A enigmática energia escura, que se acredita responder por 68% da composição do Universo, pode não existir, de acordo com uma equipe húngaro-americana.
© István Csabai (imagem de um dos quadros da simulação feita durante o estudo)
Na imagem acima, um quadro da animação mostra a expansão do Universo: no painel superior esquerdo, em vermelho, na cosmologia padrão ‘Lambda Cold Dark Matter’, que inclui a energia escura; no painel superior do meio, em azul, o novo Modelo AvERA, que considera a estrutura do Universo e elimina a necessidade de energia escura; no painel superior direito, verde, na cosmologia Einstein-de-Sitter, o modelo original sem energia escura. O painel na parte inferior mostra o aumento do “fator de escala” (uma indicação do tamanho) em função do tempo, onde 1Gya representa bilhões de anos. O crescimento da estrutura também pode ser visto nos painéis superiores. Um ponto representa aproximadamente um aglomerado de galáxias. As unidades de escala estão em Megaparsecs (Mpc). Um parsec é equivalente a 3,26156 anos-luz ou 3,08568×1016 metros.
Os pesquisadores acreditam que os modelos matemáticos do Universo não levam em conta sua estrutura mutável, mas que, uma vez que isso é feito, a necessidade de energia escura desaparece.
Nosso Universo foi formado no Big Bang, há 13,8 bilhões de anos, e tem se expandido desde então. A prova chave desta expansão é a lei de Hubble, baseada em observações das galáxias, onde a velocidade com que a galáxia se afasta de nós é proporcional à sua distância.
Astrônomos medem esta velocidade de recessão observando linhas no espectro eletromagnético de uma galáxia, que se deslocam mais para o vermelho quanto mais rápido a galáxia está se afastando. A partir da década de 1920, o mapeamento das velocidades das galáxias levou os cientistas a concluírem que o Universo está se expandindo, e que ele se iniciou como um minúsculo ponto.
Na segunda metade do século 20, astrônomos encontraram evidências de uma matéria “escura” invisível ao observar que algo a mais era necessário para explicar o movimento das estrelas dentro das galáxias. Hoje, acredita-se que a matéria escura equivale a 27% do conteúdo do Universo, sendo que apenas 5% representa a matéria ordinária.
Observações de explosões de estrelas anãs brancas em sistemas binários, chamadas de supernova do tipo Ia, nos anos 1990 levaram os cientistas à conclusão de que um terceiro componente, a energia escura, constituía 68% do cosmos e seria responsável por conduzir uma aceleração na expansão do Universo.
No novo trabalho, os pesquisadores, liderados pelo doutorando Gábor Rácz, da Universidade Eötvös Loránd, na Hungria, questionam a existência da energia escura e sugerem uma explicação alternativa. Eles argumentam que os modelos convencionais de cosmologia, que estuda a origem e evolução do Universo, dependem de aproximações que ignoram sua estrutura e nas quais se assume que a matéria possui densidade uniforme.
“As equações da relatividade geral de Einstein, que descrevem a expansão do Universo, são tão complexas matematicamente que, durante cem anos, não foram encontradas soluções que levassem em conta o efeito das estruturas cósmicas. Sabemos através de observações bastante precisas de supernovas que a expansão do Universo está se acelerando, mas, ao mesmo tempo, dependemos de aproximações grosseiras das equações de Einstein, as quais podem introduzir sérios efeitos colaterais, como a necessidade de energia escura nos modelos desenhados para se ajustarem aos dados observacionais,” explica László Dobos, também da Universidade Eötvös Loránd.
Na prática, matéria normal e matéria escura parecem preencher o Universo com uma estrutura parecida com espuma, onde galáxias estão localizadas nas finas paredes entre bolhas, e estão agrupadas em superaglomerados. Em contrapartida, o interior das bolhas está quase vazio de ambos os tipos de matéria.
Utilizando uma simulação por computador para modelar o efeito da gravidade na distribuição de milhões de partículas de matéria escura, os cientistas reconstruíram a evolução do Universo, incluindo os agrupamentos iniciais de matéria, e a formação de estruturas em larga escala.
Ao contrário das simulações convencionais, com uma expansão suave do Universo, levar em conta a estrutura conduziu a um modelo no qual diferentes regiões do cosmos se expandem em diferentes ritmos. A taxa média de expansão, porém, é consistente com as presentes observações, o que sugere uma aceleração, no geral.
“A teoria da relatividade geral é fundamental para entender a forma como o Universo evolui. Não questionamos a sua validade; questionamos a validade das soluções aproximadas. Nossas descobertas baseiam-se em uma conjectura matemática que permite a expansão diferencial do espaço, consistente com a relatividade geral, e mostram como a formação de estruturas de matéria complexas afetam esta expansão. Anteriormente, estas questões haviam sido descartadas, mas levá-las em conta pode explicar a aceleração sem a necessidade de energia escura,” completa Dobos.
Se esta descoberta se sustentar, pode ter um impacto significante nos modelos do Universo e na direção das pesquisas em física. Nos últimos 20 anos, astrônomos e físicos teóricos têm especulado sobre a natureza da energia escura, mas ela continua um mistério. Com o novo modelo, a equipe espera ao menos dar início a um animado debate.
A equipe publicou seus resultados num artigo na Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.
Fonte: Scientific American
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