sábado, 14 de outubro de 2023

Eclipse Anular do Sol

Hoje, o Brasil e as Américas serão brindados com um espetáculo celestial de tirar o fôlego: o Eclipse Anular do Sol.


© René Saade (eclipse anular do Sol)

Este fenômeno astronômico ocorre quando a Lua se alinha entre a Terra e o Sol, e o seu diâmetro aparente está menor do que o Sol. Assim, a sombra da Lua não cobre totalmente o Sol criando um "anel de fogo" no céu. 

O Brasil será um dos privilegiados a testemunhar esse evento, com destaque para as regiões Norte e Nordeste. Tanto no eclipse total quanto no anular a lua se alinha entre a Terra e o sol, bloqueando toda ou a maior parte da luz do sol em uma parte da superfície da Terra. A sombra mais escura, onde toda a luz solar é bloqueada, é chamada umbra. Em torno da umbra se define a sombra mais clara, a penumbra, onde a luz solar é parcialmente bloqueada e o eclipse é visto como parcial. Esse tipo de eclipse ocorre quando a Lua está em seu apogeu, o ponto mais distante de sua órbita da Terra, fazendo com que pareça menor do que o Sol no céu. 

A frequência com que os eclipses anulares do Sol ocorrem não é constante. O último eclipse anular do Sol ocorreu em junho de 2021, mas não foi visível do Brasil. O próximo eclipse deste tipo, após o de 14 de outubro, ocorrerá em 02 de outubro de 2024, será um eclipse parcial no Brasil e será visível apenas no centro-sul do país. Outro eclipse solar vai acontecer em 6 de fevereiro de 2027 e será visível de forma parcial em quase todo Brasil, com exceção da região norte, onde não será possível observá-lo.

Ressalta-se que em hipótese alguma se deve olhar diretamente para o Sol, nem mesmo com o uso de películas de raio X, óculos escuros ou outro material caseiro. A exposição, mesmo de poucos segundos, danifica a retina de modo irreversível. Existem duas formas de se observar o eclipse com segurança: direta ou indiretamente. A observação direta é aquela realizada com o uso de um instrumento especialmente adaptado para esse fim. Assim, o ideal é que se use filtros para a observação. Entretanto, também é importante o uso de filtros adequados e a observação não deve se estender por mais do que alguns segundos. A observação indireta é aquela feita através de uma projeção, sem o auxílio de qualquer instrumento óptico. Pode-se simplesmente usar um pedaço de papelão, como, por exemplo, uma tampa de caixa de pizza, e fazer um furo no meio. Coloca-se um papel branco no chão e direciona-se o furo para a direção do Sol. O eclipse é visto tranquilamente no papel no chão. 

O caminho de anularidade, ou seja, é a faixa da Terra de cerca de 200 km de largura onde o eclipse é visto como anular. Em localidades fora dessa faixa o eclipse será visto como parcial, sendo que quanto mais nos afastamos da faixa de anularidade menor será a porção do Sol coberta pela Lua. A faixa de anularidade passará pelos estados Amazonas, Pará, Maranhão, Piauí, Ceará, Tocantins, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte. As capitais estaduais Natal (Rio Grande do Norte) e João Pessoa (Paraíba) são as únicas que estão no caminho da anularidade. O eclipse nos demais locais do território nacional será visto como parcial. 

A anularidade, onde o Sol forma um “anel de fogo” ao redor da Lua, será visível nos Estados Unidos, México, Belize, Guatemala, Honduras, Nicarágua, Costa Rica, Panamá, Colômbia e Brasil. Em outras partes das Américas, do Alasca à Argentina, um eclipse parcial será visível. O eclipse começará na parte da manhã do dia 14 de outubro e será primeiro observado na costa oeste dos Estados Unidos, no amanhecer, ou seja, o Sol estará ainda abaixo do horizonte. Com o passar das horas, o eclipse começa a ser visto nos outros países do continente americano, já mais alto no horizonte. 

O eclipse será visto por último no Brasil, já com o Sol a caminho do ocaso. Quanto mais a leste, mais o Sol estará próximo do horizonte oeste nos minutos da anularidade. o eclipse será visível em São Paulo, mas apenas de forma parcial. Cerca de 40% do Sol será coberto no ponto máximo do fenômeno. Em São Paulo, o fenômeno deve começar a ser visível às 15h40, será o momento do primeiro contato, quando a borda do Sol parece tocar a borda da Lua, e o fim será às 17h50. O ponto máximo do eclipse será visível às 16h49. Entretanto, o ponto máximo, quando o “anel de fogo” formado pelo Sol atrás da Lua será visível, terá apenas cerca de 5 minutos. No resto do Estado, se houver diferença em horários, deve ser de apenas alguns segundos. 

O Observatório Nacional, unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (ON/MCTI), que completa 196 anos de história em 2023, está coordenando uma ação integrada nacional e internacional para observar e transmitir o Eclipse Anular do Sol. Nessa ação, os parceiros internacionais cederão as imagens do eclipse quando estiver ocorrendo na parte oeste dos EUA, parte da América Central e Colômbia. Quando a sombra da Lua atingir o Brasil será a vez dos astrônomos brasileiros cederem suas imagens para os parceiros internacionais Time and Date e NASA que tradicionalmente fazem a transmissão para o mundo. 

Esta ação é da maior importância para a Astronomia brasileira, que pela primeira vez está participando dessa integração. Para isso, os astrônomos brasileiros estarão distribuídos em diversos locais da faixa de anularidade captando imagens do eclipse quando estiver acontecendo naquele local. Para o público, esta ação transformará um evento de 4 minutos de duração em um grande evento de 6h de duração. A transmissão pelo canal do YouTube do ON terá início às 11h30 da manhã (Hora Legal de Brasília) quando o eclipse anular estará começando na costa oeste dos EUA, e vai acompanhar todo o percurso da anularidade até que chegue ao seu final na costa leste do Brasil em torno das 17h30 (Hora Legal de Brasília). Essa transmissão ao vivo poderá também ser utilizada por quem estiver promovendo eventos de observação pública em todo o país, seja do eclipse parcial, seja do eclipse anular. Dessa forma, mesmo que as condições climáticas no local sejam desfavoráveis ou que não haja óculos para todas as pessoas, será possível observar o eclipse em sua plenitude. 

Outras opções para acompanhar o eclipse são os canais: YouTube TimeandDate e YouTube da NASA.

Fonte: Observatório Nacional

Uma galáxia espiral com supernova

O que está acontecendo no braço desta galáxia espiral?

© Bernard Miller (NGC 1097 e SN 2023rve)

Uma supernova. No mês passado, a supernova SN 2023rve foi descoberta pelo Observatório Al-Khatim dos Emirados Árabes Unidos e mais tarde considerada consistente com a explosão mortal de uma estrela massiva, possivelmente deixando para trás um buraco negro. 

A galáxia espiral NGC 1097 está relativamente próxima a 45 milhões de anos-luz de distância e é visível com um pequeno telescópio em direção à constelação sul da Fornalha (Fornax).

A galáxia é notável não só pelos seus pitorescos braços espirais, mas também pelos tênues jatos consistentes com antigos fluxos estelares que sobraram de uma colisão galáctica, possivelmente com a pequena galáxia vista entre os seus braços, no canto inferior esquerdo. 

A imagem apresentada destaca a nova supernova piscando entre duas exposições tiradas com vários meses de intervalo. Encontrar supernovas em galáxias próximas pode ser importante para determinar a escala e a taxa de expansão de todo o Universo, um tema atualmente com tensão inesperada e de muito debate. 

Fonte: NASA

Nuvem de poeira da colisão entre dois planetas gelados

Pela primeira vez, astrônomos viram o brilho térmico de dois planetas gigantes gelados colidindo.

© Mark Garlick (ilustração da colisão de dois planetas gigantes)

Também puderam observar a nuvem de poeira resultante se movendo em frente da estrela progenitora vários anos mais tarde. Liderados pelo astrônomo Matthew Kenworthy, do Observatório de Leiden, os pesquisadores monitoraram as variações de brilho da estrela durante dois anos após esta ter começado a escurecer no visível. 

Foi descoberto, por coincidência, que a estrela tinha duplicado o seu brilho em comprimentos de onda infravermelhos três anos antes. A estrela chama-se ASASSN-21qj. O seu nome vem da rede de telescópios que descobriu pela primeira vez o desvanecimento da estrela em comprimentos de onda visíveis. A estrela foi estudada intensivamente por uma rede de astrônomos amadores e profissionais, que observaram as mudanças de brilho. 

Uma publicação casual de um pesquisador amador numa rede social levou à descoberta de que o sistema duplicou o seu brilho em comprimentos de onda infravermelhos cerca de três anos antes da estrela começar a desvanecer-se no visível. A missão norte-americana NEOWISE já tinha observado este fato. 

A explicação mais provável é que dois exoplanetas gigantes de gelo colidiram um com o outro, produzindo o brilho infravermelho captado pela missão NEOWISE, e que a nuvem de detritos em expansão daí resultante se deslocou para a frente da estrela cerca de três anos mais tarde, fazendo com que o brilho da estrela diminuísse nos comprimentos de onda visíveis. A temperatura e o tamanho do material incandescente e a quantidade de tempo que o brilho durou é consistente com a colisão de dois exoplanetas gigantes de gelo, como inferido nos cálculos e modelos de computador. 

Normalmente, os planetas gigantes escondem os seus elementos pesados sob espessas camadas de hidrogênio e hélio. No entanto, nesta colisão, o material do interior foi ejetado ou arrastado para as regiões exteriores do corpo criado pela fusão dos dois planetas. Neste processo foi liberado muito vapor de água que ajudou a arrefecer o corpo pós-impacto até 1000 K. 

Ao longo dos próximos anos, a nuvem de poeira começará se espalhar ao longo da órbita do remanescente da colisão, e uma dispersão de luz desta nuvem pode ser detectada tanto com telescópios terrestres como com o telescópio espacial James Webb. Em última análise, a nuvem de material em torno do remanescente pode condensar-se para formar um cortejo de luas que vão orbitar em torno deste novo planeta.

Um artigo foi publicado na revista Nature

Fonte: Universiteit Leiden

sexta-feira, 13 de outubro de 2023

Novo lançamento de dados do Gaia revela lentes gravitacionais raras

A missão Gaia da ESA divulgou uma mina de ouro de conhecimentos sobre a nossa Galáxia.

© ESA / Gaia (mapa com 10.000 estrelas variáveis)

Cada símbolo neste mapa do céu indica a posição de estrelas no catálogo Gaia. A cor vermelha indica variáveis de longo período, cuja varibilidade é conduzida pelo pulso estelar. Os pontos verdes são estrelas de longo período secundário, cuja causa da variabilidade ainda é assunto de debate, mas que se pensa estar ligada a uma nuvem de poeira em órbita da estrela. Os símbolos azuis são variáveis elipsoidais: gigantes vermelhas que fazem parte de um sistema binário com um objeto compacto denso, cuja forma é distorcida numa forma de ovo devido à forte atração gravitacional da companheira. 

Entre outras descobertas, o observador estelar Gaia ultrapassa o potencial planejado para revelar meio milhão de estrelas novas e tênues num aglomerado massivo, para identificar mais de 380 possíveis lentes cósmicas e para identificar as posições de mais de 150.000 asteroides no Sistema Solar, melhorando a precisão de suas órbitas e 

O Gaia está mapeando a Via Láctea e mais além com um extraordinário detalhe multidimensional, completando o censo estelar mais preciso de sempre. A missão está pintando um quadro detalhado do nosso lugar no Universo, permitindo-nos compreender melhor os diversos objetos que o compõem. 

A mais recente divulgação (FPR, ou "Focused Product Release") da missão vai ainda mais longe, fornecendo muitas informações novas e melhoradas sobre o espaço que nos rodeia. O lançamento traz uma ciência excitante e inesperada: descobertas que vão muito para além do que o Gaia foi inicialmente concebido para descobrir e para aprofundar a nossa história cósmica. O terceiro lançamento de dados do Gaia (DR3) continha dados sobre mais de 1,8 bilhões de estrelas, construindo uma visão bastante completa da Via Láctea e mais além. No entanto, ainda havia lacunas no mapeamento. O Gaia ainda não tinha explorado completamente áreas do céu densamente povoadas de estrelas, deixando-as comparativamente inexploradas. 

Os aglomerados globulares são um exemplo chave desta situação. Estes aglomerados são alguns dos objetos mais antigos do Universo, o que os torna especialmente valiosos para os cientistas que estudam o nosso passado cósmico. Infelizmente, os seus núcleos brilhantes, repletos de estrelas, podem sobrecarregar os telescópios que tentam obter uma visão clara. O Gaia selecionou Omega Centauri, o maior aglomerado globular que pode ser visto da Terra. Em vez de se concentrar apenas em estrelas individuais, como faria normalmente, o Gaia ativou um modo especial para mapear verdadeiramente uma área mais vasta do céu em torno do núcleo do aglomerado, sempre que este fosse visto. Foram descobertas mais de meio milhão de novas estrelas que o Gaia não tinha visto antes, em apenas um aglomerado!

As novas estrelas reveladas em Omega Centauri marcam uma das regiões mais populosas exploradas pelo Gaia até agora. O Gaia está atualmente explorando mais oito regiões desta forma, cujos resultados serão incluídos no catálogo DR4 (Data Release 4). Estes dados ajudarão os astrônomos a compreender verdadeiramente o que se passa no interior destes blocos de construção cósmica, um passo crucial para os cientistas que pretendem confirmar a idade da nossa Galáxia, localizar o seu centro, descobrir se passou por colisões no passado, verificar como as estrelas mudam ao longo da sua vida, restringir os modelos de evolução galáctica e, em última análise, inferir a possível idade do próprio Universo. 

Embora o Gaia não tenha sido concebido para a cosmologia, as suas novas descobertas perscrutam o Universo distante, à procura de objetos esquivos e excitantes que contêm pistas para algumas das maiores questões da humanidade sobre o cosmos: as lentes gravitacionais. Uma lente gravitacional ocorre quando a imagem de um objeto distante é distorcida por uma massa perturbadora situada entre nós e este objeto. Esta massa intermediária atua como uma lente gigante que pode amplificar o brilho da luz e criar múltiplas imagens da fonte distante no céu. Estas configurações curiosas e raras são visualmente intrigantes e têm um imenso valor científico, revelando pistas únicas sobre os primeiros tempos e habitantes do Universo. 

Agora são apresentados 381 candidatos sólidos a quasares com lentes, incluindo 50 que considera-se altamente prováveis: uma mina de ouro para os cosmólogos e o maior conjunto de candidatos alguma vez lançado de uma só vez. Cinco das possíveis lentes são potenciais cruzes de Einstein, sistemas de lentes raras com quatro componentes de imagem diferentes em forma de cruz. O novo conjunto de dados mapeia o disco da Via Láctea traçando sinais fracos vistos na luz das estrelas e caracteriza a dinâmica de 10.000 estrelas gigantes vermelhas pulsantes e binárias. 

No futuro, o DR4 do Gaia completará o conjunto e incluirá cometas, satélites planetários e o dobro do número de asteroides, melhorando o nosso conhecimento dos pequenos corpos no espaço próximo. O próximo lançamento de dados da missão, o DR4 do Gaia, não é esperado antes do final de 2025. 

Fonte: ESA

Estrela supergigante Mu Cephei

Mu Cephei é uma estrela muito grande.

© David Cruz (Mu Cephei)

Mu Cephei é uma supergigante de classe M com cerca de 1.500 vezes o tamanho do Sol, é uma das maiores estrelas visíveis a olho nu e até mesmo uma das maiores de toda a Galáxia. Se substituísse o Sol em nosso Sistema Solar, Mu Cephei englobaria facilmente Marte e até Júpiter. Ela não é a maior supergigante conhecida; é a estrela UY Scuti, hipergigante que tem raio quase 1.700 vezes maior que o do Sol. 

Historicamente conhecida como Estrela Granada (Grená) de Herschel, Mu Cephei é extremamente vermelha. A aproximadamente 2.800 anos-luz de distância, a supergigante é vista perto da borda da nebulosa de emissão avermelhada IC 1396 em direção à constelação Cepheus, nesta imagem telescópica. 

Muito mais fria e, portanto, mais vermelha que o Sol, a luz desta supergigante é ainda mais avermelhada pela absorção e dispersão devido à poeira interveniente na Via Láctea. Uma estrela variável bem estudada e considerada numa fase tardia da evolução estelar, Mu Cephei é também uma estrela massiva, destinada a explodir como uma supernova com colapso do núcleo. 

Fonte: NASA

quinta-feira, 12 de outubro de 2023

Encontrada uma explosão bizarra num local inesperado

Uma explosão muito rara e estranha de luz extraordinariamente brilhante no Universo acaba de se tornar ainda mais estranha, graças à visão aguçada do telescópio espacial Hubble.

© NOIRLab (explosão luminosa transiente)

O fenômeno, denominado LFBOT (Luminous Fast Blue Optical Transient), surgiu onde não se esperava que surgisse, muito longe de qualquer galáxia hospedeira. Só o Hubble conseguiu localizar o fenômeno. 

Os astrônomos não sabem o que são os LFBOTs. Os resultados do Hubble sugerem que sabem ainda menos, ao excluir algumas teorias possíveis. Os LFBOTs estão entre os eventos mais brilhantes de luz visível conhecidos no Universo, surgindo inesperadamente como os flashes de uma câmara. 

Desde a primeira descoberta em 2018, apenas foram encontrados alguns, um evento localizado a cerca de 200 milhões de anos-luz de distância que foi apelidado de "A Vaca". Atualmente, os LFBOTs são detectados uma vez por ano.

Após a sua detecção inicial, o último LFBOT foi observado por vários telescópios em todo o espetro eletromagnético, desde os raios X às ondas de rádio. Designado AT2023fhn e apelidado de "o Finch", o evento transitório mostrou todas as características de um LFBOT. Brilhava intensamente em luz azul e evoluía rapidamente, atingindo o pico de brilho e desvanecendo-se numa questão de dias, ao contrário das supernovas, que demoram semanas ou meses a desvanecer. 

Mas, ao contrário de qualquer outro LFBOT visto anteriormente, o Hubble descobriu que o Finch está localizado entre duas galáxias vizinhas, a cerca de 50.000 anos-luz de uma galáxia espiral próxima e a cerca de 15.000 anos-luz de uma galáxia menor. 

Embora se tenha assumido que estas explosões espantosas são um tipo raro de supernova chamado supernovas de colapso do núcleo, as estrelas gigantescas que se transformam em supernovas têm uma vida curta para os padrões estelares. Por conseguinte, as estrelas progenitoras massivas não têm tempo de viajar muito longe do seu local de nascimento - um aglomerado de estrelas recém-nascidas - antes de explodirem. Todos os anteriores LFBOTs foram encontrados nos braços espirais de galáxias onde o nascimento de estrelas está decorrendo, mas o Finch não se encontra em nenhuma galáxia.

A ZTF (Zwicky Transient Facility), uma câmara terrestre de angular extremamente grande que varre todo o céu do norte de dois em dois dias, alertou pela primeira vez os astrônomos para o Finch no dia 10 de abril de 2023. Assim que foi avistado, os pesquisadores desencadearam um programa de observações que tinha estado em suspensão, pronto para rapidamente voltar a sua atenção para qualquer potencial candidato a LFBOT que surgisse.

Medições espectroscópicas efetuadas com o telescópio Gemini South, no Chile, revelaram que o Finch tem uma temperatura escaldante de 20.000º C. O Gemini também ajudou a determinar a sua distância da Terra para que a sua luminosidade pudesse ser calculada. Juntamente com dados de outros observatórios, incluindo o observatório de raios X Chandra da NASA e os radiotelescópios do VLA (Very Large Array), estas descobertas confirmaram que a explosão era um LFBOT. Os LFBOTs podem ser o resultado de estrelas sendo despedaçadas por um buraco negro de massa intermediária (entre 100 e 1.000 massas solares).

A alta resolução e a sensibilidade infravermelha do telescópio espacial James Webb  poderão eventualmente ser usadas para descobrir que o Finch explodiu no interior de um aglomerado globular no halo exterior de uma das duas galáxias vizinhas. Um aglomerado globular é o local mais provável onde um buraco negro de massa intermediária pode ser encontrado. 

Para explicar a localização incomum do Finch, os pesquisadores estão considerando a possibilidade de a explosão ser o resultado de uma colisão de duas estrelas de nêutrons, viajando para longe da sua galáxia hospedeira, que têm estado espiralando uma em direção à outra durante bilhões de anos. Tais colisões produzem uma quilonova, uma explosão 1.000 vezes mais poderosa do que uma nova normal. 

No entanto, uma teoria muito especulativa é a de que se uma das estrelas de nêutrons for altamente magnetizada, ou seja, um magnetar, poderá amplificar ainda mais o poder da explosão, para 100 vezes o brilho de uma supernova normal.

Uma vez que os eventos astronômicos transientes podem surgir em qualquer lugar e a qualquer momento, e são relativamente fugazes, os pesquisadores dependem de levantamentos de campo largo que podem monitorar continuamente grandes áreas do céu para os detectar e alertar outros observatórios como o Hubble para fazer observações de acompanhamento. 

Contudo, é necessária uma amostra maior para se chegar a uma melhor compreensão do fenômeno. Os próximos telescópios de observação de todo o céu, como o observatório Vera C. Rubin, poderão ser capazes de detectar mais, dependendo da astrofísica subjacente.

A descoberta será publicada numa próxima edição do periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Space Telescope Science Institute

domingo, 8 de outubro de 2023

Explosões de formação estelar explicam o brilho do alvorecer cósmico

Quando os cientistas viram as imagens das primeiras galáxias do Universo, pelo telescópio espacial James Webb (JWST), ficaram extasiados.

© A. Geller (ilustração das primeiras galáxias com formação estelar explosiva)

As jovens galáxias pareciam demasiado brilhantes, demasiado massivas e demasiado maduras para se terem formado tão pouco tempo depois do Big Bang. 

A descoberta surpreendente levou mesmo alguns físicos a questionar o modelo padrão da cosmologia, perguntando-se se este deveria ou não ser alterado. Usando novas simulações, uma equipe de astrofísicos liderada pela Universidade Northwestern descobriu agora que estas galáxias provavelmente não são assim tão massivas.

Embora o brilho de uma galáxia seja tipicamente determinado pela sua massa, as novas descobertas sugerem que as galáxias menos massivas podem brilhar com a mesma intensidade devido a surtos irregulares e brilhantes de formação estelar. Esta descoberta não só explica porque é que as galáxias jovens parecem enganadoramente massivas, como também se enquadra no modelo padrão da cosmologia.

Normalmente, uma galáxia é brilhante porque é grande. Mas como estas galáxias se formaram no alvorecer cósmico, ainda não havia passado tempo suficiente desde o Big Bang. Como é que estas galáxias massivas se puderam formar tão rapidamente? As simulações mostram que as galáxias não têm qualquer problema em formar-se com este brilho no alvorecer cósmico. 

Um período que durou cerca de 100 milhões de anos a 1 bilhão de anos após o Big Bang, o alvorecer cósmico é marcado pela formação das primeiras estrelas e galáxias do Universo. Antes do lançamento do JWST para o espaço, os astrônomos sabiam muito pouco sobre este antigo período de tempo.

As simulações produziram galáxias do alvorecer cósmico que eram tão brilhantes como as observadas pelo JWST. As simulações fazem parte do projeto FIRE (Feedback of Relativistic Environments). As simulações FIRE combinam teoria astrofísica e algoritmos avançados para modelar a formação de galáxias. Os modelos permitem aos pesquisadores explorar o modo como as galáxias se formam, crescem e mudam de forma, considerando a energia, a massa, o momento e os elementos químicos das estrelas. 

Quando os astrônomos executaram as simulações para modelar as primeiras galáxias formadas no alvorecer cósmico, descobriram que as estrelas se formavam em surtos, um conceito conhecido como "formação estelar explosiva". Em galáxias massivas como a Via Láctea, as estrelas formam-se a um ritmo constante, com o número de estrelas aumentando gradualmente ao longo do tempo. Mas a chamada formação estelar explosiva ocorre quando as estrelas se formam num padrão alternado, muitas estrelas de uma vez, seguidas de milhões de anos de muito poucas estrelas novas e depois muitas estrelas novamente.

A formação estelar explosiva é especialmente comum em galáxias de baixa massa. Os pormenores que explicam porque é que isto acontece são ainda objeto de pesquisa. Mas o que acontece é que se forma um surto de estrelas e, alguns milhões de anos mais tarde, estas estrelas explodem como supernovas. O gás é expulso e volta a cair para formar novas estrelas, impulsionando o ciclo de formação de estrelas. Mas quando as galáxias se tornam suficientemente massivas, têm uma gravidade muito mais forte. Quando as supernovas explodem, não são suficientemente fortes para ejetar o gás do sistema. A gravidade mantém a galáxia unida e leva-a para um estado estável. 

As simulações também foram capazes de produzir a mesma abundância de galáxias brilhantes que o JWST revelou, ou seja, o número de galáxias brilhantes previsto pelas simulações corresponde ao número de galáxias brilhantes observadas. Embora outros astrofísicos tenham levantado a hipótese de a formação estelar explosiva poder ser responsável pelo brilho incomum das galáxias no alvorecer cósmico, os pesquisadores da Northwestern são os primeiros a usar simulações computacionais detalhadas para provar que isso é possível. E conseguiram fazê-lo sem acrescentar novos fatores que não estão alinhados com o nosso modelo padrão do Universo.

A maior parte da luz de uma galáxia provém das estrelas mais massivas. Como as estrelas mais massivas ardem a uma velocidade superior, têm uma vida mais curta. Consomem rapidamente o seu combustível em reações nucleares. Assim, o brilho de uma galáxia está mais diretamente relacionado com o número de estrelas que se formaram nos últimos milhões de anos do que com a massa da galáxia como um todo. 

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters

Fonte: Northwestern University

Medindo a expansão do Universo através de estrelas de nêutrons

Nos últimos anos, a astronomia tem-se visto numa espécie de crise: embora saibamos que o Universo está se expandindo, e embora saibamos aproximadamente a que velocidade, as duas principais formas de medir essa expansão não estão de acordo.

© NASA (ilustração dos dois métodos utilizados para medir a expansão do Universo)

Na imagem o hemisfério esquerdo mostra o remanescente em expansão da supernova descoberta por Tycho Brahe em 1572, aqui observada em raios X. À direita, um mapa da radiação cósmica de fundo de uma metade do céu, observada em micro-ondas.

Agora, astrofísicos do Instituto Niels Bohr sugerem um novo método que pode ajudar a resolver esta tensão. Sabemos isto desde que Edwin Hubble e outros astrônomos, há cerca de 100 anos, mediram as velocidades de um certo número de galáxias circundantes. As galáxias do Universo são "transportadas" para longe umas das outras por esta expansão e, por conseguinte, afastam-se umas das outras. 

Quanto maior for a distância entre duas galáxias, mais rapidamente se afastam, e o ritmo exato deste movimento é uma das grandezas mais fundamentais da cosmologia moderna. O número que descreve a expansão tem o nome de "constante de Hubble", aparecendo numa multiplicidade de equações e modelos diferentes do Universo e dos seus constituintes. 

Para compreender o Universo, temos, portanto, de conhecer a constante de Hubble com a maior exatidão possível. Existem vários métodos para a medir; métodos que são mutuamente independentes, mas que, felizmente, dão quase o mesmo resultado. O método intuitivamente mais fácil de compreender é, em princípio, o mesmo que Edwin Hubble e os seus colegas utilizaram há um século: localizar um conjunto de galáxias e medir as suas distâncias e velocidades. Na prática, isto é feito através da procura de galáxias com estrelas em explosão, as chamadas supernovas. 

Este método é complementado por outro método que analisa irregularidades na chamada radiação cósmica de fundo, uma forma antiga de luz que remonta a pouco tempo depois do Big Bang. Os dois métodos - o método das supernovas e o método da radiação de fundo - têm dado sempre resultados ligeiramente diferentes. Mas qualquer medição tem incertezas e, há alguns anos atrás, as incertezas eram suficientemente substanciais para que as pudéssemos culpar pela disparidade. 

No entanto, à medida que as técnicas de medição foram melhorando, as incertezas diminuíram e atingindo agora a um ponto em que podemos afirmar com um elevado grau de confiança que ambos não podem estar corretos. A raiz desta "tensão de Hubble", quer se trate de efeitos desconhecidos que enviesam sistematicamente um dos resultados, quer se trate de um indício de uma nova física ainda por descobrir, é atualmente um dos temas mais efervescentes da astronomia. 

Um dos maiores desafios consiste em determinar com exatidão as distâncias das galáxias. Mas um novo estudo propõe um novo método para medir distâncias, ajudando assim a resolver a disputa em curso. Quando duas estrelas de nêutrons ultracompactas, que são remanescentes de supernovas, se orbitam uma em torno da outra e acabam por se fundir, geram uma nova explosão, a chamada quilonova. 

Num outro estudo publicado há poucos dias, os pesquisadores mostram que as quilonovas, apesar da sua complexidade, podem ser descritas por uma única temperatura. E verifica-se que a simetria e a simplicidade das quilonovas permitem aos astrônomos deduzir exatamente a quantidade de luz que emitem. Comparando esta luminosidade com a quantidade de luz que chega à Terra, foi possível calcular a distância a que a quilonova se encontra. Foi obtido assim um método novo e independente para calcular a distância a galáxias que contêm quilonovas. 

As supernovas, que até agora têm sido utilizadas para medir as distâncias das galáxias, nem sempre emitem a mesma quantidade de luz. Além disso, exigem que se calibre primeiro a distância utilizando outro tipo de estrelas, as chamadas Cefeidas, que, por sua vez, também têm de ser calibradas. Com as quilonovas pode-se contornar estas complicações que introduzem incertezas nas medições. 

Para demonstrar o seu potencial, os astrofísicos aplicaram o método a uma quilonova descoberta em 2017. O resultado é uma constante de Hubble mais próxima da do método da radiação de fundo, mas os pesquisadores ainda não se atrevem a afirmar que o método da quilonova pode resolver a tensão de Hubble.

Os artigos foram publicados nos periódicos Astronomy & Astrophysics e The Astrophysical Journal

Fonte: Niels Bohr Institute

Os estranhos exoplanetas de lava

Os mundos de lava, exoplanetas massivos que abrigam céus cintilantes e mares vulcânicos agitados chamados oceanos de magma, são muito diferentes dos planetas do nosso Sistema Solar.


© Getty Images (ilustração de um exoplaneta de lava)

Até à data, quase 50% de todos os exoplanetas rochosos já descobertos são capazes de manter magma às suas superfícies, provavelmente porque estes planetas estão tão próximos das suas estrelas hospedeiras que completam uma órbita em menos de 10 dias. Esta proximidade faz com que os planetas sejam bombardeados por condições climáticas adversas e com temperaturas extremas à superfície, tornando-os completamente inóspitos à vida tal como a conhecemos atualmente. 

Agora, num novo estudo, os cientistas demonstraram que estes vastos oceanos fundidos têm uma grande influência nas propriedades observadas das Super-Terras rochosas e quentes, tais como no seu tamanho e no seu percurso evolutivo. 

Foi descoberto que devido à natureza extremamente compressível da lava, os oceanos de magma podem fazer com que os planetas ricos em lava sem atmosfera sejam modestamente mais densos do que os planetas sólidos de tamanho semelhante, bem como afetar a estrutura dos seus mantos, a espessa camada interior que rodeia o núcleo de um planeta. Mesmo assim, uma vez que estes objetos são notoriamente pouco estudados, caracterizar o funcionamento fundamental dos planetas de lava pode ser uma tarefa difícil.

Um dos mais conhecidos destes misteriosos exoplanetas escaldantes é 55 Cancri e, um exoplaneta situado a cerca de 41 anos-luz de distância, que os cientistas descrevem como tendo céus cintilantes e mares de lava agitados. Embora existam objetos no nosso Sistema Solar, como a lua Io de Júpiter, que são extremamente ativos do ponto de vista vulcânico, não existem verdadeiros planetas de lava na nossa parte do cosmos que os cientistas possam estudar de perto. 

Utilizando o software de modelação do interior de exoplanetas Exoplex e dados recolhidos em estudos anteriores para construir um módulo que incluía informações sobre vários tipos de composições magmáticas, os pesquisadores simularam vários cenários evolutivos de um planeta semelhante à Terra com temperaturas à superfície entre 1.420 e 2.120 °C, o ponto de fusão em que o manto sólido do planeta se transformaria em líquido. 

A partir dos modelos que criaram, a equipe foi capaz de discernir que os mantos dos planetas com oceano de magma podem assumir uma de três formas: a primeira em que todo o manto está completamente derretido, a segunda em que um oceano de magma se encontra à superfície e um terceiro modelo tipo sanduíche que consiste num oceano de magma à superfície, uma camada de rocha sólida no meio e outra camada de magma derretido que se encontra mais próxima do núcleo do planeta. 

Os resultados sugerem que a segunda e a terceira formas são ligeiramente mais comuns do que os planetas completamente fundidos. Dependendo da composição dos oceanos de magma, alguns exoplanetas sem atmosfera são melhores do que outros para reter elementos voláteis, compostos como o oxigênio e o carbono necessários para a formação das primeiras atmosferas, durante bilhões de anos. Por exemplo, o estudo refere que um planeta da classe de magma basal que seja 4 vezes mais massivo do que a Terra pode aprisionar mais de 130 vezes a massa de água dos oceanos da Terra, e cerca de 1.000 vezes a quantidade de carbono atualmente presente na superfície e na crosta do nosso planeta.

Os exoplanetas de lava estão muito longe de se tornarem suficientemente habitáveis para suportar vida, mas é importante compreender os processos evolutivos. No entanto, este estudo torna claro que medir a sua densidade não é exatamente a melhor forma de caracterizar estes mundos quando os comparamos com exoplanetas sólidos, uma vez que um oceano de magma não aumenta nem diminui significativamente a densidade do seu planeta. Em vez disso, a pesquisa revela que outros parâmetros terrestres são essenciais, como as flutuações da gravidade à superfície de um planeta, para testar as teorias sobre o funcionamento destes corpos celestes.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal

Fonte: Ohio State University

domingo, 1 de outubro de 2023

Novas evidências da rotação de um buraco negro

O buraco negro supermassivo no coração da galáxia M87, que se tornou famoso pela primeira imagem da sombra de um buraco negro, deu origem a outra novidade: confirmou-se agora que o seu jato oscila, fornecendo uma evidência direta de que o buraco negro está girando.

© Intouchable Lab (modelo do disco de acreção inclinado)

Os buracos negros supermassivos, monstros até bilhões de vezes mais pesados do que o Sol que devoram tudo à sua volta, também absorvendo a luz, são difíceis de estudar porque nenhuma informação pode escapar do seu interior. 

Teoricamente, há muitas poucas propriedades que são possíveis medir. Uma propriedade que poderia ser observada é a rotação, mas devido às dificuldades envolvidas, não têm havido observações diretas da rotação de buracos negros. À procura de evidências da rotação de buracos negros, uma equipe internacional analisou mais de duas décadas de dados observacionais da galáxia M87. 

Esta galáxia, localizada a 55 milhões de anos-luz de distância, na direção da constelação de Virgem, abriga um buraco negro 6,5 bilhões de vezes mais massivo do que o Sol, o mesmo buraco negro que produziu a primeira imagem da sombra de um buraco negro pelo EHT (Event Horizon Telescope) em 2019. 

Sabe-se que o buraco negro supermassivo na galáxia M87 tem um disco de acreção, que alimenta o buraco negro com matéria, e um jato, no qual a matéria é ejetada de perto do buraco negro a uma velocidade próxima da da luz. 

A equipe analisou dados relativos a 170 períodos de tempo recolhidos pela EAVN (East Asian VLBI Network), pelo VLBA (Very Long Baseline Array), pela rede conjunta KVN e VERA (KaVA) e pela rede VLBI EATING (East Asia to Italy Nearly Global). No total, mais de 20 radiotelescópios de todo o mundo contribuíram para este estudo. Os resultados mostram que as interações gravitacionais entre o disco de acreção e a rotação do buraco negro fazem com que a base do jato oscile, ou precesse, da mesma forma que as interações gravitacionais dentro do Sistema Solar fazem com que a Terra precesse. 

A equipe conseguiu ligar a dinâmica do jato ao buraco negro supermassivo central, fornecendo evidências diretas de que o buraco negro está girarando. A direção do jato muda cerca de 10 graus com um período de precessão de 11 anos, o que corresponde às simulações teóricas em supercomputador realizadas pelo ATERUI II no NAOJ (National Astronomical Observatory of Japan).

Uma vez que o desalinhamento entre o buraco negro e o disco é relativamente pequeno e o período de precessão é de cerca de 11 anos, a acumulação de dados de alta resolução que traçam a estrutura de M87 ao longo de duas décadas e uma análise minuciosa são essenciais para esta descoberta. Os dados observacionais, perfeitamente ajustados à curva sinusoidal simples, trazem novos avanços na compreensão do sistema de buraco negro e jato.

Um artigo foi publicado na revista Nature

Fonte: National Astronomical Observatory of Japan

Nova revisão da massa da Via Láctea

Graças ao catálogo mais recente do satélite Gaia da ESA, uma equipe internacional liderada por astrônomos do Observatório de Paris e do CNRS (Centre National de la Recherche Scientifique) obteve a medição mais precisa da massa da Via Láctea.

© NASA / JPL-Caltech (ilustração da Via Láctea)

Este estudo abre questões importantes na cosmologia, nomeadamente acerca da quantidade de matéria escura contida na nossa Galáxia. A massa total da Via Láctea está estimada em apenas 200 bilhões de vezes a do Sol, o que representa uma revisão em baixa significativa, cerca de quatro a cinco vezes inferior às estimativas anteriores. 

Este novo valor foi obtido a partir do terceiro lançamento de dados do catálogo Gaia, publicado em 2022, que fornece dados abrangentes sobre 1,8 bilhões de estrelas, englobando as três componentes espaciais e as três componentes de velocidade num espaço de seis dimensões dentro da Via Láctea. 

Utilizando os dados do Gaia, os cientistas conseguiram construir a curva de rotação mais exata alguma vez observada para uma galáxia espiral e deduzir a massa da Via Láctea. Antes do Gaia, obter uma curva de rotação robusta para a Via Láctea era um desafio, ao contrário do que acontecia com as outras galáxias espirais. Este desafio resultava da nossa posição no interior da Via Láctea, o que tornava impossível distinguir com precisão os movimentos e as distâncias das estrelas no disco galáctico. 

No estudo recente, a curva de rotação da nossa Galáxia é atípica: ao contrário das determinadas para outras grandes galáxias espirais, não é achatada. Pelo contrário, na periferia do disco da nossa Galáxia, esta curva começa a diminuir rapidamente, seguindo a previsão conhecida como declínio Kepleriano. 

A obtenção de uma curva de rotação para a Via Láctea que exiba um declínio Kepleriano exige que a nossa Galáxia seja enquadrada num contexto cosmológico. Um dos maiores avanços da astronomia moderna foi a constatação de que as velocidades de rotação dos grandes discos das galáxias espirais eram muito mais rápidas do que seria de esperar de um declínio Kepleriano. 

Na década de 1970, os astrônomos: Vera Rubin, que utilizou observações de gás ionizado, e Albert Bosma, que estudou gás neutro, demonstraram que a velocidade de rotação das galáxias espirais permanece constante, muito para além dos seus discos ópticos.

A consequência imediata desta descoberta foi a proposta da existência de matéria escura, adicional à matéria observável, distribuída num halo que envolve os discos das galáxias espirais. Sem esta matéria escura, as curvas de rotação teriam seguido um declínio Kepleriano. Este último indica a ausência de quantidades significativas de matéria fora do disco óptico. É o caso da Via Láctea, segundo o estudo atual. 

Considerando que a matéria comum (estrelas e gás frio) da Via Láctea é geralmente estimada em pouco mais de 0,6x10¹¹ massas solares, representa cerca de um-terço da matéria total. Este fato constitui uma revolução na cosmologia, uma vez que até agora se concordava que a matéria escura deveria ser pelo menos seis vezes mais abundante do que a matéria comum. 

Se a maioria das outras grandes galáxias espirais não exibe uma curva de rotação com um declínio Kepleriano, o que é que torna a nossa Galáxia tão diferente? Uma explicação possível pode ser que a Via Láctea tenha sofrido relativamente poucas perturbações devido a colisões violentas entre galáxias. A sua última grande fusão ocorreu há cerca de 9 bilhões de anos, em contraste com a média de 6 bilhões de anos para outras galáxias espirais. Em qualquer caso, isto indica que a curva de rotação obtida para a Via Láctea é particularmente precisa, não sendo afetada pelos resíduos de uma colisão tão antiga.

A segunda possibilidade pode surgir das diferenças metodológicas entre a curva de rotação derivada dos dados de seis dimensões de estrelas fornecidos pelo satélite Gaia, por exemplo, para a Via Láctea, e as curvas de rotação derivadas usando gás neutro para outras galáxias. Este trabalho abre caminho para uma reavaliação das curvas de rotação das grandes galáxias espirais e do seu conteúdo em matéria comum e escura. 

Um artigo foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics

Fonte: Observatoire de Paris

sábado, 23 de setembro de 2023

Um processo especial de um par de galáxias em colisão

Esta fotografia tirada usando a Câmera Avançada para Pesquisas (ACS) do telescópio espacial Hubble mostra Arp 107, um objeto celeste que compreende um par de galáxias no meio de uma colisão.

© Hubble (Arp 107)

A galáxia maior (à esquerda desta imagem) é uma galáxia extremamente energética de um tipo conhecido como galáxia Seyfert, que abriga núcleos galácticos ativos em seus núcleos.

As galáxias Seyfert são notáveis porque, apesar do imenso brilho do núcleo ativo, a radiação de toda a galáxia pode ser observada. Isto é evidente nesta imagem, onde as espirais de toda a galáxia são facilmente visíveis. A companheira menor está ligada à maior por uma “ponte” aparentemente tênue, composta de poeira e gás. 

A dupla galáctica em colisão fica a cerca de 465 milhões de anos-luz da Terra. O Arp 107 está incluído em um catálogo de 338 galáxias conhecido como Atlas de Galáxias Peculiares, que foi compilado em 1966 por Halton Arp. 

Foi observado pelo Hubble como parte de um programa de observação que procurava especificamente preencher uma “lacuna” observacional, fazendo observações limitadas de membros do catálogo Arp. Parte da intenção do programa de observação era fornecer ao público imagens destas galáxias espetaculares e de difícil definição. Na verdade, vários lançamentos recentes fizeram uso de observações do mesmo programa de observação.

Fonte: ESA

Medida de um grande disco galáctico

Esta imagem apresenta a galáxia conhecida como NGC 3156.


© Hubble (NGC 3156)

É uma galáxia lenticular, o que significa que fica em algum lugar entre uma galáxia elíptica e uma galáxia espiral. Situa-se a cerca de 73 milhões de anos-luz da Terra, na constelação equatorial menor de Sextans. 

A Sextans é uma pequena constelação que pertence à família de constelações de Hércules. Ela própria é uma constelação com tema astronômico, sendo batizada em homenagem ao instrumento conhecido como sextante. Os sextantes são frequentemente considerados instrumentos de navegação inventados no século XVIII. No entanto, o sextante como ferramenta astronômica já existe há muito mais tempo: estudiosos islâmicos desenvolveram sextantes astronômicos muitas centenas de anos antes para medir ângulos no céu. 

Um exemplo particularmente notável é o enorme sextante com um raio de 36 metros que foi desenvolvido por Ulugh Beg, da dinastia Timúrida, no século XV, localizado em Samarcanda, no atual Uzbequistão. Estes primeiros sextantes podem ter sido um desenvolvimento do quadrante, um dispositivo de medição proposto por Ptolomeu. Um sextante, como o nome sugere, tem o formato de um sexto de um círculo, aproximadamente o formato da constelação. 

Os sextantes não são mais utilizados na astronomia moderna, tendo sido substituídos por instrumentos capazes de medir as posições de estrelas e objetos astronômicos com muito mais precisão. 

A NGC 3156 foi estudada de muitas maneiras além da determinação da sua posição precisa; desde o seu grupo de aglomerados globulares, até à sua formação estelar relativamente recente, até às estrelas que estão sendo destruídas pelo buraco negro supermassivo no seu centro. 

Fonte: ESA

Ondas monstruosas estão colidindo com uma estrela colossal

Um sistema estelar intrigou os pesquisadores porque é a “estrela pulsante” mais dramática já registrada.

© CfA / M. Weiss (ilustração de uma estrela pulsante)

Agora, novos modelos revelaram que ondas titânicas, geradas pelas marés, rebentam repetidamente numa das estrelas do sistema; a primeira vez que este fenômeno foi observado numa estrela. 

Estrelas pulsantes são estrelas em binárias próximas que pulsam periodicamente em brilho, como o ritmo de um coração batendo em uma máquina de eletrocardiograma. As estrelas nestes sistemas percorrem órbitas ovais alongadas. Sempre que oscilam próximas umas das outras, a gravidade das estrelas gera marés, tal como a Lua cria as marés oceânicas na Terra. As marés esticam e distorcem as formas das estrelas, alterando a quantidade de luz estelar vista vindo delas à medida que seus lados largos ou estreitos ficam alternadamente voltados para a Terra. 

Um novo estudo explica por que as flutuações de brilho de um sistema estelar pulsante são cerca de 200 vezes maiores do que as de estrelas com batimento oscilante típico. A causa: ondas gigantescas que rolam pela estrela maior, levantadas quando a sua estrela companheira menor faz regularmente passagens próximas. Estas ondas gigantes atingem alturas e velocidades tão elevadas, que as ondas quebram - semelhantes às ondas do oceano - e caem na superfície da grande estrela. Cada colisão das gigantescas ondas da estrela libera energia suficiente para desintegrar todo o nosso planeta centenas de vezes. 

As estrelas pulsantes foram vistas pela primeira vez quando o telescópio espacial Kepler, que caça exoplanetas, da NASA, detectou suas pulsações de brilho estelar reveladoras, geralmente sutis. A estrela maior do sistema tem quase 35 vezes a massa do Sol e, juntamente com a sua estrela companheira menor, é oficialmente designada MACHO 80.7443.1718, não por causa de qualquer força estelar, mas porque as mudanças de brilho do sistema foram registradas pela primeira vez pelo Projeto MACHO na década de 1990, que buscava sinais de matéria escura em nossa galáxia. 

A maioria das estrelas pulsantes variam em brilho apenas em cerca de 0,1%, mas MACHO 80.7443.1718 chamou a atenção dos astrônomos por causa de suas dramáticas oscilações de brilho sem precedentes, para cima e para baixo em 20%. Para desvendar o mistério, foi criado um modelo computacional do objeto. este modelo captou como a interação da gravidade das duas estrelas gera marés massivas na estrela maior. As ondas gigantescas resultantes atingem cerca de um quinto do raio da estrela gigante, o que equivale a ondas da altura de três Sóis empilhados uns sobre os outros, ou cerca de 4,4 milhões de quilômetros de altura. 

As simulações mostram que as ondas enormes começam como ondas suaves e organizadas, tal como as ondas do oceano, antes de se enrolarem e rebentarem. A tremenda liberação de energia das ondas em MACHO 80.7443.1718 tem dois efeitos, mostra o modelo. Ele gira a superfície estelar cada vez mais rápido e lança gás estelar para fora para formar uma atmosfera estelar giratória e brilhante. Cerca de uma vez por mês, as duas estrelas passam uma pela outra e uma nova onda monstruosa atravessa a superfície da estrela. Cumulativamente, esta agitação fez com que a grande estrela MACHO 80.7443.1718 aumentasse no seu equador cerca de 50% mais do que nos seus polos. 

O brilho característico desta atmosfera foi uma das principais pistas de que ondas estavam quebrando na superfície da estrela. Por mais inédito que seja a estrela MACHO 80.7443.1718, é improvável que seja única. Das quase 1.000 estrelas com com oscilações pulsantes descobertas até agora, cerca de 20 delas apresentam grandes flutuações de brilho que se aproximam das do sistema simulado. E ao observar as ondas colossais rolando pela superfície estelar, os astrônomos esperam compreender como as interações próximas moldam a evolução dos pares estelares. 

Um artigo que descreve estes resultados foi publicado na revista Nature Astronomy

Fonte: Harvard–Smithsonian Center for Astrophysics

quarta-feira, 20 de setembro de 2023

Descobertos metano e dióxido de carbono na atmosfera de exoplaneta

Uma nova pesquisa realizada por uma equipe internacional de astrônomos, utilizando dados do telescópio espacial James Webb, sobre K2-18 b, um exoplaneta 8,6 vezes mais massivo do que a Terra, revelou a presença de moléculas de carbono, incluindo metano e dióxido de carbono.

© STScI / J. Olmstead (ilustração do exoplaneta K2-18 b)

A descoberta vem juntar-se a estudos recentes que sugerem que K2-18 b poderá ser um exoplaneta Hiceano, um exoplaneta com potencial para possuir uma atmosfera rica em hidrogênio e uma superfície coberta de oceanos de água. 

A primeira visão sobre as propriedades atmosféricas deste exoplaneta na zona habitável veio de observações com o telescópio espacial Hubble, o que levou a estudos adicionais que desde então mudaram a nossa compreensão do sistema. O exoplaneta K2-18 b orbita a estrela anã fria K2-18 na zona habitável e situa-se a 120 anos-luz da Terra, na direção da constelação de Leão. 

Os exoplanetas como K2-18 b, que têm tamanhos entre os da Terra e os de Netuno, são diferentes de tudo o que existe no nosso Sistema Solar. Esta falta de planetas análogos nas proximidades significa que estes "sub-Netunos" são mal compreendidos e a natureza das suas atmosferas é uma questão de debate ativo entre os astrônomos. A sugestão de que o sub-Netuno K2-18 b poderia ser um exoplaneta Hiceano é intrigante, uma vez que alguns astrônomos pensam que estes mundos são ambientes promissores para procurar evidências de vida.

A abundância de metano e dióxido de carbono em K2-18 b, bem como a escassez de amoníaco, apoiam a hipótese de que pode existir um oceano por baixo de uma atmosfera rica em hidrogênio. Estas observações iniciais do Webb também permitiram a detecção da molécula sulfureto de dimetilo (dimetilsulfureto). Na Terra, esta molécula só é produzida por vida. A maior parte do dimetilsulfureto na atmosfera da Terra é emitida pelo fitoplâncton em ambientes marinhos. A inferência de dimetilsulfureto é menos robusta e requer validação adicional. 

Embora K2-18 b se encontre na zona habitável e se saiba agora que abriga moléculas com carbono, isto não significa necessariamente que o planeta possa suportar vida. A grande dimensão do planeta, com um raio 2,6 vezes superior ao da Terra, significa que o seu interior contém provavelmente um grande manto de gelo a altas pressões, como Netuno, mas com uma atmosfera mais fina rica em hidrogênio e uma superfície oceânica. Prevê-se que os mundos hiceanos tenham oceanos de água. No entanto, também é possível que o oceano seja demasiado quente para ser habitável ou líquido. Embora este tipo de planeta não exista no nosso Sistema Solar, os sub-Netunos são o tipo de planeta mais comum conhecido até agora na Galáxia. 

A caracterização das atmosferas de exoplanetas como K2-18 b, ou seja, a identificação dos seus gases e condições físicas, é uma área muito ativa na astronomia. No entanto, estes planetas são ofuscados pelo brilho das suas estrelas progenitoras muito maiores, o que torna a exploração das atmosferas dos exoplanetas particularmente difícil. A equipe contornou este desafio analisando a luz da estrela hospedeira de K2-18 b à medida que esta atravessava a atmosfera do exoplaneta. O K2-18 b é um exoplaneta em trânsito, o que significa que é possível detectar uma queda de brilho à medida que passa pela face da sua estrela. Foi assim que o exoplaneta foi descoberto pela primeira vez. Isto significa que durante os trânsitos uma pequena fração da luz estelar passa pela atmosfera do exoplaneta antes de chegar a telescópios como o Webb. A passagem da luz da estrela pela atmosfera exoplanetária deixa vestígios que podem juntar para determinar os gases da atmosfera do exoplaneta. 

A equipe tenciona agora realizar uma exploração de seguimento com o MIRI (Mid-InfraRed Instrument) do telescópio Webb, que esperam venha a validar ainda mais as suas descobertas e a fornecer novos conhecimentos sobre as condições ambientais em K2-18 b.

Os resultados foram aceitos para publicação no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: ESA