede internacional de telescópios terrestres, permitindo a sua confirmação e caracterização. A maior parte dos trânsitos foram obtidos com telescópios dos projetos TRAPPIST e SPECULOOS, liderados pela Universidade de Liège. 

Ao fazer uma análise exaustiva dos dados, foi descoberto que os dois planetas estavam em órbitas ressonantes: por cada órbita do planeta exterior, o planeta interior orbita a estrela duas vezes. Os seus períodos estão, portanto, muito próximos de serem um múltiplo um do outro, com cerca de 3,12 dias para o planeta b e cerca de 6,38 dias para o planeta c. Trata-se de uma configuração muito particular, que provoca uma forte interação gravitacional entre os planetas. Esta interação atrasa ou acelera a passagem dos planetas em frente da sua estrela e pode levar à medição das massas planetárias utilizando telescópios maiores num futuro próximo. 

Os pesquisadores responsáveis pela descoberta estimam que o raio do planeta b, o mais próximo da sua estrela, é 1,2 vezes superior ao da Terra, daí o nome "super-Terra". As suas propriedades poderão ser semelhantes às da Terra: um planeta com uma composição majoritariamente rochosa, possivelmente rodeado por uma fina atmosfera. Da mesma forma, o raio do planeta c corresponde a 1,9 vezes o raio da Terra e a 55% do de Netuno, o que poderá colocar o planeta na categoria dos "mini-Netunos", planetas compostos por um núcleo rochoso e gelado rodeado por atmosferas extensas ricas em hidrogênio ou água, como Urano e Netuno no nosso Sistema Solar.

Estes tamanhos são muito interessantes porque o número de planetas com um raio entre 1,5 e 2,5 vezes o da Terra é inferior ao que os modelos teóricos preveem, tornando estes planetas uma raridade. Estes planetas são de importância crucial devido aos seus tamanhos; TOI-2096 é o único sistema encontrado até agora com uma super-Terra e um mini-Netuno precisamente nos tamanhos em que os modelos se contradizem. Além disso, estes planetas estão entre os melhores da sua categoria para estudar as suas possíveis atmosferas. 

Graças aos tamanhos relativos dos planetas em comparação com o da estrela hospedeira, bem como ao brilho estelar, os astrônomos acham que este sistema é um dos melhores candidatos para um estudo detalhado da sua atmosfera com o telescópio espacial James Webb. Estes estudos ajudarão a confirmar a presença de uma atmosfera, extensa ou não, em volta dos planetas b e c, fornecendo assim pistas sobre o seu mecanismo de formação.

Um artigo foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics

Fonte: Liège Université

domingo, 21 de maio de 2023

Encontrado exoplaneta do tamanho da Terra coberto por vulcões

Os astrônomos descobriram um exoplaneta com a dimensão da Terra, que poderá estar coberto de vulcões.

© NASA / C. Smith (ilustração do exoplaneta LP 791-18 d)

Chamado LP 791-18 d, o planeta poderá sofrer surtos vulcânicos tão frequentes como a lua de Júpiter, Io, o corpo mais vulcanicamente ativo do nosso Sistema Solar. 

Os pesquisadores descobriram e estudaram o planeta utilizando dados do TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA e do telescópio espacial Spitzer, desativado em janeiro de 2020, bem como de um conjunto de observatórios terrestres. 

O exoplaneta LP 791-18 d sofre bloqueio de maré, o que significa que o mesmo lado está constantemente virado para a sua estrela. O lado diurno será provavelmente demasiado quente para a existência de água líquida à superfície. Mas a quantidade de atividade vulcânica que suspeita-se ocorrer por todo o planeta poderia sustentar uma atmosfera, o que permitiria a condensação de água no lado noturno. 

O LP 791-18 d orbita uma pequena estrela anã vermelha a cerca de 90 anos-luz de distância na direção da constelação de Taça. A equipe estima que seja apenas ligeiramente maior e mais massivo do que a Terra. Os astrônomos já sabiam da existência de dois outros mundos no sistema antes desta descoberta, chamados LP 791-18 b e c. O planeta interior é cerca de 20% maior do que a Terra. O planeta exterior c tem cerca de 2,5 vezes o tamanho da Terra e mais de sete vezes a sua massa. 

Durante cada órbita, os planetas d e c passam muito perto um do outro. Cada passagem próxima do planeta mais massivo c produz uma atração gravitacional no planeta d, tornando a sua órbita algo elíptica. Nesta trajetória elíptica, o planeta d é ligeiramente deformado de cada vez que gira em torno da estrela. Estas deformações podem criar atrito interno suficiente para aquecer substancialmente o interior do planeta e produzir atividade vulcânica à sua superfície. 

O planeta Júpiter e algumas das suas luas afetam Io de forma semelhante. O planeta d situa-se no limite interior da zona habitável, a gama tradicional de distâncias, à estrela, em que os cientistas supõem que pode existir água líquida à superfície de um planeta. Se o planeta for tão geologicamente ativo, poderá manter uma atmosfera. As temperaturas podem descer o suficiente no lado noturno do planeta para que a água se condense à superfície. 

O planeta c já foi aprovado para tempo de observação com o telescópio espacial James Webb e a equiea pensa que o planeta d é também um candidato excepcional para estudos atmosféricos pela missão. Uma grande questão na astrobiologia, o campo que estuda amplamente as origens da vida na Terra e fora dela, é se a atividade tectônica ou vulcânica é necessária para a vida. Para além de potencialmente fornecerem uma atmosfera, estes processos podem agitar materiais que de outra forma se afundariam e ficariam presos na crosta, incluindo o elemento carbono. 

Um artigo foi publicado na revista Nature

Fonte: Harvard–Smithsonian Center for Astrophysics

quinta-feira, 11 de maio de 2023

O jogo de sombras em torno do disco de formação de planetas

A jovem estrela TW Hydrae está fazendo um jogo de sombras em torno do disco de formação de planetas que foi observado pelo telescópio espacial Hubble.

© STScI (ilustração de discos de gás e poeira ao redor da estrela TW Hydrae)

Em 2017, os astrônomos descobriram uma sombra que varre a face de um vasto disco de gás e poeira em forma de panqueca que rodeia a estrela anã vermelha. A sombra não é de um planeta, mas de um disco interior ligeiramente inclinado em relação ao disco exterior, muito maior, o que faz com que este projete uma sombra. Uma explicação é que a gravidade de um planeta invisível está puxando poeira e gás para a órbita inclinada do planeta. Agora, uma segunda sombra surgiu em apenas alguns anos nas observações armazenadas no arquivo MAST do Hubble. Poderá ser de outro disco aninhado no interior do sistema. Os dois discos são provavelmente evidências de um par de planetas em construção. 

A TW Hydrae tem menos de 10 milhões de anos e situa-se a cerca de 200 anos-luz de distância. Na sua infância, o nosso Sistema Solar pode ter-se assemelhado ao sistema de TW Hydrae, há cerca de 4,6 bilhões de anos. Como o sistema TW Hydrae está inclinado quase de face para o ponto de vista da Terra, é um alvo ótimo para obter uma visão panorâmica de um "estaleiro" de construção planetária. 

A segunda sombra foi descoberta em observações obtidas a 6 de junho de 2021, como parte de um programa plurianual concebido para seguir as sombras em discos circunstelares. A melhor solução que a equipe encontrou é que há dois discos desalinhados projetando sombras. Estavam tão próximos um do outro na observação anterior que não os conseguiam separar. Com o tempo, separaram-se e dividiram-se em duas sombras. A explicação mais simples é que os discos desalinhados são provavelmente causados pela atração gravitacional de dois planetas em planos orbitais ligeiramente diferentes. 

O Hubble está a reunir uma visão holística da arquitetura do sistema. Os discos podem ser representativos de planetas com velocidades orbitais diferentes em torno de uma estrela. É como se estivéssemos girando dois discos de vinil a velocidades ligeiramente diferentes. Por vezes os rótulos no centro coincidem, mas depois um passa à frente do outro. Isto sugere que os dois planetas têm de estar bastante próximos um do outro. Se um estivesse se movendo muito mais depressa do que o outro, teria sido captado em observações anteriores. 

Os planetas suspeitos estão localizados numa região a uma distância parecida à de Júpiter em torno do Sol. E as sombras completam uma rotação em volta da estrela a cada 15 anos; o período orbital que seria de esperar a esta distância da estrela. Além disso, estes dois discos interiores estão inclinados cerca de cinco a sete graus relativamente ao plano do disco exterior. Isto é comparável à gama de inclinações orbitais dentro do nosso Sistema Solar.

O disco exterior sobre o qual as sombras estão sendo projetadas pode estender-se até várias vezes o raio do cinturão de Kuiper do nosso Sistema Solar. Este disco maior tem uma curiosa divisão com duas vezes a distância média de Plutão ao Sol. Isto pode ser uma evidência da existência de um terceiro planeta no sistema. Quaisquer planetas interiores seriam difíceis de detectar porque a sua luz perder-se-ia no brilho da estrela. Além disso, a poeira no sistema iria escurecer a sua luz refletida. 

Os dados de TW Hydrae foram obtidos pelo instrumento STIS (Space Telescope Imaging Spectrograph) do Hubble. A visão infravermelha do Telescópio Espacial James Webb poderá também mostrar as sombras com mais pormenor.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: ESA

domingo, 7 de maio de 2023

O vapor de água encontrado é de um planeta rochoso ou da sua estrela?

As anãs vermelhas são as estrelas mais comuns no Universo, o que significa que é mais provável encontrar exoplanetas rochosos em órbita de estrelas deste tipo.


© STScI (ilustração de estrela devorando seu planeta)

As estrelas anãs vermelhas são frias, pelo que um planeta deve possuir uma órbita apertada para se manter suficientemente quente para, potencialmente, abrigar água líquida (o que significa que se encontra na zona habitável). Estas estrelas são também ativas, particularmente quando são jovens, liberando radiação ultravioleta e raios X que podem destruir atmosferas planetárias. Consequentemente, uma questão importante em aberto na astronomia é saber se um planeta rochoso poderia manter, ou restabelecer, uma atmosfera num ambiente tão hostil. 

Para ajudar a responder a esta questão, os astrônomos utilizaram o telescópio espacial James Webb para estudar um exoplaneta rochoso conhecido como GJ 486 b. Está demasiado perto da sua estrela para estar dentro da zona habitável, com uma temperatura à superfície de cerca de 430 graus Celsius. E, no entanto, as suas observações usando o NIRSpec (Near-Infrared Spectrograph) do Webb mostram indícios de vapor de água.

Se o vapor de água estiver associado ao planeta, isso indicaria que este tem uma atmosfera, apesar da sua temperatura escaldante e da proximidade à estrela. O vapor de água já foi observado em exoplanetas gasosos, mas até à data não foi definitivamente detectada qualquer atmosfera em torno de um exoplaneta rochoso. No entanto, a equipe adverte que o vapor de água pode estar na própria estrela, especificamente, em manchas estelares frias, e não no planeta.

O vapor de água numa atmosfera de um planeta quente e rochoso representaria um grande avanço para a ciência exoplanetária. O GJ 486 b é cerca de 30% maior do que a Terra e três vezes mais massivo, o que significa que é um mundo rochoso com uma gravidade mais forte do que a do nosso planeta. Orbita uma estrela anã vermelha em pouco menos de 1,5 dias terrestres. Espera-se que sofra acoplamento de maré, com um lado diurno permanente e um lado noturno permanente. 

O GJ 486 b transita a sua estrela, passando à sua frente a partir do nosso ponto de vista. Se tiver uma atmosfera, quando transita, a luz estelar filtra-se através desses gases, imprimindo impressões digitais na luz que permitem aos astrônomos decodificar a sua composição através de uma técnica chamada espectroscopia de transmissão. A equipe observou dois trânsitos, cada um com a duração de cerca de uma hora. Depois utilizaram três métodos diferentes para analisar os dados resultantes. Os resultados dos três métodos são consistentes, na medida em que mostram um espectro praticamente plano, com um aumento intrigante nos comprimentos de onda infravermelhos mais curtos.

A equipe utilizou modelos computacionais considerando uma série de moléculas diferentes e concluiu que a fonte mais provável do sinal era o vapor de água. Embora o vapor de água possa indicar, potencialmente, a presença de uma atmosfera em GJ 486 b, uma explicação igualmente plausível é vapor de água na estrela. Surpreendentemente, mesmo no nosso próprio Sol, o vapor de água pode por vezes existir nas manchas solares, porque estas manchas solares são muito frias em comparação com a superfície estelar circundante.

A estrela progenitora de GJ 486 b é muito mais fria do que o Sol, pelo que ainda mais vapor de água se concentraria nas suas manchas estelares. Como resultado, poderia criar um sinal que imitasse uma atmosfera planetária. Não foi observado indícios de que o planeta tenha atravessado quaisquer manchas estelares durante os trânsitos. Mas isso não significa que não existam manchas estelares em outros locais na estrela. E esse é exatamente o cenário físico que imprimiria este sinal de água nos dados e poderia acabar por se assemelhar a uma atmosfera planetária. 

Seria de esperar que uma atmosfera de vapor de água sofresse uma erosão gradual devido ao aquecimento e irradiação. Consequentemente, existindo uma atmosfera, é provável que tenha de ser constantemente reabastecida por vulcões que ejetam vapor do interior do planeta. Se a água estiver na atmosfera do planeta, são necessárias observações adicionais para determinar a quantidade de água presente. 

Futuras observações com o telescópio espacial James Webb poderão fornecer informações sobre este sistema. Um programa vindouro irá usar o MIRI (Mid-Infrared Instrument) para observar o lado diurno do planeta. Se o planeta não tiver atmosfera, ou se tiver apenas uma fina atmosfera, então espera-se que a parte mais quente do lado diurno esteja diretamente debaixo da estrela. No entanto, se o ponto mais quente estiver deslocado, isso indicaria uma atmosfera que pode fazer circular o calor. E

Em última análise, serão necessárias observações em comprimentos de onda infravermelhos mais curtos por outro instrumento do Webb, o NIRISS (Near-Infrared Imager and Slitless Spectrograph), para diferenciar entre a atmosfera planetária e os cenários de manchas estelares. É a junção de vários instrumentos que vai realmente determinar se este planeta tem ou não uma atmosfera.

O estudo foi aceito para publicação no periódico The Astrphysical Journal Letters

Fonte: Space Telescope Science Institute

Descoberta uma estrela devorando um planeta

Os astrônomos que utilizam o telescópio Gemini South no Chile, operado pelo NOIRLab, observaram a primeira evidência de uma estrela moribunda, semelhante ao Sol, engolindo um exoplaneta.

© NOIRLab (ilustração de estrela devorando seu planeta)

Este processo nunca antes visto pode anunciar o destino final da Terra, quando o nosso próprio Sol se aproximar do fim da sua vida, dentro de cerca de cinco bilhões de anos. Esta pesquisa confirma que, quando uma estrela semelhante ao Sol se aproxima do fim da sua vida, expande-se entre 100 e 1000 vezes o seu tamanho original, acabando por engolir os planetas interiores do sistema. 

Os primeiros indícios deste evento foram descobertos em imagens ópticas do ZTF (Zwicky Transient Facility). A cobertura infravermelha de arquivo pelo NEOWISE (Near-Earth Object Wide-field Infrared Survey Explorer) da NASA, que é capaz de perscrutar ambientes poeirentos em busca de explosões e outros eventos transientes, confirmou então o evento de engolfamento, denominado ZTF SLRN-2020. 

A distinção entre um surto de engolfamento planetário e outros tipos de atividades violentas, como proeminências ou ejeções de massa coronal, é difícil e requer observações de alta resolução para identificar a localização de um surto e medições a longo prazo do seu brilho sem contaminação de estrelas próximas. O Gemini South forneceu estes dados essenciais graças às suas capacidades de ópticas adaptativas. 

O surto de engolfamento durou cerca de 100 dias e as características da sua curva de luz, bem como o material ejetado, deram aos astrônomos uma ideia da massa da estrela e do planeta consumido. O material ejetado consistia em cerca de 33 massas terrestres de hidrogênio e cerca de 0,33 massas terrestres de poeira. A partir desta análise, a equipe estimou que a estrela progenitora tem cerca de 0,8 a 1,5 vezes a massa do nosso Sol e que o planeta engolido tem 1 a 10 vezes a massa de Júpiter.

A interpretação deste evento também fornece evidências de um elo em falta na nossa compreensão da evolução e do destino final dos sistemas planetários, incluindo o nosso. 

Um artigo foi publicado na revista Nature

Fonte: Gemini Observatory

terça-feira, 25 de abril de 2023

Um novo perigo estelar para planetas

De acordo com um novo estudo utilizando o observatório de raios X Chandra da NASA e outros telescópios de raios X, a explosão de uma estrela pode representar mais riscos para os planetas próximos do que se pensava anteriormente.

© M. Weiss (ilustração de um planeta parecido com a Terra)

Esta ameaça recentemente identificada envolve uma fase de raios X intensos que podem danificar as atmosferas dos planetas até 160 anos-luz de distância. A Terra não está hoje em perigo de tal ameaça porque não existem potenciais progenitoras de supernovas dentro desta distância, mas pode ter estado exposta a este tipo de raios X no passado. 

Antes deste estudo, a maioria da pesquisa sobre os efeitos das explosões de supernova tinha-se concentrado no perigo de dois períodos: a radiação intensa produzida por uma supernova nos dias e meses após a explosão e as partículas energéticas que chegam centenas a milhares de anos depois. No entanto, mesmo estas ameaças alarmantes não catalogam completamente os perigos na sequência da explosão de uma estrela.

Os pesquisadores descobriram que, entre estes dois perigos previamente identificados, se esconde outro. As consequências das supernovas produzem sempre raios X, mas se a onda da explosão de supernova atingir gás circundante e denso, pode produzir uma dose particularmente grande de raios X que chega meses a anos após a explosão e pode durar décadas. 

Os cálculos neste último estudo baseiam-se em observações de raios X de 31 supernovas e das suas consequências obtidas principalmente com o Chandra, Swift e NuSTAR da NASA, juntamente com o XMM-Newton da ESA. A análise destas observações mostra que podem haver consequências letais da interação de supernovas com o seu meio envolvente, para planetas localizados até cerca de 160 anos-luz de distância.

Se uma torrente de raios X varrer um planeta próximo, a radiação alteraria severamente a química atmosférica do planeta. Para um planeta semelhante à Terra, este processo poderia eliminar uma porção significativa de ozônio, o que em última análise protege a vida da perigosa radiação ultravioleta da sua estrela hospedeira. Se um planeta com a biologia da Terra fosse atingido por uma contínua radiação altamente energética de uma supernova próxima, especialmente uma que interagisse fortemente com o seu ambiente, poderia levar ao desaparecimento de uma vasta gama de organismos, especialmente os marinhos na base da cadeia alimentar. Estes efeitos podem ser suficientemente significativos para iniciar um evento de extinção em massa.

Existem fortes indícios que num passado distante - incluindo a detecção, em diferentes locais do globo, de um tipo radioativo de ferro - de que ocorreram supernovas perto da Terra há cerca de 2 a 8 milhões de anos atrás. Os astrônomos estimam que estas supernovas se encontravam a cerca de 65 a 500 milhões de anos-luz da Terra. A Terra está na "Bolha Local", uma bolha ainda em expansão de gás quente e de baixa densidade rodeada por uma concha de gás frio que se estende por cerca de 1.000 anos-luz. A expansão exterior de estrelas perto da superfície da "Bolha Solar" implica que esta se formou a partir de um surto de formação estelar e de supernovas perto do centro da bolha há aproximadamente 14 milhões de anos.

As enormes estrelas jovens responsáveis pelas explosões de supernovas estavam então muito mais próximas do nosso planeta do que estas estrelas estão agora, o que colocou a Terra em muito maior risco destas supernovas no passado. Embora esta evidência não ligue as supernovas a qualquer evento específico de extinção em massa na Terra, sugere que as explosões cósmicas afetaram o nosso planeta ao longo da sua história. Apesar da Terra e do Sistema Solar se encontrem atualmente num espaço seguro em termos de potenciais explosões de supernova, muitos outros planetas na Via Láctea não estão. 

Estes eventos altamente energéticos reduziriam efetivamente as áreas dentro da nossa Galáxia, conhecida como Zona Galáctica Habitável, onde as condições seriam propícias à vida tal como a conhecemos. Uma vez que as observações de raios X das supernovas são escassas, particularmente da variedade que interage fortemente com o seu ambiente, os autores argumentam que as observações de acompanhamento das supernovas, em interação durante meses e anos após a explosão, seriam valiosas para compreender o ciclo de vida das estrelas e também em campos como a astrobiologia, paleontologia e ciências planetárias. 

O artigo científico que descreve este resultado foi publicado no periódico The Astrophysical Journal

Fonte: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics