terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

Galáxia de braços abertos

A galáxia espiral NGC 2008 fica no centro da cena, seus braços espirais fantasmagóricos se espalhando em nossa direção, nesta imagem captada pelo telescópio espacial Hubble.


© Hubble (NGC 2008)

Esta galáxia está localizada a cerca de 425 milhões de anos-luz da Terra, na constelação de Pictor. Foi descoberta em 1834 pelo astrônomo John Herschel, a NGC 2008 é classificada como uma galáxia tipo Sc na sequência do Hubble, um sistema usado para descrever e classificar as várias morfologias das galáxias. O "S" indica que a NGC 2008 é uma espiral, enquanto o "c" significa que possui uma protuberância central relativamente pequena e braços espirais abertos. As galáxias espirais com protuberâncias centrais maiores tendem a ter braços mais apertados e são classificadas como galáxias Sa, enquanto as intermediárias são classificadas como tipo Sb.

As galáxias espirais são onipresentes em todo o cosmos, compreendendo mais de 70% de todas as galáxias observadas, incluindo a nossa, a Via Láctea. Estas coleções grandiosas e em espiral de bilhões de estrelas estão entre as vistas mais maravilhosas que foram captadas por telescópios como o Hubble e estão firmemente embutidas na iconografia astronômica.

Fonte: NASA

sábado, 8 de fevereiro de 2020

Quantas estrelas eventualmente colidem como buracos negros?

Desde o avanço na astronomia de ondas gravitacionais em 2015, que os cientistas foram capazes de detectar mais de uma dúzia de pares de buracos negros, conhecidos como buracos negros binários, graças às suas colisões.


© MIT/Caltech/LIGO (ilustração da colisão de dois buracos negros)

No entanto, os cientistas ainda debatem quantos destes buracos negros nascem a partir das estrelas e como são capazes de se aproximar o suficiente para uma colisão durante a vida útil do nosso Universo.

Agora, um novo e promissor estudo desenvolvido por um astrofísico da Universidade de Vanderbilt poderá fornecer um método para encontrar o número de estrelas disponíveis na história do Universo que colidem como buracos negros binários.

A pesquisa vai ajudar futuros cientistas a interpretar a população subjacente de estrelas e a testar as teorias de formação de todos os buracos negros em colisão ao longo da história cósmica.

"Até agora, os cientistas teorizaram a formação e a existência de pares de buracos negros no Universo, mas as origens dos seus antecessores, estrelas, ainda permanecem um mistério," disse Karan Jani, astrofísico da Universidade de Vanderbilt. "Com este trabalho, fizemos um estudo forense sobre colisões de buracos negros usando as observações astrofísicas atualmente disponíveis. No processo, desenvolvemos uma restrição fundamental, ou estimativa, que nos diz mais sobre a fração de estrelas desde o início do Universo que estão destinadas a colidir como buracos negros."

Aproveitando a teoria da relatividade geral de Einstein, que nos diz como os buracos negros interagem e eventualmente colidem, Jani e Abraham Loeb, da Universidade de Harvard, usaram os eventos LIGO registados para fazer um inventário dos recursos temporais e espaciais do Universo a qualquer determinado ponto. Desenvolveram depois as restrições responsáveis por cada etapa do processo de um buraco negro binário: o número de estrelas disponíveis no Universo, o processo de cada estrela que transita para um buraco negro individual e a detecção da eventual colisão destes buracos negros, detectados centenas de milhões de anos mais tarde pelo LIGO como ondas gravitacionais emitidas pelo impacto.

"A partir das observações atuais, descobrimos que 14% de todas as estrelas massivas do Universo estão destinadas a colidir como buracos negros. É uma eficiência notável por parte da natureza," explicou Jani. "Estas restrições adicionais podem ajudar os cientistas a rastrear as histórias dos buracos negros, respondendo a perguntas antigas e, sem dúvida, criando cenários mais exóticos."

A pesquisa foi publicada na revista The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: Vanderbilt University

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

O confronto de duas estrelas

Os astrônomos descobriram uma peculiar nuvem de gás que resultou do confronto entre duas estrelas. Uma das estrelas cresceu tanto que engoliu a outra que, por sua vez, espiralou em direção à sua companheira levando-a a liberar as suas camadas mais exteriores.


© ESO/ALMA (sistema estelar duplo HD101584)

As estrelas modificam-se com a idade, acabando por morrer. No caso do Sol e de outras estrelas como a nossa, esta modificação passa por uma fase em que, depois de queimar todo o hidrogênio em seu núcleo, ela se transforma em uma grande e brilhante estrela gigante vermelha. Eventualmente, a estrela moribunda perde as suas camadas externas, deixando para trás seu núcleo quente e denso ao qual chamamos anã branca.

“O sistema estelar HD101584 é especial no sentido em que o seu ‘processo de morte' terminou prematuramente de forma dramática quando uma companheira de pequena massa bastante próxima se viu engolida pela gigante vermelha,” explica Hans Olofsson da Universidade de Tecnologia Chalmers, na Suécia, que liderou um estudo recente sobre este objeto intrigante.

Graças às novas observações obtidas pelo ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array) e complementadas com dados do APEX (Atacama Pathfinder EXperiment), operado pelo ESO, Olofsson e a sua equipe sabem agora que o que aconteceu ao sistema estelar duplo HD101584 foi semelhante a uma luta estelar. Quando a estrela principal se transformou em uma gigante vermelha, cresceu tanto que acabou por engolir a sua parceira de menor massa. Como resultado, a estrela menor espiralou em direção ao núcleo da gigante, mas não colidiu com ele. Em vez disso, essa manobra desencadeou uma explosão na estrela maior, deixando as suas camadas de gás espalhadas e o seu núcleo exposto.

A equipe diz que a estrutura complexa do gás observada na nebulosa HD101584 se deve a uma estrela pequena espiralando em direção à gigante vermelha, assim como aos jatos que se formaram no processo. Tal como um golpe mortal desferido às camadas de gás já vencidas, estes jatos foram lançados através do material ejetado anteriormente, dando origem aos anéis de gás e às brilhantes bolhas azuladas e avermelhadas que vemos na nebulosa.

Esta colisão possibilita uma compreensão melhor da evolução final de estrelas como o Sol. “Atualmente, conseguimos descrever os processos de morte comuns a muitas estrelas do tipo do Sol, mas não conseguimos explicar o seu porquê ou exatamente como é que acontecem. A HD101584 nos dá pistas importantes para resolver este quebra-cabeça, já que atualmente se encontra em uma curta fase de transição entre estágios evolucionários que conhecemos melhor. Com imagens detalhadas do meio que envolve a HD101584, podemos fazer a ligação entre a gigante vermelha que existia anteriormente e o remanescente estelar que em breve se tornará,” explica Sofia Ramstedt, da Universidade de Uppsala, na Suécia.

Esta imagem extraordinária do meio circunstelar da HD101584 não teria sido possível sem a excelente sensibilidade e resolução angular do ALMA.

Enquanto os telescópios atuais permitem aos astrônomos estudar o gás em torno do binário, as duas estrelas no centro da complexa nebulosa encontram-se muito próximas uma da outra e muito distantes de nós para poderem ser separadas. O Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, atualmente em construção no deserto chileno do Atacama, irá fornecer informação sobre o núcleo do objeto, permitindo que os astrônomos examinem mais de perto o par em colisão.

Esta pesquisa foi publicada na revista Astronomy & Astrophysics.

Fonte: ESO

Estrela binária V Sagittae vai explodir no final do século

Atualmente, a tênue estrela V Sagittae (V Sge) situada na constelação da Flecha, é pouco visível, mesmo através de telescópios de tamanho médio.


© NASA/JPL-Caltech (ilustração do sistema V Sge)

No entanto, por volta do ano 2083, esta estrela explodirá, tornando-se tão brilhante quanto Sirius, a estrela mais brilhante do céu noturno. Durante este período de erupção, V Sge será a estrela mais luminosa da Via Láctea.

Ao longo das próximas décadas, a estrela aumentará de brilho. Por volta do ano 2083, o seu ritmo de acreção subirá catastroficamente, derramando massa a taxas incrivelmente altas sobre a anã branca. Nos últimos dias desta espiral da morte, toda a massa da estrela companheira cairá sobre a anã branca, criando um vento supermassivo da estrela em fusão.

O V Sge é um sistema estelar pertencente a uma classe grande e diversificada chamada Variáveis Cataclísmicas (CVs, sigla inglesa para "Cataclysmic Variables"), que consiste de uma estrela comum numa órbita binária com uma anã branca, onde a massa da estrela normal está colapsando lentamente. As CVs incluem vários tipos de estrelas binárias, geralmente com um comportamento espetacular. A V Sge é a mais extrema de todas as CVs, aproximadamente 100 vezes mais luminosa do que todas as outras CVs conhecidas, e está absorvendo um vento estelar massivo, igual aos ventos das estrelas mais massivas antes da sua morte. Estas duas propriedades extremas são provocadas devido a estrela normal ser 3,9 vezes mais massiva do que a anã branca.

Em todas as outras CVs conhecidas, a anã branca é mais massiva do que a estrela normal em órbita, de modo que V Sge é totalmente única.

Esta constatação veio de medições rotineiras do brilho de V Sge em fotos antigas do céu agora arquivadas no Observatório da Universidade de Harvard, fornecendo uma história detalhada que remonta ao ano de 1890.

Surpreendentemente, V Sge tem vindo a aumentar sistematicamente de brilho por um fator de 10x, 2,5 magnitudes, desde o início da década de 1890 até esta última década. Este comportamento sem precedentes foi confirmado com dados de arquivo recolhidos a partir da base de dados da AAVSO (American Association of Variable Star Observers), dados esses que mostram que o brilho de V Sge subiu desde 1907 até aos últimos anos.

O pico do brilho deste evento explosivo durará mais de um mês, em que as duas estrelas se fundem numa só. O resultado final da fusão produzirá uma única estrela com um núcleo degenerado de anã branca, uma camada que queima hidrogênio, rodeada por um vasto invólucro de gás, principalmente hidrogênio.

Os cálculos indicam que o evento de fusão irá ocorrer por volta do ano 2083. "A incerteza nesta data é ±16 anos, decorrente principalmente da falta de uma medição perfeita da escala de tempo duplicada devido às grandes oscilações intrínsecas de brilho no registo histórico. Portanto, a fusão terá lugar aproximadamente entre 2067 e 2099, provavelmente perto do ponto médio deste intervalo.

A V Sge aparecerá incrivelmente brilhante no céu noturno. Será substancialmente mais brilhante do que a nova mais brilhante de todos os tempos (magnitude -0,5), há pouco mais de um século; e a última vez que uma estrela apareceu mais brilhante foi a Supernova de Kepler em 1604.

Fonte: Astronomy

sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

Nova emissão misteriosa de ondas de rádio

A fonte de explosões rápidas de rádio (FRBs), emissões de ondas de rádio que transmitem em poucos milissegundos a energia que o Sol irradia em um dia, permanece uma questão em aberto na astronomia.


© Gemini Observatory (FRB 180916)

Embora os astrônomos tenham visto mais de 100 FRBs, a maioria é tão breve que é difícil de localizar no céu.

Agora, Benito Marcote (JIVE, Holanda) anunciou recentemente que ele e seus colegas identificaram a localização precisa de uma quinta emissão de ondas de rádio. O resultado fornece informações sobre o meio ambiente em torno dessas fontes ainda misteriosas.

O telescópio Canadian Hydrogen Intensity Mapping Experiment (CHIME) do Canadá descobriu originalmente o flash de rádio, conhecido como FRB 180916.J0158+65. Então, como a fonte continuou emitido onda de rádio, oito antenas de rádio que fazem parte da Rede Européia VLBI captaram a fonte na periferia de uma galáxia espiral. Os astrônomos usaram o telescópio Gemini North, de 8 metros, em Mauna Kea, no Havaí, para criar imagens da região, descobrindo que o flash de rádio produzido tinha um berçário de estrelas recém-nascidas como companhia.

O ambiente em torno desse emissor é uma região que está formando novas estrelas. Isso contrasta com a localização de emissões únicas de FRB, todos os quais foram localizados em galáxias massivas distantes com baixas taxas de formação de estrelas.

Esta última adição aos FRBs com locais conhecidos sugere que os dois tipos (repetitivo e não repetitivo) têm origens diferentes. Mas os astrônomos ainda estão longe de entender quais são essas origens.

Esta descoberta fazia parte do primeiro catálogo de oito repetidores do telescópio CHIME descoberto em 2018, publicada no periódico Astrophysical Journal Letters. Enquanto isso, a colaboração do CHIME anunciou em 10 de janeiro que eles descobriram nove repetidores adicionais em observações de 2019. Mais surpreendente, no entanto, é uma nota de rodapé neste último estudo, que observa que 700 detecções de FRBs ainda estão sendo analisadas e serão publicadas em um catálogo a ser publicado.

Desde que foram descobertos, o número de FRBs conhecidas ficou para trás da multidão de teorias sobre o que poderiam ser. Agora, finalmente, as observações estão começando a superar as teorias: na verdade, estamos no ponto em que a enorme quantidade de dados de rádio coletados por várias pesquisas ultrapassou as capacidades de estudantes ansiosos de pós-graduação e, em vez disso, está sendo passada para algoritmos de redes neurais.

"Até o final de 2020, teremos mais de 1.000 FRBs, pelo menos algumas dezenas que serão localizadas com precisão e podemos responder a algumas perguntas. Ou pelo menos teremos novas perguntas," prevê Jason Hessels (ASTRON, Países Baixos).

Esta descoberta foi publicada na revista Nature.

Fonte: Sky & Telescope

terça-feira, 28 de janeiro de 2020

Explosão em sistema estelar

A sonda Kepler da NASA foi construída para encontrar exoplanetas, procurando estrelas que diminuem de brilho quando um planeta passa à sua frente.


© STScI/L. Hustak (ilustração de anã branca absorvendo material de anã marrom)

Felizmente, o mesmo projeto é ideal para a detecção de outros transientes astronômicos, objetos que aumentam ou diminuem de brilho com o tempo. Uma nova exploração de dados de arquivo do Kepler encontrou uma superexplosão incomum de uma nova anã anteriormente desconhecida. O sistema aumentou cerca de 1.600 vezes de brilho ao longo de menos um dia antes de desvanecer lentamente.

O sistema estelar em questão consiste de uma estrela anã branca com uma companheira anã marrom com cerca de um-décimo da massa da anã branca. Uma anã branca é o núcleo remanescente de uma estrela velha parecida com o Sol e contém aproximadamente a mesma quantidade de material que o Sol num globo com o tamanho da Terra. Uma anã marrom é um objeto com uma massa entre 10 e 80 Júpiteres que é demasiado pequeno para deflagrar fusão nuclear.

A anã marrom orbita a anã branca a cada 83 minutos, a uma distância de apenas 400.000 km, quase a distância Terra-Lua. Estão tão próximas uma da outra que a forte gravidade da anã branca retira o material da anã marrom, sugando a sua essência como um vampiro. O material roubado forma um disco de acreção à medida que espirala para a anã branca.

Foi por sorte que o Kepler estava observando na direção certa quando este sistema sofreu uma superexplosão, aumentando mais de 1.000 vezes de brilho. Realmente, o Kepler foi o único instrumento capaz de o testemunhar, uma vez que o sistema estava muito próximo do Sol, do ponto de vista da Terra. A rápida cadência de observações do Kepler, obtendo dados a cada 30 minutos, foi crucial para captar todos os detalhes da explosão.

O Kepler captou todo o evento, observando um lento aumento de brilho seguido por uma rápida intensificação. Embora o repentino aumento de brilho seja previsto pelas teorias, a razão do início lento permanece um mistério. As teorias da física do disco de acreção não preveem este fenômeno, que foi observado posteriormente em duas outras superexplosões de novas anãs.

As teorias sugerem que uma superexplosão é provocada quando o disco de acreção atinge um ponto de inflexão. À medida que acumula material, cresce em tamanho até que a orla externa sofre ressonância gravitacional com a anã marrom em órbita. Isto pode desencadear uma instabilidade térmica, fazendo com que o disco fique superaquecido. De fato, as observações mostram que a temperatura do disco sobe de 2.700 a 5.300 ºC no seu estado normal para 9.700 a 11.700 ºC no pico da superexplosão.

Este tipo de sistema de nova anã é relativamente raro, conhecendo-se apenas mais ou menos 100. Podem passar-se anos ou décadas entre explosões, o que torna a observação em flagrante um grande desafio.

A equipe planeja continuar explorando os dados do Kepler, bem como de outro caçador de exoplanetas, o TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite), à procura de outros transientes.

O artigo científico sobre a descoberta foi publicado na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Space Telescope Science Institute

Planeta mais quente pode dilacerar moléculas na sua atmosfera

Os gigantes gasosos chamados "Júpiteres quentes", que são planetas que orbitam muito perto das suas estrelas para sustentar vida e um dos mundos mais estranhos encontrados para além do nosso Sistema Solar.


© NASA/JPL-Caltech (ilustração do exoplaneta KELT-9b)

Novas observações mostram que o mais quente de todos, denominado KELT-9b, é ainda mais estranho, propenso a fusões globais tão severas que separam as moléculas que compõem a sua atmosfera. Tem quase três vezes a massa de Júpiter e orbita uma estrela a cerca de 670 anos-luz de distância. Com uma temperatura à superfície de 4.300º Celsius (mais quente que algumas estrelas) este exoplaneta é o mais quente encontrado até ao momento.

Agora, uma equipe de astrônomos usando o telescópio espacial Spitzer da NASA encontrou evidências de que o calor até é demasiado alto para que as moléculas permaneçam intactas. As moléculas de hidrogênio gasoso provavelmente são destruídas no lado diurno de KELT-9b, incapazes de se reconstituírem até que os seus átomos desarticulados fluam para o lado noturno do planeta.

Embora ainda extremamente quente, o leve arrefecimento no lado noturno é suficiente para permitir que as moléculas de hidrogênio gasoso se reformem, ou seja, até que voltem para a face virada para a estrela, onde são quebradas novamente.

A descoberta mostra a sofisticação crescente da tecnologia e das análises necessárias para estudar estes mundos muito distantes. A ciência está apenas começando a espiar a atmosfera dos exoplanetas, estudando as desintegrações moleculares dos mais quentes e brilhantes.

O KELT-9b permanecerá firmemente categorizado entre os mundos inabitáveis. Os astrônomos tomaram conhecimento do seu ambiente extremamente hostil em 2017, quando foi detectado pela primeira vez usando o sistema KELT (Kilodegree Extremely Little Telescope), um esforço combinado que envolve observações de dois telescópios robóticos, um no sul do estado norte-americano do Arizona e outro na África do Sul.

O telescópio espacial Spitzer, que faz observações no infravermelho, pode medir variações sutis no calor. Repetidas durante muitas horas, estas observações permitem que o Spitzer capture mudanças na atmosfera, à medida que o planeta apresenta fases enquanto orbita a estrela. Surgem diferentes metades do planeta à medida que este orbita a sua estrela.

Isto permitiu vislumbrar a diferença entre o lado diurno e noturno de KELT-9b. Neste caso, o planeta orbita tão perto a sua estrela que ele demora para completar uma volta em torno da estrela em apenas um dia e meio. Isto significa que sofre bloqueio de marés, apresentando sempre a mesma face à estrela (tal como a nossa Lua mostra sempre a mesma face à Terra). No lado oposto de KELT-9b, a noite dura para sempre.

Mas os gases e o calor fluem de um lado para o outro. Uma grande questão para os pesquisadores que tentam entender as atmosferas exoplanetárias é como é que a radiação e o fluxo se equilibram.

Os modelos de computador são as principais ferramentas nessas análises, mostrando como é provável que estas atmosferas se comportem a diferentes temperaturas. O melhor ajuste para os dados de KELT-9b foi um modelo que incluía moléculas de hidrogênio sendo separadas e reconstruídas, um processo conhecido como dissociação e recombinação.

O KELT-9b não apresenta grandes diferenças de temperatura entre o lado diurno e noturno, sugerindo fluxo de calor de um para o outro. E a "mancha quente" no lado diurno, que deverá estar diretamente sobre a estrela deste planeta, foi desviada da posição esperada. Os cientistas não sabem porquê; mais um mistério a ser resolvido neste planeta estranho e quente.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: Jet Propulsion Laboratory

segunda-feira, 27 de janeiro de 2020

Descoberta estrela gigante com química peculiar

Astrônomos do Observatório Nacional (ON) descobriram e analisaram uma estrela quimicamente peculiar, a gigante vermelha HD150382.


  © Digitized Sky Survey (estrela HD150382)

A estrela já era conhecida, mas foi o primeiro estudo químico realizado. Neste trabalho, a equipe formada pelos brasileiros Nacizo Holanda e Claudio Bastos e pela russa Natalia Drake reportou a descoberta de uma estrela gigante com grande quantidade de lítio em sua atmosfera; o fato não era esperado, com base na teoria de evolução estelar. 

Através da técnica de espectroscopia, os astrônomos podem derivar a composição química das estrelas, bem como seus parâmetros atmosféricos e algumas características físicas. Grandes quantidades de lítio não são esperadas em gigantes vermelhas, visto que as estrelas que evoluem para essa fase experimentam processos de mistura convectiva que acabam diluindo e posteriormente destruindo os átomos de lítio. Entretanto, desde 1982, estrelas raras como a HD150382 vêm sendo descobertas e ainda representam um verdadeiro quebra-cabeça para a astrofísica estelar.

“A mistura convectiva é muito importante para quem trabalha com abundâncias químicas, pois permite acessar o material que foi processado no interior dessas estrelas. O que havia antes é diluído e o que estava ‘oculto’ é dragado para a ‘superfície’. Por isso alguns chamam de dragagem,” explica Nacizo Holanda, um dos autores do trabalho.

Entre as hipóteses que poderiam explicar o aparecimento destas estrelas pouco comuns (aproximadamente 2% das gigantes vermelhas), figuram os seguintes cenários: enriquecimento de lítio através da captura de matéria ejetada em eventos de supernova; acreção de planetas ou de companheiras de baixíssima massa, como anãs marrons (estrelas fracassadas); e a existência de processos de mistura não-tradicionais que ocorrem no interior das estrelas e que atuam sob condições que ainda estão em debate na comunidade científica.

No caso da estrela HD150382, os pesquisadores sugerem que um mecanismo de mistura profunda ocorreu ou ainda ocorre. A estrela em questão é fria, sua temperatura efetiva é de aproximadamente 4.000 K, e apresenta baixa gravidade superficial, o que implica num estágio evolutivo muito avançado, pouco comum até mesmo para estrelas consideradas ricas em lítio.

“O fato é que exceções como esta em astronomia são fatos interessantíssimos para testar modelos alternativos. A gigante HD150382 motiva, não somente a busca de um mecanismo para a formação dessas estrelas ricas em lítio, mas atenta também para um estudo mais direcionado de estrelas mais evoluídas dentro desse pequeno universo de objetos quimicamente peculiares,” revela Nacizo Holanda. Neste sentido, a equipe do Observatório Nacional segue "caçando" essas estrelas com perfil químico e estágio evolutivo similar ao da HD150382.

Um artigo foi publicado no periódico The Astronomical Journal.

Fonte: Observatório Nacional

sábado, 25 de janeiro de 2020

Mapeando os arredores de um buraco negro

O material que cai num buraco negro lança raios X para o espaço, e agora, pela primeira vez, o observatório de raios X XMM-Newton da ESA usou os ecos reverberantes desta radiação para mapear o comportamento dinâmico e os arredores do próprio buraco negro.


© ESA (ilustração mostra os arredores de um buraco negro)

A maior parte dos buracos negros são demasiado pequenos, no céu, para resolvermos o seu ambiente imediato, mas ainda assim podemos explorar estes objetos misteriosos observando como a matéria se comporta quando se aproxima e cai neles.

À medida que o material espirala em direção a um buraco negro, é aquecido e emite raios X que, por sua vez, ecoam e reverberam à medida que interagem com o gás próximo. Estas regiões do espaço são altamente distorcidas devido à natureza extrema e à gravidade esmagadoramente forte do buraco negro.

Pela primeira vez, pesquisadores usaram o XMM-Newton para rastrear estes ecos de luz e mapear os arredores do buraco negro no núcleo de uma galáxia ativa. Com o nome IRAS 13224–3809, a galáxia hospedeira do buraco negro é uma das fontes de raios X mais variáveis do céu, passando por flutuações muito grandes e rápidas de brilho, na ordem de 50 em poucas horas.

"Todos nós estamos habituados à forma como o eco das nossas vozes soa diferente quando falamos numa sala de aula, em comparação com uma catedral, isto deve-se simplesmente à geometria e aos materiais dos locais, que fazem com que o som se comporte e se mova de maneira diferente," explica William Alston da Universidade de Cambridge, autor principal do novo estudo.

"De maneira semelhante, podemos observar como os ecos da radiação de raios X se propagam nas proximidades de um buraco negro, a fim de mapear a geometria de uma região e o estado de um aglomerado de matéria antes de desaparecer na singularidade. É um pouco como ecolocalização cósmica."

Como a dinâmica do gás em queda está fortemente ligada com as propriedades do buraco negro, William e colegas foram também capazes de determinar a massa e a rotação do buraco negro central da galáxia, observando as propriedades da matéria enquanto espiralava para dentro.

O material em espiral forma um disco enquanto cai para o buraco negro. Acima deste disco encontra-se uma região de elétrons muito quentes, com temperaturas na ordem dos bilhões de graus, chamada coroa. Embora os cientistas esperassem ver os ecos de reverberação que usaram para mapear a geometria da região, também avistaram algo inesperado: a própria coroa mudou de tamanho incrivelmente depressa, em questão de dias.

"À medida que o tamanho da coroa muda, o mesmo ocorre com o eco de luz, um pouco como se o teto da catedral estivesse subindo e descendo, mudando o eco das nossas vozes," acrescenta William.

"Ao rastrear os ecos de luz, fomos capazes de rastrear esta coroa em mudança e também obter valores muito melhores para a massa e para a rotação do buraco negro do que poderíamos determinar se a coroa não estivesse mudando de tamanho. Sabemos que a massa do buraco negro não pode estar flutuando; portanto, qualquer alteração no eco deve ser devida ao ambiente gasoso."

O estudo usou a observação mais longa de um buraco negro em acreção já obtida com o XMM-Newton, recolhida ao longo de 16 órbitas em 2011 e 2016 e totalizando 2 milhões de segundos, ou seja, pouco mais de 23 dias. Isto, combinado com a variabilidade forte e de curto prazo do próprio buraco negro, permitiu aos pesquisadores modelarem os ecos de maneira abrangente ao longo de escalas de tempo de um dia.

A região explorada neste estudo não é acessível a observatórios como o EHT (Event Horizon Telescope), que conseguiu obter a primeira imagem do gás na vizinhança imediata de um buraco negro, aquele localizado no centro da massiva galáxia vizinha M87. O resultado, com base em observações realizadas com radiotelescópios em todo o mundo em 2017 e publicado o ano passado, tornou-se imediatamente uma sensação global.

A imagem do EHT foi obtida usando um método conhecido como interferometria, uma técnica maravilhosa que só pode funcionar nos pouquíssimos buracos negros supermassivos mais próximos da Terra, como o de M87 e o da Via Láctea, porque o seu tamanho aparente no céu é grande o suficiente para este método funcionar.

Em contraste, esta abordagem é capaz de analisar as centenas de buracos negros supermassivos mais próximos que consomem ativamente matéria, e este número aumentará significativamente com o lançamento do satélite Athena da ESA.

A caracterização dos ambientes próximos dos buracos negros é um objetivo científico essencial da missão Athena da ESA, com lançamento previsto para o início da década de 2030 e que revelará os segredos do Universo quente e energético.

A medição da massa, rotação e ritmos de acreção de uma grande amostra de buracos negros é fundamental para entender a gravidade em todo o cosmos. Além disso, dado que os buracos negros supermassivos estão fortemente ligados às propriedades das suas galáxias hospedeiras, estes estudos também são fundamentais para aprofundar o nosso conhecimento de como as galáxias se formam e evoluem ao longo do tempo.

O mapeamento da reverberação é uma técnica excitante que promete revelar muito sobre os buracos negros e sobre o Universo em geral. Espera-se que o XMM-Newton realize campanhas de observação semelhantes para mais algumas galáxias ativas nos próximos anos, para que o método esteja totalmente estabelecido quando a missão Athena for lançada.

Um artigo foi publicado na revista Nature.

Fonte: ESA

sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

O aglomerado de estrelas Hyades

O aglomerado aberto de Hyades é o mais próximo do Sol.


© Jose Mtanous (aglomerado aberto das Hyades)

O aglomerado aberto das Hyades é brilhante o suficiente para ter sido observado até milhares de anos atrás, mas não é tão brilhante ou compacto quanto o aglomerado de estrelas nas proximidades das Plêiades (M45). 

Uma imagem particularmente profunda das Hyades mostra cores vivas de estrelas e nebulosas coincidentes fracas. A estrela mais brilhante do campo é Aldebaran (amarelo), o olho do touro em direção à constelação de Touro. Aldebaran, está localizada a 65 anos-luz de distância; agora é conhecida por não estar relacionada ao aglomerado aberto das Hyades, que fica a cerca de 150 anos-luz de distância.

As estrelas centrais das Hyades estão espalhadas por cerca de 15 anos-luz. As Hyades foi formada cerca de 625 milhões de anos atrás, provavelmente compartilha uma origem comum com o aglomerado da Colmeia (M44), um aglomerado estelar aberto que pode ser visto a olho nu em direção à constelação de Câncer; isto é devido ao movimento no espaço de M44 e da idade notavelmente semelhante.

Fonte: NASA

Campanha global do Gaia revela segredos de par estelar

Uma campanha de observação global de 500 dias, liderada há mais de três anos pelo Gaia da ESA, forneceu informações sem precedentes sobre o sistema binário que provocou um aumento incomum de brilho de uma estrela ainda mais distante.


© M. Rębisz (ilustração do sistema binário Gaia16aye)

O aumento no brilho estelar, localizado na constelação de Cisne, foi detectado pela primeira vez em agosto de 2016 pelo programa Gaia Photometric Science Alerts.

Este sistema, gerido pelo Instituto de Astronomia da Universidade de Cambridge, Reino Unido, varre diariamente a enorme quantidade de dados provenientes do Gaia e alerta os astrônomos para o aparecimento de novas fontes ou variações incomuns de brilho em fontes conhecidas, para que possam apontar rapidamente outros telescópios terrestres e espaciais e assim estudar os eventos em detalhe. Os fenômenos podem incluir explosões de supernova e outros surtos estelares.

Neste caso em particular, as observações de acompanhamento realizadas com mais de 50 telescópios em todo o mundo revelaram que a fonte, desde então denominada Gaia16aye, estava se comportando de uma maneira bastante estranha.

A estrela ficou cada vez mais brilhante e então, no espaço de apenas um dia, o seu brilho caiu rapidamente. Este foi um comportamento muito incomum. Quase nenhum tipo de supernova ou outra estrela faz isto.

Os astrônomos perceberam em pouco tempo que este aumento de brilho foi provocado por uma microlente gravitacional, um efeito previsto pela teoria da relatividade geral de Einstein, que curva o espaço-tempo na vizinhança de objetos muito grandes, como estrelas ou buracos negros.

Quando um objeto tão grande, que pode ser demasiado fraco para ser observado da Terra, passa em frente de outra fonte de luz mais distante, a sua gravidade curva o tecido do espaço-tempo nas proximidades. Isto distorce o percurso da radiação oriunda da fonte de fundo, essencialmente comportando-se como uma lupa gigante.

O Gaia16aye é o segundo evento de microlentes detectado pelo satélite Gaia. No entanto, os astrônomos notaram que se comportava estranhamente, mesmo para este tipo de evento.

Neste evento, não só o aumento de brilho estelar caiu acentuadamente, em vez de a um ritmo constante, como após algumas semanas, subiu novamente de brilho. Ao longo de 500 dias de observações, foi visto o aumento e declínio de brilho cinco vezes.

Esta queda repentina e acentuada no brilho sugeriu que a lente gravitacional que provocava o aumento de brilho devia consistir de um sistema binário, um par de estrelas ou outros objetos celestes, ligados entre si pela gravidade mútua.

Os campos gravitacionais combinados dos dois objetos produzem uma lente com uma rede bastante complexa de regiões de alta ampliação. Quando uma fonte de fundo passa por estas regiões no céu, aumenta de brilho e depois cai imediatamente ao sair delas.

A partir do padrão de aumentos e quedas de brilho subsequentes, os astrônomos conseguiram deduzir que o sistema binário estava orbitando a um ritmo bastante rápido.

O longo período de observações, que durou até ao final de 2017, e a grande participação de telescópios terrestres espalhados por todo o mundo, permitiram aos astrônomos recolher uma grande quantidade de dados, quase 25.000 pontos de dados individuais.

Os astrônomos puderam determinar o período de translação do sistema, as massas dos componentes, a sua separação, a forma das suas órbitas, sem ver a luz dos componentes binários.

O par consiste de duas estrelas bastante pequenas, com 0,57 e 0,36 vezes a massa do nosso Sol, respectivamente. Separadas por aproximadamente o dobro da distância Terra-Sol, as estrelas orbitam em torno do seu centro de massa comum em menos de três anos.

Um artigo foi publicado na revista Astronomy & Astrophysics.

Fonte: ESA

terça-feira, 21 de janeiro de 2020

Pode ter sido descoberto um segundo exoplaneta em Proxima Centauri

Cientistas descobriram o que pensam ser um segundo planeta em órbita da estrela mais próxima do nosso Sistema Solar, Proxima Centauri, que ficou famosa em 2016 com a descoberta de um planeta "semelhante à Terra" em órbita, Proxima b.


© Lorenzo Santinelli (ilustração do sistema planetário em torno de Proxima Centauri)

Novas observações de Proxima Centauri tornaram possível revelar a presença do que está sendo descrito como um planeta candidato de baixa massa (pelo menos 5,8 vezes a massa da Terra), aproximadamente com metade do tamanho de Netuno, em órbita da estrela. Poderá ser uma super-Terra rochosa ou um "mini-Netuno" gasoso. Com uma órbita de 5,2 anos, provavelmente tem temperaturas na ordem dos -230 ºC, sendo demasiado frio para ser habitável.

A descoberta foi realizada por uma equipe internacional de pesquisadores da Universidade de Hertfordshire, Inglaterra, do INAF-Observatório Astrofísico de Turim, Itália, da Universidade de Creta e do Instituto de Astrofísica FORTH, Grécia.

A Proxima Centauri é uma estrela anã vermelha cerca de 8 vezes menor que o Sol. É a estrela mais próxima do Sistema Solar, a uma distância de 4,2 anos-luz. Os cientistas esperam que a descoberta possa eventualmente ajudar a nossa compreensão da composição de diferentes planetas e de como o Universo funciona.

Hugh Jones, professor de astrofísica na Universidade de Hertfordshire, comenta: "Graças à proximidade do planeta e à sua órbita a uma distância relativamente grande da sua estrela (1,5 UA), esta é uma das melhores chances possíveis de observação direta que permitirá a compreensão detalhada de outro exoplaneta. No futuro, Proxima c poderá tornar-se um possível alvo para um estudo mais direto do projeto Breakthrough StarShot, que será a primeira tentativa da humanidade de viajar para outro sistema estelar." O professor Jones, juntamente com Paul Bulter, da Instituição Carnegie para Ciência, foram responsáveis por produzir o conjunto de dados mais precisos para o projeto usando dados do espectrógrafo UVES acoplado ao Very Large Telescope (VLT) do ESO.

O professor Jones, que também fez parte da descoberta do planeta "tipo-Terra", Proxima b, explicou o processo: "Primeiro submetemos um artigo sobre a existência de Proxima b em fevereiro de 2013, embora só tenhamos obtido evidências suficientes para apoiar conclusivamente uma descoberta tão importante em 2016. As nossas observações contínuas e um melhor processamento de dados permitiram-nos discernir o sinal de Proxima c. Esperamos ansiosamente confirmar o sinal com novas instalações e descobrir quão semelhante ou diferente dos planetas do nosso Sistema Solar Proxima c realmente é."

A descoberta segue os recentes anúncios de um "Netuno frio" e de dois planetas potencialmente habitáveis encontrados em órbita de estrelas próximas, publicados na revista The Astrophysical Journal. A mesma técnica de espectrografia com o UVES também foi usada neste projeto.

A descoberta foi publicada na revista Science Advances.

Fonte: University of Hertfordshire