terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

Cygnus X-1 é mais massivo do que se pensava

Novas observações do primeiro buraco negro já detectado levaram os astrônomos a questionar o que sabem sobre os objetos mais misteriosos do Universo.

© ICRAR (ilustração do sistema Cygnus X-1)

A pesquisa mostra que o sistema conhecido como Cygnus X-1 contém o buraco negro de massa estelar mais massivo já detectado sem a utilização de ondas gravitacionais. 

Cygnus X-1 é um dos buracos negros mais próximos da Terra. Foi descoberto em 1964, quando um par de contadores Geiger foram transportados a bordo de um foguete suborbital lançado a partir do estado norte-americano do Novo México.

O objeto foi o foco de uma famosa aposta científica entre os físicos Stephen Hawking e Kip Thorne, com Hawking apostando em 1974 que não era um buraco negro. Hawking concedeu a aposta em 1990. 

Neste trabalho mais recente, uma equipe internacional de astrônomos usou o VLBA (Very Long Baseline Array), um radiotelescópio do tamanho de um continente composto por 10 antenas espalhadas pelos EUA, juntamente com uma técnica inteligente para medir distâncias no espaço.

"Se pudermos ver o mesmo objeto de locais diferentes, podemos calcular a sua distância medindo como o objeto parece mover-se em relação ao plano de fundo," disse o professor James Miller-Jones da Universidade Curtin e do ICRAR (International Centre for Radio Astronomy Research). Se colocarmos o dedo à frente dos nossos olhos e o observarmos com um olho de cada vez, vamos notar que o dedo parece saltar de posição em relação ao plano de fundo. É exatamente o mesmo princípio.

Ao longo de seis dias foi observada uma órbita completa do buraco negro e usando observações obtidas do mesmo sistema com a mesma rede de telescópios em 2011. Este método e as novas medições mostram que o sistema está mais longe do que se pensava, com um buraco negro que é significativamente mais massivo. 

As estrelas perdem massa para o ambiente circundante por meio de ventos estelares que sopram da sua superfície. Mas para formar um buraco negro assim tão massivo, é preciso diminuir a quantidade de massa que as estrelas brilhantes perdem durante as suas vidas. 

O buraco negro no sistema Cygnus X-1 começou a sua vida como uma estrela com aproximadamente 60 vezes a massa do Sol e colapsou há dezenas de milhares de anos. Incrivelmente, está orbitando a sua estrela companheira, uma supergigante, a cada cinco dias e meio a apenas um-quinto da distância entre a Terra e o Sol.

Estas novas observações dizem-nos que o buraco negro tem mais de 20 vezes a massa do nosso Sol, um aumento de 50% em relação às estimativas anteriores. Usando as medições atualizadas para a massa do buraco negro e a sua distância da Terra, foi possível confirmar que Cygnus X-1 gira incrivelmente depressa, muito perto da velocidade da luz e mais depressa do que qualquer outro buraco negro encontrado até à data.

A pesquisa foi publicada na revista Science.

Fonte: International Centre for Radio Astronomy Research

Um mapa sem precedentes do campo magnético do Sol

Durante décadas após a sua descoberta, os observadores só podiam ver a cromosfera solar por alguns momentos fugazes: durante um eclipse solar total, quando um brilho vermelho rodeava a silhueta da Lua.


© Luc Viatour (cromosfera durante um eclipse solar)

Mais de cem anos depois, a cromosfera continua a ser a mais misteriosa das camadas atmosféricas do Sol. Situada entre a brilhante superfície e a etérea coroa solar, a atmosfera externa do Sol, a cromosfera é um lugar de mudanças rápidas, onde a temperatura aumenta e os campos magnéticos começam a dominar o comportamento do Sol.

Agora, pela primeira vez, três missões da NASA perscrutaram a atmosfera para enviar medições a várias altitudes do seu campo magnético. As observações, captadas por dois satélites e pela missão CLASP2 (Chromospheric Layer Spectropolarimeter 2), a bordo de um pequeno foguete suborbital, ajudam a revelar como os campos magnéticos à superfície do Sol dão origem às erupções brilhantes na sua atmosfera externa.

Um objetivo principal da heliofísica, a ciência da influência do Sol no espaço, incluindo as atmosferas planetárias, é prever o clima espacial, que geralmente começa no Sol, mas pode espalhar-se rapidamente pelo espaço e causar distúrbios perto da Terra.

O que impulsiona estas erupções solares é o campo magnético do Sol, as linhas invisíveis de força que se estendem da superfície solar ao espaço bem para lá da Terra. Este campo magnético é difícil de ver, só pode ser observado indiretamente, pela luz do plasma, ou gás superaquecido, que traça as suas linhas como faróis de carros que viajam numa estrada distante. No entanto, a forma como estas linhas magnéticas se organizam, sejam frouxas e retas ou firmes e emaranhadas, faz toda a diferença entre um Sol silencioso e uma erupção solar. 

Idealmente, os pesquisadores poderiam ler as linhas do campo magnético na coroa, onde ocorrem as erupções solares, mas o plasma é muito esparso para leituras precisas (a coroa é mais de um bilhão de vezes menos densa do que o ar ao nível do mar). Ao invés, os cientistas medem a fotosfera mais densamente compactada, a superfície visível do Sol, duas camadas abaixo. Usam então modelos matemáticos para propagar este campo para cima até à coroa. 

Esta abordagem ignora a medição da cromosfera, que fica entre as duas, na esperança de simular o seu comportamento. Infelizmente, na cromosfera as linhas do campo magnético reorganizam-se de maneiras difíceis de prever. 

Instituições nos EUA, Japão, Espanha e França trabalharam juntas para desenvolver uma nova abordagem para medir o campo magnético da cromosfera, apesar da sua natureza desorganizada. Modificando um instrumento que voou em 2015, acoplaram o seu observatório solar num foguete de sondagem. Este tipo de foguetes é lançado para o espaço para breves pesquisas de alguns minutos antes de cair de volta à Terra. Mais acessíveis e rápidos de construir e voar do que missões com satélites maiores, são também um palco ideal para testar novas ideias e técnicas inovadoras.

Lançado a partir do Campo de Teste de Mísseis de White Sands, no estado norte-americano do Novo México, o foguete atingiu uma altitude de 274 km para uma visão do Sol acima da atmosfera da Terra, que de outra forma bloqueia certos comprimentos de onda da luz.

Enquanto o CLASP2 observava o Sol, o IRIS (Interface Region Imaging Spectrograph) da NASA e o satélite Hinode da JAXA/NASA, ambos observando o Sol a partir de órbita terrestre, ajustaram os seus telescópios para olhar para o mesmo local. Em coordenação, as três missões concentraram-se na mesma parte do Sol, mas perscrutaram profundidades diferentes. O Hinode focou-se na fotosfera, procurando linhas espectrais do ferro neutro aí formado. O CLASP2 visou três alturas diferentes dentro da cromosfera, examinando linhas espectrais do magnésio ionizado e do manganês. Entretanto, o IRIS media as linhas de magnésio em mais alta resolução, para calibrar os dados do CLASP2. Juntas, as missões monitoraram quatro camadas diferentes dentro e ao redor da atmosfera.

O aspeto mais impressionante dos dados foi o quão variada a cromosfera acabou por ser. Tanto ao longo da porção do Sol que foi estudada, quanto a diferentes alturas no seu interior, o campo magnético variou significativamente.

Na superfície do Sol, vemos campos magnéticos que mudam a distâncias curtas: mais acima, essas variações são muito mais difusas. Em alguns lugares, o campo magnético não alcançou todo o caminho até ao ponto mais alto medido, enquanto em outros lugares, ainda estava com força total.

A equipe espera usar esta técnica para medições magnéticas com várias alturas para mapear todo o campo magnético da cromosfera. Isto não apenas ajudaria na capacidade de prever o clima espacial, mas também forneceria informações importantes sobre a atmosfera em torno da nossa estrela. Em vez de apenas medir os campos magnéticos ao longo de uma faixa muito estreita, a equipe quer examiná-los ao longo do alvo e fazer um mapa bidimensional.

Um artigo científico foi publicado na revista Science Advances.

Fonte: National Astronomical Observatory of Japan

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

Voando em asas de formação planetária

Tal como um pássaro em voo, com as asas esticadas no vazio no espaço, a estrela SU Aur, muito mais jovem e mais massiva que o Sol, encontra-se rodeada por um disco gigante de formação planetária.

© ESO/Ginski (estrela SU Aur)

Esta imagem, captada pelo instrumento SPHERE montado no Very Large Telescope (VLT) do ESO, mostra o disco em torno da SU Aur com um detalhe sem precedentes, incluindo as longas correntes de poeira que se encontram ligadas ao disco.

A estrela propriamente dita aparece-nos tapada pelo coronógrafo do instrumento, um dispositivo que bloqueia a luz emitida pela estrela central com o objetivo de podermos observar as estruturas menos brilhantes que a rodeiam.

As correntes de poeira são compostas por material vindo de uma nebulosa que está fluindo para o disco. Esta nebulosa teve muito provavelmente origem numa colisão entre a estrela e uma enorme nuvem de gás e poeira, o que resultou na forma bastante única do disco de formação planetária e na estrutura da poeira circundante.

Um novo estudo da SU Aur, que fez uso do VLT e de dados de outros telescópios, incluindo o Atacama Large Millimeter/Submillimeter Array (ALMA), mostrou que a nebulosa ainda está fornecendo material ao disco de formação planetária. Estas novas observações mostram bem como os discos de formação planetária podem ser complexos.

Fonte: ESO

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

Dois exoplanetas em órbita reversa em um sistema estelar triplo

Um grupo de pesquisadores liderados por Maria Hjorth e Simon Albrecht do Centro de Astrofísica Estelar da Universidade de Aarhus descobriu um sistema exoplanetário muito especial.

© Christoffer Grønne (ilustração do sistema exoplanetário K2-290)

Dois exoplanetas estão em órbita contrária em torno da sua estrela. Esta surpreendente arquitetura orbital foi provocada pelo disco protoplanetário, no qual os dois planetas se formaram, sendo inclinado pela segunda estrela neste sistema.

Este sistema planetário é muito intrigante. Existem dois planetas que orbitam em torno da estrela quase na direção oposta à rotação da estrela em torno de si própria. Isto é diferente do nosso próprio Sistema Solar, onde todos os planetas giram na mesma direção da rotação do Sol. 

Este não é o primeiro caso conhecido de um sistema planetário "retrógrado", os primeiros foram avistados há mais de 10 anos. Mas este é um caso raro em que é preciso saber o que provocou o desalinhamento drástico, e a explicação é diferente do que os pesquisadores assumiram que poderia ter acontecido nos outros sistemas.

Em qualquer sistema planetário, pensa-se que os planetas se formam num disco circular e giratório de material que orbita em torno da jovem estrela durante alguns milhões de anos após o nascimento da própria estrela, o chamado disco protoplanetário. Normalmente, o disco e a estrela giram da mesma maneira. No entanto, se houver uma estrela vizinha, a força gravitacional desta estrela companheira pode inclinar o disco.

A física subjacente está ligada ao comportamento que um pião exibe, quando a sua rotação diminui e o próprio eixo começa a girar em forma de cone. O cenário foi teorizado em 2012 e agora foi encontrado o primeiro sistema onde este processo ocorreu. 

Depois que foi descoberto o sistema K2-290, notou-se que este sistema é ideal para testar esta teoria, pois não é orbitado apenas por dois planetas, mas também contém duas estrelas. 

Uma implicação da descoberta é que não se pode mais assumir que as condições iniciais da formação planetária exigem alinhamentos entre a rotação estelar e as órbitas planetárias. É importante ressaltar que enquanto outras teorias que visam explicar os desalinhamentos em sistemas exoplanetários tendem a funcionar melhor em grandes planetas como Júpiter em órbitas de período curto, o mecanismo de inclinação do disco aplica-se a planetas de qualquer tamanho. Poderá haver outro mundo parecido com a Terra, por exemplo, que viaja pelos polos norte e sul da sua estrela progenitora. 

Um artigo foi publicado recentemente no conceituado periódico Proceedings of the National Academy of Sciences.

Fonte: National Astronomical Observatory of Japan

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

Novos exoplanetas numa coleção de estrelas jovens

Usando observações do TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA, astrônomos descobriram um trio de exoplanetas quentes maiores do que a Terra em órbita de uma estrela muito mais jovem que nosso Sol, de nome TOI 451.

© NASA (TOI 451 e outros objetos)

Os pontos amarelos na imagem mostram as posições de membros conhecidos ou suspeitos, com TOI 451 assinalado no círculo verde. Nota-se também o famoso aglomerado das Plêiades em Touro (em cima, à esquerda).

O sistema reside na recém-descoberta corrente Peixes-Erídano, uma coleção de estrelas com menos de 3% da idade do nosso Sistema Solar que se estende por um-terço do céu. 

Os planetas foram descobertos em imagens obtidas pelo TESS entre outubro e dezembro de 2018. Estudos de acompanhamento de TOI 451 e dos seus planetas incluíram observações feitas em 2019 e 2020 usando o telescópio espacial Spitzer da NASA, desde então reformado, bem como com muitas outras instalações terrestres. 

Dados infravermelhos de arquivo do satélite NEOWISE (Near-Earth Object Wide-Field Infrared Survey Explorer) da NASA, recolhidos entre 2009 e 2011 sob o seu nome anterior, WISE, sugerem que o sistema retém um disco frio de poeira e detritos rochosos.

Outras observações mostram que TOI 451 provavelmente tem duas companheiras estelares distantes que se orbitam uma à outra muito além dos planetas. Tem apenas 120 milhões de anos e fica a apenas 400 anos-luz, permitindo observações detalhadas deste jovem sistema planetário. E dado que existem três planetas com tamanhos entre duas e quatro vezes o da Terra, são alvos especialmente promissores para testar teorias sobre como as atmosferas planetárias evoluem.

As correntes estelares formam-se quando a gravidade da Via Láctea "rasga" os aglomerados de estrelas ou galáxias anãs. As estrelas individuais movem-se ao longo da órbita original do aglomerado, formando um grupo alongado que se dispersa gradualmente.

Em 2019, uma equipe liderada por Stefan Meingast da Universidade de Viena usou dados da missão Gaia da ESA para descobrir a corrente Peixes-Erídano, com o nome das constelações que contêm as maiores concentrações de estrelas. Estendendo-se por 14 constelações, a corrente tem cerca de 1.300 anos-luz de comprimento. No entanto, a idade inicialmente determinada para a corrente era muito maior do que a determinada atualmente.

Mais tarde, ainda em 2019,pesquisadores liderados por Jason Curtis da Universidade de Columbia em Nova York analisaram os dados do TESS para dúzias de membros deste fluxo. As estrelas mais jovens giram mais depressa do que as suas homólogas mais velhas e também tendem a ter manchas estelares mais proeminentes, regiões mais escuras e frias como as manchas solares.

À medida que estas manchas giram para dentro e para fora do nosso ponto de vista, podem produzir pequenas variações no brilho de uma estrela que o TESS pode medir. As medições do TESS revelaram evidências esmagadoras de manchas estelares e de rotação rápida entre as estrelas da corrente. 

Com base neste resultado, Curtis e seus colegas descobriram que o fluxo estelar tinha apenas 120 milhões de anos, semelhante ao famoso aglomerado das Plêiades e oito vezes mais jovem do que as estimativas anteriores. 

A massa, juventude e proximidade da corrente Peixes-Erídano fazem dela um laboratório fundamental para estudar a formação e a evolução estelar e planetária. 

A jovem estrela TOI 451, mais conhecida como CD-38 1467, fica a cerca de 400 anos-luz de distância, na direção da constelação de Erídano. Tem 95% da massa do nosso Sol, mas é 12% menor, ligeiramente mais fria e emite 35% menos energia. TOI 451 completa uma rotação em torno de si própria a cada 5,1 dias, mais de cinco vezes mais depressa do que o Sol. 

O TESS identifica novos mundos procurando trânsitos, quedas ligeiras e regulares no brilho estelar que ocorrem quando um planeta passa em frente da sua estrela a partir da nossa perspetiva. São evidentes, nos dados do TESS, trânsitos de todos os três planetas. 

Observações adicionais de acompanhamento vieram do Observatório Las Cumbres, uma rede global de telescópios com sede em Goleta, Califórnia, e do PEST (Perth Exoplanet Survey Telescope), na Austrália. 

Mesmo o planeta mais distante de TOI 451 orbita três vezes mais perto do que Mercúrio orbita o Sol, de modo que todos estes mundos são bastante quentes e inóspitos à vida como a conhecemos. As estimativas de temperatura variam de cerca de 1.200º C para o planeta mais interior a cerca de 450º C para o mais exterior. 

TOI 451 b completa uma órbita a cada 1,9 dias, tem aproximadamente 1,9 vezes o tamanho da Terra e tem uma massa estimada entre duas e 12 vezes a da Terra. O planeta seguinte, TOI 451 c, completa uma órbita a cada 9,2 dias, é cerca de três vezes maior do que a Terra e possui entre três e 16 vezes a massa da Terra. O maior e mais distante mundo, TOI 451 d, orbita a estrela a cada 16 dias, tem quatro vezes o tamanho do nosso planeta e tem entre quatro e 19 massas terrestres. 

Os astrônomos esperam que planetas tão grandes quanto estes retenham grande parte da sua atmosfera, apesar do intenso calor da sua estrela. Diferentes teorias de como as atmosferas evoluem até que um sistema planetário atinge a idade de TOI 451 preveem uma ampla gama de propriedades. A observação da luz estelar passando pelas atmosferas destes planetas fornece uma oportunidade de estudar esta fase de desenvolvimento e pode ajudar a restringir os modelos atuais. Ao medir a luz estelar que penetra através da atmosfera de um planeta em diferentes comprimentos de onda, podemos inferir a sua composição química e a presença de nuvens ou neblina em alta altitude.

As observações do WISE mostram que o sistema é excepcionalmente brilhante no infravermelho, que é invisível aos olhos humanos, em comprimentos de onda de 12 e 24 micrômetros. Isto sugere a presença de um disco de detritos, onde corpos rochosos semelhantes a asteroides colidem e se transformam em poeira. 

Os astrônomos não conseguiram determinar a extensão do disco, imaginam-no como um anel difuso de rocha e poeira posicionado tão longe da sua estrela quanto Júpiter está do nosso Sol. Os pesquisadores também analisam uma estrela vizinha fraca que aparece a cerca de dois pixéis de distância de TOI 451 nas imagens obtidas pelo TESS. Com base nos dados do Gaia, a equipe determinou que esta estrela é uma companheira gravitacional localizada tão longe de TOI 451 que a sua luz leva 27 dias para chegar até ela. De fato, os cientistas pensam que a companheira é provavelmente um sistema binário composto por duas anãs do tipo-M, cada uma com cerca de 45% da massa do Sol e emitindo apenas 2% da sua energia.

Um artigo que relata as descobertas foi publicado no periódico The Astronomical Journal.

Fonte: NASA

terça-feira, 16 de fevereiro de 2021

Sinais preliminares de um planeta na zona habitável de Alpha Centauri A

Uma equipe internacional de astrônomos encontrou sinais de que poderá existir um planeta na zona habitável de Alpha Centauri AB, um sistema binário a uns meros 4,37 anos-luz de distância.

© Hubble (Alpha Centauri AB)

Poderá ser um dos planetas na zona habitável mais próximos até à data, embora a ser confirmado não seja muito parecido com a Terra. Alpha Centauri é o sistema estelar mais próximo do nosso Sistema Solar, contendo três estrelas diferentes. Estas são Alpha Centauri A e B, estrelas parecidas com o Sol que formam um binário íntimo uma em torno da outra a cerca de 4,37 anos-luz de distância. O par estelar orbita o centro de gravidade comum a cada 80 anos, com uma distância média de aproximadamente 11 vezes a distância Terra-Sol.

O sistema estelar também hospeda Proxima Centauri, uma pequena anã vermelha que até está mais próxima do Sol (a 4,24 anos-luz de distância) e tem uma relação gravitacional muito mais liberal com as outras duas estrelas. 

Sabemos que Proxima Centauri abriga dois planetas, um dos quais (Proxima b) parece ser um exoplaneta do tamanho da Terra na zona habitável (região onde a água líquida pode existir à superfície de um planeta rochoso). Mas pensa-se que Proxima b sofre bloqueio de marés e é inundado por ventos estelares, o que significa que é improvável que seja habitável.

O potencial do sistema Alpha Centauri AB para hospedar mundos propícios à vida sempre intrigou os cientistas, mas nenhum exoplaneta conhecido foi aí encontrado, em parte porque a proximidade significava que era demasiado brilhante para serem examinados eficazmente quaisquer objetos planetários na área. Mas, astrônomos usando o VLT (Very Large Telescope) do ESO no Chile encontrou um sinal de imagem térmica brilhante oriundo da zona habitável de Alpha Centauri A. 

O sinal foi derivado através do NEAR (Near Earths in the Alpha Center Region), um projeto de 3 milhões de dólares financiado pelo ESO e pela iniciativa Breakthrough Watch, que visa procurar planetas rochosos do tamanho da Terra em torno de Alpha Centauri e de outros sistemas estelares até 20 anos-luz do Sol.

O NEAR promoveu atualizações do VLT que incluíram um coronógrafo térmico, que pode bloquear a luz estelar e procurar assinaturas de calor provenientes de objetos planetários à medida que estes refletem a luz das suas estrelas. Este encontrou o sinal em torno de Alpha Centauri A após analisar 100 horas de dados.

No entanto, a existência do planeta ainda não foi verificada, pelo que ainda nem tem nome. O novo sinal sugere que é do tamanho de Netuno. Isto significa que não é um mundo parecido com a Terra, mas um gigante gasoso quente cinco a sete vezes maior que a Terra. 

Se abrigasse vida, provavelmente seria vida microbiana que vagueava pelas nuvens. E o sinal pode muito bem ser provocado por uma série de outras explicações, como poeira cósmica quente, um objeto mais distante no plano de fundo, ou fótons perdidos.

A confirmação ou refutação da existência do planeta não deverá ser muito difícil, os astrônomos simplesmente têm que observar o objeto novamente e verificar se a sua nova posição corresponde à de uma órbita.

Um artigo foi publicado na revista Nature Communications.

Fonte: Massachusetts Institute of Technology

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021

Hubble descobre concentração de pequenos buracos negros

Uma equipe de astrônomos esperave encontrar um buraco negro de massa intermediária no núcleo do aglomerado globular NGC 6397, mas, em vez disso, encontraram evidências de uma concentração de buracos negros menores escondidos ali.

© Hubble (aglomerado globular NGC 6397)

Novos dados do telescópio espacial Hubble levaram à primeira medição da extensão de uma coleção de buracos negros em um aglomerado globular colapsado. 

Os aglomerados globulares são sistemas estelares extremamente densos, nos quais as estrelas são compactadas juntas. Eles também são tipicamente muito antigos, o aglomerado globular que é o foco deste estudo, o NGC 6397, é quase tão antigo quanto o próprio Universo. 

Ele reside a 7.800 anos-luz de distância, tornando-o um dos aglomerados globulares mais próximos da Terra. Por causa de seu núcleo muito denso, é conhecido como um aglomerado com núcleo colapsado. 

Quando Eduardo Vitral e Gary A. Mamon do Institut d'Astrophysique de Paris (IAP) decidiram estudar o núcleo do NGC 6397, eles esperavam encontrar evidências de um buraco negro de massa intermediária (IMBH). Eles são menores do que os buracos negros supermassivos que ficam nos núcleos de grandes galáxias, mas maiores do que os buracos negros de massa estelar formados pelo colapso de estrelas massivas. 

Os IMBHs são o tão procurado “elo perdido” na evolução do buraco negro e sua mera existência é calorosamente debatida, embora alguns candidatos tenham sido encontrados, por exemplo, veja: Encontrado um elusivo buraco negro de massa intermediária.

Para procurar o IMBH, Vitral e Mamon analisaram as posições e velocidades das estrelas do aglomerado. Eles fizeram isso usando estimativas anteriores dos movimentos próprios das estrelas a partir de imagens do Hubble do aglomerado ao longo de vários anos, além dos movimentos adequados fornecidos pelo observatório espacial Gaia da ESA, que mede com precisão as posições, distâncias e movimentos de estrelas.

Saber a distância até o aglomerado permitiu que os astrônomos traduzissem os movimentos adequados destas estrelas em velocidades. “Nossa análise indicou que as órbitas das estrelas são quase aleatórias em todo o aglomerado globular, em vez de sistematicamente circular ou muito alongado,” explicou Mamon. “Encontramos evidências muito fortes de massa invisível nas densas regiões centrais do aglomerado, mas ficamos surpresos ao descobrir que esta massa extra não é pontual, mas estendida a alguns por cento do tamanho do aglomerado,” acrescentou Vitral. 

Este componente invisível só poderia ser feito de remanescentes (anãs brancas, estrelas de nêutrons e buracos negros) de estrelas massivas cujas regiões internas entraram em colapso sob sua própria gravidade quando seu combustível nuclear acabou. As estrelas colapsaram progressivamente para o centro do aglomerado após interações gravitacionais com estrelas menos massivas próximas, levando à pequena extensão da concentração de massa invisível. Após interagirem com estrelas próximas de menor massa, a troca de momentum entre elas faz com que as estrelas de menor porte sejam impulsionadas em direção à periferia do aglomerado, e as de maior massa vão para o centro.

Usando a teoria da evolução estelar, os cientistas concluíram que a maior parte da concentração invisível é composta de buracos negros de massa estelar, em vez de anãs brancas ou estrelas de nêutrons que são muito fracas para serem observadas. Dois estudos recentes também propuseram que remanescentes estelares e, em particular, buracos negros de massa estelar, poderiam povoar as regiões internas dos aglomerados globulares. 

“Nosso estudo é a primeira descoberta a fornecer tanto a massa quanto a extensão do que parece ser uma coleção de buracos negros em um aglomerado globular colapsado,” disse Vitral. “Nossa análise não teria sido possível sem ter os dados do Hubble para restringir as regiões internas do aglomerado e os dados de Gaia para restringir as formas orbitais das estrelas externas, que por sua vez restringem indiretamente as velocidades das estrelas de primeiro e segundo planos no regiões internas,” acrescentou Mamon. 

Os astrônomos também observam que esta descoberta levanta a questão de saber se as fusões destes buracos negros compactados em aglomerados globulares colapsados ​​podem ser uma fonte importante de ondas gravitacionais recentemente detectadas pelo experimento do Observatório de Ondas Gravitacionais com Interferômetro a Laser (LIGO).

Fonte: ESA

sábado, 13 de fevereiro de 2021

A órbita do objeto mais distante no Sistema Solar

Uma equipe de astrônomos, incluindo o professor associado Chad Trujillo do Departamento de Astronomia e Ciência Planetária da Universidade do Norte do Arizona, confirmou um planetoide que está quase quatro vezes mais distante do Sol do que Plutão, tornando-o o objeto mais distante já observado no nosso Sistema Solar.

© NOIRLab (ilustração de Farfarout)

O planetoide, apelidado "Farfarout," foi detectado pela primeira vez em 2018, e já foi possível recolher observações suficientes para definir a sua órbita. O Minor Planet Center já lhe deu a designação oficial de 2018 AG37. A alcunha Farfarout distinguia-o do detentor do recorde anterior "Farout", descoberto pela mesma equipe em 2018. 

Além de Trujillo, a equipe inclui Scott S. Sheppard da Instituição Carnegie para Ciência e David Tholen do Instituto para Astronomia da Universidade do Havaí, que está realizando um levantamento para mapear o Sistema Solar exterior para além de Plutão. 

O Farfarout receberá um nome oficial (como Sedna e outros objetos semelhantes) depois da sua órbita ser melhor determinada ao longo dos próximos anos. Foi descoberto com o telescópio Subaru de 8 metros localizado no topo do Maunakea, no Havaí, e recuperado usando os telescópios Gemini Norte e Magellan nos últimos anos para determinar a sua órbita com base no seu lento movimento pelo céu. 

A distância média de Farfarout ao Sol é de 132 UA (unidades astronômicas, a distância Terra-Sol, 150 milhões de quilômetros). Para comparação, Plutão fica a 39 UA do Sol. O objeto recém-descoberto tem uma órbita alongada que o leva a 175 UA no afélio (ponto orbital mais distante do Sol), e para dentro da órbita de Netuno, a cerca de 27 UA, quando está no periélio (ponto orbital mais próximo do Sol). 

A jornada de Farfarout em torno do Sol leva cerca de mil anos, cruzando a órbita do planeta gigante Netuno. Isto significa que Farfarout provavelmente sofreu fortes interações gravitacionais com Netuno ao longo da idade do Sistema Solar, e é a razão pela qual tem uma órbita tão grande e alongada. 

Farfarout é muito tênue, e com base no seu brilho e distância do Sol, estima-se que tenha aproximadamente 400 km em diâmetro, colocando-o na extremidade inferior da classificação de planeta anão, assumindo que é um objeto rico em gelo. 

"A descoberta de Farfarout mostra a nossa crescente capacidade de mapear o Sistema Solar exterior e de observar cada vez mais longe em direção à fronteira do nosso Sistema Solar," disse Sheppard. "Somente com os avanços nos últimos anos de grandes câmaras digitais em telescópios muito grandes foi possível descobrir com eficácia objetos muitos distantes como Farfarout. Embora alguns destes objetos distantes sejam bastante grandes, sendo planetas anões em tamanho, são muito tênues por causa das suas distâncias extremas ao Sol. Farfarout é apenas a ponta do iceberg dos objetos do Sistema Solar muito distante." 

Dado que Netuno interage fortemente com Farfarout, a órbita e o movimento de Farfarout não podem ser usados para determinar a existência de outro planeta massivo no Sistema Solar muito distante, uma vez que estas interações dominam a dinâmica orbital de Farfarout.

Apenas aqueles objetos cujas órbitas ficam no Sistema Solar muito distante, bem para lá da influência de Netuno, podem ser usados para sondar por sinais de um planeta massivo desconhecido. 

Estes incluem Sedna e 2012 VP113 que, embora estejam atualmente mais perto do Sol do que Farfarout (cerca de 80 UA), nunca se aproximam de Netuno e, portanto, seriam fortemente influenciados ao invés pelo possível Planeta X. 

"A dinâmica orbital de Farfarout pode ajudar-nos a entender como Netuno se formou e evoluiu, já que Farfarout foi provavelmente lançado para o Sistema Solar exterior por ter passado demasiado perto de Netuno no passado distante," disse Trujillo. "Farfarout provavelmente vai interagir fortemente com Netuno de novo, uma vez que as suas órbitas continuam a intersectar-se."

Fonte: Northern Arizona University

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

A primeira medição da densidade de um exoplaneta muito jovem

Uma equipe liderada por cientistas do IRAP (CNRS/CNES/Université Toulouse III - Paul Sabatier) e do IPAG (CNRS/UGA) mediu pela primeira vez a densidade interna de um exoplaneta muito jovem que orbita uma estrela extremamente ativa e recém-formada.

© NASA/JPL-Caltech (ilustração de anã vermelha e seu planeta)

Apesar do "ruído" gerado pela atividade da estrela, conseguiram fazê-lo usando o instrumento de caça exoplanetária SPIRou acoplado ao CFHT (Canada-France-Hawaii Telescope). 

A estrela AU Microscopii (AU Mic) não tem mais do que 22 milhões de anos. Portanto, é muito jovem, assim como o sistema planetário em seu redor, que abriga um gigante gasoso chamado AU Mic b. 

A massa e a densidade de AU Mic b, que foi detectado pela primeira vez pelo satélite TESS da NASA, foram agora determinadas usando o espectropolarímetro SPIRou. Os valores revelaram-se muito semelhantes aos de Netuno, que é mais de 4 bilhões de anos mais velho. No entanto, a órbita do exoplaneta está 450 vezes mais próxima da sua estrela do que Netuno está do Sol. A sua atmosfera tem uma temperatura de cerca de 300º C, pelo que pertence à família dos "Netunos quentes".

A sua estrela, que é altamente ativa por ser tão jovem, gera campos magnéticos muito fortes, tornando extremamente difícil a análise do sinal de AU Mic b. No entanto, as capacidades de alto desempenho do SPIRou, juntamente com o trabalho realizado pelos cientistas do IRAP e do IPAG, finalmente tornaram possível a determinação da sua massa e, portanto, da sua densidade, apesar do "ruído" gerado pela atividade da estrela AU Mic. 

Esta é a primeira vez que os astrônomos medem com sucesso a massa (usando o SPIRou) e o raio (graças ao TESS) de um exoplaneta com menos de 200 milhões de anos. É também o primeiro exoplaneta cuja massa foi medida pelo SPIRou, um instrumento de próxima geração projetado e construído sob a supervisão de equipes francesas e recentemente acoplado ao CFHT. 

As equipes envolvidas com o SPIRou também confirmaram o desempenho incomparável do novo instrumento e estudaram outra característica de AU Mic b, a inclinação da sua órbita. Esta acabou por estar bem alinhada com o planeta equatorial da sua estrela, sugerindo que a sua formação não foi afetada por outros objetos massivos. 

Todas estas descobertas fornecem informações adicionais que vão ajudar os cientistas a refinar os modelos de formação e migração planetária.

Os resultados foram publicados no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: National Centre for Scientific Research

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

Uma ampulheta cósmica

A Imagem do telescópio espacial Hubble desta semana apresenta um retrato impressionante de M1-63, um exemplo lindamente captado de uma nebulosa planetária bipolar localizada na constelação de Scutum (o Escudo).

© Hubble (M1-63)

Uma nebulosa como esta é formada quando a estrela em seu centro derrama enormes quantidades de material de suas camadas externas, deixando para trás uma nuvem espetacular de gás e poeira.

Acredita-se que um sistema binário de estrelas no centro da nebulosa bipolar seja capaz de criar formas de ampulheta ou borboletas como a desta imagem. Isso ocorre porque o material da estrela que se desprende é afunilado em direção aos seus polos, com a ajuda da companheira, criando a distinta estrutura de lóbulo duplo vista em nebulosas como M1-63.

Fonte: ESA

Um zoom na formação estelar

Descoberta no ano de 1836 por John Herschel, a NGC 6902 é uma galáxia em espiral situada a mais de 130 milhões de anos-luz de distância na constelação do Sagitário.

© ESO/VLT (NGC 6902)

Esta imagem foi obtida pelo instrumento MUSE (Multi Unit Spectroscopic Explorer), montado num dos telescópios de 8,2 metros de diâmetro que compõem o Very Large Telescope (VLT) do ESO, e mostra a galáxia de uma perspectiva única. 

Um zoom em direção ao centro da galáxia, a imagem mostra um anel nuclear onde podemos ver o brilho laranja da formação estelar intensa. No interior deste anel situa-se uma pequena e tênue barra de estrelas. 

Os pesquisadores descobriram que as estrelas no seu interior se distribuem de forma diferente dependendo da idade, com as estrelas mais jovens alinhadas ao longo da barra e as estrelas mais velhas mais dispersas. 

Esta distribuição de estrelas jovens e velhas no interior da barra central da NGC 6902 confirma as previsões feitas há vários anos por modelos e simulações. Esta é a primeira vez que estas previsões de estrutura galáctica são confirmadas por observações, o que se deve à notável resolução espacial do instrumento MUSE.

Fonte: ESO

domingo, 7 de fevereiro de 2021

Atividade bizarra em magnetar

Astrônomos do OzGrav (ARC Centre of Excellence for Gravitational Wave Discovery) e da CSIRO (Commonwealth Scientific and Industrial Research Organisation) observaram um comportamento bizarro e nunca antes visto de um magnetar com emissão no rádio, um tipo raro de estrela de nêutrons e um dos ímãs mais fortes do Universo.

© OzGrav (ilustração de um magnetar ativo)

As suas novas descobertas sugerem que os magnetares têm campos magnéticos mais complexos do que se pensava, o que pode desafiar as teorias de como nascem e evoluem ao longo do tempo. 

Os magnetares são um tipo raro de estrelas de nêutrons giratória com alguns dos campos magnéticos mais poderosos do Universo. Os astrônomos só detectaram trinta destes objetos dentro e ao redor da Via Láctea, a maioria deles descobertos por telescópios de raios X após uma explosão altamente energética.

No entanto, vários destes magnetares também emitiu pulsos de rádio semelhantes aos pulsares, objetos menos magnéticos dos magnetares que produzem feixes de ondas de rádio a partir dos seus polos magnéticos. Rastrear como os pulsos destes magnetares com emissão no rádio mudam ao longo do tempo fornece uma janela única para a sua evolução e geometria. 

Em março de 2020, um novo magnetar chamado Swift J1818.0-1607 (J1818 para abreviar) foi descoberto depois de ter emitido uma brilhante explosão de raios X. Observações rápidas de acompanhamento detectaram pulsos de rádio originários do magnetar. Curiosamente, a aparência dos pulsos de rádio de J1818 era bem diferente daqueles vistos em outros magnetares com emissão no rádio.

A maioria dos pulsos de rádio dos magnetares mantém um brilho consistente numa ampla faixa de frequências de observação. No entanto, os pulsos de J1818 eram muito mais brilhantes em frequências baixas do que em frequências altas, semelhante ao que é visto nos pulsares, outro tipo comum de estrela de nêutrons emissora de rádio.

A fim de entender melhor como J1818 iria evoluir ao longo do tempo, uma equipe liderada por cientistas do OzGrav (Centro ARC de Excelência para Descoberta de Ondas Gravitacionais) observou-o oito vezes com o radiotelescópio Parkes da CSIRO entre maio e outubro de 2020. 

Durante este tempo, descobriram que o magnetar passou por uma breve crise de identidade: em maio, ainda estava emitindo os pulsos incomuns de pulsar que haviam sido detectados anteriormente; no entanto, em junho começou a piscar entre um estado brilhante e um estado fraco. 

Este comportamento oscilante atingiu um pico em julho, quando o viram alternando entre pulsos de rádio semelhantes aos dos pulsares e pulsos de rádio semelhantes aos dos magnetares. 

Os cientistas também procuraram alterações na forma do pulso e no brilho em diferentes frequências de rádio e compararam as suas observações com um modelo teórico com 50 anos. Este modelo prevê a geometria esperada de um pulsar, com base na direção de torção da sua luz polarizada. A partir das observações, foi descoberto que o eixo magnético de J1818 não está alinhado com o seu eixo de rotação. Em vez disso, o polo magnético emissor de rádio parece estar no seu hemisfério sul, localizado logo abaixo do equador. A maioria dos outros magnetares têm campos magnéticos que estão alinhados com os seus eixos de rotação ou são um pouco ambíguos.

Notavelmente, esta geometria magnética parece ser estável na maioria das observações. Isto sugere que quaisquer mudanças no perfil do pulso são simplesmente devido às variações no momento em que os pulsos de rádio são emitidos acima da superfície da estrela de nêutrons. No entanto, a observação de 1 de agosto de 2020 destaca-se como uma curiosa exceção.

O melhor modelo geométrico para esta data sugere que o feixe de rádio mudou brevemente para um polo magnético completamente diferente localizado no hemisfério norte do magnetar. Uma falta distinta de quaisquer mudanças na forma do perfil de pulso do magnetar indica que as mesmas linhas de capo magnético que acionam os pulsos de rádio "normais" também devem ser responsáveis pelos pulsos vistos do outro polo magnético. 

O estudo sugere que isto são evidências de que os pulsos de rádio de J1818 têm origem em "loops" de linhas de campo magnético que ligam dois polos próximos, como aqueles vistos a ligarem os dois polos de um ímã em "ferradura" ou em manchas solares no Sol. Isto é diferente da maioria das estrelas de nêutrons comuns, que devem ter polos norte e sul em lados opostos da estrela, que são ligados por um campo magnético em forma de toroide.

Esta configuração peculiar do campo magnético também é apoiada por um estudo independente dos pulsos de raios X de J1818 que foram detectados pelo telescópio NICER a bordo da Estação Espacial Internacional. Os raios X parecem vir de uma única região distorcida de linhas de campo magnético que emergem da superfície do magnetar ou de duas regiões menores, mas bem espaçadas. 

Estas descobertas têm implicações potenciais para as simulações de computador de como os magnetares nascem e evoluem durante longos períodos de tempo, já que as geometrias de campo magnético mais complexas mudarão a rapidez com que os seus campos magnéticos se devem deteriorar com o tempo.

Além disso, as teorias que sugerem que as FRBs (Fast Radio Bursts) podem ter origem nos magnetares terão que levar em conta os pulsos de rádio potencialmente originários de vários locais ativos dentro dos seus campos magnéticos. Captar uma inversão dos polos magnéticos em ação também pode proporcionar a primeira oportunidade de mapear o campo magnético de um pulsar.

As novas descobertas foram publicadas na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: OzGrav

terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

Descoberto sistema sêxtuplo eclipsante

Uma equipe internacional de pesquisadores liderada por Brian P. Powell do Goddard Space Flight Center da NASA e Veselin P. Kostov do Instituto SETI identificou um sistema único que consiste de seis estrelas.

© NASA (ilustração da estrela binária Thuban)

O TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) revelou anteriormente que Thuban, formalmente conhecida como Estrela do Norte, também é um binário eclipsante, conforme ilustrado acima.

As três estrelas binárias formam um sistema vinculado gravitacionalmente e cada par está produzindo eclipses. O sistema estelar TYC 7037-89-1 foi descoberto em dados do TESS com uma rede neuronal projetada para detectar estrelas binárias eclipsantes.

Este recém-descoberto e complexo sistema estelar está na direção da constelação de Eridanus, a cerca de 1.900 anos-luz da Terra. "Os sistemas múltiplos eclipsantes, como TYC 7037-89-1, permitem medições simultâneas e precisas dos tamanhos estelares, temperaturas e, potencialmente, as massas dos pares de estrelas que partilham uma história comum," disse Kostov.

© NASA (sistema estelar sêxtuplo TYC 7037-89-1)

Este esquema mostra a configuração do sistema estelar sêxtuplo TYC 7037-89-1. O sistema quádruplo interior é composto por dois binários, A e C, que se orbitam um ao outro mais ou menos a cada 4 anos. O binário B, mais exterior, orbita o sistema quádruplo mais ou menos a cada 2.000 anos. Todos os três pares são binários eclipsantes. As órbitas não estão em escala.

Por sua vez, isto fornece uma melhor compreensão da formação e evolução estelar em ambientes dinamicamente ricos. "O sistema tem três binários (chamemo-los A, B e C) com períodos orbitais que variam entre 1 e 8 dias, e organizados de forma hierárquica," disse Saul Rappaport, do Departamento de Física do MIT (Massachusetts Institute of Technology).

O binário A orbita em torno do binário C com um período de vários anos, enquanto o binário B orbita ao redor do sistema quádruplo A-C com um período de vários milhares de anos. O surpreendente é que todos os três binários têm os seus planos orbitais suficientemente bem alinhados com a nossa linha de visão para que possamos ver eclipses de todos eles. Isto, apesar das suas enormes separações entre os três binários.

A inteligência artificial e a aprendizagem de máquina continuam demonstrando o seu potencial, gerando descobertas tentadoras a partir da vasta quantidade de dados recolhidos por missões como a do TESS e do seu antecessor, Kepler. Considerando que estas descobertas ainda precisem de ser confirmadas por meio de análises humanas e, às vezes, por observações de acompanhamento, a velocidade com que novas descobertas podem ser reveladas está aumentando exponencialmente.

Embora a missão do TESS seja a de procurar exoplanetas usando o método de trânsito, a equipe aplicou este mesmo método para detectar estrelas eclipsantes. O método de trânsito é a forma mais comum de encontrar exoplanetas. Para esta finalidade, os cientistas medem o brilho de uma estrela ao longo do tempo. Quando um planeta passa entre a estrela e o instrumento de observação, a estrela escurece em intervalos fixos, indicando a presença de um exoplaneta. 

Para diferenciar o escurecimento provocado por um exoplaneta da queda de brilho provocada por uma estrela binária, os cientistas podem usar a profundidade medida do evento e o tamanho da estrela hospedeira para calcular o tamanho do objeto em trânsito. Se este objeto for maior do que cerca de 2 raios de Júpiter, é mais provável que seja uma segunda estrela. 

Já era conhecido alguns outros sistemas de seis estrelas, notavelmente Castor na constelação de Gêmeos. Mas esta é a primeira vez que cada um dos sistemas binários constituintes é um binário eclipsante. 

Estudos adicionais de sistemas como TYC 7037-89-1 podem fornecer pistas sobre a formação estelar. Não é conhecido ainda como estes complexos sistemas estelares se formam, mas até agora o TESS e a inteligência artificial identificaram mais de 100 sistemas candidatos. Um potencial cenário de formação é que uma jovem estrela binária capturou uma terceira estrela, após o qual cada um dos três corpos se fragmentou em dois.

Fonte: SETI Institute

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

Medições da luz em aglomerado sugerem ligação com a matéria escura

Uma combinação de dados observacionais e simulações sofisticadas de computador deu passos em frente num campo da astrofísica com poucos avanços no último meio século.

© J. Golden-Marx/Y. Zhang (luz intra-aglomerado)

À esquerda temos uma imagem simulada na qual a luz intra-aglomerado é visível como uma neblina difusa entre picos discretos de brilho, as galáxias. Em observações, como as da direita, esta componente de luz intra-aglomerado é amplamente abafada pelo ruído.

O DES (Dark Energy Survey), com sede no Laboratório Nacional do Acelerador Fermi do Departamento de Energia dos EUA, publicou uma série de novos resultados sobre a luz intra-aglomerado, um tipo tênue de luz encontrada dentro de aglomerados de galáxia. Um primeiro artigo foi publicado na revista The Astrophysical Journal em abril de 2019. Outro apareceu mais recentemente na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society

Numa descoberta surpreendente deste último trabalho, os físicos do DES descobriram novas evidências de que a luz intra-aglomerado pode fornecer uma nova maneira de medir uma substância misteriosa chamada matéria escura. A fonte da luz intra-aglomerado parece ser estrelas errantes, aquelas que não estão gravitacionalmente ligadas a nenhuma galáxia. 

Há muito que se suspeita que a luz intra-aglomerado seja um componente significativo dos aglomerados de galáxias, mas o seu brilho fraco torna-a difícil de medir. Ninguém sabe quanto existe ou até que ponto se espalhou pelos aglomerados de galáxias.

"Observacionalmente, descobrimos que a luz intra-aglomerado é um marcador radial muito bom da matéria escura. Isto significa que a luz intra-aglomerado é relativamente brilhante, a matéria escura é relativamente densa," disse Yuanyuan Zhang, cientista do Fermilab que liderou ambos os estudos. 

Embora invisível, a matéria escura é responsável pela maior parte da matéria no Universo. Em que consiste a matéria escura é um dos maiores mistérios da cosmologia moderna. Sabe-se apenas que difere muito da matéria normal que consiste dos prótons, nêutrons e elétrons que dominam a vida quotidiana. 

A maioria dos astrofísicos mede a luz intra-aglomerado no centro de um aglomerado de galáxias, onde é mais brilhante e abundante. No entanto, os colaboradores do DES conseguiram obter a medição da luz intra-aglomerado mais radialmente estendida até agora. A equipe usou lentes gravitacionais fracas para comparar a distribuição radial da luz intra-aglomerado, como muda com a distância ao centro, com a distribuição radial da massa de um aglomerado de galáxias. 

A lente gravitacional fraca é um método sensível à matéria escura para medir a massa de uma galáxia ou aglomerado. Ocorre quando a gravidade de uma estrela ou aglomerado em primeiro plano desvia a luz de uma galáxia mais distante, distorcendo a sua forma aparente. Descobriu-se observacionalmente que a luz intra-aglomerado reflete a distribuição tanto da massa visível total de um aglomerado de galáxias quanto, possivelmente, a distribuição da matéria escura invisível.

Para obter mais informações, foi usada sofisticada simulação de computador para estudar a relação entre a luz intra-aglomerado e a matéria escura. Foi descoberto que os perfis radiais entre os dois fenômenos na simulação não estavam de acordo com os dados observacionais.

A luz intra-aglomerado que a equipe mediu é cerca de cem a mil vezes mais tênue do que a que os cientistas do DES normalmente tentam medir. Os astrofísicos normalmente fazem medições da luz intra-aglomerado usando um punhado de aglomerados de galáxias de cada vez. Para obter uma imagem maior e para reduzir o ruído, a equipe do DES calculou estatisticamente uma média de 300 aglomerados de galáxias no primeiro estudo e mais de 500 no segundo. Todos eles estão a alguns bilhões de anos-luz da Terra. Para filtrar o sinal do ruído de cada agloemrado são necessários muitos dados, que é exatamente o que o DES gerou. 

No início de 2019, o DES completou a sua missão de seis anos de observar centenas de milhões de galáxias distantes nos céus do hemisfério sul e publicou este mês o seu segundo lançamento de dados. As medições da luz intra-aglomerado sondam aglomerados que estão até 3,3 bilhões de anos-luz da Terra. Em estudos futuros, os astrônomos pretendem estudar a evolução do desvio para o vermelho da luz intra-aglomerado, como muda com o tempo cósmico.  

Fonte: Fermi National Accelerator Laboratory

Explicação alternativa para a formação do Sistema Solar

Uma nova teoria que explica porque é que o Sistema Solar interior é tão diferente das regiões exteriores vai contra a sabedoria predominante.

© Mark A. Garlick (formação do Sistema Solar em duas populações planetárias distintas)

A teoria foi proposta por um grupo internacional de pesquisadores. Mercúrio, Vênus, Terra e Marte no Sistema Solar interior são planetas relativamente pequenos e secos, ao contrário de Júpiter, Saturno, Urano e Netuno nas regiões exteriores, planetas que contêm quantidades muito maiores de elementos voláteis. 

"Nos últimos anos, também descobrimos outra grande diferença entre as duas partes do Sistema Solar," diz Maria Schönbächler, professora no Instituto de Geoquímica e Petrologia da Universidade de Zurique. "Os meteoritos têm uma 'impressão digital' diferente dependendo se tiveram origem no Sistema Solar interior ou exterior." 

A sua origem determina o conteúdo isotópico dos meteoritos. Os isótopos são átomos distintos de um determinado elemento, que partilham o mesmo número de prótons nos seus núcleos, mas variam no número de nêutrons. A explicação atual para as diferenças na composição química dos planetas e meteoritos é a seguinte: há 4,5 bilhões de anos, à medida que o Sistema Solar se formava a partir de um disco de gás e poeira, o planeta Júpiter foi o primeiro a desenvolver-se. Este dividiu o disco numa região interna e noutra externa e bloqueou a troca de materiais entre as duas. 

De acordo com simulações computacionais, o Sistema Solar interior e exterior foram formados em duas ondas separadas e em dois momentos diferentes. Muito cedo, quando o disco original de poeira e gás, bem como o Sol, ainda estavam se formando, surgiram os primeiros blocos de construção dos planetas interiores, denominados planetesimais, que medem cerca de 100 km. 

Aqui a chamada linha da neve desempenha um papel fundamental, que se formou a uma certa distância do Sol ainda muito jovem. Dentro desta linha da neve, a água existia como vapor, enquanto a água para lá transformava-se em cristais de gelo. Logo do lado de fora da linha da neve, parte do vapor de água condensou-se em grãos de poeira, que se agregaram para formar os primeiros planetesimais. 

A nova teoria também fornece uma explicação: o disco de poeira continha o isótopo radioativo alumínio-26, que os blocos de construção planetária herdaram. Tem uma meia-vida de 700.000 anos e libera uma grande quantidade de energia à medida que se decompõe, o suficiente para aquecer planetesimais por dentro e derretê-los. Isto levou à formação de núcleos de ferro e à evaporação da água e de outros elementos voláteis.

Surgiu então uma segunda onda de formação planetesimal, só que desta vez no Sistema Solar exterior. Com o aquecimento do disco de gás e poeira, a linha da neve moveu-se para fora, e as partículas de poeira que se moviam em direção ao Sol ficaram retidas na nova fronteira.  

Dado que o segundo processo começou mais tarde, uma grande parte do alumínio-26 radioativo já havia decaído, o que significa que uma quantidade menor de elementos voláteis evaporou. Como resultado, na região externa ocorreu a formação de gigantes de gás e gelo como Júpiter, Saturno ou Urano. 

De acordo com o modelo, a fase inicial foi dominada por colisões entre os planetesimais. Mais tarde, a gravidade destes corpos fez com que atraíssem e acumulassem partículas de poeira num processo de "acreção de seixos". Seguiu-se outra fase de colisões até ao fim do processo de formação da Terra, quando colidiu com um último grande pedaço. Este impacto fez com que o jovem planeta ejetasse material que acabou por formar a Lua. As simulações também ilustram como os planetas migraram para mais perto do Sol à medida que se formavam, antes de se estabelecerem nas órbitas que vemos hoje.

O estudo propõe um cenário geral que reproduz a composição e a história da formação do Sistema Solar. E, de fato, os cálculos correspondem aos dados de análises de meteoritos e observações astronômicas.

O trabalho foi publicado na revista Science.

Fonte: University of Oxford