Graças à combinação de dados do telescópio espacial Hubble e da missão Gaia, astrônomos da Universidade de Groningen conseguiram medir o movimento próprio de quinze estrelas da Galáxia Anã do Escultor, a primeira medição do gênero para uma galáxia pequena além da Via Láctea.
© ESO (Galáxia Anã do Escultor)
Os resultados mostram uma preferência inesperada na direção do movimento, o que sugere que o modelo teórico padrão usado para descrever o movimento das estrelas e do halo de matéria escura em outras galáxias pode ser inválido.
Há muito que os astrônomos são capazes de medir o movimento das estrelas na nossa "linha de visão" através do desvio para o vermelho, provocado pelo efeito Doppler. No entanto, a medição do movimento no plano do céu, chamado "movimento próprio", é muito mais difícil. Para detectar este movimento são necessárias múltiplas medições muito precisas da posição de uma estrela ao longo de vários anos. Devido à imensa distância que nos separa, muitas estrelas da nossa Galáxia têm movimentos extremamente pequenos a partir do ponto de vista do céu da Terra. Para estrelas fora da nossa Galáxia, este movimento é ainda menor.
A missão Gaia da ESA, atualmente em andamento, está concebida para medir a posição exata de mais de um bilhões de estrelas, principalmente na Via Láctea. "Mas o Gaia também mede posições estelares em galáxias próximas," explica o astrônomo Davide Massari da Universidade de Groningen. "E para algumas destas estrelas, também temos a localização medida pelo telescópio espacial Hubble, há cerca de 12 anos."
Massari e colegas do Instituto Astronômico Kapteyn propuseram combinar ambos os conjuntos de dados. Esta não é uma tarefa fácil, pois ambas as missões medem a posição de maneiras diferentes. Ao usar galáxias de fundo que não mudaram de posição nos doze anos, a equipe foi capaz de combinar os dados. "Tivemos que ter muito cuidado para excluir quaisquer erros sistemáticos," comenta Massari. Mas foram bem-sucedidos e das 120 estrelas medidas, tanto pelo Hubble como pelo Gaia na Galáxia Anã do Escultor, descobriram quinze observações emparelhadas extremamente precisas.
"Em seguida, determinamos como as estrelas se movem nesta galáxia pequena, que é quantificado pelo parâmetro de anisotropia. Se alto, as estrelas têm trajetórias muito alongadas, se muito pequeno, têm órbitas circulares. Com este conhecimento conseguimos determinar as propriedades do halo de matéria escura no qual a galáxia está embebida. Mas o nosso valor medido foi muito surpreendente, não é permitido pelos modelos padrão. Isto significa que alguns dos pressupostos em que estes modelos se baseiam devem estar errados."
Uma possível explicação é que o modelo assume que todas as estrelas pertencem a uma única população. Mas nós sabemos que a Anã do Escultor é uma galáxia complexa e tem pelo menos dois componentes estelares (um mais compacto e outro mais estendido). Na verdade, existe um modelo que inclui este parâmetro e a anisotropia que Massari e colegas observaram é, de fato, por ele prevista, caso a maioria das estrelas medidas pertençam ao componente mais compacto.
O movimento das estrelas depende principalmente do halo invisível de matéria escura em torno de uma galáxia. É por isso que é tão importante determinar o parâmetro de anisotropia, pois pode ser usado para determinar a distribuição da matéria escura nesta galáxia, que por sua vez depende da natureza da própria matéria escura. "Os nossos resultados mostram que, por meio dos dados do Gaia, combinados com outros conjuntos de dados, podemos medir o movimento próprio de estrelas fora da Via Láctea e assim melhorar os modelos que descrevem a forma como a matéria escura está distribuída nestas outras galáxias."
Um segundo resultado importante é uma medição mais precisa da órbita da Galáxia Anã do Escultor em torno da Via Láctea. "Esta órbita é muito maior do que o esperado. Anteriormente, pensava-se que a atual forma esferoidal era, em parte, o resultado de algumas passagens próximas, mas as nossas medições mostram que não é o caso." Massari e a equipe do Instituto Kapteyn estão ansiosos por ampliar a sua amostra de estrelas fora da Via Láctea com movimento próprio conhecido após o novo lançamento de dados do Gaia, no início do próximo ano.
Os resultados foram publicados na revista Nature Astronomy.
Fonte: University of Groningen