segunda-feira, 24 de abril de 2017

Como explicar a expansão acelerada do Universo sem a energia escura?

A enigmática energia escura, que se acredita responder por 68% da composição do Universo, pode não existir, de acordo com uma equipe húngaro-americana.

imagem de um dos quadros da simulação feita durante o estudo

© István Csabai (imagem de um dos quadros da simulação feita durante o estudo)

Na imagem acima, um quadro da animação mostra a expansão do Universo: no painel superior esquerdo, em vermelho, na cosmologia padrão ‘Lambda Cold Dark Matter’, que inclui a energia escura; no painel superior do meio, em azul, o novo Modelo AvERA, que considera a estrutura do Universo e elimina a necessidade de energia escura; no painel superior direito, verde, na cosmologia Einstein-de-Sitter, o modelo original sem energia escura. O painel na parte inferior mostra o aumento do “fator de escala” (uma indicação do tamanho) em função do tempo, onde 1Gya representa bilhões de anos. O crescimento da estrutura também pode ser visto nos painéis superiores. Um ponto representa aproximadamente um aglomerado de galáxias. As unidades de escala estão em Megaparsecs (Mpc). Um parsec é equivalente a 3,26156 anos-luz ou 3,08568×1016 metros.

Os pesquisadores acreditam que os modelos matemáticos do Universo não levam em conta sua estrutura mutável, mas que, uma vez que isso é feito, a necessidade de energia escura desaparece.

Nosso Universo foi formado no Big Bang, há 13,8 bilhões de anos, e tem se expandido desde então. A prova chave desta expansão é a lei de Hubble, baseada em observações das galáxias, onde a velocidade com que a galáxia se afasta de nós é proporcional à sua distância.

Astrônomos medem esta velocidade de recessão observando linhas no espectro eletromagnético de uma galáxia, que se deslocam mais para o vermelho quanto mais rápido a galáxia está se afastando. A partir da década de 1920, o mapeamento das velocidades das galáxias levou os cientistas a concluírem que o Universo está se expandindo, e que ele se iniciou como um minúsculo ponto.
Na segunda metade do século 20, astrônomos encontraram evidências de uma matéria “escura” invisível ao observar que algo a mais era necessário para explicar o movimento das estrelas dentro das galáxias. Hoje, acredita-se que a matéria escura equivale a 27% do conteúdo do Universo, sendo que apenas 5% representa a matéria ordinária.

Observações de explosões de estrelas anãs brancas em sistemas binários, chamadas de supernova do tipo Ia, nos anos 1990 levaram os cientistas à conclusão de que um terceiro componente, a energia escura, constituía 68% do cosmos e seria responsável por conduzir uma aceleração na expansão do Universo.

No novo trabalho, os pesquisadores, liderados pelo doutorando Gábor Rácz, da Universidade Eötvös Loránd, na Hungria, questionam a existência da energia escura e sugerem uma explicação alternativa. Eles argumentam que os modelos convencionais de cosmologia, que estuda a origem e evolução do Universo, dependem de aproximações que ignoram sua estrutura e nas quais se assume que a matéria possui densidade uniforme.

“As equações da relatividade geral de Einstein, que descrevem a expansão do Universo, são tão complexas matematicamente que, durante cem anos, não foram encontradas soluções que levassem em conta o efeito das estruturas cósmicas. Sabemos através de observações bastante precisas de supernovas que a expansão do Universo está se acelerando, mas, ao mesmo tempo, dependemos de aproximações grosseiras das equações de Einstein, as quais podem introduzir sérios efeitos colaterais, como a necessidade de energia escura nos modelos desenhados para se ajustarem aos dados observacionais,” explica László Dobos, também da Universidade Eötvös Loránd.

Na prática, matéria normal e matéria escura parecem preencher o Universo com uma estrutura parecida com espuma, onde galáxias estão localizadas nas finas paredes entre bolhas, e estão agrupadas em superaglomerados. Em contrapartida, o interior das bolhas está quase vazio de ambos os tipos de matéria.

Utilizando uma simulação por computador para modelar o efeito da gravidade na distribuição de milhões de partículas de matéria escura, os cientistas reconstruíram a evolução do Universo, incluindo os agrupamentos iniciais de matéria, e a formação de estruturas em larga escala.

Ao contrário das simulações convencionais, com uma expansão suave do Universo, levar em conta a estrutura conduziu a um modelo no qual diferentes regiões do cosmos se expandem em diferentes ritmos. A taxa média de expansão, porém, é consistente com as presentes observações, o que sugere uma aceleração, no geral.

“A teoria da relatividade geral é fundamental para entender a forma como o Universo evolui. Não questionamos a sua validade; questionamos a validade das soluções aproximadas. Nossas descobertas baseiam-se em uma conjectura matemática que permite a expansão diferencial do espaço, consistente com a relatividade geral, e mostram como a formação de estruturas de matéria complexas afetam esta expansão. Anteriormente, estas questões haviam sido descartadas, mas levá-las em conta pode explicar a aceleração sem a necessidade de energia escura,” completa Dobos.

Se esta descoberta se sustentar, pode ter um impacto significante nos modelos do Universo e na direção das pesquisas em física. Nos últimos 20 anos, astrônomos e físicos teóricos têm especulado sobre a natureza da energia escura, mas ela continua um mistério. Com o novo modelo, a equipe espera ao menos dar início a um animado debate.

A equipe publicou seus resultados num artigo na Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Scientific American

domingo, 23 de abril de 2017

Lente cósmica fornece visão única de supernova

Astrônomos descobriram uma supernova tipo Ia através de lente gravitacional, que logo lhes dará uma nova medida da expansão do Universo.

lente gravitacional da supernova tipo Ia

© Hubble/SDSS/Palomar (lente gravitacional da supernova tipo Ia)

Esta imagem composta mostra a supernova iPTF16geu de tipo Ia vista com diferentes telescópios. A imagem de fundo mostra o céu noturno através do observatório Palomar. A imagem mais à esquerda mostra uma observação do Sloan Digital Sky Survey (SDSS). O telescópio espacial Hubble captou a imagem central, que mostra a galáxia de primeiro plano responsável por curvar a luz da supernova (SDSS J210415.89-062024.7). A imagem mais à direita também foi obtida com o Hubble e retrata as quatro imagens da explosão de supernova ao redor da galáxia.

É assim que Mansi Kasliwal, do California Institute of Technology (Caltech), descreve sua primeira impressão quando ela olhou para as imagens iniciais da supernova iPTF 16geu. Era claramente um tipo Ia, o tipo de supernova que se tornou famosa em seu papel como uma vela padrão. Em 2011, uma equipe de astrônomos usou apenas este tipo de supernovas para medir a luminosidade independentemente da distância para descobrir a existência da energia escura. Os cientistas norte-americanos Saul Perlmutter, Adam Riess e Brian Schmidt receberam o Prêmio Nobel de Física por pesquisas que mostraram como a expansão do Universo está acelerando.

Mas esta supernova não parecia seguir a regra que governava o resto do seu tipo."Era muito mais brilhante do que deveria ter sido dada sua distância de nós," diz Kasliwal.

Observações efetuadas com o telescópio espacial Hubble, o telescópio Keck no Havaí e o Very Large Telescope (VLT) do Observatório Europeu do Sul (ESO) no Chile revelaram mais três supernovas perto da primeira. Elas eram exatamente idênticas. Acontece que a gravidade de uma galáxia de primeiro plano tinha curvado a luz da supernova iPTF 16geu durante sua viagem de 4,3 bilhões de anos em direção à Terra, evidenciando seu brilho por um fator de 52 e dividindo sua luz em quatro imagens apenas 0,3 segundos de arco. O resultado é uma clássica Cruz de Einstein, a primeira relativa a uma supernova do Tipo Ia.

Os astrônomos descobriram dezenas de lentes gravitacionais pela dúzia. As galáxias massivas em primeiro plano ou os aglomerados de galáxias magnificam e distorcem a luz das galáxias de fundo, propicinado uma visão do Universo primordial que estaria de outra maneira fora de alcance.

Mas as supernovas raramente são captadas em tais lentes. Seu brilho de luz é muito breve, da ordem de meses ou anos, dependendo do tipo de supernova e sua distância. Apenas uma supernova com múltiplas imagens foi captada antes: a Supernova Refsdal, uma supernova de colapso de núcleo.

Esta descoberta foi realizada pelo Intermediate Palomar Transient Factory (iPTF), um telescópio totalmente automatizado de 1,2 metros que varre o céu com uma câmera de campo largo. Ele foi projetado para captar eventos celestes em rápida mudança, como supernovas, em tempo quase real. Os pesquisadores do Global Relay of Observatories Watching Transients Happen (GROWTH) lideraram as observações que acompanharam a descoberta da supernova.

Como a luz da Supernova iPTF 16geu foi dividida em quatro imagens, cada uma destas imagens tomou um caminho ligeiramente diferente para a Terra. Agora, a equipe internacional de astrônomos está calculando o comprimento de cada um destes caminhos. Logo, os astronômos terão uma medida da constante de Hubble, que nos diz quão rapidamente o Universo está se acelerando. Esta é uma peça valiosa de dados, já que os astrônomos têm discutido sobre a constante do Hubble há décadas e o debate apenas se intensificou nos últimos anos.

"Quando a taxa de expansão do Universo é medida localmente, usando supernovas ou estrelas Cefeidas, é obtido um número diferente daquele procurado nas primeiras observações do Universo e da radiação de fundo de microondas cósmico," diz Ariel Goobar, da Universidade de Estocolmo, Suécia.

Fonte: Sky & Telescope

sábado, 22 de abril de 2017

O coração pulsante da NGC 4696 pode enviar ondas de choque gigantescas

O aglomerado de galáxias Centaurus é o lar de centenas de galáxias.

galáxia NGC 4696

© Chandra/VLA/Hubble (galáxia NGC 4696)

Esta imagem composta contém observações de raios X (vermelho), rádio (azul) e luz óptica (verde).

Dentro de seu centro fica a NGC 4696, uma grande galáxia elíptica localizada a cerca de 145 milhões de anos-luz de distância da Terra. Como a maioria das galáxias, a NGC 4696 contém um buraco negro supermassivo central. Os astrônomos sabem que os aglomerados de galáxias são ambientes únicos, onde as galáxias estão tão bem unidas que podem afetar suas vizinhas próximos. Dentro da galáxia NGC 4696, o buraco negro supermassivo agora foi flagrado bombeando energia e material para o espaço em torno de sua galáxia de acolhimento, como um coração batendo forte.

Um estudo recente combinando novos dados do observatório de raios X Chandra com observações no rádio pelo Very Large Array  (VLA) e no visível pelo telescópio espacial Hubble revelou a natureza do espaço que rodeia a galáxia NGC 4696. Os resultados indicam que o buraco negro supermasivo da galáxia tem um "pulso" de 5 a 10 milhões de anos, emanando material em intervalos parcialmente regulares para interagir com a nuvem de gás quente e difuso ao redor da galáxia. Quando visto em múltiplos comprimentos de onda, o buraco negro mostra evidências de sua presença através de jatos que lançam partículas longe da galáxia, criando ondas de choque e quase cavidades ventriculares no material que permeia o espaço entre as galáxias no aglomerado Centaurus.

No total, os pesquisadores identificaram nove cavidades que abrangem quase 122 mil anos-luz no gás ao redor da NGC 4696. Eles também mapearam os elementos presentes neste gás, descobrindo que o gás rico em elementos mais pesados ​​gerados por supernovas na galáxia foi gerado pelas explosões do buraco negro, empurrado sempre para fora de sua origem no centro do aglomerado para enriquecer o espaço mais distante. Devido o gás ser aquecido e mantido quente por pulsos intermitentes do buraco negro, nunca tem a chance de esfriar e formar estrelas.

Os aspectos curvos do gás quente emissor de raios X ao redor da galáxia também são visíveis, quase como ondas sonoras que viajam pelo ar (embora estas ondas estão numa frequência muito baixa para ser ouvida: cerca de 56 oitavas abaixo do dó médio). Estas características podem ser devidas a ondas de choque (explosões sônicas) das explosões repetidas do buraco negro, embora os astrônomos ainda não tenham descartado campos magnéticos ou outros tipos de turbulência como origem.

Este trabalho baseou-se em observações anteriores do aglomerado publicado no Monthly Notices of the Royal Astronomical Society em janeiro de 2016.

Fonte: Astronomy

quinta-feira, 20 de abril de 2017

Descoberto exoplaneta em trânsito na zona habitável de uma estrela

Um exoplaneta em órbita de uma estrela anã vermelha, situada a 40 anos-luz de distância da Terra, pode ser o novo detentor do título “melhor local para procurar sinais de vida para além do Sistema Solar".

exoplaneta rochoso LHS 1140b

© M. Weiss/CfA (exoplaneta rochoso LHS 1140b)

Com o auxílio do instrumento HARPS montado em La Silla, e outros telescópios em todo o mundo, uma equipe internacional de astrônomos descobriu uma “super-Terra” em órbita na zona de habitabilidade de uma estrela anã vermelha. A zona de habitabilidade define-se como uma zona na órbita de uma estrela onde um planeta possui temperatura adequada para que possa existir água líquida à sua superfície. Este mundo é um pouco maior do que a Terra, mas possui mais massa e muito provavelmente ainda mantém sua atmosfera. Este aspecto, juntamente com o fato de passar em frente da sua estrela hospedeira ao longo da sua órbita, torna-o num dos mais interessantes alvos futuros para estudos atmosféricos.

A recentemente descoberta super-Terra LHS 1140b orbita na zona de habitabilidade de uma fraca estrela anã vermelha, chamada LHS 1140, situada na constelação da Baleia. As anãs vermelhas são menores e mais frias que o Sol e, embora LHS 1140b esteja dez vezes mais próximo da sua estrela do que a Terra está do Sol, recebe apenas cerca de metade da luz de sua estrela, quando comparado com a Terra, situando-se no meio da zona de habitabilidade. A partir da Terra vemos a sua órbita quase de perfil e quando o exoplaneta passa em frente da estrela bloqueia um pouco da luz estelar emitida, algo que acontece uma vez por órbita, a cada 25 dias.

“Trata-se do exoplaneta mais interessante que descobrimos na última década,” explica o autor principal deste estudo Jason Dittmann, do Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics (Cambridge, EUA). “Não podíamos desejar um melhor alvo para realizar uma das maiores buscas da ciência, a procura de vida fora da Terra.”

“As atuais condições da anã vermelha são particularmente favoráveis, LHS 1140 gira mais lentamente e emite menos radiação de alta energia que outras estrelas de baixa massa semelhantes,” explica o membro da equipe Nicola Astudillo-Defru do Observatório de Genebra, na Suíça.

Apesar do planeta se situar numa zona onde a vida tal como a conhecemos pode potencialmente existir, este corpo celeste não entrou muito provavelmente nesta região antes de 40 milhões de anos após a formação da estrela anã vermelha. Durante esta fase, o exoplaneta pode ter estado sujeito ao passado ativo e volátil da sua estrela progenitora. Uma anã vermelha pode facilmente remover a água da atmosfera de um planeta que está se formando na sua vizinhança, levando a um efeito de estufa descontrolado, semelhante ao que observamos em Vênus.

Para que a vida tal como a conhecemos possa existir, um planeta tem que ter água em sua superfície e possuir atmosfera. Sabe-se que quando as anãs vermelhas são jovens emitem radiação que pode ser prejudicial às atmosferas dos planetas que as orbitam. Neste caso, o grande tamanho do planeta aponta para que um oceano de magma possa ter existido na sua superfície durante milhões de anos. Este oceano de lava fervente pode ter alimentado a atmosfera com vapor, muito depois da estrela ter atingido o seu atual estado calmo e de brilho constante, tendo assim fornecido água ao planeta.

A descoberta foi inicialmente feita pela infraestrutura MEarth, que detectou os primeiros apagões característicos na luz estelar quando o planeta passa em frente à estrela. O instrumento HARPS (High Accuracy Radial velocity Planet Searcher) do ESO fez em seguida as cruciais observações de acompanhamento que confirmaram a presença de um exoplaneta do tipo super-Terra. O HARPS também ajudou a determinar o período orbital e permitiu que tanto a massa do exoplaneta como a sua densidade fossem deduzidas.

Os astrônomos estimaram que a idade do planeta é pelo menos de 5 bilhões de anos e deduziram também que tem um diâmetro 1,4 vezes maior do que o da Terra, quase 18.000 km. A massa é cerca de 7 vezes maior que a da Terra e por isso a sua densidade é muito mais elevada, o que aponta para que o exoplaneta seja muito provavelmente constituído por rochas com um núcleo denso de ferro.

Esta super-Terra pode ser a melhor candidata descoberta até agora para futuras observações para estudar e caracterizar a sua atmosfera, se esta existir. Dois dos membros europeus da equipe, Xavier Delfosse e Xavier Bonfils, ambos no CNRS e no IPAG em Grenoble, França, concluem: “O sistema LHS 1140 pode vir a ser um alvo ainda mais importante para a futura caracterização de planetas na zona de habitabilidade do que o Proxima b ou o TRAPPIST-1. Este tem sido um ano extraordinário no que concerne descobertas de exoplanetas!”

O planeta em órbita de Proxima b encontra-se muito mais próximo da Terra, mas muito provavelmente não transita em frente à sua estrela, o que torna muito difícil determinar se possui ou não uma atmosfera. Contrariamente ao sistema TRAPPIST-1, não se encontraram mais exoplanetas em torno de LHS 1140. Pensa-se que os sistemas com planetas múltiplos sejam comuns em torno de anãs vermelhas, pelo que é possível que exoplanetas adicionais não tenham sido detectados até agora por serem muito pequenos.

Em particular, observações a serem realizadas em breve com o telescópio espacial Hubble da NASA/ESA mostrarão exatamente quanta radiação de alta energia está sendo enviada para LHS 1140b, por isso a sua capacidade de poder suportar vida poderá ser melhor limitada.

Num futuro não muito distante,quando novos telescópios como o Extremely Large Telescope do ESO estiverem operacionais, é muito provável que possamos fazer observações detalhadas das atmosferas de exoplanetas e o LHS 1140b é um candidato excepcional para tais estudos.

Este trabalho foi descrito no artigo científico intitulado “A temperate rocky super-Earth transiting a nearby cool star”, de J. A. Dittmann et al., que foi publicado hoje na revista Nature.

Fonte: ESO

quarta-feira, 19 de abril de 2017

A monstruosa galáxia que cresceu demasiado depressa

Uma equipe internacional de astrônomos avistou, pela primeira vez, uma galáxia massiva e inativa num instante em que o Universo tinha apenas 1,65 bilhões de anos.

ilustração da galáxia ZF-COSMOS-20115

© Leonard Doublet/U. Swinburne (ilustração da galáxia ZF-COSMOS-20115)

Os astrônomos pensam que a maioria das galáxias desta época têm uma massa baixa, mas que formam estrelas a um grande ritmo. No entanto, de acordo com o professor Karl Glazebrook, líder da equipe de pesquisa e Diretor do Centro para Astrofísica e Supercomputação da Universidade de Swinburne, esta galáxia é um "monstro" e está inativa.

Os cientistas descobriram que num curto espaço de tempo, esta galáxia massiva conhecida como ZF-COSMOS-20115, formou todas as suas estrelas (três vezes mais estrelas do que o total atual da Via Láctea) através de um evento explosivo de formação estelar. Mas que parou de produzir estrelas apenas bilhões de anos após o Big Bang, para se tornar numa galáxia quiescente ou "vermelha e morta", o que é comum no nosso Universo da atualidade, mas não se espera que exista nessa época antiga.

A galáxia é também pequena e extremamente densa, tem 300 bilhões de estrelas amontoadas numa região do espaço com aproximadamente o mesmo tamanho da distância que separa o Sol e a vizinha Nebulosa de Órion.

Os astrofísicos ainda estão debatendo como é que as galáxias param de formar estrelas. Até recentemente, os modelos sugeriam que as galáxias moribundas como esta só deveriam existir a partir de aproximadamente três bilhões de anos após o Big Bang.

"Esta descoberta estabelece um novo recorde para a primeira galáxia vermelha e massiva. É um achado incrivelmente raro que coloca um novo desafio aos modelos de evolução galáctica, o de acomodar a existência de tais galáxias muito mais cedo no Universo."

Esta pesquisa baseia-se num estudo anterior, também da Universidade de Swinburne, que sugeria que estas galáxias moribundas podiam existir e que tinha por base tênues objetos avermelhados em imagens extremamente profundas no infravermelho próximo.

Neste estudo mais recente, foram utilizados os telescópios W.M. Keck no Havaí para confirmar as assinaturas destas galáxias, através do novo e único espectrógrafo MOSFIRE. Obtiveram espectros profundos no infravermelho próximo para procurar as características definitivas que assinalam a presença de estrelas velhas e uma ausência de formação estelar ativa.

"Nós usamos o telescópio mais poderoso do mundo, mas ainda precisamos observar esta galáxia durante mais de duas noites para revelar a sua natureza impressionante," comenta a professora Vy Tyran, da Universidade do Texas A&M.

Mesmo com grandes telescópios como o Keck, com o seu espelho de 10 metros, é necessário um tempo de observação longo para detectar as linhas de absorção que são muito fracas em comparação com as linhas de emissão mais proeminentes geradas por galáxias ativas que formam estrelas.

"Através do recolhimento de luz suficiente para medir o espectro desta galáxia, nós deciframos esta narrativa cósmica de que estrelas e elementos estão presentes nestas galáxias e construímos uma linha temporal de quando formaram as suas estrelas," comenta a professora Tran.

A taxa de formação estelar observada nesta galáxia é equivalente a menos de um-quinto da massa do Sol por ano [em estrelas novas] mas, no seu pico, 700 milhões de anos antes, esta galáxia formava estrelas 5.000 vezes mais rapidamente.

"Esta galáxia formou-se como um foguete em menos de 100 milhões de anos, logo no início da história cósmica," comenta o professor Glazebrook.

"Rapidamente se tornou num objeto monstruoso e, igualmente, se desligou. Como foi capaz de fazer isto, só podemos especular. Esta rápida vida e morte, tão cedo no Universo, não está prevista nas nossas teorias modernas da formação galáctica."

O Dr. Corentin Schreiber, da Universidade de Leiden, que foi o primeiro a medir o espectro, especula que estes "fogos-de-artifício" do início do Universo estão obscurecidos por detrás de um véu de poeira e que as observações futuras, usando telescópios submilimétricos, vão descobrir mais.

"As ondas submilimétricas são emitidas pela poeira quente, que bloqueia outras partes da luz, e evidenciarão quando é que estas galáxias 'explodiram' e qual o seu papel no desenvolvimento do Universo primordial," comenta o Dr. Schreiber.

Com o lançamento do telescópio espacial James Webb em 2018, os astrnomos serão capazes de construir grandes amostras destas galáxias moribundas graças à sua alta sensibilidade, ao seu grande espelho e à vantagem de não haver atmosfera no espaço.

Esta pesquisa foi publicada na revista Nature.

Fonte: Swinburne University of Technology

Buracos negros supermassivos encontrados em galáxias minúsculas

Há três anos atrás, uma equipe da Universidade do Utah descobriu uma galáxia anã ultracompacta que continha um buraco negro supermassivo, no momento a galáxia menor que se sabia abrigar um buraco negro enorme.

galáxias anãs ultracompactas, VUCD3 e M59cO, com buracos negros supermassivos

© NASA/STScI (galáxias anãs ultracompactas, VUCD3 e M59cO, com buracos negros supermassivos)

Os achados sugerem que as anãs são provavelmente remanescentes de galáxias maiores a quem foram retiradas as suas regiões externas depois de colidirem com as galáxias maiores M87 e M59, respetivamente.

Os achados sugeriram que as anãs ultracompactas podiam ser os minúsculos remanescentes de galáxias massivas que foram despojadas das suas regiões externas depois de colidirem com outras galáxias maiores.

Agora, o mesmo grupo de astrônomos encontrou mais duas galáxias anãs ultracompactas com buracos negros supermassivos. Os três exemplos sugerem que os buracos negros se escondem no centro da maioria destes objetos, potencialmente duplicando o número de buracos negros supermassivos conhecidos no Universo. Os buracos negros constituem uma grande porcentagem da massa total destas galáxias compactas, apoiando a teoria de que as anãs são restos de galáxias massivas dilaceradas por galáxias ainda maiores.

"Nós ainda não compreendemos totalmente como é que as galáxias se formam e evoluem ao longo do tempo. Estes objetos podem dizer-nos como é que as galáxias se fundem e colidem," comenta Chris Ahn, candidato de pós-doutorado do Departamento de Física e Astronomia da Universidade de Utah. "Talvez uma fração dos centros de todas as galáxias sejam realmente estas galáxias compactas despojadas das suas regiões externas."

Os pesquisadores mediram duas galáxias anãs ultracompactas, chamadas VUCD3 e M59cO, situadas muito além dos braços espirais da nossa Via Láctea, em órbita de galáxias massivas no aglomerado galáctico de Virgem. Eles detectaram um buraco negro supermassivo em cada das galáxias; o buraco negro de VUCD3 tem uma massa equivalente a 4,4 milhões de sóis, representando cerca de 13% da massa total da galáxia, e o buraco negro de M59cO tem uma massa equivalente a 5,8 milhões de sóis, representando cerca de 18% da sua massa total.

Em comparação, o buraco negro supermassivo no centro da Via Láctea tem uma massa de 4 milhões de sóis, mas representa menos de 0,01% da massa total da Galáxia.

"É incrível quando realmente pensamos sobre isto. Estas anãs ultracompactas têm cerca de 0,1% do tamanho da Via Láctea, no entanto hospedam buracos negros maiores do que o buraco negro no centro da nossa Galáxia," exclama Ahn.

Para calcular a massa das galáxias anãs, os astrônomos mediram o movimento das estrelas usando o telescópio Gemini Norte localizado no vulcão Mauna Kea no Havaí. Os astrônomos têm que corrigir as distorções provocadas pela atmosfera da Terra. Disparam um laser para o céu a fim de produzir uma pequena estrela falsa, e movem um espelho centenas de vezes por segundo para desfazer a distorção atmosférica. Aplicam então esta técnica às galáxias anãs ultracompactas, objetos tão pequenos que estas correções se tornam imprescindíveis a fim de medir os movimentos dentro dos objetos. A técnica, com o nome ótica adaptativa, melhora a qualidade de imagem da galáxia.

Também analisaram imagens do telescópio espacial Hubble para medir a distribuição das estrelas em cada galáxia e criaram uma simulação computacional que melhor se adapta às suas observações.

Os cientistas descobriram que o movimento das estrelas no centro das galáxias é muito mais rápido do que aquelas nas regiões mais externas, uma assinatura clássica de um buraco negro. VUDC3 e M59cO são a segunda e terceira galáxias anãs ultracompactas que se sabe abrigar um buraco negro supermassivo, sugerindo que todas as anãs deste gênero podem abrigar este tipo de objetos exóticos.

Os astrônomos descobriram as galáxias anãs ultracompactas no final da década de 1990. Estes objetos são formados por centenas de milhões de estrelas densamente agrupadas numa região, em média, com 100 anos-luz de diâmetro. Os cientistas obtiveram medições para ver o que estava acontecendo no seu interior, e algo não estava correto; as galáxias anãs ultracompactas tinham mais massa do que as suas estrelas, por si só, podiam explicar. O professor Anil Seth, professor assistente do Departamento de Física e Astronomia da Universidade de Utah, liderou o estudo de 2014 que encontrou a primeira galáxia anã ultracompacta com um buraco negro supermassivo. Os dois estudos suportam a ideia de que os buracos negros supermassivos no centro de galáxias deste gênero são responsáveis pela massa extra.

Uma teoria alternativa diz que as anãs são apenas aglomerados estelares enormes, grupos de centenas de milhares de estrelas nascidas ao mesmo tempo. O maior aglomerado estelar da Via Láctea contém três milhões de estrelas, e as galáxias anãs ultracompactas são entre 10 e 100 vezes maiores. "A questão era, isto porque formam aglomerados maiores com o mesmo processo? Ou são, de alguma maneira, diferentes? Este trabalho mostra que são diferentes," continua Seth.

"É óbvio em retrospetiva, porque o centro de uma galáxia regular parece-se quase exatamente com estes objetos, mas isso não era o que a maioria das pessoas pensava que eram. Eu não estava convencido de que íamos encontrar um buraco negro quando fiz as observações," explica Seth. "Este é um exemplo interessante de descoberta científica e da rapidez com que podemos reorientar a nossa compreensão do Universo."

Os buracos negros são áreas com uma gravidade tão forte que nem a luz pode escapar. Formam-se quando as estrelas colapsam, deixando para trás um buraco negro que exerce força gravitacional sobre os objetos ao seu redor. Os buracos negros supermassivos têm uma massa superior a um milhão de sóis, e pensa-se que existam no centro de todas as grandes galáxias.

Uma explicação para o buraco negro supermassivo no interior das galáxias anãs ultracompactas é que as galáxias já abrigaram bilhões de estrelas. Os pesquisadores pensam que as anãs foram "engolidas" e rasgadas pela gravidade de galáxias muito maiores. O buraco negro da anã ultracompacta é o remanescente do seu anteriormente gigante tamanho. Os resultados alteram o modo como os astrônomos podem resolver o problema da formação e evolução galáctica ao longo do tempo.

"Sabemos que as galáxias se fundem e combinam, é assim que evoluem. A Via Láctea está, neste preciso momento, devorando galáxias menores," salienta Seth. "O nosso quadro geral de como as galáxias se formam é que galáxias pequenas fundem-se para formar galáxias maiores. Mas a nossa imagem está realmente incompleta. As galáxias anãs ultracompactas fornecem-nos um cronograma mais longo que podemos usar para ver o que aconteceu no passado."

O estudo foi publicado ontem na revista The Astrophysical Journal.

Fonte: University of Utah

segunda-feira, 17 de abril de 2017

Descoberta grande mancha fria em Júpiter

Tão grande que pode engolir várias Terras, a Grande Mancha Vermelha de Júpiter é uma tempestade gigantesca que existe há séculos, com ventos que ultrapassam os 600 km por hora.

grande mancha fria em Júpiter

© ESO/T. Stallard (grande mancha fria em Júpiter)

No entanto, esta mancha tem uma rival: uma segunda Grande Mancha no planeta Júpiter, desta vez uma mancha fria.

Os astrnomos descobriram nas regiões polares do planeta uma mancha escura na atmosfera superior, cerca de 200 ºC mais fria do que o meio que a circunda. Chamada “Grande Mancha Fria”, esta intrigante estrutura é comparável em termos de tamanho à Grande Mancha Vermelha, com 24.000 km de um lado ao outro e 12.000 km de altura.

Os dados obtidos ao longo de 15 anos mostram que a Grande Mancha Fria é muito mais volátil que a sua lenta prima. Esta mancha varia drasticamente, tanto em forma como em tamanho, em poucos dias ou semanas; no entanto nunca desaparece, mantendo-se sempre mais ou menos no mesmo local.

Pensa-se que a Grande Mancha Fria é causada pelas auroras poderosas do planeta, as quais liberam energia para a atmosfera sob a forma de calor, que circula em torno do planeta. Este fenômeno dá origem a uma região mais fria na atmosfera superior, o que faz da Grande Mancha Fria o primeiro sistema climático gerado por auroras alguma vez observado.

Fonte: ESO

sexta-feira, 14 de abril de 2017

Um membro distante e tênue do nosso Sistema Solar

Usando o ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array), os astrônomos revelaram detalhes extraordinários sobre um recém-descoberto e distante membro do nosso Sistema Solar, o corpo planetário 2014 UZ224, mais informalmente conhecido como DeeDee.

ilustração do corpo planetário DeeDee

© NRAO/Alexandra Angelich (ilustração do corpo planetário DeeDee)

A cerca de três vezes a distância atual de Plutão ao Sol, DeeDee é o segundo objeto transnetuniano (OTN) mais distante com uma órbita confirmada, superada apenas pelo planeta anão Éris. Os astrônomos estimam que existam dezenas de milhares destes corpos gelados no Sistema Solar exterior para além da órbita de Netuno.

Os novos dados do ALMA revelam, pela primeira vez, que DeeDee tem aproximadamente 635 km de diâmetro, cerca de dois-terços do diâmetro do planeta anão Ceres, o maior membro do cinturão de asteroides. Com este tamanho, DeeDee deverá ter massa suficiente para ser esférico, o critério necessário para que seja considerado um planeta anão, embora ainda tenha que receber esta designação oficial.

"Muito além de Plutão situa-se uma região surpreendentemente rica em corpos planetários. Alguns são muito pequenos, mas outros têm tamanhos que rivalizam com Plutão e que podem, possivelmente, até ser muito maiores," afirma David Gerdes, cientista da Universidade de Michigan. "Dado que estes objetos são tão distantes e tênues, é incrivelmente difícil detectá-los, quanto mais estudá-los em detalhe. O ALMA, no entanto, tem capacidades únicas que nos permitiram aprender detalhes excitantes sobre estes mundos distantes."

Atualmente, DeeDee está a aproximadamente 92 UA (unidades astronômicas) do Sol. Uma unidade astronômica é a distância média da Terra ao Sol, cerca de 150 milhões de quilômetros. A esta tremenda distância, DeeDee leva mais de 1.100 anos a completar uma órbita. A luz de DeeDee demora quase 13 horas para chegar à Terra. Sendo que o planeta Netuno está a 30 UA e o planeta anão Plutão está a 40 UA do Sol.

Gerdes e a sua equipe anunciaram a descoberta de DeeDee no outono de 2016. Descobriram-no usando o telescópio Blanco de 4 metros do Observatório Interamericano de Cerro Tololo, no Chile, como parte de observações do DES (Dark Energy Survey), um levantamento óptico de mais ou menos 12% do céu que procura compreender a força, ainda misteriosa, que está acelerando a expansão do Universo.

O levantamento DES produz vastas quantidades de imagens astronômicas, que fornecem aos astrônomos a oportunidade de também procurar por objetos do Sistema Solar distante. A pesquisa inicial, que inclui quase 15.000 imagens, identificou mais de 1,1 bilhões de objetos candidatos. A vasta maioria destes revelaram-se como estrelas de fundo e galáxias ainda mais distantes. No entanto, observou-se que uma pequena fração se movia lentamente através do céu ao longo de observações sucessivas, o sinal revelador de um OTN.

Um destes objetos foi identificado em 12 imagens separadas. Os astrônomos informalmente apelidaram-no de DeeDee, abreviatura de "Distant Dwarf" (anão distante).

Os dados ópticos do telescópio Blanco permitiram a medida da distância e das propriedades orbitais de DeeDee, mas não foi possível determinar o seu tamanho ou outras características físicas. Era possível que DeeDee fosse um membro relativamente pequeno do nosso Sistema Solar, contudo, reflexivo o suficiente para ser detectado da Terra. Ou poderia ser invulgarmente grande e escuro, refletindo apenas uma pequena parte da fraca luz solar que lá chega; ambos os cenários produzem dados ópticos idênticos.

Tendo em conta que o ALMA observa o Universo frio e escuro, pode detectar o calor, sob a forma de radiação milimétrica, emitido naturalmente por objetos frios no espaço. A assinatura de calor de um objeto do Sistema Solar distante seria diretamente proporcional ao seu tamanho.

"Calculamos que este objeto seria incrivelmente frio, com apenas cerca de 30 Kelvin, um pouco acima do zero absoluto," comenta Gerdes.

Enquanto a luz visível refletida por DeeDee é apenas tão brilhante quanto uma vela vista a meio caminho até à Lua, o ALMA poderia rapidamente focar-se na assinatura de calor do corpo planetário e medir o seu brilho nos comprimentos de onda milimétricos.

Isto permitiu a determinação de que o objeto reflete apenas cerca de 13% da luz solar que o atinge.

Ao comparar estas observações do ALMA com os dados ópticos anteriores, os astrônomos obtiveram as informações necessárias para calcular o tamanho do objeto. "O ALMA captou-o com bastante facilidade," comenta Gerdes. "Fomos então capazes de resolver a ambiguidade que tínhamos com apenas os dados ópticos."

Objetos como DeeDee são restos cósmicos da formação do Sistema Solar. As suas órbitas e propriedades físicas revelam detalhes importantes sobre a formação dos planetas, incluindo a Terra.

Esta descoberta também é excitante porque mostra que é possível detectar objetos muito distantes e em movimento lento no nosso Sistema Solar. Os pesquisadores realçam que estas mesmas técnicas podem ser usadas para detectar o teórico "Planeta Nove" que poderá residir muito além de DeeDee e Éris.

"Ainda existem muitos novos mundos por descobrir no nosso quintal cósmico. "O Sistema Solar é um lugar rico e complicado," conclui Gerdes.

Um artigo foi publicado na revista The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: National Radio Astronomy Observatory

Exoplanetas do tamanho da Terra podem ser habitáveis

Com dois sóis no céu, Tatooine, o planeta natal de Luke Skywalker, da saga "Guerra das Estrelas", parece um mundo arenoso e desértico.

ilustração de planeta hipotético em torno do sistema binário Kepler-35

© NASA/JPL-Caltech (ilustração de planeta hipotético em torno do sistema binário Kepler-35)

Na vida real, graças a observatórios como o telescópio espacial Kepler da NASA, sabemos que os sistemas binários podem, de fato, suportar planetas, embora os planetas descobertos, até agora, em estrelas duplas, sejam grandes e gasosos. Os cientistas perguntam-se: se um planeta do tamanho da Terra orbitar dois sóis, poderá suportar vida?

Ao que parece, um tal planeta poderá ser bastante hospitaleiro se localizado à distância ideal das suas duas estrelas e não teria, necessariamente, desertos. De acordo com um novo estudo, numa gama particular de distâncias em relação a duas estrelas progenitoras parecidas com o Sol, um planeta coberto por água permaneceria habitável e manteria a sua água durante muito tempo.

"Isto significa que os sistemas binários do tipo aqui estudado são excelentes candidatos a hospedar planetas habitáveis, apesar das grandes variações na quantidade de luz estelar que estes planetas hipotéticos receberiam," comenta Max Popp, pesquisador associado da Universidade de Princeton em New Jersey, EUA, e do Instituto Max Planck de Meteorologia em Hamburgo, Alemanha.

Popp e Siegfried Eggl, pesquisador pós-doutorado do Jet Propulsion Laboratory (JPL) da NASA em Pasadena, no estado norte-americano da Califórnia, criaram um modelo para um planeta no sistema Kepler-35. Na realidade, o par estelar Kepler-35A e B abrigam um planeta chamado Kepler-35b, um planeta gigante com cerca de oito vezes o tamanho da Terra e uma órbita de 131,5 dias terrestres. Para o seu estudo, os cientistas ignoraram a influência gravitacional deste planeta e adicionaram um hipotético planeta coberto de água, do tamanho da Terra, em torno das estrelas Kepler-35A e B. Eles examinaram como o clima deste planeta se comportaria à medida que orbitava as duas estrelas com períodos entre 341 e 380 dias.

Na pesquisa exoplanetária, os cientistas falam de uma região chamada "zona habitável", a variedade de distâncias ao redor de uma estrela onde um planeta terrestre tem mais probabilidade de abrigar água líquida à sua superfície. Neste caso, dado que as duas estrelas estão em órbita uma da outra, a zona habitável depende da distância ao centro de massa que ambos os corpos estelares orbitam. Para tornar as coisas ainda mais complicadas, um planeta em torno de duas estrelas não viajaria num círculo; em vez disso, a sua órbita oscilaria através da interação gravitacional com as duas estrelas.

Popp e Eggl descobriram que na margem mais distante da zona habitável do sistema duplo Kepler-35, o hipotético planeta coberto de água teria muita variação em termos de temperaturas superficiais. Dado que um planeta frio teria apenas uma pequena fração de vapor de água na sua atmosfera, as temperaturas médias globais da superfície iriam subir e descer até 2º C ao longo de um ano.

"Isto é análogo a como, na Terra, climas áridos como desertos passam por grandes variações de temperatura do dia para a noite," explica Eggl. "A quantidade de água no ar faz uma grande diferença".

Mas, mais perto das estrelas, próximo do limite interior da zona habitável, as temperaturas médias globais da superfície, neste mesmo planeta, permaneceriam quase constantes. Isto porque uma maior quantidade de vapor de água seria capaz de persistir na atmosfera do planeta hipotético, que atua como um "buffer" para manter as condições superficiais confortáveis.

Tal como acontece nos sistemas com uma única estrela, um planeta para além da fronteira exterior da zona habitável dos seus dois sóis, acabaria eventualmente num chamado estado de "bola de neve", completamente coberto de gelo. Mais perto do que o limite interno da zona habitável, a atmosfera isolaria demais o planeta, criando um efeito estufa desenfreado e transformando o planeta num mundo parecido com Vênus, inóspito à vida como a conhecemos.

Outra característica do modelo climático deste estudo é que, em comparação com a Terra, um planeta coberto por água em torno de duas estrelas teria uma menor cobertura de nuvens. Isso significaria um céu mais limpo para a observação do pôr-do-Sol duplo nestes mundos exóticos.

O novo estudo foi publicado na revista Nature Communications.

Fonte: Jet Propulsion Laboratory

quinta-feira, 13 de abril de 2017

Descoberto possível gêmeo de Vênus ao redor de estrela anã

Usando o telescópio espacial Kepler da NASA, os astrônomos descobriram um planeta a 219 anos-luz de distância que parece ser um parente próximo de Vênus.

ilustração de um exoplaneta análogo de Vênus em torno de uma anã M

© Danielle Futselaar (ilustração de um exoplaneta análogo de Vênus em torno de uma anã M)

Este mundo recém-descoberto é apenas ligeiramente maior do que a Terra e orbita uma estrela de temperatura baixa chamada Kepler-1649 com um-quinto do diâmetro do nosso Sol.

O planeta abraça firmemente a sua estrela progenitora, completando uma órbita a cada 9 dias. Esta órbita íntima faz com que o fluxo de luz estelar que alcança o planeta seja 2,3 vezes maior do que o fluxo solar na Terra. Em comparação, o fluxo solar de Vênus é 1,9 vezes do que o valor terrestre.

A descoberta fornecerá mais informações sobre a natureza de exoplanetas em torno de anãs M, de longe o tipo mais comum de estrelas no Universo. Enquanto estas estrelas são mais vermelhas e mais tênues do que o Sol, as recentes descobertas exoplanetárias revelaram casos em que mundos tipo-Terra orbitam anãs M em órbitas que os colocam na zona habitável da estrela. Mas estes exoplanetas podem, inevitavelmente, não ser semelhantes à Terra, que tem um clima salubre. Podem ser análogos a Vênus, com atmosferas espessas e temperaturas escaldantes.

Segundo a cientista Isabel Angelo, do Instituto SETI, o estudo de planetas parecidos com Kepler-1649b, análogo de Vênus, "é cada vez mais importante para entender os limites das zonas habitáveis das anãs M."

"Existem vários fatores, como a variabilidade estelar e os efeitos de maré, que tornam estes exoplanetas diferentes de planetas do tamanho da Terra ao redor de estrelas parecidas com o Sol."

Diz-se que Vênus é um planeta irmão da Terra, mas, em muitos aspetos, não é um irmão próximo. Apesar de ter o mesmo tamanho que a Terra, e de estar apenas 40% mais próximo do Sol, a sua atmosfera e temperatura são extremamente diferentes.

Elisa Quintana, do Instituto SETI e do Goddard Space Flight Center da NASA, membro da equipe que descobriu Kepler-1649b, realça que "muitas pessoas estão focadas na descoberta de outras Terras. Mas os análogos de Vênus são igualmente importantes."

"Uma vez que estão prestes a sair novos telescópios, que nos permitirão estudar atmosferas, o foco tanto em análogos da Terra como em análogos de Vênus poderá ajudar-nos a decifrar porque é que, no nosso Sistema Solar, um permite com que a vida se desenvolva e o outro não, apesar de terem massas parecidas, densidades comparáveis, etc."

Fonte: SETI Institute

segunda-feira, 10 de abril de 2017

Misteriosa explosão cósmica

Cientistas descobriram um flash misterioso de raios X usando o observatório Chandra da NASA, obtendo a imagem mais profunda de raios X até o momento.

misteriosa fonte de raios X

© Chandra (misteriosa fonte de raios X)

A fonte de raios X está localizada em uma região do céu conhecida como Chandra Deep Field-South (CDF-S), que é mostrada no painel principal deste gráfico. Durante os 17 anos que o Chandra vem operando, o telescópio observou este campo muitas vezes, resultando em um tempo de exposição total de 7 milhões de segundos, ou seja, dois meses e meio. Nesta imagem do CDF-S, as cores representam diferentes bandas de energia de raios X, onde vermelho, verde e azul mostram, respectivamente, os raios X de baixa, média e alta energia que Chandra pode detectar.

A misteriosa fonte descoberta, mostrada na caixa de inserção, tem propriedades notáveis. Antes de outubro de 2014, esta fonte não foi detectada em raios X, mas então ela entrou em erupção e tornou-se pelo menos um fator de 1.000 mais brilhante em poucas horas. Após cerca de um dia, a fonte tinha desvanecida completamente abaixo da sensibilidade do Chandra.

Milhares de horas de dados obtidos pelos telescópios espaciais Hubble e Spitzer ajudaram a determinar que o evento surgiu de uma pequena galáxia distante a cerca de 10,7 bilhões de anos-luz da Terra. Por alguns minutos, a fonte de raios X produziu mil vezes mais energia do que todas as estrelas nesta galáxia.

Enquanto os cientistas pensam que esta fonte provavelmente vem de algum tipo de evento destrutivo, suas propriedades não correspondem a nenhum fenômeno conhecido. Isso significa que esta fonte pode ser de uma variedade que nunca foi vista antes.

Os pesquisadores, no entanto, têm algumas ideias sobre o que esta fonte poderia ser. Duas das três principais possibilidades de explicar a fonte de raios X invocam eventos de explosão de raios gama (GRB), que são explosões de jato desencadeadas pelo colapso de uma estrela massiva ou pela fusão de uma estrela de nêutrons com outra estrela de nêutrons ou um buraco negro. Se o jato está apontando para a Terra, uma explosão de raios gama é detectada. À medida que o jato se expande, perde energia e produz radiação mais fraca e isotrópica em raios X e outros comprimentos de onda.

As explicações possíveis para a fonte de raios X CDF-S, de acordo com os pesquisadores, são um GRB que não é apontado para Terra, ou um GRB que se encontra além da galáxia pequena. Uma terceira possibilidade é que um buraco negro de tamanho médio dilacerou uma estrela anã branca.

A misteriosa fonte de raios X não foi vista em nenhum outro momento durante os dois meses e meio de tempo de exposição que Chandra observou a região CDF-S. Além disso, não foram encontrados eventos semelhantes em observações de Chandra de outras partes do céu.

Esta fonte de raios X no CDF-S tem propriedades diferentes das fontes de raios X ainda inexplicáveis ​​descobertas nas galáxias elípticas NGC 5128 e NGC 4636 por Jimmy Irwin e colaboradores. Em particular, a fonte CDF-S provavelmente está associada com a destruição completa de uma estrela de nêutrons ou anã branca e é aproximadamente 100.000 vezes mais luminosa em raios X. Ela também está localizada em uma galáxia hospedeira muito menor e mais jovem, e só é detectada durante uma única explosão de várias horas.

Pesquisas adicionais altamente direcionadas através do arquivo do Chandra e as do satélite XMM-Newton da ESA e da Swift da NASA podem revelar mais exemplos deste tipo de objeto variável que até agora passaram despercebidos. Futuras observações de raios X pelo Chandra e outros telescópios de raios X também podem revelar o mesmo fenômeno de outros objetos.

Um artigo que descreve este resultado será publicada na edição de junho de 2017 do periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics

domingo, 9 de abril de 2017

Descobertos dois novos radiantes nos céus austrais

O dia 20 de março de 2017 se torna mais uma data importante para a ciência no Brasil. O Meteor Data Center, órgão ligado à União Astronômica Internacional (IAU) incluiu, pela primeira vez na sua lista geral de chuvas de meteoros, duas descobertas feitas por brasileiros.

composição das órbitas dos meteoros do radiante Epsilon Gruids

 © BRAMON (composição das órbitas dos meteoros do radiante Epsilon Gruids)

composição das órbitas dos meteoros do radiante August Caelids

 © BRAMON (composição das órbitas dos meteoros do radiante August Caelids)

São as recém batizadas Epsilon Gruids (EGR) e a August Caelids (ACD), localizadas nas constelações do Grou e do Cinzel, respectivamente. O Sol (em amarelo) pode ser visto no centro das imagens. A Terra (em azul) está á esquerda do Sol no radiante Epsilon Gruids e está á direita do Sol no radiante August Caelids.

As descobertas couberam à Rede Brasileira de Observação de Meteoros (BRAMON) que desde 2014 tem realizado um trabalho de monitorar os céus do país, registrando os meteoros que surgem. Atualmente a rede conta com 82 estações de monitoramento, distribuídas em 19 estados do Brasil. E ao longo deste tempo de atuação, possui em seu banco de dados, vídeos de mais de 86.000 meteoros. Assim, se firma como uma das maiores redes de monitoramento do mundo e uma das poucas do hemisfério sul da Terra.

O planeta Terra, em seu giro anual ao redor do Sol encontra, algumas vezes, pequenas partículas no espaço. E toda vez que estas partículas entram na atmosfera e queimam, formam os rastros luminosos dos meteoros. Todos nós já vimos as chamadas “estrelas cadentes” e, ao longo do ano, algumas datas são especialmente favoráveis aos seus avistamentos. São as noites onde ocorrem as chuvas de meteoros.

A União Astronômica Internacional mantém o catálogo atualizado de todas estas “chuvas”, com as datas e as posições no céu em que são visíveis. A lista possui quase 800 grupos de meteoros.

Um dos grandes interesses da BRAMON é registrar um mesmo meteoro sob vários pontos de vista. Isto é, ter vídeos de um mesmo meteoro gravados em cidades diferentes. Isto possibilita determinar a órbita que o referido meteoro possuía antes de encontrar a Terra pelo caminho.

Assim, em três anos de operação, foram determinadas 4205 órbitas. A grande maioria de meteoros participantes de “chuvas” já catalogadas. Outros, num primeiro olhar, pareciam apenas vir de pontos aleatórios do céu.

Quando os registros do banco de dados completaram três anos, foi hora de iniciar uma pesquisa para saber se, dentre os meteoros que pareciam vagar aleatoriamente pelo Sistema Solar, existiria alguma nova família a ser descoberta.

Os trabalhos tiveram início no final de 2016. Os pesquisadores Carlos Di Pietro (São Paulo – SP) e Marcelo Zurita (João Pessoa – PB) observaram que um grupo de meteoros pareciam surgir de um único ponto no ceú, bem na constelação do Grou. Mas confirmar uma nova chuva de meteoros não é tarefa fácil, uma série de testes devem ser empregados e a matemática envolvida não é das mais simples.

No final de janeiro de 2017, outro integrante da BRAMON, Lauriston Trindade (Maranguape – CE) integrou o grupo de pesquisa com objetivo de executar os cálculos e conseguir a validação da descoberta. “Foram centenas de cálculos, envolvendo milhares de meteoros. Foram dezenas de leituras de artigos para o entendimento dos cálculos, ferramentas matemáticas tiveram que ser totalmente desenvolvidas para facilitar o trabalho. Foi um mês de trabalho dedicado. E para a alegria de todos, não só foi possível validar o primeiro grupo descoberto como acabei encontrando um segundo grupo válido. Assim, a BRAMON estava prestes a conseguir a descoberta de duas chuvas de meteoros.

De posse dos dados orbitais das duas “chuvas” o Meteor Data Center foi comunicado, no último dia 9 de março, sendo que em 20 de março, as duas novas chuvas descobertas pela BRAMON foram incluídas na lista oficial da União Astronômica Internacional. Tanto a Epsilon Gruids quanto a August Caelids foram inclusas com o status “Working pro tempore”. Uma vez que são “chuvas” com baixa taxa de ocorrência de meteoros, e ainda carecem de mais observações, que agora serão feitas por outros observadores espalhados pelo mundo.

Descobertas desta natureza possuem muitos significados para a comunidade científica, pois mostra o poder de uma rede de pesquisa voluntária e colaborativa, formada por cidadãos comuns que tem interesse em produção e divulgação científica.

Fonte: BRAMON

sábado, 8 de abril de 2017

Detectada atmosfera ao redor de exoplaneta parecido com a Terra

Astrônomos detectaram uma atmosfera em torno da super-Terra GJ 1132b.

ilustração do exoplaneta GJ 1132b e sua estrela

© Max Planck Institute for Astronomy (ilustração do exoplaneta GJ 1132b e sua estrela)

Este achado marca a primeira detecção de uma atmosfera ao redor de um exoplaneta parecido com a Terra e, portanto, é um passo importante no caminho para a detecção de vida para além do nosso Sistema Solar. A equipe que fez a descoberta, liderada pelo Dr. John Southworth da Universidade Keele, usou o telescópio de 2,2 metros do ESO/MPG no Chile para obter imagens da estrela progenitora GJ 1132. Foram capazes de medir a ligeira diminuição de brilho à medida que o planeta e a sua atmosfera absorvem luz estelar enquanto transita (passa em frente) da estrela.

O Dr. John Southworth explica: "embora esta não seja a detecção de vida em outro planeta, é um passo importante na direção certa: esta detecção de uma atmosfera ao redor da super-Terra GJ 1132b marca a primeira vez que foi descoberta uma atmosfera num exoplaneta parecido com a Terra."

A estratégia atual dos astrônomos, para encontrar vida em outro planeta, é detectar a composição química da atmosfera deste planeta, procurando desequilíbrios químicos que podem ser provocados por organismos vivos. No caso da nossa própria Terra, a presença de grandes quantidades de oxigênio é um sinal de vida.

Até estes achados pela equipe do Dr. Southworth, todas as detecções anteriores de atmosferas exoplanetárias envolviam gigantes gasosos e quentes parecidos com Júpiter.

O Dr. Southworth diz que apesar de estarmos ainda muito longe de detectar vida em exoplanetas, esta descoberta é o primeiro passo:

"Com esta pesquisa, demos o primeiro passo no estudo das atmosferas de planetas menores e parecidos com a Terra. Nós simulamos uma variedade de atmosferas possíveis para este planeta, descobrindo que aquelas ricas em água e/ou metano explicariam as observações de GJ 1132b. O planeta é significativamente mais quente e um pouco maior do que a Terra, de modo que uma possibilidade é que poderá ser um 'mundo de água' com uma atmosfera de vapor quente."

O planeta em questão, GJ 1132b, orbita a estrela de massa muito baixa GJ 1132 na direção da constelação do hemisfério sul, Vela, a uma distância de 39 anos-luz da Terra. O sistema foi estudado pela equipe do Dr. John Southworth (Universidade Keele, Reino Unido) e por Luigi Mancini (Universidade de Roma Tor Vergata), e inclui pesquisadores do Instituto Max Planck para Astronomia e da Universidade de Cambridge.

O instrumento GROND acoplado ao telescópio de 2,2 metros do ESO/MPG foi utilizado para observar o planeta em sete diferentes bandas de comprimento de onda, simultaneamente, abrangendo o óptico e o infravermelho próximo. Dado que GJ 1132b é um planeta de trânsito, passa diretamente entre a Terra e a sua estrela hospedeira a cada 1,6 dias, bloqueando uma pequena fração da sua luz. A partir da quantidade de luz perdida, é possível deduzir o tamanho do planeta; neste caso, tem apenas 1,4 vezes o tamanho da Terra.

Crucialmente, as novas observações mostraram que o planeta era maior numa das sete bandas de comprimento de onda. Isto sugere a presença de uma atmosfera opaca a esta radiação em particular (fazendo com que o planeta pareça maior), mas transparente a todos os outros.

A descoberta desta atmosfera é encorajadora. As estrelas de massa muito baixa são extremamente comuns (muito mais do que estrelas parecidas com o Sol), e são conhecidas por hospedar muitos planetas pequenos. Mas também mostram muita atividade magnética, produzindo níveis muito altos de raios X e raios ultravioleta, que podem evaporar as atmosferas dos planetas. No entanto, as propriedades do GJ 1132b mostram que sua atmosfera pode suportar durante bilhões de anos sem ser destruída. Dado o grande número de estrelas de massa muito baixa e de planetas, isto pode significar que as condições adequadas para a vida são comuns no Universo.

Esta descoberta torna o GJ 1132b um dos alvos de maior prioridade para um estudo mais aprofundado pelas atuais instalações, como o telescópio espacial Hubble e o VLT do ESO, bem como pelo telescópio espacial James Webb, com lançamento previsto para o ano que vem.

Este trabalho intitulado "Detection of the atmosphere of the 1,6 Earth mass exoplanet GJ 1132B" foi publicado no periódico Astronomical Journal.

Fonte: Max Planck Institute for Astronomy

sexta-feira, 7 de abril de 2017

O ALMA observa fogos de artifícios estelares

As explosões estelares são normalmente associadas a supernovas, as espetaculares mortes das estrelas. No entanto, novas observações do ALMA forneceram informações sobre explosões na outra ponta do ciclo de vida estelar, o nascimento das estrelas.

explosão estelar em Órion

© ALMA/J. Bally/H. Drass (explosão estelar em Órion)

A imagem de fundo inclui imagens ópticas e no infravermelho próximo obtidas pelo telescópio Gemini South e pelo Very Large Telescope do ESO. O famoso aglomerado do Trapézio, composto por estrelas quentes e jovens, aparece na parte de baixo da imagem. Os dados do ALMA não cobrem toda a imagem mostrada aqui.

Astrônomos captaram estas imagens quando exploravam os restos, parecidos com fogos de artifício, do nascimento de um grupo de estrelas massivas, demonstrando assim que a formação estelar pode ser também um processo violento e explosivo.

A 1.350 anos-luz de distância na constelação de Órion, situa-se uma fábrica de estrelas densa e ativa chamada Nuvem Molecular de Orion 1 (OMC-1), que faz parte do mesmo complexo que a famosa Nebulosa de Órion. As estrelas nascem quando nuvens de gás, com centenas de vezes a massa do Sol, colapsam sob a sua própria gravidade. Nas regiões mais densas, as protoestrelas acendem-se e começam a vaguear sem rumo. Ao longo do tempo, algumas estrelas “caem” em direção a um centro de gravidade comum, geralmente dominado por uma protoestrela particularmente grande; e se as estrelas sofrem encontros próximos antes de escapar da sua maternidade estelar, podem então ocorrer interações violentas.

Há cerca de 100.000 anos, várias protoestrelas começaram a se formar no interior da OMC-1. A gravidade fez com que elas se aproximassem umas das outras com velocidades cada vez maiores até que, há cerca de 500 anos, duas delas se chocaram. Os astrônomos não sabem se estas estrelas apenas se tocaram ou colidiram completamente, mas em qualquer dos casos o fenômeno deu origem a uma poderosa erupção que lançou para o espaço interestelar várias protoestrelas próximas e centenas de correntes colossais de gás e poeira, deslocando-se a velocidades de mais de 150 quilômetros por segundo. A interação cataclísmica liberou tanta energia como a que o nosso Sol emite durante 10 milhões de anos.

Agora, uma equipe de astrônomos liderada por John Bally (Universidade do Colorado, EUA) utilizou o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) para observar o coração desta nuvem. A equipe descobriu um resto do nascimento explosivo deste grupo de estrelas massivas que parece uma versão cósmica de fogos de artifício, com enormes correntes de matéria se deslocando em todas as direções.

Acredita-se que tais explosões são relativamente curtas, e que os restos observados pelo ALMA não duram mais que alguns séculos. No entanto, embora breves, tais explosões de protoestrelas podem ser relativamente comuns. Ao destruírem a sua nuvem progenitora, estes eventos poderão ajudar a regular a taxa de formação estelar nestas nuvens moleculares gigantes.

Indícios da natureza explosiva dos restos da OMC-1 foram inicialmente observados em 2009 pelo Submillimeter Array no Havaí. Bally e a sua equipe também observaram este objeto no infravermelho próximo com o telescópio Gemini South no Chile, revelando uma estrutura notável de correntes de matéria, com dimensões de quase um ano-luz de ponta a ponta.

As novas imagens do ALMA mostram a natureza explosiva em alta resolução, revelando detalhes importantes sobre a distribuição e os movimentos de alta velocidade do gás de monóxido de carbono (CO) situado no interior das correntes de material. Isso ajudará os astrônomos a compreender melhor a força por detrás da explosão e o impacto que tais eventos podem ter na formação estelar na Galáxia.

Um artigo foi publicado no periódico Astrophysical Journal.

Fonte: ESO

Descrito novo modelo para formação do cinturão de asteroides

Em 1801, quando procurava um planeta que acreditava existir entre as órbitas de Marte e Júpiter, o padre e astrônomo italiano Giuseppe Piazzi (1746 – 1826) acabou descobrindo Ceres, um planeta-anão de quase mil quilômetros de diâmetro.

ilustração de asteroides entre as órbitas de Marte e Júpiter

© NASA (ilustração de asteroides entre as órbitas de Marte e Júpiter)

Ceres é o maior objeto do chamado cinturão de asteroides, mas está longe de ser o único. Estima-se que o cinturão seja formado por mais de 1 milhão deles. Há mais de 200 anos os astrônomos quebram a cabeça para descobrir como foi que o cinturão de asteroides se formou e por que não existe nenhum planeta entre Marte e Júpiter.

Apesar da enorme quantidade de dados reunida em dois séculos de pesquisas sobre o cinturão, inclusive graças a diversas sondas espaciais que foram enviadas até lá, ainda não se chegou a um consenso sobre como ele teria se formado.

Novas hipóteses continuam sendo formuladas, como é o modelo denominado de “Caótico”. Seus autores são os astrônomos brasileiros André Izidoro e Othon Winter, do Grupo de Dinâmica Orbital e Planetologia da Universidade Estadual Paulista (UNESP), campus de Guaratinguetá, em colaboração com colegas da França e dos Estados Unidos. 

Os planetas do Sistema Solar são divididos em duas categorias, os rochosos ou terrestres (Mercúrio, Vênus, Terra e Marte), que ficam no Sistema Solar interno, e os gigantes gasosos (Júpiter, Saturno, Urano e Netuno) do Sistema Solar externo.

Entre os dois grupos está o cinturão principal de asteroides. Suas centenas de milhares de objetos se distribuem por uma ampla faixa orbital que vai de aproximadamente 1,8 a 3,2 unidades astronômicas do Sol (uma unidade astronômica equivale à distância média do Sol à Terra).

“Os gigantes gasosos, como Júpiter e Saturno, foram os primeiros a se formar, quando o Sistema Solar contava com no máximo 10 milhões de anos”, disse Izidoro, cuja pesquisa “Formação e dinâmica planetária: do Sistema Solar a exoplanetas” tem apoio da FAPESP por meio do Programa Jovens Pesquisadores em Centros Emergentes.

Segundo ele, os gigantes gasosos se formaram a partir da acreção, ou seja, do acúmulo do gás da nebulosa solar que envolvia o protossistema solar. Esse mesmo gás é parte daquele que serviu de matéria-prima para a formação e ignição do Sol.

A Terra se formou quando não havia mais gás à disposição, pois toda matéria da nebulosa havia sido tragada pelo Sol ou pelos gigantes gasosos, e o que não fora se dissipou ou então foi expelido para longe pela intensa radiação do Sol recém-nascido. “Estima-se que a Terra tenha se formado quando o Sol tinha entre 30 e 150 milhões de anos. O cinturão de asteroides se formou mais cedo do que a Terra, mas os asteroides só atingiram a distribuição atual ao longo da história do Sistema Solar”, disse Izidoro.

“Para explicar o modelo Caótico é preciso primeiro falar sobre o principal modelo atual de formação do Sistema Solar, o Grand Tack”, disse Izidoro. O nome dessa teoria é inspirado em uma manobra náutica chamada “cambada”, que consiste em mudar a direção de um barco colocando a proa contra o vento.

Pelo modelo Grand Tack, durante a formação de Júpiter, o planeta teria migrado da sua órbita original a 3,5 unidades astronômicas do Sol até cerca de 1,5. No entanto, assim como migrara para perto do Sol, o planeta Júpiter, em seguida, realizou o caminho contrário. Isso ocorreu graças a Saturno, o segundo maior planeta do Sistema Solar.

Conforme Saturno incorporava gás e crescia, ele também migrava em direção ao Sol. Júpiter e Saturno teriam dado uma “cambada” assim que Saturno encontrou Júpiter no caminho de aproximação do Sol.

Esse movimento de ida e volta de Júpiter e Saturno, de acordo com o Grand Tack, teve duas consequências: uma para Marte e a outra para a formação do cinturão de asteroides.

No caso marciano, o “limpador” planetário no qual Júpiter (e Saturno) se convertera removeu a maior parte da matéria-prima disponível desde a órbita de Marte até o cinturão de asteroides. É por isso que Marte, ao se formar mais tarde, acumularia material suficiente para atingir apenas um décimo da massa da Terra.

Já no caso do cinturão de asteroides, a influência gravitacional de Júpiter trouxe consequências mais drásticas. Somente uma pequena fração da matéria original sobreviveu na região do cinturão de asteroides, uma quantia insuficiente para formar um planeta, mas consistente com o que é observado hoje. Além disso, a distribuição dos asteroides nesse modelo é bastante similar àquela dos asteroides reais.

Ao observar as nebulosas de protossistemas solares na Via Láctea, os astrônomos verificam as condições pelas quais planetas gigantes se formam.

“O Grand Tack é muito aceito, é bem sólido e encontra respaldo em observações astronômicas. Mas isso não quer dizer que esteja correto, nem que o cinturão de asteroides se formou da forma por ele prevista”, disse Izidoro.

Winter concorda. “O Grand Tack não é o único modelo que explica a formação do cinturão de asteroides. O nosso modelo Caótico também é viável”, disse o professor titular do Departamento de Matemática da Faculdade de Engenharia da Unesp, coordenador do Projeto Temático "Dinâmica Orbital de Pequenos Corpos".

A diferença dos dois modelos parte de uma variável básica: a quantidade de matéria-prima disponível na região de Marte e do cinturão de asteroides. O Grand Tack parte da premissa de que havia muita matéria nessas regiões e que essa matéria foi removida por Júpiter e Saturno durante uma dramática fase de migração.

Já o modelo Caótico desenvolvido por Izidoro e Winter parte da premissa de que quase não havia matéria naquelas regiões. Tal hipótese prescinde de uma migração tão intensa de Júpiter em direção ao Sol, pois assume já de início que quase não havia matéria ali.

Estudos astronômicos são conduzidos tanto a partir de observações astronômicas como de simulações computacionais. Essas últimas são feitas ao compilar e rodar programas que simulam o comportamento dos corpos celestes que se quer estudar de acordo com as leis físicas e as variáveis que se quer testar.

“Nos estudos astronômicos, são realizadas dezenas ou até centenas de simulações diferentes. “No entanto, todas elas forneceram resultados insatisfatórios, que não reproduziam um Sistema Solar tal qual o observamos. Todas, menos uma.”

O único resultado positivo do modelo Caótico, aquele que condiz com o Sistema Solar que observamos, foi obtido por acaso. Isso aconteceu quando, nas variáveis da simulação, as órbitas de Júpiter e Saturno foram levemente alteradas, mas mantidas em uma mesma ressonância.

Dois planetas estão em ressonância quando suas órbitas estão sincronizadas à razão de números inteiros, como 1, 2, 3, 4 etc. Nesse caso específico, a configuração era tal que, para cada órbita de Saturno, Júpiter descrevia praticamente, mas não exatamente, duas voltas completas em torno do Sol. A simulação previa uma pequena vibração nas órbitas de Júpiter e Saturno.

“A vibração era mínima, incapaz de retirar os planetas do estado de ressonância, porém suficiente para alterar o equilíbrio do sistema. Foi aí que emergiu o caos que dá nome ao modelo”, disse Winter.

Em vez de a simulação calcular as órbitas de Júpiter e de Saturno como elipses perfeitas, os planetas descreveriam órbitas minimamente diferentes umas das outras, tanto na forma da elipse quanto na sua oscilação em relação ao plano do Sistema Solar. Essa condição mínima foi suficiente para alterar todo o comportamento dos asteroides no cinturão principal.

“A diferença entre o resultado dessa simulação onde Júpiter e Saturno tinham órbitas caóticas e daquelas onde não tinham foi realmente impressionante”, disse Izidoro.

“A simulação resultou em um Sistema Solar interior com Marte pequeno, com massa equivalente àquela que ele de fato tem, e um cinturão de asteroides com distribuição de corpos muito semelhante àquela observada. No nosso modelo, a distribuição dos asteroides atingiu o seu status atual em algum momento durante a infância do Sistema Solar, ou seja, durante os seus primeiros 700 milhões de anos”, disse Izidoro.

“No modelo Caótico, Júpiter e Saturno provavelmente migraram um pouco em direção ao Sol, mas em uma intensidade muito menor do que aquela do modelo Grand Tack. Na nossa concepção, Júpiter e Saturno nunca adentraram 5,2 unidades astronômicas”, disse.

O novo modelo desenvolvido pelos brasileiros e que descreve a formação do cinturão de asteroides é plausível e reproduz um Sistema Solar como o conhecemos. Mas seria essa hipótese a resposta definitiva para a questão?

“Ainda não podemos afirmar isso. Os dois modelos são a priori válidos, tanto o Grand Tack como o Caótico. Mas qualquer um deles pode ser descartado a qualquer momento, se algum deles falhar em reproduzir resultados condizentes com a realidade que observamos.

“Nosso modelo tem certas vantagens em relação ao Grand Tack, que é um modelo muito bonito, porém muito complexo. Para funcionar, ele exige que o disco do Sistema Solar satisfaça algumas condições peculiares. Já o nosso modelo Caótico é pautado em situações mais comuns, que foram observadas, como o fato de os planetas entrarem em ressonância”, disse Winter.

“O modelo Caótico é mais simples. E, na ciência, geralmente as respostas mais simples são aquelas que mais frequentemente conduzem à solução de um problema”, disse.

O artigo intitulado The asteroid belt as a relic from a chaotic early Solar System foi publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: FAPESP (Agência)