quarta-feira, 13 de abril de 2022

Estudo revela a origem do planeta anão Ceres

Um estudo, que contou com a colaboração do astrônomo do Observatório Nacional (ON/MCTI), Dr. Rodney Gomes, revelou a origem do planeta anão Ceres, o maior objeto do Cinturão de Asteroides localizado entre Marte e Júpiter.

© ESO/L. Calçada (Ceres)

De acordo com os pesquisadores, o planeta anão foi formado na zona mais fria do Sistema Solar, que se estende além da órbita de Júpiter. Posteriormente, Ceres teria sido lançado para o Cinturão de Asteroides, onde permanece até hoje. 

O que levou os cientistas a essa conclusão foi a composição diferenciada de Ceres em relação aos objetos vizinhos. O planeta anão tem um formato aproximadamente esférico, com o núcleo sendo provavelmente composto de ferro e silicato. Seu diâmetro é de quase mil quilômetros, mas a massa de Ceres não é suficientemente grande para segurar, por atração gravitacional, uma atmosfera.

Contudo, o que realmente destaca Ceres dos demais objetos é seu manto de gelo de amônia e água, que evapora com a incidência da luz solar, formando uma névoa que se dispersa no exterior. Como a maioria dos corpos do cinturão não tem amônia, é provável que Ceres tenha sido formado fora do Cinturão, em uma órbita além de Saturno, onde a amônia era abundante. Depois, devido à instabilidade gravitacional provocada pela formação de Júpiter e Saturno, Ceres teria sido “puxado” para a zona média do Cinturão.

“A presença de gelo de amônia é uma forte evidência observacional de que Ceres possa ter sido formado na região mais fria do Sistema Solar, além da chamada Linha de Gelo, onde as temperaturas eram baixas o suficiente para ocorrer condensação e fusão de água e substâncias voláteis, como monóxido de carbono, dióxido de carbono e amônia,” afirmou o autor principal do estudo Rafael Ribeiro de Sousa, professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp). 

Quando o Sistema Solar estava em formação, há cerca de 4,5 bilhões de anos, essa Linha Gel, que hoje está próxima da órbita de Júpiter, variou de posição, de acordo com a evolução do disco de gás protoplanetário (disco composto por 99% de gás e 1% de poeira). Mais precisamente, a perturbação gravitacional provocada pelo crescimento dos planetas pode ter alterado a densidade, a pressão e a temperatura do disco, deslocando a Linha de Gelo e fazendo com que planetas em crescimento migrassem para órbitas mais próximas do Sol.

Para chegar a esta conclusão, os cientistas realizaram simulações computacionais da fase de formação dos planetas gigantes, considerando as presenças de Júpiter, Saturno, embriões planetários (precursores de Urano e Netuno) e vários objetos similares em tamanho e composição química a Ceres. Nas simulações, eles verificaram que a fase de formação dos planetas gigantes caracterizou-se por colisões gigantescas entre os precursores de Urano e Netuno e pela ejeção de planetas para fora do Sistema Solar. Além disso, a perturbação gravitacional espalhou objetos similares a Ceres por toda a parte, sendo que alguns provavelmente alcançaram a região do Cinturão de Asteroides, adquirindo órbitas estáveis.

“Nosso principal resultado indica que, no passado, havia no mínimo 3.500 objetos do tipo Ceres, além da órbita de Saturno. E que, com esse número de objetos, nosso modelo mostrou que um deles conseguiu ser transportado e capturado no Cinturão de Asteroides, em uma órbita muito similar à órbita atual de Ceres,” destacou o professor Ribeiro de Sousa. 

O estudo, então, corrobora pesquisas anteriores que já haviam estimado o número de 3.500 objetos de tipo Ceres a partir da observação de crateras e de tamanhos de outras populações de astros situadas além de Saturno.

“Com nosso cenário, fomos capazes de confirmar tal número e explicar as propriedades orbitais e químicas de Ceres. Esse trabalho conta um ponto a favor dos modelos mais recentes de formação do Sistema Solar,” resume Ribeiro de Sousa.

O Cinturão de Asteroides é uma espécie de laboratório, pois guarda informações do que teria sido a evolução do Sistema Solar primitivo. “Nos primórdios do Sistema Solar, interagiam gravitacionalmente objetos maiores chamados proto-planetas e objetos menores, denominados planetesimais, pequenos corpos que, em se agregando, formariam os proto-planetas e finalmente os planetas. Nesse tempo ainda existia um disco de gás no qual esses corpos estavam imersos. Esse disco de gás teria tido um importante papel na estabilização final da órbita de Ceres,” disse Gomes. 

Quando os planetas já estavam praticamente formados, muitos dos planetesimais restantes, encontrando um meio menos denso, não conseguiram se aglutinar em corpos maiores e permaneceram no seu tamanho original. Hoje esses planetesimais são os chamados asteroides, que se encontram em sua maior parte entre as órbitas de Marte e Júpiter, como também os objetos transnetunianos, que se encontram além da órbita de Netuno.

“No entanto, os asteroides hoje apresentam composições químicas bastante variadas, sugerindo que tenham vindo de regiões diferentes. A maior parte teria tido sua origem na própria região asteroidal, muito embora nesta região tenha havido uma ‘mistura’ de objetos inicialmente em distâncias diferentes ao Sol. Contudo, alguns objetos, devido a sua composição de elementos mais voláteis, sugerem terem vindo de regiões mais afastadas do Sol e este seria o caso de Ceres," disse Gomes. 

"O trabalho liderado por Rafael Ribeiro de Souza tem justamente o objetivo de mostrar um caminho dinâmico pelo qual Ceres se deslocou de sua posição inicial além dos planetas gigantes até a sua posição atual dentro do Cinturão de Asteroides. Além disso, o estudo visa mostrar que esse caminho tem uma probabilidade significativa de ter ocorrido, sendo, portanto, uma hipótese provável. Minha contribuição foi principalmente orientar o Rafael no emprego de ferramentas estatísticas e sua interpretação a fim de avaliar a probabilidade da hipótese. Entre várias importâncias que esse trabalho pode ter, uma delas é dar mais uma comprovação do modelo primordial de formação e evolução do Sistema Solar primitivo. Também motiva a realização de um estudo mais amplo sobre a origem de outros asteroides de composição compatível com uma formação primordial além das órbitas originais dos planetas gigantes,” complementa Gomes.

Além de Ribeiro de Sousa e Rodney Gomes, também assinam o artigo o professor Ernesto Vieira Neto (UNESP) e pesquisadores da Université Côte d’Azur, na França; da Rice University e nos Estados Unidos. 

O estudo em questão será publicado em junho deste ano no periódico Icarus. 

Fonte: Observatório Nacional

Avistada a galáxia mais distante

Uma equipe internacional de astrônomos, incluindo pesquisadores do Harvard–Smithsonian Center for Astrophysics, avistou o objeto astronômico mais distante no momento: uma galáxia, denominada HD1, que está a cerca de 13,5 bilhões de anos-luz de distância.


© VISTA (galáxia HD1)

A equipe propõe duas ideias: a galáxia HD1 pode estar formando estrelas a um ritmo espantoso e possivelmente até é o lar de estrelas de População III, as primeiras estrelas do Universo; que, até agora, nunca foram observadas. Alternativamente, a galáxia HD1 pode conter um buraco negro supermassivo com cerca de 100 milhões de vezes a massa do nosso Sol. Outro detalhe: a galáxia HD1 é extremamente brilhante no ultravioleta (UV).

No início, os pesquisadores assumiram que HD1 era uma típica galáxia "starburst", uma galáxia que cria estrelas a um ritmo elevado. Mas depois de calcular quantas estrelas HD1 estava produzindo, obtiveram que HD1 estaria formando mais de 100 estrelas por ano! Isto é pelo menos 10 vezes mais do que o que esperamos para estas galáxias.

Foi aí que a equipe começou a suspeitar que HD1 poderia não estar formando estrelas normais e quotidianas. A primeira população de estrelas que se formaram no Universo eram mais massivas, mais luminosas e mais quentes do que as estrelas modernas.

Se for assumido que as estrelas produzidas em HD1 são estas primeiras, ou de População III, então as suas propriedades poderiam ser explicadas mais facilmente. De fato, as estrelas de População III são capazes de produzir mais luz UV do que estrelas normais, o que poderia clarificar a luminosidade ultravioleta extrema de HD1. No entanto, um buraco negro supermassivo poderia também explicar a luminosidade extrema de HD1. Ao absorver enormes quantidades de gás, podem ser emitidos fótons altamente energéticos pela região em torno do buraco negro. Se for esse o caso, seria de longe o mais antigo buraco negro supermassivo conhecido, observado muito mais próximo, no tempo, do Big Bang em comparação com o atual detentor do recorde.

A galáxia HD1 foi descoberta após mais de 1.200 horas de tempo de observação com o telescópio Subaru, o telescópio VISTA, o UKIRT (United Kingdom Infrared Telescope) e com o telescópio espacial Spitzer. 

"Foi muito difícil encontrar HD1 por entre mais de 700.000 objetos," diz Yuichi Harikane, astrônomo da Universidade de Tóquio, que descobriu a galáxia. "A cor vermelha de HD1 correspondia às características esperadas de uma galáxia a 13,5 bilhões de anos-luz de distância." 

A equipe realizou então observações de acompanhamento utilizando o ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array) para confirmar a distância, que é 100 milhões de anos-luz mais do que GN-z11, a atual detentora do recorde para galáxia mais distante. 

Utilizando o telescópio espacial James Webb, a equipe voltará em breve a observar HD1 para verificar a sua distância da Terra. Se os cálculos iniciais se revelarem corretos, HD1 será a galáxia mais distante e mais antiga registrada.

A desboberta foi descrita no periódico The Astrophysical Journal, e num artigo de acompanhamento publicado na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Harvard–Smithsonian Center for Astrophysics

terça-feira, 12 de abril de 2022

Variações surpreendentes nas temperaturas de Netuno

Uma equipe internacional de astrônomos analisou as temperaturas atmosféricas de Netuno e descobriu que existe uma queda surpreendente nas temperaturas globais de Netuno, seguida por um aquecimento dramático em seu polo sul.

© ESO/NAOJ (imagens térmicas de Netuno)

Os astrônomos estavam observando Netuno desde o início do seu verão austral e esperavam que as temperaturas fossem gradualmente subindo e não descendo. Tal como na Terra, existem estações em Netuno à medida que o planeta orbita em torno do Sol, com a diferença de que uma estação em Netuno dura cerca de 40 anos terrestres e um ano tem uma duração de 165 anos terrestres.

É verão no hemisfério sul de Netuno desde 2005 e os astrônomos estavam ansiosos para ver como as temperaturas variavam após o solstício de verão austral. Os astrônomos analisaram quase uma centena de imagens térmicas, em infravermelho, de Netuno, captadas durante um período de 17 anos, para compreenderem as tendências gerais na temperatura do planeta com mais detalhe do que o conseguido até hoje.

Os dados mostraram que, apesar do começo do verão austral, a maior parte do planeta esfriou gradualmente nas últimas duas décadas. A temperatura média global de Netuno caiu 8 °C entre 2003 e 2018. Os astrônomos ficaram surpresos ao descobrir um aquecimento dramático do polo sul de Netuno durante os últimos dois anos de suas observações, quando as temperaturas subiram rapidamente 11 °C entre 2018 e 2020. Embora o vórtice polar quente de Netuno seja conhecido há muitos anos, um aquecimento polar tão rápido nunca foi observado anteriormente no planeta. 

Os astrônomos mediram a temperatura de Netuno com o auxílio de câmaras térmicas, instrumentos que medem a radiação infravermelha emitida por objetos astronômicos. Para sua análise, a equipe combinou todas as imagens existentes de Netuno coletadas nas últimas duas décadas por telescópios terrestres. Foi analisada a radiação infravermelha emitida por uma camada da atmosfera de Netuno chamada estratosfera, o que permitiu esboçar um quadro da temperatura de Netuno e suas variações durante parte do seu verão austral. Como Netuno está a cerca de 4,5 bilhões de quilômetros de distância e é muito frio, a temperatura média do planeta chega a cerca de -220 °C, medir sua temperatura da Terra não é tarefa fácil. 

Este tipo de estudo só é possível graças a imagens infravermelhas sensíveis obtidas por grandes telescópios tais como o Very Large Telescope (VLT) do ESO, que consegue observar Netuno muito nitidamente. Cerca de um terço de todas as imagens foram obtidas pelo instrumento VISIR (VLT Imager and Spectrometer for mid-InfraRed) montado no VLT, no deserto chileno do Atacama. Devido ao tamanho do espelho do telescópio e à altitude, as imagens têm uma resolução muito elevada e uma grande qualidade, oferecendo as imagens mais nítidas de Netuno. A equipe utilizou também dados do telescópio espacial Spitzer da NASA e imagens obtidas com o telescópio Gemini Sul no Chile, assim como dos telescópios Subaru, Keck e Gemini Norte, todos instalados no Havaí. 

Como as variações de temperatura de Netuno foram tão inesperadas, os astrônomos ainda não sabem qual a sua origem. Poderão ser devidas a variações na química estratosférica de Netuno, ou padrões climáticos aleatórios ou até ao ciclo solar. Serão necessárias mais observações durante os próximos anos para explorar as razões destas flutuações.

Telescópios terrestres futuros, tais como o Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, poderão observar variações de temperatura como estas com maior detalhe, enquanto o telescópio espacial James Webb fornecerá novos mapas das temperaturas e da química da atmosfera de Netuno.

Esta pesquisa foi publicada na revista The Planetary Science Journal

Fonte: ESO

domingo, 10 de abril de 2022

Detectado maser poderoso em Nkalakatha

Um poderoso laser de ondas de rádio, chamado de "megamaser", foi observado pelo telescópio MeerKAT na África do Sul.

© SARAO (Telescópio MeerKAT)

A descoberta recorde é o megamaser mais distante de seu tipo já detectado, a cerca de cinco bilhões de anos-luz da Terra. A luz do megamaser viajou 58 sextilhões (58 seguidos de 21 zeros) quilômetros até a Terra. 

A descoberta foi feita por uma equipe internacional de astrônomos liderada pelo Dr. Marcin Glowacki, que trabalhou anteriormente no Instituto Interuniversitário de Astronomia Intensiva de Dados e na Universidade do Cabo Ocidental, na África do Sul, e agora está baseado na Universidade Curtin do Centro Internacional de Pesquisa em Radioastronomia (ICRAR) na Austrália Ocidental.

Os megamasers geralmente são criados quando duas galáxias colidem violentamente no Universo. Quando as galáxias colidem, o gás que elas contêm torna-se extremamente denso e pode disparar feixes de luz concentrados. Este é o primeiro megamaser de hidroxila deste tipo a ser observado pelo MeerKAT e o mais distante visto por qualquer telescópio até o momento. 

O objeto que quebrou o recorde foi chamado de "Nkalakatha", uma palavra isiZulu que significa “Grande Chefe”. O objeto está localizado próximo da Constelação de Órion, entre as estrelas Archernar e Aldebaran.

O megamaser foi detectado na primeira noite de uma pesquisa envolvendo mais de 3.000 horas de observações pelo telescópio MeerKAT. A equipe está usando o MeerKAT para observar regiões estreitas do céu extremamente profundas e medirá o hidrogênio atômico em galáxias do passado distante até agora.

A combinação de estudar masers de hidroxila e hidrogênio ajudará os astrônomos a entender melhor como o Universo evoluiu ao longo do tempo. Os astrônomos realizaram observações de acompanhamento do megamaser planejadas e esperam fazer muitas outras descobertas.

O MeerKAT é um instrumento precursor do Square Kilometer Array, uma iniciativa global para construir os maiores radiotelescópios do mundo na Austrália Ocidental e na África do Sul. 

Um artigo foi aceito para publicação no periódico The Astrophysical Journal Letters

Fonte: South African Radio Astronomy Observatory

Relação entre lua galileana e as emissões aurorais em Júpiter

No dia 8 de novembro de 2020, a nave espacial Juno da NASA voou através de um intenso feixe de elétrons, viajando desde Ganimedes, a maior lua de Júpiter, até à sua pegada auroral sobre o gigante gasoso.


© NASA/SwRI (feixe de elétrons de Ganimedes até Júpiter)

Cientistas do SwRI (Southwest Research Institute) utilizaram dados de instrumentos científicos da Juno para estudar a população de partículas viajando ao longo da linha do campo magnético que liga Ganimedes a Júpiter, ao mesmo tempo que detectavam remotamente as emissões aurorais associadas para desvendar os processos misteriosos que criam as luzes cintilantes.

As luas mais massivas de Júpiter criam cada uma as suas próprias auroras nos polos norte e sul de Júpiter. Tal como na Terra, Júpiter produz luz auroral ao redor das regiões polares à medida que partículas da sua magnetosfera massiva interagem com as moléculas da atmosfera joviana. No entanto, as auroras de Júpiter são significativamente mais intensas que as da Terra e, ao contrário da Terra, as maiores luas de Júpiter também criam manchas aurorais. 

A missão Juno está orbitando Júpiter numa órbita polar e voou através do "cordão" de elétrons que liga Ganimedes à sua pegada auroral associada. Ganimedes é a única lua no nosso Sistema Solar que tem o seu próprio campo magnético. A sua mini-magnetosfera interage com a magnetosfera massiva de Júpiter, criando ondas que aceleram os elétrons ao longo das linhas do campo magnético do gigante gasoso, que podem ser medidas diretamente pela Juno. 

Dois instrumentos da Juno, o JADE (Jovian Auroral Distributions Experiment) e o UVS (Ultraviolet Spectrometer), forneceram dados chave para este estudo, que também foi apoiado pelo sensor de campo magnético da Juno construído no Goddard Space Flight Center da NASA. O JADE mediu os elétrons que viajavam ao longo das linhas do campo magnético, enquanto o UVS fotografava a mancha da pegada auroral relacionada.

Desta forma, a Juno é capaz de medir a "chuva" de elétrons e observar imediatamente a luz UV que cria quando embate em Júpiter. As medições anteriores da Juno mostraram que grandes perturbações magnéticas acompanhavam os feixes de elétrons causando a pegada auroral. No entanto, desta vez, a Juno não observou perturbações semelhantes com o feixe de elétrons.

A relação entre Júpiter e Ganimedes será mais explorada pela missão alargada da Juno, bem como pela futura missão JUICE (JUpiter ICy moons Explorer) da ESA. E o SwRI está construindo a próxima geração do instrumento UVS para a missão.

Um artigo foi publicado no periódico Geophysical Research Letters

Fonte: Southwest Research Institute

sábado, 9 de abril de 2022

Descoberto um exoplaneta se formando de maneira não convencional

O telescópio espacial Hubble fotografou diretamente evidências da formação de um protoplaneta do tipo Júpiter através de um processo intenso e violento.

© STScI (ilustração do exoplaneta AB Aurigae b)

Esta descoberta apoia uma teoria há muito debatida de como planetas como Júpiter se formam, chamada "instabilidade do disco". 

O novo mundo em construção está embebido num disco protoplanetário de gás e poeira com uma estrutura espiral distinta que gira em torno de uma jovem estrela que se estima ter cerca de 2 milhões de anos. Trata-se da idade do nosso Sistema Solar quando a formação dos planetas estava em curso (a idade do Sistema Solar é atualmente de 4,6 bilhões de anos). 

Todos os planetas são feitos de material com origem num disco circunstelar. A teoria dominante para a formação de um planeta joviano é chamada de "acreção do núcleo", uma abordagem de baixo para cima onde os planetas incorporados no disco crescem a partir de pequenos objetos - com tamanhos que vão desde grãos de poeira a rochas - colidindo e aglutinando-se à medida que orbitam uma estrela.

Em contraste, a abordagem de instabilidade do disco é um modelo de cima para baixo onde, à medida que um disco massivo em torno de uma estrela arrefece, a gravidade faz com que o disco se desfaça rapidamente num ou mais fragmentos de massa planetária. O planeta recentemente formado, chamado AB Aurigae b, é provavelmente cerca de nove vezes mais massivo do que Júpiter e orbita a sua estrela hospedeira a uma distância incrível de quase 14 bilhões de quilômetros, ou seja, mais de duas vezes a distância que separa Plutão do Sol. A essa distância, levaria muito tempo para que um planeta do tamanho de Júpiter se formasse por acreção do núcleo.

Isto leva os pesquisadores a concluir que a instabilidade do disco permitiu que este planeta se formasse a uma distância tão grande. E está num contraste impressionante com as expectativas de formação planetária pelo modelo amplamente aceito de acreção do núcleo.

© Subaru (exoplaneta AB Aurigae b)

A nova análise combina dados de dois instrumentos do Hubble: o STIS (Space Telescope Imaging Spectrograph) e o NICMOS (Near Infrared Camera and Multi-Object Spectrograph). Estes dados foram comparados com os de um instrumento de última geração chamado SCExAO (Subaru Coronagraphic Extreme-AO) acoplado ao Telescópio Subaru de 8,2 metros do Japão, localizado no cume do Mauna Kea, Havaí. A riqueza dos dados dos telescópios espaciais e terrestres revelou-se crítica, porque é muito difícil distinguir entre planetas infantis e características complexas de disco não relacionadas com os planetas. A própria natureza também deu uma ajuda: o vasto disco de poeira e gás que gira em torno da estrela AB Aurigae está inclinado para quase de face, da perspetiva da Terra. 

No final, a gravidade é tudo o que conta, uma vez que os remanescentes do processo de formação estelar acabarão por ser puxados juntos pela atração gravitacional e para formar planetas. Compreender os primeiros dias da formação de planetas semelhantes a Júpiter proporciona aos astrônomos mais contexto na história do nosso próprio Sistema Solar. Esta descoberta abre caminhos para futuros estudos da composição química de discos protoplanetários como AB Aurigae, incluindo a exploração com o telescópio espacial James Webb da NASA.

Os resultados foram publicados na revista Nature Astronomy

Fonte: National Astronomical Observatory of Japan

quarta-feira, 6 de abril de 2022

Movimentos estelares revelam detalhes da Grande Nuvem de Magalhães

Usando dados do levantamento VMC (VISTA survey of the Magellanic Clouds system), os pesquisadores do Instituto Leibniz para Astrofísica em Potsdam, Alemanha, em colaboração com cientistas da equipe do VMC, confirmaram a existência de órbitas alongadas que constituem a espinha dorsal do processo de formação de uma barra.

© Hubble (NGC 1300)

A galáxia espiral barrada NGC 1300, considerada como prototípica das galáxias espirais barradas. As espirais barradas diferem das galáxias espirais normais na medida em que os braços da galáxia não entram em espiral até ao centro, mas estão ligados às duas extremidades de uma barra de estrelas que contém o núcleo no seu centro.

O método utilizou observações repetidas para construir um mapa de velocidade das estrelas na região central da GNM. A GNM é visível a olho nu do hemisfério sul e é a galáxia satélite mais brilhante e massiva da Via Láctea. A GNM é rica em estrelas que abrangem uma grande faixa etária, desde estrelas recém-formadas até estrelas tão antigas quanto o Universo. Está classificada como uma galáxia irregular porque é caracterizada por um único braço em espiral e uma barra que está deslocada do centro do disco.

As estruturas estelares de barra são uma característica comum das galáxias espirais. Pensa-se que se formem a partir de pequenas perturbações no interior do disco estelar que removem estrelas dos seus movimentos circulares e as forçam em órbitas alongadas. Um tipo específico destas órbitas são as que estão alinhadas com o eixo principal da barra. Estas são consideradas como a "espinha dorsal" das barras estelares e fornecem o principal suporte deste tipo de estrutura.

© AIP (órbitas de estrelas no centro da Grande Nuvem de Magalhães)

A imagem acima mostra órbitas observadas de estrelas dentro das partes centrais da Grande Nuvem de Magalhães (GNM). As estrelas na região central, ao longo da barra, seguem órbitas alongadas que se desviam de uma forma circular (contornos tracejados).

O telescópio VISTA foi desenvolvido para vigiar o céu do hemisfério sul em comprimentos de onda do infravermelho próximo e estudar fontes que emitem preferencialmente neste domínio espectral, devido à sua natureza ou à presença de poeira. Usando dados do levantamento VMC, a equipe encontrou agora as primeiras evidências diretas destas órbitas dentro da barra da GNM. 

O VMC é um projeto público do ESO, realizado entre 2010 e 2018, com o objetivo de estudar o conteúdo e a dinâmica estelar das nossas vizinhas extragaláticas mais próximas. A equipe desenvolveu um método sofisticado para determinar com precisão os movimentos próprios das estrelas dentro das Nuvens de Magalhães.

Num novo estudo, este método foi aplicado às partes centrais da GNM. A partir dos valores medidos, os astrônomos calcularam os movimentos estelares reais dentro do quadro da GNM, produzindo mapas detalhados da estrutura de velocidade da galáxia.

Para espanto dos pesquisadores, os seus mapas revelaram movimentos estelares alongados que seguem a estrutura e orientação da barra. Graças à sua proximidade de cerca de 163.000 anos-luz, foi possível observar estrelas individuais dentro das Nuvens de Magalhães utilizando telescópios terrestres como o VISTA. De grande interesse são as dinâmicas das estrelas, uma vez que contêm informações valiosas sobre a formação e evolução das galáxias. 

No entanto, durante muito tempo, as velocidades unidimensionais das estrelas têm sido a única fonte de informação dinâmica. Estas velocidades podem ser rapidamente medidas por desvios espectroscópicos de Doppler, que dependem do efeito da luz observada de uma estrela parecer mais azulada ou avermelhada, dependendo se se aproxima ou se afasta de nós.

A fim de obter as velocidades tridimensionais totais das estrelas, é necessário conhecer os movimentos próprios das estrelas, que são os movimentos bidimensionais das estrelas no plano do céu. Estes movimentos podem ser obtidos observando as mesmas estrelas várias vezes ao longo de um determinado período de tempo, normalmente vários anos. Os deslocamentos das estrelas são então determinados em relação a objetos de referência próximos (da perspetiva do céu). Estes objetos podem ser, por exemplo, galáxias muito distantes de fundo, que podem ser consideradas em repouso, dadas as suas grandes distâncias, ou estrelas com movimentos próprios já conhecidos. Uma vez que os movimentos observados das estrelas, vistos da Terra, são minúsculos, as medições precisas continuam a ser um desafio.

À distância das Nuvens de Magalhães, os movimentos observados das estrelas estão na ordem dos milissegundos de arco por ano; sendo que um milissegundo de arco é aproximadamente o tamanho de um astronauta na Lua, visto da Terra.

No total, foram precisos 9 anos de monitoramento para acumular imagens suficientes para se poder medir estes pequenos movimentos.

Um artigo foi publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Leibniz Institute for Astrophysics Potsdam

sábado, 2 de abril de 2022

Os gigantescos vulcões de gelo de Plutão

Os cientistas da missão New Horizons da NASA determinaram que múltiplos episódios de criovulcanismo podem ter criado alguns tipos de estruturas à superfície de Plutão, nunca vistas em nenhum outro lugar do Sistema Solar.

© NASA/JHUAPL/SwRI (região próxima à Sputnik Planitia em Plutão)

O material expulso de baixo da superfície deste distante planeta anão gelado poderia ter criado uma região de grandes cúpulas e elevações ladeadas por colinas, montes e depressões. 

A New Horizons foi a missão da NASA que fez a primeira exploração de Plutão e do seu sistema de cinco luas.

Em vez de erosão ou outros processos geológicos, a atividade criovulcânica parece ter extrudido grandes quantidades de material para o exterior de Plutão e ter ressurgido toda uma região do hemisfério que a New Horizons viu de perto.

A equipe de cientistas analisou a geomorfologia e composição de uma área localizada a sudoeste do brilhante e gelado "coração" de Plutão, Sputnik Planitia. A região criovulcânica contém várias grandes cúpulas, que vão de 1 a 7 quilômetros de altura e 30 a 100 ou mais quilômetros de largura, que por vezes se fundem para formar estruturas mais complexas. Colinas irregulares interligadas, montes e depressões cobrem os lados e os topos de muitas das estruturas maiores. Nesta área existem poucas ou nenhumas crateras, o que indica que é geologicamente jovem. As maiores estruturas da região rivalizam com o vulcão Mauna Loa no Havaí. 

Mesmo com a adição de amoníaco e outros componentes semelhantes a anticongelantes para baixar a temperatura de fusão da água gelada, um processo semelhante à forma como o sal inibe a formação de gelo nas ruas e estradas, as temperaturas extremamente baixas e as pressões atmosféricas em Plutão congelam rapidamente a água líquida à sua superfície. 

Uma vez que se trata de terrenos geológicos jovens e que foram necessárias grandes quantidades de material para os criar, é possível que a estrutura interior de Plutão tenha retido calor num passado relativamente recente, permitindo que materiais ricos em água fossem depositados à superfície. 

Os fluxos criovulcânicos capazes de criar as grandes estruturas poderiam ter ocorrido se o material tivesse uma consistência semelhante à da pasta de dentes, se se comportasse de certa forma como os glaciares sólidos de gelo na Terra ou se tivesse uma concha ou calota com material ainda capaz de fluir por baixo. 

De acordo com a equipe, outros processos geológicos, considerados capazes de criar as características, são improváveis. Por exemplo, a área tem variações significativas nos altos e baixos do terreno que não poderiam ter sido criados através da erosão. Não foram vistas evidências de erosão glaciar extensa ou de sublimação no terreno úmido que rodeia as maiores estruturas.

Imagens obtidas em 2015 pela sonda New Horizons revelaram diversas características geológicas que povoam Plutão, incluindo montanhas, vales, planícies e glaciares. Foram particularmente intrigantes porque esperava-se que as temperaturas geladas à distância de Plutão produzissem um mundo gelado e geologicamente inativo.

Este trabalho recentemente publicado é um verdadeiro marco, mostrando mais uma vez a personalidade geológica de Plutão, e como tem sido incrivelmente ativo durante longos períodos.

Um artigo foi publicado na revista Nature Communications.

Fonte: Southwest Research Institute

Hubble encontra a estrela mais distante

O telescópio espacial Hubble estabeleceu uma nova e extraordinária referência: a detecção da luz de uma estrela que existiu nos primeiros bilhões de anos após o nascimento do Universo no Big Bang, a estrela individual mais distante alguma vez vista até agora.

© STScI (estrela Earendel)

A descoberta é um enorme salto no tempo em relação à anterior detentora estelar do recorde; detectada pelo Hubble em 2018. Esta estrela existiu quando o Universo tinha cerca de 4 bilhões de anos, ou 30% da sua idade atual, num instante em que o "desvio para o vermelho" é de 1,5. 

O termo "desvio para o vermelho" está relacionado à expansão do Universo, pois a luz de objetos distantes é esticada ou "desviada" para comprimentos de onda mais longos e avermelhados à medida que viaja na nossa direção.

A estrela recentemente detectada está tão longe que a sua luz levou 12,9 bilhões de anos para chegar à Terra, situada num momento em que o Universo tinha apenas 7% da sua idade atual, e um desvio para o vermelho de 6,2.

Os objetos menores anteriormente vistos a uma distância tão grande são aglomerados de estrelas, embebidos dentro das primeiras galáxias. 

A descoberta foi feita a partir de dados recolhidos durante o programa RELICS (Reionization Lensing Cluster Survey), liderado por Dan Coe no STScI (Space Telescope Science Institute).

A galáxia que acolhe esta estrela, chamada Earendel, foi ampliada e distorcida por uma lente gravitacional num longo crescente de nominado Arco do Sol Nascente. 

A descoberta contém a promessa de abrir uma era desconhecida de formação estelar muito precoce. Earendel existiu há tanto tempo que não pode ter tido todas as mesmas matérias-primas que as estrelas que nos rodeiam hoje. 

A equipe estima que Earendel tem pelo menos 50 vezes a massa do nosso Sol e é milhões de vezes mais brilhante, rivalizando com as estrelas mais massivas conhecidas. Mas mesmo uma estrela tão brilhante e massiva seria impossível de ver a uma distância tão grande sem a ajuda da ampliação natural por um enorme aglomerado de galáxias, WHL0137-08, situado entre nós e Earendel. A massa do aglomerado de galáxias distorce o tecido do espaço, criando uma poderosa lupa natural que curva e amplia a luz de objetos distantes por trás dele. 

Graças ao raro alinhamento com o aglomerado de galáxias de ampliação, a estrela Earendel aparece diretamente sobre, ou extremamente perto, de uma ondulação no tecido do espaço. Esta ondulação, que é definida na óptica como "cáustica", proporciona uma ampliação e aumento de brilho máximo. O efeito é análogo à superfície ondulada de uma piscina, criando padrões de luz brilhante no fundo da piscina num dia de Sol. As ondulações à superfície atuam como lentes e focam a luz solar ao brilho máximo no fundo da piscina. Esta cáustica faz com que a estrela Earendel "salte à vista" do brilho geral da sua galáxia natal. O seu brilho é ampliado mil vezes ou mais. 

Neste ponto, os astrônomos não são capazes de determinar se Earendel é uma estrela binária, embora a maioria das estrelas massivas tenham pelo menos uma estrela companheira menor. 

Os astrônomos esperam que Earendel permaneça altamente ampliada nos próximos anos. Será observada pelo telescópio espacial James Webb da NASA. A alta sensibilidade do Webb à luz infravermelha é necessária para aprender mais sobre Earendel, porque a sua luz é esticada para comprimentos de onda infravermelhos mais longos devido à expansão do Universo.

Estes detalhes irão restringir o seu tipo e fase no ciclo de vida estelar. Também espera-se descobrir que a galáxia do Arco do Sol nascente carece de elementos pesados que se formam nas gerações seguintes de estrelas. Isto sugere que Earendel é uma rara e massiva estrela pobre em metal. A composição de Earendel será de grande interesse, pois formou-se antes do Universo ser preenchido com os elementos pesados produzidos por sucessivas gerações de estrelas massivas. Se estudos posteriores descobrirem que Earendel é apenas composta por hidrogênio e hélio primordiais, seria a primeira evidência para as lendárias estrelas de População III, que são teorizadas como sendo as primeiras estrelas nascidas após o Big Bang.

Será que o telescópio espacial James Webb irá bater o recorde de distância de Earendel? 

Um artigo sobre a descoberta foi publicado na revista Nature.

Fonte: Space Telescope Science Institute

sexta-feira, 1 de abril de 2022

A morte misteriosa de uma estrela de carbono

Cientistas que estudavam V Hydrae (V Hya) testemunharam o misterioso "leito de morte" da estrela em detalhes sem precedentes.


© NRAO (ilustração da estrela V Hydrae)

Usando o ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array) e dados do telescópio espacial Hubble, a equipe descobriu seis anéis em expansão lenta e duas estruturas em forma de ampulheta provocadas pela ejeção de matéria em alta velocidade para o espaço.

V Hya é uma estrela AGB (Asymptotic Giant Branch) rica em carbono localizada a aproximadamente 1.300 anos-luz da Terra na direção da constelação de Hidra. Mais de 90% das estrelas com uma massa igual ou superior à do Sol evoluem para estrelas AGB à medida que o combustível necessário para alimentar os processos nucleares é removido. 

Entre estes milhões de estrelas, V Hya tem sido de particular interesse para os cientistas devido aos seus comportamentos e características tão singulares, incluindo erupções de plasma a escalas extremas que ocorrem aproximadamente a cada 8,5 anos e a presença de uma estrela companheira quase invisível que contribui para o comportamento explosivo de V Hya.

"O nosso estudo confirma dramaticamente que o modelo tradicional de como as estrelas AGB morrem - através da ejeção em massa de combustível via um vento lento, relativamente estável e esférico ao longo de 100.000 anos ou mais - está, na melhor das hipóteses, incompleto, ou na pior, incorreto," disse Raghvendra Sahai, astrônomo no Jet Propulsion Laboratory (JPL) da NASA e pesquisador principal do estudo. 

No caso de V Hya, a combinação de uma estrela companheira próxima e de uma hipotética companheira distante é responsável, pelo menos em certa medida, pela presença dos seus anéis e pelos fluxos velozes que estão provocando a morte miraculosa da estrela. V Hydra foi apanhada no processo de libertação da sua atmosfera, com a maior parte da sua massa, o que é algo que a maioria das estrelas gigantes vermelhas em fase final fazem.

Os seis anéis expandiram-se para longe de V Hya ao longo de mais ou menos 2.100 anos, acrescentando matéria e impulsionando o crescimento de uma estrutura de alta densidade em forma de disco deformado à volta da estrela. 

Para além de um conjunto completo de anéis em expansão e de um disco deformado, o ato final de V Hya apresenta duas estruturas em forma de ampulheta, e uma estrutura adicional em forma de jato, que estão se expandindo com velocidades elevadas de mais de 240 km/s. Estas estruturas em forma de ampulheta já tinham sido observadas anteriormente em nebulosas planetárias, incluindo MyCn 18, também chamada de Nebulosa da Ampulheta, uma jovem nebulosa de emissão localizada a cerca de 8.000 anos-luz da Terra na direção da constelação do hemisfério sul da Mosca, e na mais conhecida Nebulosa Caranguejo do Sul, uma nebulosa de emissão localizada a aproximadamente 7.000 anos-luz da Terra na direção da constelação de Centauro.

Devido tanto à distância como à densidade da poeira que envolve a estrela, o estudo de V Hya exigiu um instrumento único com o poder de ver claramente a matéria que está ao mesmo tempo muito longe e é também difícil ou impossível de detectar com a maioria dos telescópios ópticos. A equipe alistou os receptores de Banda 6 (1,23 mm) e Banda 7 (0,85 mm) do ALMA, que revelaram os múltiplos anéis e os fluxos da estrela com grande clareza.

Os resultados do estudo foram publicados no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: National Radio Astronomy Observatory

quinta-feira, 31 de março de 2022

Estrela de nêutrons devora estrela comum e libera gases no espaço

Cientistas flagraram uma estrela de nêutrons, um objeto extremamente denso e com fortes campos magnéticos, devorando sua estrela companheira em um sistema binário.

© IAC (ilustração de uma estrela comum e uma estrela de nêutrons)

Com esforços coordenados de diversos telescópios, foi observado pela primeira vez a emissão de “ventos” de diferentes classes. O sistema binário em questão é classificado como um binário emissor de raios X de massa baixa (LMXB). Esta classe é composta por um objeto compacto – uma estrela de nêutrons ou um buraco negro – e uma estrela comum, orbitando um ao outro. Devido a sua grande proximidade, parte do material da estrela comum é atraído pelo objeto compacto, “devorando-o” em um processo conhecido como acreção. Porém, parte desse material é lançado ao espaço, formando um disco de acreção, emissões de jato verticais ou até “ventos”, projetados ao seu redor.

“Estrelas de nêutrons possuem um campo gravitacional incrivelmente forte, que as permite englobar o gás de outras estrelas. No entanto, essas canibais estelares desperdiçam  muito do gás, que são lançados no espaço em altas velocidades. Esse comportamento tem grande impacto tanto na própria estrela de nêutrons como nos seus entornos. 

Nesse estudo, foi relatado uma nova descoberta que provém informações essenciais sobre os padrões de alimentação desleixados desses monstros cósmicos. A descoberta se refere aos tipos de “ventos” detectados no estudo. O grupo observou um “evento de raios X transientes” neste LMXB, uma espécie de erupção na qual uma grande quantidade de gás foi arrancada de uma vez, liberando energia e radiação eletromagnética que pode ser observada da Terra para determinar as características da emissão.

O Swift J1858, nome dado a este evento, liberou ao mesmo tempo “ventos” amenos, observados no espectro ultravioleta, e “ventos” frios, analisados no espectro visível, uma combinação nunca antes observada para um sistema desse tipo. Apesar da maioria das emissões de gases de objetos astronômicos serem classificadas como “ventos” amenos, até agora só foram detectados eventos de raios X transientes com “ventos” frios ou quentes, nunca ambos ao mesmo tempo. 

Normalmente as erupções estão obscurecidas por pó interestelar, o que dificulta muito sua observação. O Swift J1858 foi especial, pois, mesmo localizado do outro lado da galáxia, o obscurecimento foi pequeno o suficiente para permitir um estudo em diversos comprimentos de onda. Apesar dos LMXB estarem sempre ativos, os eventos de raios X transientes têm curta duração. Somente um outro LMXB, nomeado V404 Cyg, demonstrou propriedades similares, mas os cientistas não tiveram tempo de mobilizar os telescópios espaciais e terrestres para observá-lo simultaneamente. 

Além de descobrir os novos tipos de emissões de gases, a equipe também estudou sua evolução ao longo do evento. Nessa análise, foi identificado que “ventos” amenos continuaram a ser emitidos, independentemente do brilho do sistema, uma descoberta que confirmou estudos teóricos anteriores. 

Esse estudo ajudará a entender as interações desses objetos em situações extremas, além de contribuir para pesquisas de evolução estelar. 

Um artigo foi publicado na revista Nature

Fonte: Scientific American

quarta-feira, 30 de março de 2022

Mapeado o movimento das anãs brancas na Via Láctea

As anãs brancas foram outrora estrelas normais semelhantes ao Sol, mas que colapsaram depois de esgotarem todo o seu combustível.

© STScI (ilustração de uma anã branca)

Estes remanescentes interestelares têm sido historicamente difíceis de estudar. No entanto, um estudo recente da Universidade de Lund, na Suécia, revela novas informações sobre os padrões de movimento destas estrelas intrigantes.

As anãs brancas têm um raio de cerca de 1% do raio do Sol. Têm aproximadamente a mesma massa, o que significa que têm uma densidade surpreendente de cerca de 1 tonelada por centímetro cúbico. Após milhares de milhões de anos, as anãs brancas arrefecem até um ponto em que deixam de emitir luz visível e transformam-se nas chamadas anãs negras. 

A primeira anã branca descoberta foi 40 Eridani A. É um corpo celeste brilhante a 16,2 anos-luz da Terra, rodeado por um sistema binário composto pela anã branca 40 Eridani B e pela anã vermelha 40 Eridani C. Desde que foi descoberta em 1783 que os astrônomos têm tentado aprender mais sobre as anãs brancas a fim de adquirirem uma compreensão mais profunda da história evolutiva da nossa Galáxia. 

Num estudo, pesquisadores apresentaram novas descobertas sobre a forma como as estrelas colapsadas se movem. "Graças às observações do telescópio espacial Gaia, conseguimos pela primeira vez revelar a distribuição tridimensional da velocidade para o maior catálogo de anãs brancas até à data. Isto dá-nos uma imagem detalhada da sua estrutura de velocidade com detalhes inigualáveis," diz Daniel Mikkola, estudante de doutoramento em astronomia na Universidade de Lund.

O Gaia propiciou aos astrônomos medirem posições e velocidades para cerca de 1,5 bilhões de estrelas. Mas só recentemente foram capazes de se concentrar completamente nas anãs brancas na vizinhança solar.

"Conseguimos mapear as velocidades das anãs brancas e os padrões de movimento. O Gaia revelou que existem duas sequências paralelas de anãs brancas ao olhar para a sua temperatura e brilho. Se as estudarmos separadamente, podemos ver que elas provavelmente se movem de modo diferente, provavelmente como consequência de terem massas e vidas diferentes," diz Mikkola. 

Os resultados podem ser utilizados para desenvolver novas simulações e modelos para continuar mapeando a história e desenvolvimento da Via Láctea. Através de um maior conhecimento das anãs brancas, os pesquisadores esperam ser capazes de esclarecer uma série de dúvidas em torno do nascimento da Via Láctea. 

"Este estudo é importante porque aprendemos mais sobre as regiões mais próximas na nossa Galáxia. Os resultados também são interessantes porque a nossa própria estrela, o Sol, irá um dia transformar-se numa anã branca como 97% de todas as estrelas na Via Láctea," conclui Mikkola.

O estudo publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Lund University

segunda-feira, 28 de março de 2022

Atingido o marco de 5.000 exoplanetas descobertos

Não há muito tempo, vivíamos num Universo com apenas um pequeno número de planetas conhecidos, todos eles em órbita do nosso Sol.

© NASA/JPL-Caltech (variedade de exoplanetas)

Mas uma nova fornada de descobertas assinala um marco científico: foram agora confirmados, no total, mais de 5.000 planetas localizados para lá do nosso Sistema Solar. O odômetro planetário rodou a 21 de março, com o lote mais recente de 65 exoplanetas adicionado ao Arquivo de Exoplanetas da NASA.

O arquivo registra as descobertas de exoplanetas que aparecem em artigos científicos revistos por pares e que foram confirmados utilizando múltiplos métodos de detecção ou por técnicas analíticas. Os mais de 5.000 planetas encontrados até agora incluem mundos pequenos e rochosos como a Terra, gigantes de gás muitas vezes maiores que Júpiter e "Júpiteres quentes" em órbitas abrasadoramente íntimas em torno das suas estrelas. Existem "super-Terras", que são mundos rochosos maiores do que o nosso, e "mini-Netunos", versões menores do que Netuno do nosso Sistema Solar.

Acrescente-se à mistura planetas que orbitam duas estrelas ao mesmo tempo e planetas que teimam em orbitar os remanescentes estelares de estrelas moribundas. A Via Láctea contém provavelmente centenas de bilhões de exoplanetas. 

A batida constante da descoberta começou em 1992 com estranhos novos mundos em órbita de uma estrela ainda mais estranha. Era um tipo de estrela de nêutrons conhecida como pulsar, um cadáver estelar com rotação rápida que pulsa com rajadas de radiação de milissegundos. A medição de ligeiras alterações no tempo dos pulsos permitiu aos cientistas revelar planetas em órbita em torno do pulsar. A descoberta de apenas três planetas em torno desta estrela giratória abriu essencialmente as comportas.

O TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite), lançado em 2018, continua fazendo novas descobertas exoplanetárias. Mas em breve os poderosos telescópios de próxima geração e os seus instrumentos altamente sensíveis, começando pelo recentemente lançado telescópio espacial James Webb, irão captar luz das atmosferas dos exoplanetas, identificando quais os gases presentes para potencialmente identificar sinais indicadores de condições habitáveis.

O telescópio espacial Nancy Grace Roman, cujo lançamento está previsto para 2027, fará novas descobertas de exoplanetas utilizando uma variedade de métodos. A missão ARIEL (Atmospheric Remote-sensing Infrared Exoplanet Large-survey) da ESA, com lançamento previsto para 2029, irá observar as atmosferas de exoplanetas.

A estreita ligação entre a química da vida na Terra e a química encontrada por todo o Universo, bem como a detecção de moléculas orgânicas disseminadas, sugere que a detecção da própria vida é apenas uma questão de tempo. 

Este quadro nem sempre pareceu tão promissor. O primeiro planeta detectado em torno de uma estrela parecida com o Sol, em 1995, revelou-se um Júpiter quente: um gigante gasoso com cerca de metade da massa do planeta Júpiter numa órbita extremamente íntima, de quatro dias, em torno da sua estrela. 

Alguns exoplanetas foram encontrados utilizando o método de "oscilação": o rastreamento de movimentos ligeiros de uma estrela, provocados pela atração gravitacional de planetas em órbita. Mas mesmo assim, nada parecia ser habitável. A descoberta de mundos pequenos e rochosos como o nosso exigiu o próximo grande salto na tecnologia de caça exoplanetária: o método de "trânsito".

O astrônomo William Borucki, pesquisador principal da missão Kepler, missão lançada em 2009 e está agora aposentada, teve a ideia de fixar detectores de luz extremamente sensíveis a um telescópio, lançando-o depois para o espaço. O telescópio olharia durante anos para um campo com mais de 170.000 estrelas, à procura de pequenas quedas no brilho das estrelas quando um planeta passava em frente, do ponto de vista do Sistema Solar.

Fonte: Jet Propulsion Laboratory

quarta-feira, 23 de março de 2022

Nuvem gigante de detritos criada por choque entre corpos celestes

A maioria dos planetas rochosos e satélites do nosso Sistema Solar, incluindo a Terra e a Lua, foram formados ou moldados por colisões massivas no início da história do Sistema Solar.

© NASA/JPL-Caltech (ilustração de nuvem de detritos bloqueando uma estrela)

Ao chocarem uns com os outros, os corpos rochosos podem acumular mais material, aumentando de tamanho, ou podem desfazer-se em múltiplos corpos menores.

Os astrônomos, usando o agora aposentado telescópio espacial Spitzer da NASA, encontraram no passado evidências destes tipos de colisões em torno de estrelas jovens, onde planetas rochosos estão sendo formados. Mas estas observações não forneceram muitos detalhes sobre as colisões, tais como o tamanho dos objetos envolvidos.

Num novo estudo, um grupo de astrônomos da Universidade do Arizona relatou as primeiras observações de uma nuvem de detritos de uma destas colisões ao passar em frente da sua estrela e ao bloquear brevemente a luz. Juntamente com o conhecimento sobre o tamanho e brilho da estrela, as observações permitiram a determinação do tamanho da nuvem pouco depois do impacto, a estimativa do tamanho dos objetos que colidiram e a velocidade com que a nuvem se dispersou.

A partir de 2015, a equipa começou a fazer observações de rotina de uma estrela com 10 milhões de anos chamada HD 166191. Por volta desta fase inicial da vida de uma estrela, a poeira que sobra da sua formação junta-se para formar corpos rochosos chamados planetesimais. Assim que o gás que anteriormente preenchia o espaço entre estes objetos se dispersa, colisões catastróficas entre eles tornam-se comuns. 

Antevendo que poderiam ver evidências de uma destas colisões em torno de HD 166191, a equipe utilizou o Spitzer para realizar mais de 100 observações do sistema entre 2015 e 2019. Embora os planetesimais sejam demasiado pequenos e distantes para serem resolvidos por telescópio, as suas colisões produzem grandes quantidades de poeira.

O Spitzer detectou luz infravermelha, ou seja, comprimentos de onda ligeiramente superiores ao que os olhos humanos podem ver. O infravermelho é ideal para detectar poeira, incluindo os detritos criados por colisões entre protoplanetas. Em meados de 2018, o telescópio espacial viu o sistema HD 166191 tornar-se significativamente mais brilhante, sugerindo um aumento na produção de detritos. Durante este tempo, o Spitzer também detectou uma nuvem de detritos bloqueando a estrela. Combinando a observação do trânsito pelo Spitzer com as observações por telescópios no solo, a equipe pôde deduzir o tamanho e a forma da nuvem de detritos. 

O seu trabalho sugere que a nuvem era altamente alongada, com uma área mínima estimada três vezes maior do que a estrela. No entanto, a quantidade de aumento de brilho infravermelho que o Spitzer viu sugere que apenas uma pequena parte da nuvem passou em frente da estrela e que os detritos deste evento cobriram uma área centenas de vezes maior do que a da estrela.

Para produzir uma nuvem tão grande, os objetos na colisão principal devem ter sido do tamanho de planetas anões, como Vesta no nosso Sistema Solar, um objeto com 530 km de diâmetro localizado no cinturão principal de asteroides entre Marte e Júpiter.

O choque inicial gerou energia e calor suficientes para vaporizar parte do material. Também desencadeou uma reação em cadeia de impactos entre fragmentos da primeira colisão e outros pequenos corpos no sistema, o que provavelmente criou uma quantidade significativa de poeira que o Spitzer observou. Nos meses seguintes, a grande nuvem de poeira cresceu em tamanho e tornou-se mais translúcida, indicando que a poeira e outros detritos estavam rapidamente se dispersando pelo jovem sistema estelar.

Em 2019, a nuvem que passava em frente da estrela já não era visível, mas o sistema continha o dobro da poeira que tinha antes do Spitzer ter avistado a nuvem. Esta informação pode ajudar os cientistas a testar teorias sobre como os planetas terrestres se formam e crescem.

Olhando para discos poeirentos de detritos em torno de estrelas jovens, é possível essencialmente olhar para trás no tempo e ver os processos que podem ter moldado o nosso próprio Sistema Solar. Aprendendo sobre o resultado das colisões nestes sistemas, podemos também ter uma melhor ideia da frequência com que os planetas rochosos se formam em torno de outras estrelas.

O novo estudo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: Jet Propulsion Laboratory