sábado, 20 de março de 2021

Perscrutando o núcleo empoeirado de uma galáxia

Pesquisadores vão em breve mapear e modelar o núcleo da galáxia vizinha Centaurus A com o telescópio espacial James Webb da NASA.

© NASA/NRAO/Rolf Olsen (Centaurus A)

Centaurus A é uma galáxia gigante, mas as suas aparições em observações telescópicas podem enganar. Faixas de poeira escura e jovens aglomerados de estrelas azuis, que cruzam a sua região central, são aparentes no ultravioleta, no visível e no infravermelho próximo, pintando uma paisagem bastante moderada. Mas se mudarmos para comprimentos de onda em raios X e rádio desvenda-se uma cena muito mais "barulhenta": do núcleo da galáxia elíptica disforme, jatos espetaculares de material irromperam do seu buraco negro supermassivo, conhecido como núcleo galáctico ativo, enviando material para o espaço muito além dos limites da galáxia. 

O que, precisamente, está acontecendo no seu núcleo para provocar toda esta atividade? O gás, o disco e as estrelas da galáxia movem-se sob a influência do seu buraco negro supermassivo central. Dado que a galáxia está tão perto da Terra, será possível criar mapas bidimensionais para ver como o gás e as estrelas se movem na sua região central, como são influenciados pelos jatos do seu núcleo galáctico ativo e, em última análise, caracterizar melhor a massa do seu buraco negro.

Centaurus A é bem estudada porque está relativamente próxima, a cerca de 13 milhões de anos-luz, o que significa que podemos resolver claramente a galáxia inteira. O primeiro registo foi feito em meados do século XIX, mas os astrônomos perderam o interesse até à década de 1950 porque a galáxia parecia ser uma galáxia elíptica quieta, embora deformada.

Assim que os pesquisadores começaram a observá-la com radiotelescópios nas décadas de 1940 e 50, Centaurus A tornou-se radicalmente mais interessante, os seus jatos tornaram-se visíveis. Em 1954, os cientistas descobriram que Centaurus A é o resultado de duas galáxias que se fundiram, o que mais tarde foi estimado ter ocorrido há 100 milhões de anos. Com mais observações no início dos anos 2000, estimou-se que há cerca de 10 milhões de anos, o seu núcleo galáctico ativo disparou jatos gêmeos em direções opostas. Quando examinada em todo o espectro eletromagnético, desde raios X ao rádio, fica claro que há muito mais nesta história que ainda precisamos de aprender. 

A combinação de imagens e espectros fornecidos pelo telescópio James Webb permitirá a criação de mapas de altíssima resolução das velocidades do gás e das estrelas no centro de Centaurus A, para modelar como todo o disco no centro da galáxia se move para determinar com mais precisão a massa do buraco negro. Com um conjunto mais completo de dados infravermelhos, também será possível determinar se partes diferentes do gás estão se comportando conforme o previsto.

Fonte: Space Telescope Science Institute

sexta-feira, 19 de março de 2021

O que aconteceu à água de Marte?

Há bilhões de anos, o Planeta Vermelho era muito mais azul; de acordo com evidências ainda encontradas à superfície, a água abundante fluiu por Marte formando lagos e oceanos profundos.

© Viking (Marte)

A questão que se põe é, então para onde foi toda esta água? A resposta: para lado nenhum. Segundo uma nova pesquisa do California Institute of Technology (Caltech) e do Jet Propulsion Laboratory (JPL), uma porção significativa da água de Marte, entre 30% e 99%,  está presa dentro de minerais na crosta do planeta. 

A pesquisa desafia a teoria atual de que a água do Planeta Vermelho escapou para o espaço. A equipe do Caltech/JPL descobriu que há cerca de quatro bilhões de anos, Marte continha água suficiente para cobrir todo o planeta com um oceano com aproximadamente 100 a 1.500 metros de profundidade; um volume aproximadamente equivalente a metade do Oceano Atlântico da Terra. Mas, um bilhão de anos depois, o planeta estava tão seco quanto hoje. 

Anteriormente, os cientistas que procuravam explicar o que aconteceu com a água que corria em Marte sugeriram que escapou para o espaço, vítima da baixa gravidade de Marte. Embora parte da água realmente tenha deixado Marte desta maneira, parece agora que tal fuga não pode ser responsável pela maior parte da perda de água.

A equipe estudou a quantidade de água em Marte ao longo do tempo em todas as suas formas (vapor, líquido e gelo) e a composição química da atual atmosfera e crosta do planeta por meio da análise de meteoritos, bem como usando dados fornecidos por rovers e orbitadores, olhando em particular para a proporção de deutério para hidrogênio. 

A água é composta por hidrogênio e oxigênio. No entanto, nem todos os átomos de hidrogênio são criados iguais. Existem dois isótopos estáveis de hidrogênio. A vasta maioria dos átomos de hidrogênio tem apenas um próton dentro do núcleo atômico, enquanto uma pequena fração (cerca de 0,02%) existe como deutério, ou o chamado hidrogênio "pesado", que tem um próton e um nêutron no núcleo. O hidrogênio mais leve (também conhecido como prótio) tem mais facilidade em escapar da gravidade do planeta para o espaço do que a sua contraparte mais pesada. Por causa disto, o escape de água de um planeta pela atmosfera superior deixaria uma assinatura reveladora na proporção de deutério para hidrogênio na atmosfera do planeta; haveria uma proporção descomunal de deutério deixado para trás. 

No entanto, a perda de água apenas através da atmosfera não pode explicar o sinal de deutério para hidrogênio observado na atmosfera marciana nem as grandes quantidades de água no passado. Em vez disso, o estudo propõe que uma combinação de dois mecanismos, o aprisionamento de água em minerais na crosta do planeta e a perda de água para a atmosfera, pode explicar o sinal de deutério para hidrogênio observado na atmosfera marciana. 

Quando a água interage com a rocha, a erosão química forma argilas e outros minerais hidratados que contêm água como parte da sua estrutura mineral. Este processo ocorre tanto na Terra quanto em Marte. Dado que a Terra é tectonicamente ativa, a crosta velha é derretida continuamente no manto e forma uma nova crosta nos limites das placas, reciclando água e outras moléculas de volta para a atmosfera através do vulcanismo. 

No entanto, Marte é principalmente tectonicamente inativo e, portanto, a "secagem" da superfície, assim que ocorre, é permanente. A fuga atmosférica claramente teve um papel na perda de água, mas as descobertas da última década de missões marcianas apontaram para o fato de que havia um enorme reservatório de antigos minerais hidratados cuja formação certamente diminuiu a disponibilidade de água ao longo do tempo. Toda esta água foi sequestrada bastante cedo, e nunca mais reciclada. 

A pesquisa, que se baseou em dados de meteoritos, telescópios, observações de satélites e amostras analisadas por rovers em Marte, ilustra a importância de existirem várias maneiras de estudar o Planeta Vermelho. 

Pesquisas anteriores buscaram entender a habitabilidade de Marte ao traçar a história do carbono, dado que o dióxido de carbono é o principal constituinte da atmosfera. Em seguida, a equipe planeja continuar usando dados isotópicos e de composição mineral para determinar o destino dos minerais contendo nitrogênio e enxofre. 

Além disso, a equipe pretende examinar os processos pelos quais a água da superfície de Marte foi perdida para a crosta usando experiências laboratoriais que simulam processos de erosão marciana, bem como através de observações da crosta antiga pelo rover Perseverance, que recolherá amostras de rochas e enviará à Terra, o que permitirá aos cientistas testar estas hipóteses sobre as causas das mudanças climáticas em Marte.

Um artigo foi publicado na revista Science.

Fonte: California Institute of Technology

Ventos estratosféricos muito fortes em Júpiter

Com o auxílio do Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), do qual o Observatório Europeu do Sul (ESO) é um parceiro, uma equipe de astrônomos mediu diretamente, e pela primeira vez, ventos na atmosfera intermediária de Júpiter.

© ESO/L. Calçada (representação de ventos estratosféricos em Júpiter)

Ao analisar o resultado da colisão de um cometa em 1994, os pesquisadores descobriram ventos muito fortes, com velocidades de até 1.450 km/hora, perto dos polos de Júpiter, o que pode apontar para o que a equipe descreveu como um “monstro meteorológico único no nosso Sistema Solar”.

O planeta Júpiter é famoso pelas suas distintas faixas vermelhas e brancas: nuvens rodopiantes de gás em movimento que os astrônomos tradicionalmente usam para rastrear os ventos na baixa atmosfera de Júpiter. Os cientistas observam também brilhos intensos, as chamadas auroras, perto dos polos do planeta gigante, que parecem estar associadas a ventos fortes na atmosfera superior.

Porém, até agora, os pesquisadores nunca foram capazes de medir diretamente os padrões do vento entre estas duas camadas atmosféricas, isto é, na estratosfera. Medir a velocidade do vento na estratosfera de Júpiter usando as técnicas normais de rastreamento de nuvens é impossível devido à ausência de nuvens nesta parte da atmosfera. 

No entanto, com a ajuda do cometa Shoemaker-Levy 9, que colidiu com o gigante gasoso de forma espetacular em 1994, os astrônomos tiveram a oportunidade de fazer estas medições utilizando uma técnica alternativa. O impacto deste cometa no planeta deu origem a novas moléculas na estratosfera de Júpiter, onde elas têm se movido com os ventos desde então.

Uma equipe de astrônomos, liderada por Thibault Cavalié do Laboratoire d'Astrophysique de Bordeaux, na França, seguiu uma destas moléculas, o cianeto de hidrogênio (HCN), para medir diretamente “jatos” estratosféricos em Júpiter. Estes jatos se referem às faixas estreitas de ventos na atmosfera, tal como as correntes de jato na Terra.

“O resultado mais espetacular que obtivemos foi a detecção de jatos muito fortes, com velocidades de até 400 metros por segundo, localizados por baixo das auroras, perto dos polos,” diz Cavalié. 

Estas velocidades dos ventos correspondem a mais de duas vezes as velocidades máximas de tempestade alcançadas na Grande Mancha Vermelha de Júpiter e mais de três vezes a velocidade do vento medida nos tornados mais fortes da Terra. Esta detecção indica que estes jatos podem se comportar como um vórtice gigante com um diâmetro de até quatro vezes o tamanho da Terra e com cerca de 900 km de altura.

Os astrônomos já sabiam da existência de ventos fortes perto dos polos de Júpiter, mas situados muito mais alto na atmosfera, a centenas de quilômetros acima da área de foco deste novo estudo. Estudos anteriores previam que estes ventos na atmosfera superior diminuiriam em velocidade e desapareceriam muito antes de chegar às profundidades correspondentes à estratosfera.

A equipe utilizou 42 das 66 antenas de alta precisão do ALMA, localizadas no deserto do Atacama, no norte do Chile, para analisar as moléculas de cianeto de hidrogênio que se movem na estratosfera de Júpiter desde o impacto do cometa Shoemaker-Levy 9. Os dados do ALMA permitiram medir o desvio de Doppler, ou seja, variações minúsculas na frequência da radiação emitida pelas moléculas, causado pelos ventos nesta região do planeta. Ao medir estas variações é possível determinar a velocidade dos ventos, análogo à velocidade de um trem que passa pela variação na frequência do apito do trem.

Além dos surpreendentes ventos polares, a equipe usou também o ALMA para confirmar a existência de fortes ventos estratosféricos em torno do equador do planeta ao medir diretamente, e também pela primeira vez, as suas velocidades. Os jatos descobertos nesta região do planeta têm velocidades médias de cerca de 600 quilômetros por hora. As observações ALMA necessárias para seguir os ventos estratosféricos nos polos e no equador de Júpiter necessitaram de menos de 30 minutos em termos de tempo de telescópio. 

“Esta descoberta preparou também o terreno para as medições, semelhantes mas mais extensas, que serão feitas pela missão JUICE e o seu instrumento de ondas submilimétricas,” disse Thomas Greathouse, cientista no Southwest Research Institute. O JUICE (JUpiter ICy moons Explorer) da Agência Espacial Europeia (ESA), com previsão que seja lançado no próximo ano. 

O Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, que deverá ver a sua primeira luz durante a segunda metade desta década, irá também explorar Júpiter. O telescópio será capaz de fazer observações extremamente detalhadas das auroras do planeta, dando-nos uma visão mais aprofundada da atmosfera de Júpiter. 

Este trabalho foi apresentado no artigo intitulado "First direct measurement of auroral and equatorial jets in the stratosphere of Jupiter”, publicado na revista Astronomy & Astrophysics.

Fonte: ESO

quarta-feira, 17 de março de 2021

O esboço de um sistema estelar envelhecido

Os astrônomos pintaram a sua melhor imagem de uma variável RV Tauri, um tipo raro de binário estelar onde duas estrelas, orbitam dentro de um extenso disco de poeira.

© NASA (estrela primária de U Mon e sua companheira azulada)

O seu conjunto de dados de 130 anos abrange a mais ampla gama de luz já recolhida para um destes sistemas, de rádio a raios X. Existem apenas cerca de 300 variáveis RV Tauri conhecidas na Via Láctea. 

O estudo estudo foi concentrado na segunda mais brilhante, de nome U Monocerotis, que é agora o primeiro destes sistemas no qual foram detetados raios X. O sistema, abreviado para U Mon, está situado a cerca de 3.600 anos-luz de distância na direção da constelação de Unicórnio. 

As suas duas estrelas orbitam-se uma à outra a cada seis anos e meio num percurso inclinado 75 graus a partir da nossa perspetiva. A estrela primária, uma velha supergigante amarela, tem cerca de duas vezes a massa do Sol, mas inchou para 100 vezes o tamanho do Sol. 

Uma concorrência entre a pressão e a temperatura na sua atmosfera faz com que se expanda e contraia regularmente, e estas pulsações criam mudanças de luz previsíveis com alternância de profundas e superficiais diminuições de brilho, características dos sistemas RV Tauri. 

Os cientistas sabem menos sobre a estrela companheira, no entanto acham que tem massa semelhante mas é muito mais jovem do que a primária. O disco frio em torno de ambas as estrelas é composto de gás e poeira ejetados pela estrela primária à medida que evolui.

Usando observações rádio do SMA (Submillimeter Array) em Maunakea, Havaí, a equipe estimou que o disco tem cerca de 82 bilhões de quilômetros de diâmetro. O binário orbita dentro de uma lacuna central que os cientistas pensam ser comparável à distância entre as duas estrelas na sua separação máxima, quando estão a mais ou menos 870 milhões de quilômetros uma da outra. 

Quando as estrelas estão mais distantes uma da outra, estão aproximadamente alinhadas com a nossa linha de visão. O disco obscurece parcialmente a primária e cria outra flutuação previsível na luz do sistema. Os astrônomos acham que é quando uma ou ambas as estrelas interagem com a orla interna do disco, sugando fluxos de gás e poeira. Eles sugerem que a estrela companheira canaliza o gás para o seu próprio disco, que aquece e gera um fluxo de gás que emite raios X.

Este modelo poderia explicar os raios X detectados em 2016 pelo satélite XMM-Newton da ESA. As medições foram efetuadas em vários comprimentos de onda, tanto no solo como no espaço, fornecendo novas informações sobre um sistema há muito estudado. Na análise de U Mon, também foi incorporada 130 anos de observações no visível. 

A primeira medição disponível do sistema, recolhida no dia 25 de dezembro de 1888, veio dos arquivos da AAVSO (American Association of Variable Star Observers), uma rede internacional de astrônomos amadores e profissionais com sede em Cambridge, Massachusetts. A AAVSO forneceu medições históricas adicionais que vão desde meados da década de 1940 até ao presente.

Os cientistas também usaram imagens de arquivo catalogadas pelo DASCH (Digital Access to a Sky Century @ Harvard), um programa do Observatório de Harvard em Cambridge dedicado à digitalização de imagens astronômicas em placas fotográficas de vidro feitas por telescópios terrestres entre as décadas de 1880 e 1990.

A luz de U Mon varia porque a estrela primária pulsa e porque o disco obscurece parcialmente a cada aproximadamente 6,5 anos. Os dados combinados da AAVSO e do DASCH permitiram os astrônomos detectassem um ciclo ainda mais longo, em que o brilho do sistema aumenta e diminui a cada 60 anos. Eles pensam que uma dobra ou amontoado no disco, localizado à mesma distância do sistema que Netuno do Sol, provoca esta variação extra durante a sua órbita.

Este sistema evoluído tem muitas características e comportamentos em comum com binários recém-formados. Ambos estão embebidos em discos de gás e poeira, puxam material destes discos e produzem fluxos de gás. E os discos podem formar dobras ou amontoados. Nos binários jovens, podem assinalar o início da formação de um planeta.

Ainda os pesquisadores têm dúvidas sobre a característica no disco de U Mon, que podem ser respondidas por futuras observações no rádio. É fascinante como estes dois estágios da existência de binários se assemelham.

O artigo que descreve os achados foi publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: NASA

Detectado um buraco negro em movimento

Os cientistas há muito que teorizam que os buracos negros supermassivos podem vaguear pelo espaço, mas captá-los no ato é difícil.

© SDSS (galáxia J0437+2456)

Agora, pesquisadores do Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics identificaram o caso mais claro até agora de um buraco negro supermassivo em movimento. 

Pesquisadores têm trabalhado para observar esta rara ocorrência ao longo dos últimos cinco anos, comparando as velocidades de buracos negros supermassivos e galáxias. 

Será que as velocidades dos buracos negros são as mesmas que as velocidades das galáxias onde residem? Espera-se que tenham a mesma velocidade. Caso contrário, isso implica que o buraco negro foi perturbado. Para a sua busca, a equipe investigou inicialmente 10 galáxias distantes e os buracos negros supermassivos nos seus núcleos. Estudaram especificamente os buracos negros que continham água nos seus discos de acreção, as estruturas espirais que giram para dentro em direção ao buraco negro.

Conforme a água orbita ao redor do buraco negro, produz um feixe de rádio semelhante a um laser conhecido como maser. Quando estudado com uma rede combinada de antenas de rádio usando uma técnica conhecida como VLBI (Very Long Baseline Interferometry), os masers podem ajudar a medir a velocidade de um buraco negro com muita precisão.

A técnica ajudou determinar que nove dos dez buracos negros supermassivos estavam em repouso, mas um destacou-se e parecia estar em movimento. Localizado a 230 milhões de anos-luz da Terra, o buraco negro fica no centro de uma galáxia chamada J0437+2456. A sua massa é cerca de três milhões de vezes a do nosso Sol. 

Usando observações de acompanhamento com os Observatórios Arecibo e Gemini, a equipe confirmou agora as suas descobertas iniciais. O buraco negro supermassivo está se movendo a uma velocidade de aproximadamente 177.000 quilômetros por hora dentro da galáxia J0437+2456. 

Mas o que está causando este movimento não é conhecido. A equipe suspeita que existem duas possibilidades. Pode estar sendo observado as consequências da fusão de dois buracos negros supermassivos. O resultado de tal fusão pode fazer com que o buraco negro recém-nascido recue, e podemos observá-lo  no ato de recuar ou enquanto se acomoda novamente. Mas há outra possibilidade: o buraco negro pode ser parte de um sistema binário.

O que pode estar sendo observado na galáxia J0437+2456 é um dos buracos negros deste par, com o outro permanecendo oculto nas nossas observações rádio por causa da sua falta de emissão maser. No entanto, serão necessárias mais observações para determinar a verdadeira causa do movimento incomum deste buraco negro supermassivo. 

Os seus resultados foram publicados no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics

segunda-feira, 15 de março de 2021

Nova atmosfera se formando em um exoplaneta rochoso

Pela primeira vez, cientistas usando o telescópio espacial Hubble encontraram evidências de atividade vulcânica reformando a atmosfera em um exoplaneta rochoso ao redor de uma estrela distante.

© Caltech/R. Hurt (ilustração do exoplaneta GJ 1132 b)

O planeta, GJ 1132 b, tem densidade, tamanho e idade semelhantes aos da Terra. O planeta GJ 1132 b parece ter começado a vida como um mundo gasoso com uma espessa manta de atmosfera. Este Sub-Netuno, com várias vezes o raio da Terra, rapidamente perdeu sua atmosfera primordial de hidrogênio e hélio, que foi arrancada pela intensa radiação de sua jovem estrela quente. 

Em um curto período de tempo, foi reduzido a um núcleo vazio do tamanho da Terra. Para a surpresa dos astrônomos, novas observações do Hubble descobriram uma atmosfera secundária que substituiu a primeira atmosfera do planeta. É rico em hidrogênio, cianeto de hidrogênio, metano e amônia, e também possui uma névoa de hidrocarbonetos. 

Os astrônomos teorizam que o hidrogênio da atmosfera original foi absorvido pelo manto de magma derretido do planeta e agora está sendo lentamente liberado pelo vulcanismo para formar uma nova atmosfera. Esta segunda atmosfera, que continua vazando para o espaço, está continuamente sendo reabastecida do reservatório de hidrogênio no magma do manto.

Em alguns aspectos, GJ 1132 b tem vários paralelos com a Terra, mas em outros também é muito diferente. Ambos têm densidades semelhantes, tamanhos e idades semelhantes, com cerca de 4,5 bilhões de anos. Ambos começaram com uma atmosfera dominada por hidrogênio e ambos estavam quentes antes de esfriarem. 

O trabalho da equipe até sugere que GJ 1132 b e a Terra têm pressão atmosférica semelhante na superfície. No entanto, as histórias de formação dos planetas são profundamente diferentes. Não se acredita que a Terra seja o núcleo sobrevivente de um sub-Netuno. E a Terra orbita a uma distância confortável de nosso Sol. 

O GJ 1132 b está tão perto de sua estrela anã vermelha hospedeira que completa uma órbita em torno da estrela uma vez a cada dia e meio. Esta proximidade extremamente estreita mantém o GJ 1132 b travado por força de maré, mostrando a mesma face para sua estrela o tempo todo, assim como nossa Lua mantém um hemisfério permanentemente voltado para a Terra.

A questão é: o que mantém o manto quente o suficiente para permanecer líquido e alimentar o vulcanismo? O fenômeno do aquecimento das marés ocorre através do atrito, quando a energia da órbita e rotação de um planeta é dispersa como calor dentro do planeta. O GJ 1132 b está em uma órbita elíptica, e as forças de maré agindo sobre ele são mais fortes quando está mais próximo ou mais distante de sua estrela hospedeira. 

Pelo menos um outro planeta no sistema da estrela hospedeira também exerce uma atração gravitacional no planeta. As consequências são que o planeta é comprimido ou esticado por esta atração gravitacional. 

Este aquecimento das marés mantém o manto líquido por muito tempo. Um exemplo próximo em nosso próprio Sistema Solar é a lua de Júpiter, Io, que tem vulcanismo contínuo como resultado de um cabo de guerra entre Júpiter e as luas de Júpiter vizinhas.

A equipe acredita que a crosta do GJ 1132 b é extremamente fina, talvez com apenas centenas de metros de espessura. Isso é muito fraco para suportar qualquer coisa que se pareça com montanhas vulcânicas. Seu terreno plano também pode ser rachado como uma casca de ovo pela flexão da maré. 

O hidrogênio e outros gases podem ser liberados por meio destas rachaduras. Se esta atmosfera tiver uma pressão superficial semelhante à da Terra, provavelmente significa que poderá ser vistor até o solo em comprimentos de onda infravermelhos. Isto significa que se os astrônomos usarem o telescópio espacial James Webb para observar este planeta, existe a possibilidade de que eles vejam não o espectro da atmosfera, mas sim o espectro da superfície. 

E se houver poças de magma ou vulcanismo acontecendo, estas áreas serão mais quentes, gerando mais emissão. Este resultado é significativo porque fornece uma maneira de descobrir algo sobre a geologia de um planeta a partir de sua atmosfera. E também é importante para entender onde os planetas rochosos no Sistema Solar (Mercúrio, Vênus, Terra e Marte) se encaixam no quadro mais amplo da planetologia comparativa, em termos da disponibilidade de hidrogênio versus oxigênio na atmosfera.

Fonte: ESA

A origem da luz zodiacal

Olhe para o céu logo antes do nascer do Sol, ou depois do pôr do Sol, e poderá ver uma tênue coluna de luz se estendendo do horizonte.

© Juan Carlos Casado (luz zodiacal)

Este brilho difuso é a luz zodiacal, ou luz solar refletida em direção à Terra por uma nuvem de minúsculas partículas de poeira que orbitam o Sol. Os astrônomos há muito tempo que pensam que a poeira é trazida para o Sistema Solar interior por algumas famílias de asteroides e cometas que se aventuram de longe. Mas agora, cientistas da Juno argumentam que Marte pode ser o responsável. 

Um instrumento a bordo da sonda Juno detectou por acaso partículas de poeira se chocarem contra a nave espacial durante a sua viagem da Terra a Júpiter. Os impactos forneceram pistas importantes sobre a origem e evolução orbital da poeira, resolvendo algumas variações misteriosas da luz zodiacal.

Os pesquisadores calcularam o tamanho aparente e a velocidade dos objetos nas imagens e perceberam algo: grãos de poeira estavam colidindo com a Juno a cerca de 16.000 km/h, lascando pedaços submilimétricos. Ao que parece, o spray de detritos estava vindo dos grandes painéis solares da Juno, o maior e mais sensível detector não intencional de poeira já construído. Cada pedaço de detrito regista o impacto de uma partícula de poeira interplanetária, permitindo compilar uma distribuição de poeira ao longo da viagem da Juno. 

A Juno foi lançada em 2011. Após uma manobra no espaço profundo no cinturão de asteroides em 2012, regressou ao Sistema Solar interior para uma assistência gravitacional da Terra em 2013, que catapultou a nave em direção a Júpiter. Os pesquisadores notaram que a maioria dos impactos de poeira foram registados entre a Terra e o cinturão de asteroides, com lacunas na distribuição relacionadas com a influência da gravidade de Júpiter. 

Segundo os cientistas, esta foi uma revelação radical. Até agora, não foi possível medir a distribuição destas partículas de poeira no espaço. Os detectores de poeira dedicados têm áreas de recolhimento limitadas e, portanto, sensibilidade limitada a uma população esparsa de poeira. Contam principalmente as partículas de poeira mais abundantes e muito menores do espaço interestelar. Em comparação, os expansivos painéis solares da Juno têm 1.000 vezes mais área de absorção do que a maioria dos detectores de poeira. 

Os cientistas da Juno determinaram que a nuvem de poeira acaba na Terra porque a gravidade do nosso planeta "suga" toda a poeira que chega aqui. Esta é a poeira que vemos como luz zodiacal. Referente à orla mais externa, a cerca de 2 UA do Sol (1 UA é a distância entre a Terra e o Sol), esta acaba logo além de Marte.

Neste ponto, a influência da gravidade de Júpiter atua como uma barreira, evitando que as partículas de poeira atravessem do Sistema Solar interior para o espaço profundo. Este mesmo fenômeno, conhecido como ressonância orbital, também funciona no sentido inverso, onde bloqueia a poeira originária no espaço profundo de passar para o Sistema Solar interior.  

A influência profunda da barreira gravitacional indica que as partículas de poeira estão numa órbita quase circular em torno do Sol. E o único objeto conhecido numa órbita quase circular por volta das 2 UA é Marte, de modo que Marte seja uma fonte desta poeira.

Os cientistas desenvolveram um modelo de computador para prever a luz refletida pela nuvem de poeira, dispersada pela interação gravitacional com Júpiter que espalha a poeira num disco mais espesso. O espalhamento depende apenas de duas variáveis: a inclinação da poeira em relação à eclíptica e a sua excentricidade orbital.

Quando os pesquisadores inseriram os elementos orbitais de Marte, a distribuição previu com precisão a assinatura reveladora da variação da luz zodiacal perto da elíptica. Embora existam agora boas evidências de que Marte, o planeta mais empoeirado que conhecemos, seja a fonte da luz zodiacal, os astrônomos ainda não conseguem explicar como a poeira pode ter escapado da atração gravitacional marciana. 

Entretanto, salientam que a determinação da verdadeira distribuição e densidade das partículas de poeira no Sistema Solar vai ajudar os engenheiros a projetar materiais para naves espaciais que podem suportar melhor os impactos da poeira. O conhecimento da distribuição precisa de poeira também pode orientar o design de trajetórias de voo para futuras espaçonaves, a fim de evitar a maior concentração de partículas.

As partículas minúsculas que viajam a velocidades tão altas podem arrancar até 1.000 vezes a sua massa de uma nave espacial. Os painéis solares da Juno escaparam a estes danos porque as células solares estão bem protegidas contra impactos na parte de trás (lado escuro) dos painéis pela estrutura de suporte.

Um artigo foi publicado no periódico Journal of Geophysical Research: Planets.

Fonte: NASA

Um lampejo de vida

Localizada a cerca de 5.000 anos-luz de distância na constelação de Cygnus (O Cisne), Abell 78 é um tipo incomum de nebulosa planetária.

© Hubble/M. Guerrero/Judy Schmidt (Abell 78)

Depois de exaurir o combustível nuclear em seus núcleos, estrelas com massa em torno de 0,8 a 8 vezes a massa do nosso Sol colapsam para formar estrelas anãs brancas quentes e densas. 

À medida que este processo ocorre, a estrela moribunda se desprende de suas camadas externas de material, formando uma elaborada nuvem de gás e poeira conhecida como nebulosa planetária. 

Este fenômeno não é incomum, e as nebulosas planetárias são um foco popular para astrofotógrafos por causa de suas formas frequentemente belas e complexas. No entanto, algumas como Abell 78 são o resultado de uma estrela “renascida”.

Embora o núcleo da estrela tenha parado de queimar hidrogênio e hélio, uma reação termonuclear em sua superfície ejeta material em alta velocidade. Este material ejetado choca e varre o material da antiga nebulosa, produzindo os filamentos e a casca irregular ao redor da estrela central vista na imagem acima, que apresenta dados da Wide Field Camera 3 do Hubble e PANSTARSS.

Fonte: ESA

sexta-feira, 12 de março de 2021

Detritos de explosão estelar encontrados em local incomum

No primeiro levantamento de todo o céu pelo telescópio de raios X eROSITA, astrônomos do Instituto Max Planck para Física Extraterrestre identificaram um remanescente de supernova até então desconhecido, denominado "Hoinga".

© ICRAR/eROSITA (remanescente de supernova Hoinga)

A imagem acima é uma composição de dados rádio e de raios X do remanescente de supernova Hoinga. Os raios X descobertos pelo eROSITA são emitidos pelos detritos quentes da progenitora explodida, ao passo que as antenas de rádio detectam emissão de síncrotron dos elétrons relativistas, que são desacelerados na camada exterior do remanescente.

O remanescente de supernova Hoinga é muito grande e está localizado longe do plano galáctico, o que implica que os próximos anos podem trazer muito mais descobertas. 

As estrelas massivas terminam as suas vidas em explosões de supernova gigantescas quando os processos de fusão no seu interior não produzem mais energia suficiente para conter o seu colapso gravitacional. Mas mesmo com centenas de bilhões de estrelas numa galáxia, estes eventos são muito raros. Na Via Láctea, estima-se a ocorrência de uma supernova, em média, a cada 30 a 50 anos.

Embora a própria supernova só seja observável numa escala de tempo de meses, os seus remanescentes podem ser detectados durante cerca de 100.000 anos. Estes remanescentes são compostos por material ejetado a altas velocidades pela explosão da estrela que formam ondas de choque quando atingem o meio interestelar circundante. 

Conhecemos atualmente cerca de 300 remanescentes de supernovas, muito menos dos que os 1.200 estimados na nossa Galáxia. Portanto, ou os astrofísicos entenderam mal o ritmo de ocorrência de supernovas ou uma grande maioria não foi observada até agora. 

Uma equipe internacional de astrônomos está agora usando os levantamentos de todo o céu do telescópio de raios X eROSITA para procurar vestígios de supernovas até então desconhecidas. Com temperaturas de milhões de graus, os detritos de tais supernovas emitem radiação altamente energética, ou seja, devem aparecer nos dados de levantamentos de raios X de alta qualidade. 

Hoinga é o maior remanescente de supernova já descoberto em raios X. Com um diâmetro de aproximadamente 4,4 graus, cobre uma área cerca de 9 vezes maior do que o tamanho da Lua Cheia. Além disso, fica muito longe do plano galáctico, o que é muito incomum. 

A maioria das pesquisas anteriores por remanescentes de supernova concentraram-se no disco da nossa Galáxia, onde a formação estelar é mais alta e os remanescentes estelares, portanto, devem ser mais numerosos, mas parece que muitos remanescentes de supernova foram negligenciados devido a esta estratégia de pesquisa. 

Depois dos astrônomos terem descoberto o objeto nos dados de todo o céu do eROSITA, voltaram-se para outros recursos para confirmar a sua natureza. Hoinga é visível também em dados obtidos pelo telescópio de raios X ROSAT de há 30 anos atrás, mas ninguém o tinha visto antes devido ao seu fraco brilho e à sua localização a altas latitudes galácticas. No entanto, a confirmação real veio de dados de rádio, a banda espectral onde 90% de todos os remanescentes de supernova conhecidos foram encontrados até agora.

O telescópio de raios X eROSITA vai realizar um total de oito levantamentos de todo o céu e é cerca de 25 vezes mais sensível do que o seu antecessor ROSAT. Ambos os observatórios espaciais foram projetados, construídos e são operados pelo Instituto Max Planck para Física Extraterrestre.

Os astrônomos esperam descobrir novos remanescentes de supernova nos seus dados de raios X nos próximos anos, mas ficaram surpresos ao identificar um tão cedo no programa. 

Juntamente com as próximas pesquisas no rádio, o levantamento de raios X do eROSITA mostra-se bastante promissor no que se refere a encontrar muitos dos remanescentes de supernova em falta, ajudando a resolver este mistério astrofísico de longa data.

Fonte: Max Planck Institute for Extraterrestrial Physics

Sistema Solar estava na mira das grandes explosões cósmicas no passado

Eventos como os GRBs, que despejam em 10 segundos energia equivalente à que toda a Via Láctea emite em um século, eram sérias ameaças ao surgimento da vida. Só a partir de 4 bilhões de anos o Sistema Solar teria experimentado condições mais seguras.

© NASA/Swift/Cruz deWilde (ilustração de uma GRB alcançando a Terra)

Para entender como a vida surgiu na Terra, os cientistas têm procurado avaliar todos os possíveis fatores que permitem que ela se forme e se mantenha, desde os mais microscópicos e locais até os de dimensões verdadeiramente cósmicas.

Agora, um novo estudo sugere que, na verdade, até seis bilhões de anos atrás o Sistema Solar estava posicionado numa região perigosa para o surgimento da vida. Nesta época, a parte central da nossa galáxia, onde está a Terra, era varrida por intensas explosões de raios gama, capazes de destruir formas incipientes de vida. E talvez uma destas explosões tenha realmente contribuído para um dos grandes eventos de destruição em massa que o nosso planeta experimentou. 

Um grupo de pesquisadores liderado por Riccardo Spinelli, doutorando na Universidade de Insubria e associado ao Instituto Nacional de Astrofísica da Itália (INAF), procurou determinar onde e quando a vida poderia ter se desenvolvido em nossa galáxia de forma a estar a salvo do impacto de violentas explosões cósmicas, tais como as explosões de raios gama (GRBs) e as explosões de supernovas. 

Tanto as supernovas quanto as GRBs estão ligados ao ciclo de vida das estrelas e, em particular, à sua morte. Uma supernova ocorre quando uma estrela com massa muito maior do que o Sol chega ao fim de sua vida e explode. Ou quando explode uma anã branca – o remanescente de estrelas menos massivas, como o Sol – após acumular massa de uma companheira em um sistema binário. Já a GRB é um flash intenso de radiação de alta energia emitido quando uma estrela muito massiva e em rotação rápida morre, ou quando duas estrelas de nêutrons, ou uma estrela de nêutrons e um buraco negro – ambos remanescentes de estrelas massivas – se fundem. 

A energia liberada por GRBs e supernovas é enorme. Uma supernova libera em poucas horas, na faixa de alta energia, tanta energia quanto a Via Láctea, que contém centenas de bilhões de estrelas. Uma GRB, em 10 segundos, emite o mesmo que nossa galáxia em um século. As supernovas são mais frequentes em regiões do espaço onde estrelas de grande massa são formadas. Já as GRBs costumam ocorrer em áreas de formação de estrelas onde há pouca disponibilidade de elementos pesados. 

“Nessas regiões, as estrelas massivas formadas por gases pobres em metais perdem menos massa durante sua vida, devido aos ventos estelares. Portanto, estas estrelas são capazes de se manter em rotação rápida, condição necessária para que, uma vez formado um buraco negro, um jato poderoso seja gerado,” diz Giancarlo Ghirlanda, também do INAF. 

“Para entender como estes eventos se distribuem em nossa galáxia, partimos de um modelo que descreve a evolução de nossa galáxia,” diz Francesco Haardt, pesquisador associado do INAF. “Este modelo prevê que as regiões internas se formaram rapidamente nos estágios iniciais da história de nossa galáxia, ao contrário do que ocorreu nas regiões periféricas. Com o passar do tempo, a taxa de formação de estrelas diminuiu no centro e aumentou gradualmente na periferia. Consequentemente, no centro da Via Láctea, os gases primordiais, contendo hidrogênio e hélio, foram enriquecidos com elementos mais pesados ​​(oxigênio, carbono, nitrogênio) rapidamente. Já na periferia o enriquecimento foi mais gradual, sem entretanto atingir as altas metalicidades das regiões centrais.” 

“Excluindo as regiões muito centrais, a menos de 6.500 anos-luz do centro galáctico, onde as explosões de supernovas são mais frequentes, nosso estudo sugere que a pressão evolutiva em cada época é determinada principalmente por GRBs,” diz Spinelli. “Embora sejam eventos muito mais raros que as supernovas, as GRBs são capazes de causar uma extinção em massa a distâncias maiores”. 

Os resultados do estudo mostram que, até 6 bilhões de anos atrás, excetuando-se as regiões periféricas da Via Láctea, onde havia relativamente poucos planetas, os demais planetas estavam sujeitos a muitos destes eventos de grandes explosões, capazes de desencadear extinções em massa, devido à alta taxa de formação de estrelas e baixa metalicidade que se verificava à época. 

Mais tarde, a partir de 4 bilhões de anos atrás, o aumento na quantidade de elementos pesados ​disponíveis, que foi o resultado das gerações seguintes de estrelas, reduziu a frequência da ocorrência de GRBs. Isto garantiu que as regiões centrais se tornassem um ambiente mais seguro, numa distância entre 6,5 mil e 26 mil anos-luz do centro galáctico (e 26 mil anos-luz corresponde à distância do Sol ao centro).

É nesta região que planetas do tipo da Terra são mais abundantes. Em paralelo, aumentava a formação de estrelas na periferia da galáxia, favorecendo a ocorrência de GRBs e tornando estas regiões inseguras. Em um planeta como a Terra, um evento como um GRB teria efeitos catastróficos. 

Vários estudos sugerem que a radiação gama liberada por uma GRB a uma distância de 3,3 mil anos-luz da Terra destruiria a camada de ozônio na atmosfera. Sem esta proteção, o planeta ficaria exposto à radiação ultravioleta do Sol que poderia desencadear a extinção de quase todas as formas de vida na superfície.

A destruição da camada de ozônio produziria compostos de nitrogênio. Isto reduziria a luz solar visível, causando resfriamento global. Por estas razões, vários estudos propuseram que a primeira das cinco extinções em massa que afetaram a Terra, a extinção em massa do Ordoviciano Tardio, cerca de 445 milhões de anos atrás, foi causada por uma GRB.

O trabalho de Spinelli e colaboradores apóia essa hipótese. Em relação ao passado “recente”, o estudo constata que, nos últimos 500 milhões de anos, a Via Láctea tornou-se globalmente mais segura do que em épocas anteriores. As regiões periféricas estão mais expostas à ação das GRBs letais. Já nas regiões a uma distância de até 6,5 mil anos-luz do centro galáctico estão mais expostas à supernovas. 

Por fim os pesquisadores estimam que nosso planeta deve ter experimentado pelo menos uma GRB letal nos últimos 500 milhões de anos, possivelmente associado à primeira grande extinção em massa de que temos conhecimento.

O trabalho foi publicado na revista Astronomy & Astrophysics.

Fonte: Scientific American

quinta-feira, 11 de março de 2021

Resolvido o mistério do escurecimento de estrela monstruosa

No ano passado, os astrônomos ficaram intrigados quando Betelgeuse, a brilhante estrela supergigante vermelha na constelação de Órion, desvaneceu dramaticamente, mas depois recuperou.

© Hubble (material expelido pela hipergigante VY Canis Majoris)

A diminuição de brilho durou semanas. Agora, os astrônomos voltaram as suas atenções para uma estrela monstruosa na constelação adjacente de Cão Maior. A hipergigante vermelha VY Canis Majoris, que é muito maior, mais massiva e mais violenta do que Betelgeuse, passa por períodos muito mais longos e tênues que duram anos. 

Novas descobertas do telescópio espacial Hubble sugerem que os mesmos processos que ocorreram em Betelgeuse estão acontecendo nesta hipergigante, mas a uma escala muito maior. 

Para Betelgeuse, o escurecimento correspondeu a um fluxo de gás que pode ter formado poeira, o que obstruiu brevemente parte da luz de Betelgeuse a partir do nosso ponto de vista, criando o efeito de escurecimento. Em VY Canis Majoris vemos algo semelhante, mas a uma escala muito maior. Ejeções massivas de material que correspondem ao seu desvanecimento muito profundo, o que é provavelmente devido à poeira que bloqueia temporariamente a luz da estrela.

A enorme hipergigante vermelha é 300.000 vezes mais brilhante do que o nosso Sol. Se substituíssemos o Sol no nosso próprio Sistema Solar, este monstro inchado estender-se-ia por quase um bilhão de quilômetros, até entre as órbitas de Júpiter e Saturno.

Arcos colossais de plasma rodeiam a estrela a distâncias milhares de vezes superiores à distância Terra-Sol. Estes arcos parecem-se com as proeminências solares do nosso Sol, apenas numa escala muito maior. Além disso, não estão fisicamente ligadas à estrela, mas, ao invés, podem ter sido expelidas e estão se afastando.

Algumas das outras estruturas próximas da estrela ainda são relativamente compactas, parecendo pequenos nós e características nebulosas. Em trabalhos anteriores foi determinado quando estas grandes estruturas foram expulsas da estrela. Foram descobertas datas que variam ao longo das últimas centenas de anos, algumas apenas nos últimos 100 a 200 anos. 

Agora, num novo trabalho com o telescópio espacial Hubble, os pesquisadores resolveram características muito mais próximas da estrela, que podem ter menos de um século. Foram determinadas as velocidades e os movimentos de nós próximos de gás quente e outras características. Notavelmente, muitos destes nós estão ligados a episódios múltiplos nos séculos XIX e XX quando VY Canis Majoris desvaneceu para um-sexto do seu brilho normal.

Ao contrário de Betelgeuse, VY Canis Majoris é agora demasiado tênue para ser vista a olho nu. A estrela já foi visível à vista desarmada, mas escureceu tanto que agora só pode ser observada com telescópios. A hipergigante perde 100 vezes mais massa do que Betelgeuse. A massa em alguns dos nós é mais do que o dobro da massa de Júpiter. Este aspecto pode até ser o principal mecanismo responsável pela perda de massa, o que sempre foi um mistério para as supergigantes vermelhas.

Embora outras supergigantes vermelhas sejam comparativamente brilhantes e liberem muita poeira, nenhuma delas é tão complexa quanto VY Canis Majoris. Ela pode estar num estágio evolutivo único que a separa das outras estrelas. Está provavelmente assim tão ativa por um período muito curto, talvez apenas alguns milhares de anos. 

A estrela começou a sua vida como uma supergigante azul, brilhante e superquente, talvez com 35 a 40 vezes a massa do nosso Sol. Depois de alguns milhões de anos, à medida que o ritmo de fusão do hidrogênio no seu núcleo mudava, a estrela inchou até se tornar numa supergigante vermelha. Talvez o que torna VY Canis Majoris tão especial, tão extrema, com este material ejetado muito complexo, seja o fato de ser uma supergigante vermelha de segundo estágio. VY Canis Majoris pode já ter perdido metade da sua massa. Em vez de explodir como uma supernova, poderá simplesmente colapsar diretamente para um buraco negro. 

As descobertas foram publicadas no periódico The Astronomical Journal.

Fonte: ESA

terça-feira, 9 de março de 2021

Descoberta uma super-Terra que pode possuir atmosfera

Ao longo dos últimos 25 anos, fora descobertos uma grande variedade de exoplanetas, compostos por rocha, gelo e gás, graças à construção de instrumentos astronômicos projetados especificamente para a caça de planetas.

© RendrerArea (ilustração da superfície do exoplaneta Gliese 486b)

Além disso, usando uma combinação de diferentes técnicas de observação, foram capazes de determinar um grande número de massas, tamanhos e, portanto, densidades dos planetas, o que os ajuda a estimar a sua composição interna e a elevar o número de planetas que foram descobertos para além do Sistema Solar.

No entanto, o estudo das atmosferas dos planetas rochosos, que por sua vez permitiria caracterizar completamente aqueles exoplanetas semelhantes à Terra, é extremamente difícil com os instrumentos atualmente disponíveis. Por isso, os modelos atmosféricos para planetas rochosos ainda não foram testados. 

Os astrônomos descobriram uma super-Terra quente com auxílio  do telescópio Carlos Sánchez de 1,52 metros no Observatório de Teide. O exoplaneta está em órbita de uma anã vermelha próxima, Gliese 486, a apenas 26 anos-luz do Sol. Para tal, os cientistas usaram as técnicas combinadas de fotometria de trânsito e espectroscopia de velocidade radial.

O exoplaneta, chamado Gliese 486b, tem uma massa 2,8 vezes a da Terra e é apenas 30% maior. Calculando a sua densidade média a partir das medições da sua massa e raio, foi inferida que a sua composição é parecida à de Vênus ou da Terra, que possuem núcleos metálicos no seu interior. 

O Gliese 486b orbita a sua estrela hospedeira num percurso circular a cada 1,5 dias, a uma distância de 2,5 milhões de quilômetros. Apesar de estar tão perto da sua estrela, o planeta provavelmente conservou parte da sua atmosfera original (a estrela é muito menos quente do que o nosso Sol), de modo que é um bom candidato para ser observado em mais detalhe com a próxima geração de telescópios espaciais e terrestres, o iminente telescópio espacial James Webb e o ELT (Extremely Large Telescope), atualmente em construção.

O Gliese 486b leva o mesmo tempo para completar uma rotação sob si próprio do que para completar uma órbita à volta da sua estrela progenitora, de modo que tem sempre o mesmo lado voltado para a estrela. Embora Gliese 486 seja muito mais fraca e fria que o Sol, a radiação é tão intensa que a superfície do planeta aquece até pelo menos  430º C. Por isso, a superfície de Gliese 486b é provavelmente mais parecida com a superfície de Vênus do que a da Terra, com uma paisagem quente e seca, com rios ardentes de lava. 

No entanto, ao contrário de Vênus, Gliese 486b pode ter uma atmosfera fina. Os cálculos feitos com modelos existentes de atmosferas planetárias podem ser consistentes com cenários de superfície quente e atmosfera fina porque a irradiação estelar tende a evaporar a atmosfera, enquanto a gravidade do planeta tende a retê-la. 

Futuras observações tentarão determinar a sua inclinação orbital, o que torna possível que Gliese 486 atravessa a linha de visão entre nós e a superfície da estrela, ocultando parte da sua luz, e produzindo trânsitos. Será possível também fazer medições espectroscópicas, usando "espectroscopia de emissão", quando as áreas do hemisfério iluminado pela estrela forem visíveis como fases do planeta (análogas às fases da nossa Lua), durante as órbitas de Gliese 486b, antes de desaparecer por trás da estrela.

Os resultados deste estudo foram publicados na revista Science.

Fonte: Max Planck Institute for Astronomy

segunda-feira, 8 de março de 2021

Descoberto quasar mais distante com poderosas emissões rádio

Com a ajuda do Very Large Telescope (VLT) do ESO, os astrônomos descobriram e estudaram em detalhes a fonte de emissão rádio mais distante conhecida até hoje, um quasar com forte emissão rádio (um objeto brilhante com jatos poderosos que emitem nos comprimentos de onda do rádio) tão distante que a sua luz demorou 13 bilhões de anos para chegar até nós.

© ESO/M. Kornmesser (ilustração do quasar P172+18)

A descoberta pode fornecer pistas importantes para ajudar os astrônomos a entender o Universo primordial. Os quasares são objetos muito brilhantes que se encontram no centro de algumas galáxias e que são alimentados por buracos negros supermassivos. À medida que consomem o gás que os rodeia, os buracos negros liberam energia, permitindo assim aos astrônomos detectá-los, mesmo quando se encontram muito distantes.

O quasar recém-descoberto, P172+18, está tão distante que a luz dele viajou por cerca de 13 bilhões de anos para chegar até nós, ou seja, nós o vemos como era quando o Universo tinha cerca de 780 milhões de anos. 

Embora quasares mais distantes tenham sido descobertos, esta é a primeira vez que os astrônomos foram capazes de identificar as assinaturas reveladoras de jatos de rádio em um quasar no início da história do Universo.

Apenas cerca de 10% dos quasares, os que emitem fortemente no rádio, têm jatos que brilham intensamente nas frequências rádio. As ondas de rádio usadas na astronomia têm frequências entre cerca de 300 MHz e 300 GHz. 

O P172+18 é alimentado por um buraco negro com cerca de 300 milhões de vezes a massa do nosso Sol, que consome gás a uma taxa extraordinária. “O buraco negro está devorando matéria muito rapidamente, crescendo em massa a uma das taxas mais altas já observadas,” explica a astrônoma Chiara Mazzucchelli, bolsista do ESO no Chile, que liderou a descoberta junto com Eduardo Bañados do Instituto Max Planck de Astronomia, na Alemanha.

Os astrônomos pensam que existe uma ligação entre o rápido crescimento de buracos negros supermassivos e os poderosos jatos de rádio detectados em quasares como o P172+18. Acredita-se que os jatos sejam capazes de perturbar o gás ao redor do buraco negro, aumentando a taxa à qual o gás é capturado. Portanto, o estudo de quasares com forte emissão rádio pode nos fornecer pistas importantes sobre como é que os buracos negros no Universo primordial cresceram tão rapidamente para tamanhos supermassivos após o Big Bang.

O P172+18 foi inicialmente reconhecido como um quasar distante, após ter sido previamente identificado como uma fonte de rádio, no telescópio Magalhães no Observatório Las Campanas no Chile por Bañados e Mazzucchelli. “Assim que obtivemos os dados, fizemos uma inspeção visual e soubemos imediatamente que havíamos descoberto o quasar de alta potência mais distante que se conhecia até agora,” disse Bañados.

No entanto, devido ao curto tempo de observação, a equipe não conseguiu obter dados suficientes para estudar o objeto com detalhe. Seguiram-se assim uma quantidade de observações obtidas com outros telescópios, incluindo o instrumento X-shooter montado no VLT do ESO, que permitiram investigar melhor as características do quasar, incluindo a determinação de propriedades-chave, como a massa do buraco negro e quão rápido ele está consumindo a matéria que o circunda.

Outros telescópios que contribuíram para este estudo incluem o Very Large Array do Observatório Nacional de Radioastronomia e o telescópio Keck, nos EUA. Observações obtidas com infraestruturas como o ALMA e com o futuro Extremely Large Telescope (ELT) do ESO poderão ajudar a descobrir e estudar mais destes objetos primitivos do Universo em detalhes. 

Esta pesquisa foi apresentada num artigo intitulado “The discovery of a highly accreting, radio-loud quasar at z=6.82” publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: ESO

sábado, 6 de março de 2021

Átomo extinto revela os segredos há muito guardados do Sistema Solar

Usando o átomo extinto de nióbio-92, pesquisadores do Instituto Federal de Tecnologia de Zurique (ETH Zurique) foram capazes de datar eventos no início do Sistema Solar com maior precisão do que antes.

© Makiko K. Haba (átomo instável nióbio-92 no início do Sistema Solar)

O estudo conclui que as explosões de supernovas devem ter ocorrido no ambiente natal do nosso Sol. Se um átomo de um elemento químico tiver um excedente de prótons ou nêutrons, torna-se instável. Este libera estas partículas adicionais como radiação gama até que se torne instável novamente. 

Um destes isótopos instáveis é o radionuclídeo nióbio-92 (92Nb). A sua meia-vida de 37 milhões de anos é relativamente curta, de modo que foi extinto logo após a formação do Sistema Solar. Hoje, apenas o seu isótopo filho, zircônio-92 (92Zr), atesta a existência de 92Nb. 

Mesmo assim, os cientistas continuaram a usar o radionuclídeo extinto na forma do "cronômetro" 92Nb-92Zr, com o qual podem datar eventos que ocorreram no início do Sistema Solar, há cerca de 4,57 bilhões de anos. A utilização do "cronômetro" 92Nb-92Zr tem sido limitada até agora, devido a uma falta de informações precisas sobre a quantidade de 92Nb presente durante o nascimento do Sistema Solar.

Isto compromete a sua utilização na datação e na determinação da produção destes radionuclídeos em ambientes estelares. Agora, pesquisadores do ETH Zurique e do Instituto de Tecnologia de Tóquio melhoraram em muito este "cronômetro". Os cientistas alcançaram este avanço por meio de um truque inteligente: recuperaram os raros zircão e minerais de rutilo de meteoritos que eram fragmentos do protoplaneta Vesta. 

Estes minerais são considerados os mais adequados para a determinação do 92Nb, porque fornecem evidências precisas de quão comum ele era durante a formação do meteorito. Então, com a técnica de datação de urânio-chumbo (átomos de urânio que decaem para chumbo), foi calculada a abundância de 92Nb durante a formação do Sistema Solar.

Ao combinar os dois métodos, os pesquisadores conseguiram melhorar consideravelmente a precisão do "cronômetro" 92Nb-92Zr, sendo uma ferramenta poderosa para fornecer idades precisas para a formação e desenvolvimento de asteroides e planetas, eventos que ocorreram nas primeiras dezenas de milhões de anos após a formação do Sistema Solar.

Agora que os pesquisadores sabem com mais precisão quão abundante o 92Nb era no início do nosso Sistema Solar, podem determinar mais eficazmente onde estes átomos foram formados e onde o material que compõe o nosso Sol e os planetas teve origem.

O novo modelo sugere que o Sistema Solar interior, com os planetas terrestres como a Terra e Marte, é amplamente influenciado pelo material ejetado por supernovas do Tipo Ia na nossa Galáxia, a Via Láctea. Em tais explosões estelares, duas estrelas em órbita interagem entre si antes de explodir e liberar material estelar. Em contraste, o Sistema Solar exterior foi alimentado principalmente por uma supernova de colapso de núcleo, provavelmente no berçário estelar onde o nosso Sol nasceu, na qual uma estrela massiva colapsou sobre si própria e explodiu violentamente.

Fonte: Eidgenössische Technische Hochschule Zürich

Estrelas velhas podem servir como nova "régua" cósmica

Apesar de um século de medições, os astrônomos não conseguem concordar no valor da expansão do Universo.

© Martin Pugh (R Leropis)

Uma técnica que se baseia na medição de distâncias a um tipo específico de estrela velha em outras galáxias, chamado método JAGB (J-region Asymptotic Giant Branch), pode ajudar.

A estrela brilhante e alaranjada, R Leropis, visível no centro, é um exemplo de um tipo de estrelas localizada na região-J do ramo assintótico das gigantes. A cor impressionante vem das grandes quantidades de carbono na atmosfera.

A astrofísica e estudante da Universidade de Chicago, Abigail Lee, analisou observações da luz de uma galáxia próxima para validar o método JAGB para medir distâncias cósmicas. Esta nova técnica permitirá futuras medições independentes de distância que podem ajudar a responder a uma das maiores questões pendentes da cosmologia: quão depressa está o Universo se expandindo? 

"Uma das questões mais interessantes da cosmologia hoje é se há uma nova física em falta no nosso entendimento atual de como o Universo está evoluindo. Uma discrepância atual na medição da constante de Hubble pode estar sinalizando uma nova propriedade física do Universo ou incertezas não reconhecidas de medição," disse Wendy L. Freedman, professora de astronomia e astrofísica na mesma universidade. Existem poucos métodos para medir distâncias que podem fornecer a precisão necessária.

Em 1920, Edwin Hubble notou pela primeira vez a relação entre a distância de uma galáxia e quão depressa estava se afastando de nós. Este valor, agora conhecido como constante de Hubble, é um parâmetro chave dos modelos cosmológicos. Hubble primeiro mediu esta constante comparando medições de distâncias galácticas e velocidades derivadas de um tipo específico de estrela que pulsa regularmente. 

As medições, usando métodos diretos como o de Hubble, melhoraram muito ao longo das décadas, mas não concordam com os métodos que extrapolam a partir da radiação cósmica de fundo em micro-ondas, a radiação remanescente do Universo muito primitivo. Esta discordância é chamada de tensão de Hubble e é uma das questões mais proeminentes da cosmologia moderna. 

Um método de medição independente pode ajudar a preencher a lacuna entre os métodos e levar a um valor mais decisivo da constante de Hubble medida diretamente das distâncias. É aqui que entra o método JAGB. As estrelas na região-J do ramo assintótico das gigantes são um tipo específico de gigantes velhas que contêm uma quantidade substancial de carbono nas suas atmosferas e que é trazido para a superfície por correntes de convecção, dando-lhes uma cor e brilho muito distintos que permite que sejam identificadas num determinado conjunto de estrelas numa galáxia.

Foi observado empiricamente que estas estrelas têm um brilho intrínseco conhecido de galáxia para galáxia. Isto torna-as grandes candidatas de velas padrão. Sabendo que o brilho aparente de uma estrela depende tanto da distância ao observador como do seu brilho intrínseco, se for conhecido este brilho intrínseco de uma estrela, é possível inferir a sua distância. 

A equipe selecionou uma galáxia na periferia do grupo galáctico mais próximo, chamada WLM (Wolf–Lundmark–Melotte), e usou dados obtidos de observações com os telescópios Magellan no Observatório Las Campanas no Chile. 

Usando um único objeto como alvo e aplicando quatro métodos diferentes e independentes de medição, a equipe pôde comparar a exatidão e a precisão do método JAGB com os métodos estabelecidos anteriormente. Depois de analisarem dados de quatro maneiras diferentes, as pesquisadoras determinaram que o método JAGB não é apenas uma verificação independente de outros métodos de medição de distâncias, mas que requer menos tempo de observação. 

Considerando que as estrelas JAGB são mais brilhantes do que as estrelas usadas em outras medições de distância, também podem ser observadas mais longe, o que permitirá calibrações mais distantes do que é possível com os outros métodos. Além disso, as estrelas JAGB podem ser encontradas em todos os tipos de galáxias, ao contrário das estrelas pulsantes usadas por Edwin Hubble, que se encontram apenas no subconjunto mais limitado de galáxias espirais e sofrem frequentemente de aglomeração e interferência significativa da poeira.

"Idealmente, vamos obter tempo de observação com o telescópio espacial James Webb e com o telescópio espacial Hubble para usar este método e medir distâncias a galáxias que hospedam supernovas do Tipo Ia," disse Lee. 

As supernovas do Tipo Ia são usadas para medir galáxias mais distantes, mas precisam de ser calibradas por medições de distâncias inferiores usando técnicas como o método JAGB. "Assim que fizermos isto, podemos não apenas medir a constante de Hubble, mas também comparar estes vários métodos de distância para ver se há problemas com algum deles." 

Se este novo valor independente para a constante de Hubble concordar com outros métodos de medição direta ou com medições do Universo inicial, irá lançar luz sobre esta questão que há muito intriga os astrônomos e cosmólogos.

"Não temos uma compreensão firme do valor da constante de Hubble, de modo que este trabalho é realmente importante para ajudar a resolver, de momento, aquilo que é um dos maiores problemas da cosmologia," conclui Lee.

Fonte: University of Chicago