Com o auxílio do Very Large Telescope (VLT) do ESO, os pesquisadores encontraram, pela primeira vez, evidências de um planeta gigante associado a uma estrela anã branca.
© ESO/M. Kornmesser (ilustração do sistema WDJ0914+1914)
O planeta orbita a anã branca quente, o remanescente de uma estrela parecida com o Sol, a curta distância, fazendo com que sua atmosfera seja removida e forme um disco de gás ao redor da estrela. Este sistema único sugere como será o nosso próprio Sistema Solar em um futuro distante.
A equipe estudou cerca de 7.000 anãs brancas observadas pelo Sloan Digital Sky Survey (SDSS) e descobriu uma muito diferente das restantes. Ao analisar as variações sutis da radiação emitida pela estrela, eles descobriram indícios de elementos químicos em quantidades que nunca tinham sido antes observadas numa anã branca.
Para ter uma ideia melhor das propriedades desta estrela incomum, chamada WDJ0914+1914, a equipe observou-a com o instrumento X-shooter montado no VLT do ESO, no deserto chileno do Atacama. Estas observações de acompanhamento confirmaram a presença de hidrogênio, oxigênio e enxofre associados à anã branca. Ao estudar os detalhes nos espectros obtidos pelo X-shooter, a equipe descobriu que estes elementos se encontravam em um disco de gás em torno da anã branca e não na estrela propriamente dita. A única maneira de tal disco poder existir seria devido à evaporação de um planeta gigante.
As quantidades detectadas de hidrogênio, oxigênio e enxofre são semelhantes às encontradas nas profundas camadas atmosféricas de planetas gigantes e gelados, como Netuno e Urano. Se um tal planeta orbitasse perto da anã branca quente, a intensa radiação ultravioleta emitida pela estrela arrancaria as suas camadas mais exteriores e parte deste gás acabaria num disco girando em torno da anã branca. É este fenômeno que os cientistas pensam estar vendo em torno da WDJ0914+1914: o primeiro planeta em evaporação orbitando uma anã branca.
Combinando dados observacionais com modelos teóricos, a equipe de astrônomos do Reino Unido, Chile e Alemanha conseguiu obter uma ideia mais clara deste sistema único. A anã branca é pequena e extremamente quente, apresentando uma temperatura de 28.000 graus Celsius (o que corresponde a cinco vezes a temperatura do Sol). O planeta, por sua vez, é gelado e grande, pelo menos duas vezes o tamanho da estrela. Uma vez que descreve uma órbita muito próxima da estrela, completando uma translação em apenas 10 dias, os fótons de alta energia emitidos pela estrela estão gradualmente "soprando" a atmosfera do planeta. A maior parte do gás escapa, mas parte é puxado para um disco que gira em torno da estrela, a uma taxa de 3.000 toneladas por segundo. É este disco que faz com que o planeta do tipo de Netuno seja visível, o que não aconteceria de outro modo.
As estrelas como o nosso Sol queimam hidrogênio nos seus núcleos durante a maior parte das suas vidas. Quando gastam este combustível, crescem transformando-se em gigantes vermelhas, tornando-se centenas de vezes maiores e “engolindo” os planetas mais próximos. No caso do Sistema Solar, isso incluirá Mercúrio, Vênus e até a Terra, que serão consumidos pelo Sol em sua fase de gigante vermelha dentro de cerca de 5 bilhões de anos. Eventualmente, o Sol perderá as suas camadas mais exteriores, sobrando apenas um núcleo gasto e consumido, uma anã branca. Tais restos estelares podem ainda hospedar planetas e estima-se que existam muitos destes sistemas estelares na nossa Galáxia. No entanto, até agora os cientistas nunca tinham descoberto evidências de um planeta gigante sobrevivente em torno de uma anã branca. A detecção de um exoplaneta em órbita da WDJ0914+1914, situada a cerca de 1.500 anos-luz de distância da Terra na constelação de Câncer, pode ser a primeira de muitas detecções deste tipo de sistemas.
De acordo com os pesquisadores, o exoplaneta orbita a anã branca a uma distância de apenas 10 milhões de km, ou 15 vezes o raio do Sol, o que teria correspondido ainda ao interior da gigante vermelha. A localização incomum do planeta sugere que em algum momento após a estrela se tornar uma anã branca, o planeta se deslocou para mais perto desta. Os astrônomos acreditam que esta nova órbita pode ter sido o resultado de interações gravitacionais com outros planetas no sistema, o que significaria que mais do que um planeta pode ter sobrevivido à violenta transição da sua estrela hospedeira.
Esta pesquisa foi apresentada em um artigo publicado na revista Nature.
Fonte: ESO