terça-feira, 27 de agosto de 2019

ALMA mostra o interior das tempestades de Júpiter

Nuvens rodopiantes, grandes cinturões coloridos, tempestades gigantes. A atmosfera incrivelmente turbulenta de Júpiter tem sido exibida muitas vezes.


© NRAO/S. Dagnello (imagem rádio de Júpiter)

As bandas brilhantes na imagem acima indicam temperaturas altas e as bandas escuras temperaturas baixas. As bandas escuras correspondem a zonas em Júpiter normalmente brancas no visível. As bandas brilhantes correspondem aos cinturões acastanhados no planeta. Esta imagem contém mais de 10 horas de dados, de modo que os detalhes são difusos devido à rotação do planeta.

Mas o que está acontecendo por baixo das nuvens? O que provoca tantas tempestades e erupções que vemos à "superfície" do planeta? Para estudar isto, a luz visível não é suficiente. Precisamos de estudar Júpiter usando ondas de rádio.

Novas imagens feitas com o ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array) fornecem uma visão única da atmosfera de Júpiter até cinquenta quilômetros abaixo da camada visível de nuvens do planeta.

"O ALMA permitiu-nos fazer um mapa tridimensional da distribuição de amônia abaixo das nuvens. E, pela primeira vez, fomos capazes de estudar a atmosfera por baixo das camadas de nuvens de amônia depois de uma erupção energética em Júpiter," disse Imke de Pater da Universidade da Califórnia, em Berkeley, EUA.

A atmosfera do planeta gigante Júpiter é composta principalmente de hidrogênio e hélio, juntamente com os gases residuais metano, amônia, hidrossulfeto e água. A camada mais alta de nuvens é composta por amônia gelada. Por baixo, há uma camada de partículas sólidas de hidrossulfeto de amônia e, ainda mais profundamente, a cerca de 80 quilômetros por baixo do topo das nuvens, existe provavelmente uma camada de água líquida. As nuvens superiores formam as distintivas zonas acastanhadas e brancas vistas da Terra.

Muitas das tempestades em Júpiter ocorrem dentro destes cinturões. Podem ser comparadas a tempestades na Terra e são frequentemente associadas com eventos de relâmpagos. As tempestades revelam-se no visível como pequenas nuvens brilhantes, chamadas de plumas. Estas erupções de plumas podem provocar uma grande perturbação no cinturão, que pode permanecer visível durante meses ou anos.

As imagens do ALMA foram obtidas alguns dias depois dos astrônomos amadores terem observado uma erupção no Cinturão Equatorial Sul de Júpiter em janeiro de 2017. Ao início foi vista uma pequena pluma brilhante, e depois uma ruptura em grande escala no cinturão que durou semanas após a erupção.

Os astrônomos usaram o ALMA para estudar a atmosfera por baixo da pluma e o cinturão perturbado no rádio e compararam estas imagens com imagens no UV-visível e no infravermelho, obtidas com outros telescópios aproximadamente ao mesmo tempo.

As observações do ALMA são as primeiras a mostrar que altas concentrações de amônia sobem pela atmosfera durante uma erupção energética. Isto possibilitou confirmar a teoria atual de que as plumas energéticas são desencadeadas pela convecção úmida na base das nuvens de água, localizadas no fundo da atmosfera. As plumas trazem o gás amônia das profundezas da atmosfera até grandes altitudes, bem acima da camada principal superior de amônia.

Fonte: National Radio Astronomy Observatory

segunda-feira, 26 de agosto de 2019

Uma fantasia passageira

Esta Imagem obtida pelo telescópio espacial Hubble mostra a NGC 5307, uma nebulosa planetária que se encontra a cerca de 10.000 anos-luz da Terra.


© Hubble (NGC 5307)

Esta nebulosa está localizada na constelação Centaurus, que pode ser vista principalmente no hemisfério sul. Uma nebulosa planetária é o estágio final de uma estrela semelhante ao Sol. Como tal, as nebulosas planetárias nos permitem um vislumbre do futuro do nosso próprio Sistema Solar.

Uma estrela como o nosso Sol irá, no final da sua vida, transformar-se numa gigante vermelha. As estrelas são sustentadas pela fusão nuclear que ocorre em seu núcleo, gerando energia. Os processos de fusão nuclear tentam constantemente separar a estrela. Apenas a gravidade da estrela impede que isso aconteça.

No final da fase gigante vermelha de uma estrela, estas forças se tornam desequilibradas. Sem energia suficiente criada pela fusão, o núcleo da estrela colapsa em si mesmo, enquanto as camadas da superfície são ejetadas para fora. Depois disso, tudo o que resta da estrela é o que vemos aqui: camadas exteriores brilhantes em torno de uma estrela anã branca, os remanescentes do núcleo da estrela gigante vermelha.

Este não é o fim da evolução desta estrela, estas camadas externas ainda estão se movendo e esfriando. Em apenas alguns milhares de anos elas se dissiparão, e tudo o que será deixado para ser visto é a anã branca que brilha.

Fonte: NASA

domingo, 25 de agosto de 2019

Livro reúne imagens de astrofotógrafos brasileiros amadores

Reunindo mais de 75 fotos de 25 astrofotógrafos brasileiros amadores, o livro “Encontro Brasileiro de Astronomia” é um prato cheio para os amantes do espaço e de suas maravilhas ocultas. Publicado pelo Clube de Astronomia de Brasília, a obra tem versão gratuita online.


© João Mattei (Galáxia do Triângulo)

A imagem acima mostra a Galáxia do Triângulo, também conhecida como M33, fotografada por João Mattei. A imagem precisou de um tempo de exposição de 5,8 horas.

A compilação é fruto do EBA (Encontro Brasileiro de Astronomia), que ocorre todos anos desde 2007. O clube reúne amantes da área de diversos estados, profissões e perfis, unidos pelo hobby de estudar e fotografar o espaço. Ao longo dos anos, as fotos do grupo foram ganhando repercussão na internet, além de conquistarem prêmios internacionais. Foi então que, em 2015, decidiram organizar e publicar o livro, que pretende ser o primeiro de uma série com a mesma temática.

“A astrofotografia é um campo que combina duas coisas: arte e ciência,” conta João Antonio Mattei, um dos organizadores do livro. “Tem muita ciência envolvida, mas não há quem não se encante quando vê. Nosso intuito é trabalhar em prol da divulgação científica, por isso deixamos o livro gratuito, disponível na internet”. Além de Mattei, Almir Menezes, Carlos Fairbairn e Paulo Alonso foram os responsáveis pela coordenação da publicação.

Mattei é engenheiro de formação e astrofotógrafo nas horas vagas. Ele explica que a influência começou logo cedo, com o pai, que o presenteou com uma luneta. “Quando vi Saturno, foi amor à primeira vista. Fiquei hipnotizado pela imagem e achei que era aquilo que deveria fazer por toda a vida,” explica Mattei. Mas foi só nos anos 90, com a popularização da internet, que ele conheceu outros astrofotógrafos amadores e passou a se dedicar mais à área. Foi de forma parecida que vários grupos e encontros sobre o tema surgiram, incluindo o EBA.

O livro reúne fotos diversas, de planetas, cometas, galáxias e outras estruturas espaciais. Mattei, por exemplo, se dedica à chamada “astrofotografia de céu profundo”, ou seja, uma técnica que utiliza longa exposição para fotografar galáxias, nebulosos, asteroides e outros objetos ocultos a olho nu. Essas fotografias levam tempo de exposição e exigem filtros específicos para detectar as nuances dos objetos.

Na coletânea, também é possível entender um pouco do processo e dos equipamentos usados para cada foto. Quanto ao caráter técnico, Mattei garante: é possível fazer muito com pouco. “Depende muito do que se quer fotografar. Com uma simples câmera digital, e até celular, dá pra fazer fotos muito boas. Aqui no Brasil há dificuldades, sendo que os equipamentos geralmente são importados, com altas taxas, mas conseguimos aprender a nos virarmos com o que temos, gerando resultados incríveis,” disse Mattei.

Mattei ressalta que um dos objetivos do livro é atrair mais pessoas para a área. Segundo ele, o primeiro passo é procurar grupos de astronomia amadora, que geralmente se dividem por cidades. A presença online dos amantes da astrofotografia também é muito forte, o próprio EBA se comunica por trocas de mensagens, por exemplo. Astrofotógrafos amadores tendem a ser muito receptivos, conta Mattei, e muito do que se aprende é na base das trocas de experiências.

Fonte: Clube de Astronomia de Brasília

sábado, 24 de agosto de 2019

Detectado um buraco negro engolindo uma estrela de nêutrons

Cientistas dizem ter detectado, pela primeira vez, um buraco negro engolindo uma estrela de nêutrons.


© OzGrav/Carl Knox (ilustração de buraco negro engolindo estrela de nêutrons)

As estrelas de nêutrons e os buracos negros são remanescentes  muito densos de estrelas mortas.

Os instrumentos de ondas gravitacionais nos EUA e na Itália detectaram ondulações no espaço-tempo de um evento cataclísmico que ocorreu a 900 milhões de anos-luz da Terra.

A professora Susan Scott, membro da equipe e da Escola de Física da Universidade Nacional Australiana, disse que esta conquista completou o trio de observações na sua lista original, que inclui a fusão de dois buracos negros e a colisão de duas estrelas de nêutrons.

O telescópio SkyMapper da Universidade Nacional Australiana respondeu ao alerta de detecção e estudou toda a provável região do espaço onde o evento ocorreu, mas não foi encontrada nenhuma confirmação visual.

Os cientistas ainda estão analisando os dados para confirmar o tamanho exato dos dois objetos, mas as descobertas iniciais indicam uma grande probabilidade de um buraco negro ter engolido uma estrela de nêutrons.

Nunca foi detectado um buraco negro menor que cinco massas solares ou uma estrela de nêutrons maior que 2,5 vezes a massa do nosso Sol.

Entretanto, existe a pequena mas intrigante possibilidade de que o objeto engolido foi, ao invés, um buraco negro muito leve, muito mais leve do que qualquer outro buraco negro conhecido no Universo.

A Universidade Nacional Australiana é a parceira do LIGO (Advanced Laser Interferometer Gravitational-wave Observatory), o instrumento científico mais sensível já construído e que consiste de detectores duplos nos EUA.

O Observatório Gravitacional Europeu tem um detector de ondas gravitacionais na Itália, de nome Virgo.

Fonte: Australian National University

Exoplaneta rochoso e do tamanho da Terra não tem atmosfera

Um novo estudo usando dados do telescópio espacial Spitzer da NASA fornece um raro vislumbre das condições à superfície de um planeta rochoso que orbita uma outra estrela que não o Sol.


© NASA/JPL-Caltech/R. Hurt (ilustração do exoplaneta LHS 3844b)

O estudo mostra que a superfície do planeta poderá ser semelhante à da Lua ou à de Mercúrio: o planeta provavelmente tem pouca ou nenhuma atmosfera e pode estar coberto pelo mesmo material vulcânico refrigerado encontrado nas áreas escuras da superfície da Lua, chamadas mares.

Descoberto em 2018 pela missão TESS (Transiting Exoplanet Satellite Survey) da NASA, o planeta LHS 3844b está localizado a 48,6 anos-luz da Terra e tem 1,3 vezes o raio da Terra. Orbita uma estrela pequena e fria, chamada anã M, o tipo estelar mais comum e duradouro da Via Láctea. As anãs M podem abrigar uma alta porcentagem do número total de planetas da nossa Galáxia.

O TESS encontrou o planeta através do método de trânsito, que envolve a detecção de quando a luz observada de uma estrela progenitora escurece por causa de um planeta que orbita entre a estrela e a Terra. A detecção da luz vinda diretamente da superfície do planeta é difícil porque a estrela é muito mais brilhante e abafa a luz do planeta.

Mas durante observações de acompanhamento, o Spitzer foi capaz de detectar a luz da superfície de LHS 3844b. O planeta completa uma órbita em torno da sua estrela hospedeira em apenas 11 horas. Com uma órbita tão íntima, LHS 3844b tem muito provavelmente "bloqueio de marés", ou seja, um lado do planeta está permanentemente virado para a estrela. O lado diurno tem uma temperatura de aproximadamente 170º C. Sendo extremamente quente, o planeta irradia muita luz infravermelha favorecendo a observação do telescópio Spitzer. A estrela progenitora do planeta é relativamente fria (embora ainda seja muito mais quente do que o planeta), o que faz com que a observação direta do lado diurno de LHS 3844b seja possível.

Esta observação assinala a primeira vez que os dados do Spitzer foram capazes de fornecer informações sobre a atmosfera de um mundo terrestre em torno de uma anã M.

Ao medir as diferenças de temperatura entre o lado quente e o lado frio do planeta, a equipe descobriu que existe uma quantidade insignificante de calor sendo transferido entre os dois. Se existisse uma atmosfera, o ar quente do lado diurno se expandiria naturalmente, produzindo ventos que transferiam calor em torno do planeta. Num mundo rochoso com pouca ou nenhuma atmosfera, como a Lua, não existe ar para transferir calor.

A compreensão dos fatores que podem preservar ou destruir atmosferas planetárias é parte de como os cientistas planejam procurar ambientes habitáveis localizados além do Sistema Solar. A atmosfera da Terra é a razão pela qual a água líquida pode existir à superfície, permitindo que a vida prospere. Por outro lado, a pressão atmosférica de Marte é agora inferior a 1% da da Terra e os oceanos e rios que outrora polvilharam a superfície do Planeta Vermelho desapareceram.

Em comparação com estrelas parecidas com o Sol, as anãs M emitem altos níveis de radiação ultravioleta (embora menos luz no geral), o que é prejudicial à vida e pode erodir a atmosfera de um planeta. São particularmente violentas na sua juventude, expelindo um grande número de proeminências, ou surtos de radiação e partículas que podem arrancar as atmosferas planetárias em desenvolvimento.

As observações do Spitzer descartam uma atmosfera com mais de 10 vezes a pressão da da Terra (medida em bares, a pressão atmosférica da Terra, ao nível do mar, é cerca de 1 bar). Uma atmosfera entre 1 e 10 bares, em LHS 3844b, foi também quase totalmente descartada, embora os pesquisadores notem que poderá haver uma pequena chance de existir caso algumas propriedades estelares e planetárias satisfaçam determinados critérios muito específicos e improváveis. Eles também argumentam que, com o planeta tão perto da estrela, uma atmosfera fina seria arrancada pela intensa radiação e pelo vento estelar.

O Spitzer e o telescópio espacial Hubble já reuniram informações sobre as atmosferas de vários planetas gasosos, mas LHS 3844b parece ser diminuto para o qual os cientistas usaram a luz vinda da sua superfície para aprender mais sobre a sua atmosfera. Com o Spitzer foi usado anteriormente o método de trânsito para estudar os sete mundos rochosos em torno da estrela TRAPPIST-1 (também uma anã M) e para aprender mais sobre a sua possível composição geral; por exemplo, alguns provavelmente contêm água gelada.

Os pesquisadores também aplicaram o albedo da superfície de LHS 3844b (a sua refletividade) para tentar inferir a sua composição.

O estudo mostra que LHS 3844b é "bastante escuro". O exoplaneta está coberto por basalto, um tipo de rocha vulcânica.

O estudo foi publicado esta semana na revista Nature.

Fonte: Massachusetts Institute of Technology

terça-feira, 20 de agosto de 2019

Aniquilação total para estrelas supermassivas

Uma estrela renegada, que explodiu numa galáxia distante, gerando um novo tipo de supernova que pode aniquilar completamente a sua estrela progenitora,  não deixando nenhum remanescente para trás.


© Joy Pollard (ilustração da supernova SN 2016iet)

O evento nunca havia sido visto antes, pode representar o modo pelo qual as estrelas mais massivas do Universo, incluindo as primeiras estrelas, morrem.

O satélite Gaia da ESA notou pela primeira vez a supernova, conhecida como SN 2016iet, no dia 14 de novembro de 2016. Três anos de observações intensivas de acompanhamento com uma variedade de telescópios, incluindo o Gemini Norte no Havaí, o Observatório MMT de Harvard e do Smithsonian, localizado no Observatório Fred Lawrence Whipple (EUA), e os telescópios Magellan, no Observatório Las Campanas, no Chile, forneceram perspetivas cruciais sobre a distância e a composição do objeto.

Este olhar profundo revelou apenas uma fraca emissão de hidrogênio na posição da supernova, evidenciando que a estrela progenitora da SN 2016iet viveu numa região isolada com muito pouca formação estelar. Este é um ambiente incomum para uma estrela tão massiva.

A SN 2016iet tem uma infinidade de excentricidades, incluindo a sua duração incrivelmente longa, grande energia, impressões digitais químicas incomuns e ambiente pobre em elementos mais pesados, para os quais não existem análogos óbvios na literatura astronômica.

A natureza incomum da SN 2016iet, como revelado pelo Gemini e por outros dados, sugere que começou a sua vida como uma estrela com cerca de 200 vezes a massa do nosso Sol, tornando-se uma das explosões estelares mais massivas e poderosas já observadas. Evidências crescentes sugerem que as primeiras estrelas nascidas no Universo podem ter sido igualmente massivas. Os astrônomos previram que se tais estrelas gigantes mantiverem a sua massa durante a sua breve vida (alguns milhões de anos), morrerão como supernovas por instabilidade de pares, que recebe o nome dos pares de matéria-antimatéria formados na explosão.

A maioria das estrelas massivas terminam as suas vidas num evento explosivo que expele matéria rica em metais pesados para o espaço, enquanto o seu núcleo colapsa numa estrela de nêutrons ou buraco negro. Mas as supernovas por instabilidade de pares pertencem a outra classe. O núcleo em colapso produz enormes quantidades de raios gama, levando a uma produção descontrolada de pares de partículas e antipartículas que, eventualmente, desencadeiam uma explosão termonuclear catastrófica que aniquila toda a estrela, incluindo o núcleo.

Os modelos de supernovas por instabilidade de pares preveem que ocorrerão em ambientes pobres em metais, como em galáxias anãs e no Universo inicial, e os astrônomos descobriram exatamente isso. O evento ocorreu a uma distância de um bilhão de anos-luz numa galáxia anã, anteriormente não catalogada, pobre em metais.

Outra característica surpreendente é a localização da SN 2016iet. A maioria das estrelas massivas nasce em aglomerados densos de estrelas, mas a SN 2016iet formou-se isolada a cerca de 54.000 anos-luz do centro da sua galáxia anã hospedeira.

A fim de explicar a longa duração do evento e a sua lenta evolução de brilho, a equipe sugere que a estrela progenitora expeliu matéria para o seu ambiente circundante a um ritmo de cerca de três vezes a massa do Sol por ano durante uma década antes da explosão estelar. Quando a estrela finalmente se tornou supernova, os detritos colidiram com este material, alimentando a emissão da SN 2016iet.

A maioria das supernovas desaparecem e tornam-se invisíveis contra o brilho das suas galáxias hospedeiras em poucos meses. Mas dado que a SN 2016iet é tão brilhante e está tão isolada, é possível estudar a sua evolução durante anos.

Há não muito tempo atrás, não se sabia se tais estrelas supermassivas podiam realmente existir. A descoberta e as observações de acompanhamento da SN 2016iet forneceram evidências da sua existência e do potencial para afetar o desenvolvimento do Universo inicial.

Futuramente, o LSST (Large Synoptic Survey Telescope) irá descobrir milhares destes eventos e o Gemini está bem posicionado para fazer o trabalho crucial de acompanhamento.

A pesquisa foi publicada na revista The Astrophysical Journal.

Fonte: Harvard–Smithsonian Center for Astrophysics

segunda-feira, 19 de agosto de 2019

A morte de uma estrela

Esta imagem obtida com o telescópio espacial Hubble, mostra uma cena escura e sombria na constelação de Gêmeos.


© Hubble (NGC 2371 e NGC 2372)

O tema desta imagem confundiu os astrônomos quando foi estudado pela primeira vez, ao invés de ser classificado como um único objeto, ele foi registrado como dois objetos, devido à sua estrutura simétrica, conhecida como NGC 2371 e NGC 2372, embora às vezes referida em conjunto como NGC 2371/2.

Estes dois lóbulos são visíveis no canto superior esquerdo e inferior direito da imagem, e juntos formam uma nebulosa planetária. Apesar do nome, tais nebulosas não têm nada a ver com planetas; a NGC 2371/2 foi formada quando uma estrela parecida com o Sol chegou ao fim de sua vida e explodiu suas camadas externas, derramando o material constituinte e empurrando-o para o espaço, deixando apenas um remanescente superaquecido para trás. Este remanescente é visível como a estrela de cor laranja no centro da imagem, situando perfeitamente entre os dois lóbulos.

A estrutura desta região é complexa. Ela é preenchida com densos nós de gás, jatos rápidos que parecem estar mudando de direção ao longo do tempo e expandindo nuvens de material que fluem para fora em lados diametralmente opostos da estrela remanescente. As manchas desta cena cósmica brilham intensamente quando a estrela remanescente emite radiação energética que excita o gás dentro destas regiões, fazendo com que ela acenda. Este panorama continuará mudando nos próximos milhares de anos; eventualmente os lóbulos nodosos se dissiparão completamente, e a estrela remanescente esfriará e escurecerá para formar uma anã branca.

Fonte: ESA

Jovem Júpiter foi atingido de frente por enorme protoplaneta

Segundo um estudo, uma colisão colossal entre Júpiter e um planeta ainda em formação no início do Sistema Solar, há cerca de 4,5 bilhões de anos, pode explicar leituras surpreendentes da nave espacial Juno da NASA.


© K. Suda/Y Akimoto (ilustração da colisão entre um jovem Júpiter e um protoplaneta massivo)

Astrônomos da Universidade Rice e da Universidade Sun Yat-sen da China dizem que o seu cenário de impacto pode explicar as leituras gravitacionais anteriormente confusas da sonda Juno, que sugerem que o núcleo de Júpiter é menos denso e mais extenso do que o esperado.

As principais teorias sobre a formação de planetas sugerem que Júpiter começou como um planeta denso, rochoso ou gelado que mais tarde reuniu a sua atmosfera espessa do disco primordial de gás e poeira que deu origem ao nosso Sol.

Os astrônomos realizaram milhares de simulações de computador e descobriu que um Júpiter em rápido crescimento pode ter perturbado as órbitas de "embriões planetários" próximos, protoplanetas que estavam nos estágios iniciais da formação planetária.

Os cálculos incluíram estimativas da probabilidade de colisões sob diferentes cenários e da distribuição de ângulos de impacto. Em todos os casos, os pesquisadores descobriram que havia pelo menos 40% de hipóteses de que Júpiter engolisse um embrião planetário nos primeiros milhões de anos. Além disso, Júpiter produziu em massa um "forte foco gravitacional" que deu origem a colisões frontais mais comuns do que aquelas apenas raspantes.

Os impactos em ângulos que apenas raspam o planeta podem fazer com que o objeto impactante se torne preso gravitacionalmente e afunde gradualmente no núcleo de Júpiter, e os embriões planetários menores tão massivos quanto a Terra se desintegrariam na espessa atmosfera de Júpiter.

O único cenário que resultou num perfil de densidade de núcleo semelhante ao que a Juno mede hoje é um impacto frontal com um embrião planetário cerca de 10 vezes mais massivo do que a Terra.

Os cálculos sugerem que, mesmo que este impacto tenha ocorrido há 4,5 bilhões de anos, ainda poderá levar muitos bilhões de anos para que o material pesado volte a assentar num núcleo denso sob as circunstâncias sugeridas pelo estudo.

A missão Juno foi desenhada para ajudar os cientistas a melhor compreender a origem e a evolução de Júpiter. A sonda, lançada em 2011, transporta instrumentos para mapear os campos gravitacionais e magnéticos de Júpiter e para investigar a estrutura interna profunda do planeta.

O estudo foi publicado na revista Nature.

Fonte: Rice University

Uma anã branca “impossível” identificada nos dados do Kepler

As anãs brancas possuem uma variedade de tamanhos diferentes. Uma anã branca típica pode ter em torno de 0,6 da massa solar e surgir quando uma estrela isolada com algumas vezes a massa do Sol se expande em uma gigante vermelha, esgota seu suprimento de combustível e expele suas camadas externas.


© NASA/JPL-Caltech (ilustração de auto-lente gravitacional de par de estrelas)

Mas algumas anãs brancas observadas têm massas muito menores, entre 0,15 e 0,3 da massa solar. Para produzir uma massa remanescente tão pequena, a massa da estrela progenitora inicial também teria que ser muito baixa. Mas isso representa um problema: estrelas menores demoram mais para evoluir, então uma estrela de massa tão baixa precisaria mais do que a idade do Universo para exaurir seu suprimento de combustível!

Como a evolução estelar isolada não consegue explicar as anãs brancas de massa extremamente baixa, há uma outra explicação: as interações binárias. Neste cenário, a órbita próxima de duas estrelas em um binário resulta em material sendo retirado da estrela progenitora, acelerando sua perda de massa e permitindo que ela evolua para uma anã branca de baixa massa.

Até agora, esta explicação se encaixou  nas observações. Mas agora, a descoberta de uma nova anã branca de baixa massa está desafiando nossa compreensão.

Em uma nova pesquisa, uma equipe de cientistas liderada por Kento Masuda, da Universidade de Princeton, apresenta a descoberta do sistema binário KIC 8145411 a partir dos dados do Kepler. Este binário único é um dos cinco sistemas de auto-lentes conhecidos: um objeto no binário gravitacionalmente amplifica a luz do outro à medida que passa na frente uma vez por órbita.

Masuda e colaboradores usam observações de acompanhamento do Observatório Fred Lawrence Whipple, no Arizona, e do telescópio Subaru, no Havaí, para determinar as propriedades do sistema, confirmando que estamos analisando uma anã branca com massa solar de 0,2 que orbita uma estrela parecida com o Sol, eclipsando-a.

A órbita da KIC 8145411 é bastante ampla, a 1,28 UA (um período de ~ 450 dias), dez vezes mais ampla para a progenitora primária e a anã branca interagirem da maneira esperada.

Masuda e colaboradores discutem alguns mecanismos de formação propostos da existência desta anã branca, como interações com um objeto terciário ejetado ou engolido, mas nenhum deles é especialmente satisfatório.

Os autores apontam que tivemos apenas uma chance em 200 de detectar este sistema em particular, devido à sua orientação de perfil, o que provavelmente significa que a KIC 8145411 é apenas a ponta do iceberg. Novas pesquisas dedicadas podem revelar muito mais destes sistemas no futuro, ajudando explicar por que esta anã branca é possível, afinal de contas!

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: Sky & Telescope

domingo, 18 de agosto de 2019

ALMA identificou antepassados "escuros" de galáxias elípticas gigantes

Os astrônomos usaram o ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array) para identificar 39 galáxias tênues que não foram observadas na visão mais profunda do Universo do telescópio espacial Hubble, a 10 bilhões de anos-luz de distância.


© NAOJ (ilustração de galáxias distantes observadas com o ALMA)

São dez vezes mais numerosas do que galáxias igualmente massivas, mas visualmente brilhantes, detectadas com o Hubble. Os pesquisadores assumem que estas galáxias fracas antecedem as galáxias elípticas massivas no Universo atual. No entanto, nenhuma teoria significativa para a evolução do Universo previu uma população tão abundante de galáxias massivas escuras e formadoras de estrelas. Os novos resultados do ALMA colocam em questão a nossa compreensão do Universo primitivo.

"Estudos anteriores descobriram galáxias com formação estelar extrema no Universo primitivo, mas a população é bastante limitada," disse Tao Wang, da Universidade de Tóquio, da Comissão Francesa de Energias Alternativas e Energia Atômica (CEA) e do National Astronomical Observatory of Japan (NAOJ) do Japão. "A formação estelar nas galáxias tênues que identificamos é menos intensa do que em galáxias extremamente ativas, mas estas são 100 vezes mais abundantes. É importante estudar um componente tão importante da história do Universo para compreender a formação das galáxias."

Wang e a sua equipe observaram três "janelas" ALMA do Universo profundo, abertas pelo telescópio espacial Hubble: os campos CANDELS. A equipe descobriu 63 objetos extremamente vermelhos nas imagens infravermelhas obtidas pelo telescópio espacial Spitzer da NASA: são demasiado vermelhas para serem detectadas com o Hubble. No entanto, a resolução espacial limitada do Spitzer impediu que os astrônomos identificassem a sua natureza.

O ALMA detectou emissão de ondas submilimétricas de 39 dos 63 objetos extremamente vermelhos. Graças à sua alta resolução e sensibilidade, o ALMA confirmou que são galáxias massivas com formação estelar e que estão produzindo estrelas 100 vezes de modo mais eficiente do que a Via Láctea. Estas galáxias são representativas da maioria das galáxias massivas do Universo de há 10 bilhões de anos, a maioria das quais até agora não tinham sido discernidas por estudos anteriores.

Ao manter este ritmo de formação estelar, as galáxias detectadas pelo ALMA provavelmente se transformariam na primeira população de galáxias elípticas massivas formadas no início do Universo, mas são inesperadamente abundantes. Os cientistas estimaram a sua densidade numérica como equivalente a 530 objetos por cada grau quadrado do céu. Esta densidade numérica excede em muito as previsões dos modelos teóricos atuais e das simulações de computador. Além disso, de acordo com o modelo amplamente aceito do Universo com um tipo particular de matéria escura, é um desafio construir um grande número de objetos massivos numa fase tão inicial do Universo. Como um todo, os resultados atuais do ALMA desafiam a nossa atual compreensão da evolução do Universo.

As galáxias elípticas massivas estão localizadas no coração de aglomerados de galáxias. Elas formaram a maioria das suas estrelas no início do Universo. No entanto, pesquisas anteriores pelas progenitoras destas galáxias massivas não tiveram sucesso porque foram baseadas apenas em galáxias que são facilmente detectáveis com o Hubble. A descoberta deste grande número de galáxias tênues e massivas, invisíveis ao Hubble, fornece evidências diretas da montagem precoce de galáxias massivas durante os primeiros bilhões de anos do Universo. Observações de acompanhamento mais detalhadas, com o ALMA e com o futuro telescópio espacial James Webb da NASA, serão essenciais para fornecer informações adicionais sobre a natureza destas galáxias. Os novos estudos poderão construir um quadro completo da formação galáctica no Universo inicial.

Os resultados foram publicados na última edição da revista Nature.

Fonte: University of Tokyo

Descoberto buraco negro "encoberto" no Universo primordial

Os astrônomos descobriram evidências do mais distante buraco negro "encoberto" até à data, usando o observatório de raios X Chandra da NASA.


© Chandra/ALMA/Pan-STARRS (o mais distante buraco negro encoberto)

Esta é a primeira indicação de um buraco negro escondido por gás num momento tão precoce na história do cosmos. Os buracos negros supermassivos, com milhões a bilhões de vezes a massa do nosso Sol, normalmente crescem puxando material de um disco de matéria circundante. O crescimento rápido gera grandes quantidades de radiação numa região muito pequena ao redor do buraco negro. Esta fonte extremamente brilhante e compacta é denominada quasar.

De acordo com as teorias atuais, uma densa nuvem de gás abastece o material no disco em torno do buraco negro supermassivo durante o seu período de crescimento inicial, que esconde da nossa observação a maior parte da luz brilhante do quasar. À medida que o buraco negro consome material e se torna mais massivo, o gás na nuvem esgota-se, até que o buraco negro e o seu disco brilhante ficam a descoberto.

É extraordinariamente desafiador encontrar quasares nesta fase encoberta, porque grande parte da sua radiação é absorvida e não pode ser detectada pelos instrumentos atuais.

A nova descoberta surgiu de observações de um quasar chamado PSO167-13, que foi descoberto pela primeira vez pelo Pan-STARRS, um telescópio óptico no Havaí. Observações ópticas deste e de outros levantamentos detectaram cerca de 200 quasares que já brilhavam intensamente quando o Universo tinha menos de um bilhão de anos, ou cerca de 8% da sua idade atual. Estas pesquisas só foram consideradas eficazes para encontrar buracos negros não cobertos, porque a radiação que detectam é suprimida até por finas nuvens de gás e poeira. Como PSO167-13 fazia parte destas observações, esperava-se que este quasar também estivesse desobstruído.

Os astrônomos testaram esta ideia usando o Chandra para observar PSO167-13 e outros nove quasares descobertos com levantamentos ópticos. Após 16 horas de observações, apenas três fótons de raios X foram detectados de PSO167-13, todos com energias relativamente altas. Dado que os raios X de baixa energia são mais facilmente absorvidos do que os de mais alta energia, a explicação provável é que o quasar é altamente obscurecido pelo gás, permitindo que sejam detectados apenas raios X de alta energia.

Uma reviravolta interessante no que toca a PSO167-13 é que a galáxia hospedeira tem uma galáxia companheira, visível nos dados anteriormente obtidos com o ALMA (Atacama Large Millimeter Array) no Chile e com o telescópio espacial Hubble da NASA. Dada a sua pequena separação e o fraco brilho da fonte em raios X, a equipe não foi capaz de determinar se a recém-descoberta emissão de raios X está associada com o quasar PSO167-13 ou com a galáxia companheira.

Se os raios X vierem do quasar conhecido, então qual será o motivo de o quasar parecer altamente obscurecido em raios X, mas não no visível? Uma possibilidade é que houve um aumento grande e rápido no "disfarce" do quasar durante os três anos que separam as observações ópticas e com as de raios X.

Por outro lado, se em vez disso os raios X tiverem origem na galáxia companheira, então representa a detecção de um novo quasar em íntima proximidade com PSO167-13. Este par de quasares seria o mais distante já detectado.

Em qualquer um destes dois casos, o quasar detectado pelo Chandra seria o quasar encoberto mais distante já visto, 850 milhões de anos após o Big Bang. O recordista anterior foi observado 1,3 bilhões de anos após o Big Bang.

Os autores também planejam procurar mais exemplos de buracos negros altamente obscurecidos.

O artigo que descreve estes resultados foi aceito para publicação na revista Astronomy and Astrophysics.

Fonte: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics

segunda-feira, 12 de agosto de 2019

Um vasto globo de gás no espaço

Embora pareça mais uma entidade vista através de um microscópio do que de um telescópio, esse objeto arredondado, chamado NGC 2022, certamente não é uma alga ou uma pequena água-viva.


© Hubble (NGC 2022)

Em vez disso, é um vasto globo de gás no espaço, arrematado por uma estrela envelhecida. A estrela é visível no centro do globo, brilhando através dos gases que anteriormente mantinham durante a maior parte de sua vida estelar.

Quando estrelas como o Sol crescem em idade avançada, elas se expandem e brilham em vermelho. Essas supostas gigantes vermelhas começam então a perder suas camadas externas de material para o espaço. Mais da metade da massa de uma dessas estrelas pode ser emanada dessa maneira, formando uma camada de gás circundante. Ao mesmo tempo, o núcleo da estrela encolhe e fica mais quente, emitindo luz ultravioleta que faz com que os gases expelidos brilhem.

Esse tipo de objeto é chamado, de maneira um tanto confusa, de uma nebulosa planetária, embora não tenha nada a ver com planetas. O nome deriva da aparência arredondada e planetária desses objetos vistos nos primeiros telescópios.

A NGC 2022 está localizada na constelação de Órion (O Caçador).

Fonte: NASA

sexta-feira, 9 de agosto de 2019

Um mergulho na "esfera de influência" de um buraco negro

O que acontece dentro de um buraco negro fica dentro de um buraco negro, mas o que acontece dentro da "esfera de influência" de um buraco negro, ou seja, a região mais interna de uma galáxia onde a gravidade de um buraco negro é a força dominante, é de grande interesse para os astrônomos e pode ajudar a determinar a massa de um buraco negro bem como o seu impacto na sua vizinhança galáctica.


© NRAO (ilustração de um disco de material girando em torno de buraco negro supermassivo)

Novas observações com o ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array) fornecem uma visão sem precedentes de um disco rodopiante de gás interestelar frio em torno de um buraco negro supermassivo. Este disco está no centro de NGC 3258, uma enorme galáxia elíptica a cerca de 100 milhões de anos-luz da Terra. Com base nestas observações, uma equipe liderada por astrônomos da Universidade A&M do Texas e da Universidade da Califórnia determinou que este buraco negro tem uma massa equivalente a 2,25 bilhões de sóis, o buraco negro mais massivo medido, até agora, com o ALMA.

Embora os buracos negros supermassivos possam ter massas de milhões a bilhões de vezes a massa do Sol, representam apenas uma pequena fração da massa de uma galáxia inteira. Isolar a influência da gravidade de um buraco negro das estrelas, do gás interestelar e da matéria escura é um grande desafio e requer observações altamente sensíveis em escala fenomenalmente pequenas.

Os astrônomos usam uma variedade de métodos para medir as massas dos buracos negros. Em galáxias elípticas gigantes, a maioria das medições vem de observações do movimento orbital de estrelas ao redor do buraco negro, captadas no visível ou no infravermelho. Outra técnica, usando masers naturais de água (lasers no rádio) em nuvens de gás que orbitam em torno de buracos negros, fornece uma maior precisão, mas estes masers são muito raros e estão associados quase exclusivamente a galáxias espirais com buracos negros menores.

Ao longo dos últimos anos, o ALMA desbravou caminho ao utilizar um novo método para estudar buracos negros em galáxias elípticas gigantes. Cerca de 10% das galáxias elípticas contêm discos giratórios de gás frio e denso nos seus centros. Estes discos contêm monóxido de carbono (CO) gasoso, que pode ser observado com radiotelescópios no comprimento de onda milimétrico.

Usando o efeito Doppler da emissão das moléculas de CO, é possível medir as velocidades das nuvens de gás em órbita, e o ALMA possibilita a resolução dos próprios centros de galáxias onde as velocidades orbitais são mais altas.

A NGC 3258 é o melhor alvo que já encontrado, porque possibilita rastrear a rotação do disco para mais perto do buraco negro do que em qualquer outra galáxia.

Tal como a Terra orbita o Sol mais depressa do que Plutão, pois é-lhe exercida uma maior força gravitacional, as regiões mais internas do disco da NGC 3258 orbitam mais depressa do que as partes mais externas devido à gravidade do buraco negro. Os dados do ALMA mostram que a velocidade de rotação do disco sobe de 1 milhão de quilômetros por hora na sua orla externa, a cerca de 500 anos-luz do buraco negro, para mais de 3 milhões de quilômetros por hora perto do centro do disco, a uma distância de apenas 65 anos-luz do buraco negro.

Os pesquisadores determinaram a massa do buraco negro modelando a rotação do disco, tendo em conta a massa adicional das estrelas na região central da galáxia e outros detalhes como a forma ligeiramente distorcida do disco gasoso. A detecção clara da rápida rotação permitiu que os cientistas determinassem a massa do buraco negro com uma precisão inferior a 1%, embora tenham estimado uma incerteza sistemática adicional de 12% na medição porque a distância até NGC 3258 não é conhecida com muita precisão. Mesmo considerando a incerteza na distância, esta é uma das medições mais precisas da massa de qualquer buraco negro localizado além da Via Láctea.

O próximo desafio desta prospecção é encontrar mais exemplos de discos giratórios quase perfeitos como este, para que seja aplicado este método de medir massas de buracos negros numa amostra maior de galáxias.

O estudo foi publicado na revista The Astrophysical Journal.

Fonte: National Radio Astronomy Observatory

quinta-feira, 8 de agosto de 2019

Anatomia de uma gaivota cósmica

Colorida e pouco densa, esta intrigante coleção de objetos é conhecida por Nebulosa da Gaivota, devido à sua semelhança com uma gaivota em voo.


© ESO/VST (Sharpless 2-296)

Constituída por poeira, hidrogênio, hélio e traços de elementos mais pesados, esta região é o berço quente e energético das novas estrelas. O detalhe notável com que foi captada pelo Telescópio de Rastreio do VLT (VST) do ESO revela os objetos astronômicos individuais que compõem este pássaro celeste, assim como as suas estruturas mais detalhadas. O VST é um dos maiores telescópios de rastreio do mundo que observa o céu no visível.

Os componentes principais da Gaivota são três enormes nuvens de gás, sendo a mais distinta das três a que forma as “asas” do pássaro celeste, Sharpless 2-296 (Sh2-296). Com uma dimensão de cerca de 100 anos-luz de uma ponta à outra das asas, Sh2-296 apresenta material brilhante e faixas de poeira escura que se entrelaçam por entre as estrelas brilhantes. Trata-se de um belo exemplo de uma nebulosa de emissão, neste caso uma região HII, indicando formação ativa de novas estrelas, as quais podem ser vistas um pouco por toda a imagem.

É a radiação emitida por estas estrelas jovens que dá às nuvens as suas cores fantásticas e atraentes, ionizando o gás circundante e fazendo com que ele brilhe. Esta radiação é também a principal responsável pela forma das nuvens, já que exerce pressão no material circundante, esculpindo-o nas formas extravagantes que vemos. Uma vez que cada nebulosa tem a sua distribuição única de estrelas e pode, como é o caso desta, ser uma composição de várias nuvens, são inúmeras as variedades de formas que podemos ver, o que desperta a imaginação dos astrônomos e os faz evocar comparações com animais ou objetos familiares.

Esta diversidade de formas está bem exemplificada no contraste entre Sh2-296 e Sh2-292. Esta última, vista aqui logo abaixo das “asas”, é uma nuvem mais compacta que forma a “cabeça” da gaivota. Sua característica mais proeminente é uma estrela enorme e extremamente luminosa chamada HD 53367, que é 20 vezes mais massiva que o Sol, e que vemos como o “olho” penetrante da gaivota. A Sh2-292 é ao mesmo tempo uma nebulosa de emissão e de reflexão: muita da sua luz é emitida por gás ionizado que rodeia as suas estrelas recém-nascidas, mas uma quantidade significante é também refletida pelas estrelas que se encontram no seu exterior.

As zonas escuras que cortam a homogeneidade das nuvens e lhes dão textura são as faixas de poeira, locais de material muito mais denso que escondem parte do gás luminoso por trás deles. Nebulosas como esta têm densidades de algumas centenas de átomos por centímetro cúbico, o que é muito menos que os melhores vácuos artificiais na Terra. No entanto, as nebulosas são ainda assim muito mais densas que o gás que as rodeia, o qual apresenta uma densidade média de cerca de 1 átomo por centímetro cúbico.

A Gaivota situa-se ao longo da fronteira entre as constelações do Cão Maior e do Unicórnio, a uma distância de cerca de 3.700 anos-luz num dos braços da Via Láctea. As galáxias em espiral podem conter milhares destas nuvens, quase todas concentradas ao longo dos braços em espiral.

Há várias nuvens menores que também fazem parte da Nebulosa da Gaivota, entre elas Sh2-297, que se trata de uma pequena adição à ponta da “asa” de cima (Sh2-292 e Sh2-295) da gaivota. Todos estes objetos foram incluídos no Catálogo de Sharpless, uma lista de mais de 300 nuvens de gás brilhante compilada pelo astrônomo americano Steward Sharpless.

Você consegue identificar a gaivota nesta foto?

Fonte: ESO

terça-feira, 6 de agosto de 2019

A Via Láctea em três dimensões

Quando Galileu apontou o seu primeiro telescópio à Via Láctea no início do século XVII, ele notou que consiste principalmente de inúmeras estrelas.


© OGLE/Jan Skowron (estrutura tridimensional da Via Láctea)

Desde aquela época, o estudo das propriedades e da história da nossa Galáxia tem absorvido muitas gerações de cientistas. Na revista Science, astrônomos poloneses do Observatório Astronômico da Universidade de Varsóvia apresentaram um mapa tridimensional único da Via Láctea. O mapa fornece informações sobre a estrutura e sobre a história da nossa Galáxia.

Desde o século XVII que os astrônomos estão cientes de que a Terra, o Sol e os outros planetas do Sistema Solar, juntamente com bilhões de estrelas vistas com telescópios, formam a nossa Galáxia.

Atualmente, pensa-se que a Via Láctea é uma típica galáxia espiral barrada que consiste de uma região central em forma de barra rodeada por um disco plano de gás, poeira e estrelas. O disco compreende quatro braços espirais e tem um diâmetro de aproximadamente 120.000 anos-luz. O Sistema Solar está localizado dentro do disco, a cerca de 27.000 anos-luz do Centro Galáctico, e é por isso que as estrelas do disco, vistas de dentro, parecem uma faixa tênue no céu, a Via Láctea.

O conhecimento atual sobre a forma do disco da Via Láctea é baseado em vários elementos (como contagens de estrelas ou observações de moléculas de gás no rádio) informados pela extrapolação de estruturas vistas em outras galáxias. No entanto, as distâncias destas características são medidas indiretamente e dependem do modelo. O método mais robusto de estudar a forma da Via Láctea seria medir diretamente as distâncias de uma grande amostra de estrelas de um tipo específico, o que permitiria a construção de um mapa tridimensional da Galáxia.

As estrelas variáveis Cefeidas são perfeitas para esta tarefa. As Cefeidas são supergigantes jovens pulsantes: o seu brilho muda com um padrão muito regular e muito bem definido, que pode variar de horas a várias dúzias de dias.

"As Cefeidas seguem uma relação entre o período de pulsação e a luminosidade, permitindo inferir a luminosidade intrínseca de uma Cefeida a partir do seu período. A distância pode então ser determinada comparando o brilho aparente e intrínseco," diz a Dra. Dorota Skowron, autora principal do estudo. Ela acrescenta: a dificuldade adicional surge da presença de poeira e gás interestelar que pode diminuir o brilho de uma Cefeida. Felizmente, as observações no infravermelho reduzem estas incertezas.

As distâncias às Cefeidas podem ser determinadas com uma precisão superior a 5%.

O novo mapa tridimensional da Via Láctea foi construído usando uma amostra de mais de 2.400 Cefeidas, a maioria das quais foram recentemente identificadas nos dados fotométricos recolhidos pelo levantamento OGLE (Optical Gravitational Lensing Experiment).

O mapa tridimensional recém-construído da Via Láctea é o primeiro mapa que se baseia em distâncias diretas de milhares de objetos individuais tão distantes quanto o limite esperado do disco Galáctico. O mapa demonstra que o disco da Via Láctea não é plano, é deformado a distâncias maiores que 25.000 anos-luz de Centro Galáctico.

Estrelas nas partes externas do disco da Via Láctea podem estar deslocadas do plano Galáctico até 4.500 anos-luz em relação às regiões centrais da Galáxia. A deformação pode ter sido provocada por interações com galáxias satélites, gás intergaláctico ou matéria escura.

O disco Galáctico não tem uma espessura constante, cresce com a distância ao Centro Galáctico. O disco Galáctico tem cerca de 500 anos-luz de espessura perto do Sol, enquanto excede 3.000 anos-luz perto da orla.

A idade das Cefeidas pode ser determinada com base nos seus períodos de pulsação, o que permitiu que os astrônomos realizassem uma tomografia etária da Via Láctea. As Cefeidas mais jovens estão localizadas perto do Centro Galáctico, enquanto que as mais velhas estão perto do limite da Via Láctea.

Foram encontradas muitas subestruturas alongadas no disco, compostas por estrelas de idade semelhante. Isto indica que as Cefeidas ali localizadas devem ter-se formado mais ou menos ao mesmo tempo num dos braços espirais. No entanto, as Cefeidas formadas num braço espiral não seguem a localização exata deste braço, porque as velocidades de rotação dos braços espirais e das estrelas são ligeiramente diferentes.

Os astrônomos realizaram uma simulação simples para testar esta hipótese. Injetaram vários episódios de formação estelar nos braços espirais e atribuíram movimentos e velocidades típicas às estrelas aí presentes.

As estruturas simuladas e observadas são surpreendentemente semelhantes. Isto mostra que a nossa ideia sobre a história recente do disco Galáctico é plausível e que pode explicar as estruturas que vemos.

Fonte: University of Warsaw