Os astrônomos usaram o VLA (Karl G. Jansky Very Large Array) para fazer a primeira imagem direta de uma característica empoeirada, com a forma de um donut, em torno de um buraco negro supermassivo no núcleo de uma das mais poderosas galáxias rádio do Universo, uma característica pela primeira vez postulada pelos teóricos há quase quatro décadas como parte essencial de tais objetos.
© NRAO/VLA (região central da poderosa radiogaláxia Cygnus A)
Os cientistas estudaram Cygnus A, uma galáxia a cerca de 760 milhões de anos-luz da Terra. A galáxia abriga um buraco negro no seu núcleo que é 2,5 bilhões de vezes mais massivo que o Sol. À medida que a poderosa atração gravitacional do buraco negro atrai material circundante, também impulsiona jatos supervelozes de material que viajam para fora quase à velocidade da luz, produzindo "lóbulos" espetaculares e brilhantes de emissão rádio.
Os "motores centrais" movidos a buracos negros que produzem emissões brilhantes em vários comprimentos de onda, e jatos que se estendem muito além da galáxia, são comuns nestes imensos objetos, mas mostram propriedades diferentes quando observados. Estas diferenças levaram a uma variedade de nomes, como quasares, blazares ou galáxias Seyfert. Para explicar as diferenças, os teóricos construíram um "modelo unificado" com um conjunto comum de características que mostrariam propriedades diferentes dependendo do ângulo a partir do qual são observados.
O modelo unificado inclui o buraco negro central, um disco giratório de material em queda e ao redor do buraco negro e os jatos que se deslocam para fora dos polos do disco. Além disso, para explicar por que o mesmo tipo de objeto parece diferente quando visto de ângulos diferentes, é incluído um "toro" espesso, empoeirado e em forma de donut, rodeando as regiões interiores. O toro obscurece algumas características quando visto de lado, levando a diferenças aparentes para o observador, mesmo para objetos intrinsecamente similares. Os astrônomos geralmente denominam este conjunto comum de características de núcleo galáctico ativo (NGA).
"O toro é uma parte essencial do fenômeno dos NGAs e existem evidências de tais estruturas em NGAs próximos e de baixa luminosidade, mas nunca antes tínhamos visto um, diretamente, numa galáxia rádio tão brilhante. O toro ajuda a explicar porque objetos conhecidos por nomes diferentes são, na verdade, a mesma coisa, apenas observados de uma perspetiva diferente," disse Chris Carilli, do NRAO (National Radio Astronomy Observatory).
Na década de 1950, os astrônomos descobriram objetos que emitiam fortes ondas de rádio, mas pareciam pontuais, semelhantes a estrelas distantes, quando mais tarde observados com telescópios ópticos. Em 1963, Maarten Schmidt, do Caltech, descobriu que um destes objetos era extremamente distante, e outras descobertas rapidamente se seguiram. Para explicar como estes objetos, denominados quasares, podiam ser tão brilhantes, os teóricos sugeriram que deveriam estar aproveitando a tremenda energia gravitacional de buracos negros supermassivos. A combinação de buraco negro, do disco giratório, chamado disco de acreção, e dos jatos, foi apelidada de "motor central" responsável pelos prolíficos fluxos energéticos do objeto.
O mesmo tipo de motor central também parecia explicar o fluxo de outros tipos de objetos, incluindo galáxias rádio, blazares e Galáxias Seyfert. No entanto, cada mostrava um conjunto diferente de propriedades. Os teóricos trabalharam para desenvolver um "esquema de unificação" com o intuito de explicar como a mesma coisa podia ter aspetos diferentes. Em 1977, o obscurecimento por poeira foi sugerido como um elemento deste esquema. Num artigo científico datado de 1982, Robert Antonucci, da Universidade da Califórnia, apresentou um desenho de um toro opaco em torno do motor central. Daquele ponto em diante, o toro obscurecido permaneceu uma característica comum da visão unificada dos astrônomos sobre todos os tipos de núcleos galácticos ativos.
As observações do VLA revelaram diretamente o gás no toro de Cygnus A, que tem um raio de aproximadamente 900 anos-luz. Os modelos de longa data para o toro sugerem que a poeira se encontra em nuvens embebidas no gás, que é um tanto ou quanto desajeitado.
Mais detalhes poderão ser obtidos com o ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array) que pode revelar diretamente a poeira, sendo que objetos mais fracos e distantes deverão exigir maior resolução que futuramente o ngVLA (Next Generation Very Large Array) propiciará resultados condizentes.
Os pesquisadores descobriram o toro quando acompanhavam a sua surpreendente descoberta, em 2016, de um novo objeto brilhante perto do centro de Cygnus A. Este novo objeto é provavelmente um segundo buraco negro supermassivo que só recentemente encontrou material novo para devorar, fazendo com que produzisse emissões brilhantes da mesma forma que o buraco negro central. A existência do segundo buraco negro sugere que Cygnus A se fundiu com outra galáxia no passado astronomicamente recente.
Cygnus A, assim chamado porque é o mais poderoso objeto emissor de rádio na constelação de Cisne, foi descoberto em 1946 pelo físico e radioastrônomo inglês James Stanley Hey. Foi correspondido, em 1951, a uma galáxia gigante, no visível, por Walter Baade e Rudolf Minkowski. Tornou-se um alvo inicial do VLA pouco depois da sua conclusão no início da década de 1980. Imagens detalhadas de Cygnus A, pelo VLA, publicadas em 1984, produziram grandes avanços na compreensão de tais galáxias pelos astrônomos.
Um artigo científico foi publicado na revista The Astrophysical Journal Letters.
Fonte: National Radio Astronomy Observatory