sexta-feira, 2 de julho de 2021

Uma anã branca vivendo no limite

Os astrônomos descobriram a menor e mais massiva anã branca alguma vez vista. A cinza fumegante, que se formou quando duas anãs brancas menos massivas se fundiram, acumulou uma massa maior do que a do nosso Sol num corpo com aproximadamente o tamanho da nossa Lua.

© Giuseppe Parisi (ilustração de anã branca comparada com a Lua)

A anã branca está ilustrada acima da Lua, e tem aproximadamente 4.300 km de diâmetro, enquanto nossa Lua tem 3.475 km de diâmetro.

As anãs brancas menores são mais massivas. Isto deve-se ao fato de as anãs brancas não possuírem a queima nuclear que contraria a própria gravidade das estrelas normais, e o seu tamanho é regulado pela mecânica quântica.

A descoberta foi feita pelo ZTF (Zwicky Transient Facility), que opera no Observatório Palomar do Caltech; outros dois telescópios no Havaí, o Observatório W. M. Keck em Maunakea e o Pan-STARRS (Panoramic Survey Telescope and Rapid Response System) do Instituto de Astronomia da Universidade do Havaí, ajudaram a caracterizar a estrela moribunda, juntamente com o Telescópio Hale de 200 polegadas em Palomar, o observatório espacial Gaia da ESA e o Observatório Neil Gehrels Swift da NASA.

As anãs brancas são os remanescentes colapsados de estrelas que já tiveram cerca de oito vezes a massa do Sol ou menos. O nosso Sol, por exemplo, depois de inchar pela primeira vez numa gigante vermelha daqui a cerca de 5 bilhões de anos, acabará por desprender as suas camadas externas e encolherá até uma anã branca compacta. Cerca de 97% de todas as estrelas tornam-se anãs brancas. 

Apesar do nosso Sol estar sozinho no espaço sem uma parceira estelar, muitas estrelas orbitam em pares. As estrelas envelhecem juntas, e se ambas tiverem menos de oito massas solares, ambas irão evoluir para anãs brancas. 

A nova descoberta fornece um exemplo do que pode acontecer após esta fase. O par de anãs brancas, que espiralam uma em direção à outra, perde energia na forma de ondas gravitacionais e, por fim, fundem-se. Se as estrelas moribundas tiverem massa suficiente, explodem no que é chamado de supernova do Tipo Ia. Mas se estiverem abaixo de um determinado limite de massa, combinam-se numa nova anã branca que é mais pesada do que qualquer uma das progenitoras. Este processo de fusão aumenta o campo magnético daquela estrela e acelera a sua rotação em comparação com a das progenitoras.

A anã branca minúscula recém-descoberta, denominada ZTF J1901+1458, tomou o segundo percurso de evolução; as suas progenitoras fundiram-se e produziram uma anã branca com 1,35 vezes a massa do nosso Sol. A anã branca tem um campo magnético extremo quase um bilhão de vezes mais forte do que o do nosso Sol e gira em torno de si própria uma vez a cada sete minutos (a anã branca mais rápida conhecida, chamada EPIC 228939929, completa uma rotação a cada 5,3 minutos).

É possível que a anã branca fundida pode ser massiva o suficiente para evoluir para uma estrela moribunda rica em nêutrons, ou estrela de nêutrons, que normalmente se forma quando uma estrela muito mais massiva do que o nosso Sol explode como supernova. Isto é altamente especulativo, mas é possível que a anã branca seja massiva o suficiente para se transformar numa estrela de nêutronsÉ tão massiva e densa que, no seu núcleo, os elétrons estão sendo capturados pelos prótons nos núcleos para formar nêutrons. Dado que a pressão dos elétrons empurra contra a força da gravidade, mantendo a estrela intacta, o núcleo entra em colapso quando um número grande o suficiente de elétrons é removido. Se esta hipótese de formação de estrela de nêutrons estiver correta, pode significar que uma porção significativa de outras estrelas de neutrões é formada desta maneira. 

A proximidade do objeto recém-descoberto (cerca de 130 anos-luz de distância) e a sua tenra idade (100 milhões de anos ou menos) indicam que objetos semelhantes podem ocorrer mais frequentemente na nossa Galáxia.

Dados do Swift, que observa no ultravioleta, ajudaram a definir o tamanho e a massa da anã branca. Com um diâmetro de mais ou menos 4.300 km, ZTF J1901+1458 garante o título de a menor anã branca conhecida, retirando o título às recordistas anteriores, RE J0317-853 e WD 1832+089, cada uma com diâmetros de aproximadamente 5.000 km. 

Há tantas questões a serem respondidas ainda, como por exemplo a taxa de fusões de anãs brancas na Galáxia, e será que esta é suficiente para explicar o número de supernovas do tipo Ia? Como é que um campo magnético é gerado nestes eventos poderosos, e porque é que existe tanta diversidade na intensidade do campo magnético das anãs brancas? A descoberta de uma grande população de anãs brancas nascidas a partir de fusões vai ajudar a responder estas perguntas e a muitas mais.

O novo estudo foi publicado na revista Nature.

Fonte: W. M. Keck Observatory

quinta-feira, 1 de julho de 2021

A jornada de um grão de poeira pelo Sistema Solar recém-nascido

Uma equipe liderada pela Universidade do Arizona reconstruiu em detalhes sem precedentes a história de um grão de poeira que se formou durante o nascimento do Sistema Solar, há mais de 4,5 bilhões de anos.

© Heather Roper (ilustração do início do Sistema Solar)

A imagem mostra o início do Sistema Solar, num momento em que ainda não tinham sido formados os planetas. Uma nuvem rodopiante de gás e poeira rodeava o jovem Sol. O corte no disco protoplanetário serve para mostrar a sua estrutura tridimensional.

Os achados fornecem informações sobre os processos fundamentais subjacentes à formação dos sistemas planetários, muitos dos quais ainda estão envoltos em mistério. Para o estudo, foi desenvolvida uma nova metodologia que combina mecânica quântica e termodinâmica para simular as condições às quais o grão foi exposto durante a sua formação, quando o Sistema Solar era um disco giratório de gás e poeira conhecido como disco protoplanetário ou nebulosa solar.

A comparação das previsões do modelo com uma análise extremamente detalhada da composição química e da estrutura cristalina da amostra, juntamente com um modelo de como a matéria foi transportada na nebulosa solar, revelou pistas sobre a viagem do grão e sobre as condições ambientais que o moldaram durante o caminho. 

O grão analisado no estudo é uma das várias inclusões, conhecidas como inclusões ricas em cálcio-alumínio, descobertas numa amostra do meteorito Allende, que caiu sobre o estado mexicano de Chihuahua em 1969. As inclusões ricas em cálcio-alumínio são de especial interesse porque pensa-se que estejam entre os primeiros sólidos formados no Sistema Solar há mais de 4,5 bilhões de anos. As estruturas a escalas microscópicas e a escalas atômicas da amostra desvendam um registo das suas histórias de formação, que foram controladas pelos ambientes coletivos aos quais foram expostas. 

Os cientistas analisaram a composição das inclusões embebidas no meteorito usando os microscópios eletrônicos de varredura por transmissão de resolução atômica de última geração do KMICF (Kuiper Materials Imaging and Characterization Facility) do LPL (Lunar and Planetary Laboratory) e da fábrica da Hitachi em Hitachinaka, Japão. 

As inclusões consistem principalmente de tipos de minerais conhecidos como espinela e perovskite, que também ocorrem em rochas na Terra e estão sendo estudados como materiais candidatos para aplicações como microeletrônica e energia solar fotovoltaica. Tipos semelhantes de sólidos ocorrem em outros gêneros de meteoritos conhecidos como condritos carbonáceos, que são particularmente interessantes para os cientistas planetários, pois são conhecidos por serem remanescentes da formação do Sistema Solar e contêm moléculas orgânicas, incluindo aquelas que podem ter fornecido as matérias-primas para a vida. 

A análise precisa do arranjo espacial dos átomos permitiu o estudo, em grande detalhe, da composição das estruturas cristalinas subjacentes. Para surpresa da equipe, alguns dos resultados estavam em desacordo com as teorias atuais no que concerne aos processos físicos considerados ativos dentro dos discos protoplanetários. 

Com base nos dados extraídos das amostras, os pesquisadores concluíram que a partícula foi formada numa região do disco protoplanetário não muito longe de onde a Terra está agora, que depois viajou para mais perto do Sol, onde estava cada vez mais quente, para depois inverter caminho e chegar a regiões mais frias, mais distantes do jovem Sol. Eventualmente, foi incorporada num asteroide, que mais tarde se partiu em pedaços. Alguns destes fragmentos foram capturados pela gravidade da Terra e caíram como meteoritos. 

As amostras para este estudo foram retiradas do interior de um meteorito e são consideradas primitivas, ou seja, não foram afetadas por influências ambientais. Pensa-se que o material tão primitivo não tenha sofrido nenhuma mudança significativa desde a sua formação há mais de 4,5 bilhões de anos, o que é raro. 

Está ainda por determinar se objetos semelhantes existem no asteroide Bennu, amostras do qual serão trazidas para a Terra pela missão OSIRIS-REx em 2023. Até lá, os cientistas contam com amostras que caem para a Terra por meio de meteoritos. 

Um artigo foi publicado no periódico The Planetary Science Journal.

Fonte: University of Arizona

quarta-feira, 30 de junho de 2021

Encontrando a Terra retroiluminada pelo Sol

Cientistas da Universidade de Cornell e do Museu Americano de História Natural identificaram 2.034 sistemas estelares próximos, até uma pequena distância cósmica de 326 anos-luz, que poderiam encontrar a Terra meramente observando o nosso pálido ponto azul cruzando o Sol.

© OpenSpace (ilustração da Terra e do Sol vistos de um exoplaneta)

São 1.715 sistemas estelares que podem ter avistado a Terra desde que a civilização humana floresceu há cerca de 5.000 anos, e mais 319 sistemas estelares que serão acrescentados nos próximos 5.000 anos.

Os exoplanetas em torno destas estrelas próximas têm lugar cósmico de destaque para ver se a Terra contém vida. Foram usadas as posições e os movimentos do catálogo Gaia EDR3 da ESA para determinar quais as estrelas que entram e saem da Zona de Trânsito da Terra, e por quanto tempo. A nossa vizinhança solar é um lugar dinâmico onde as estrelas saem e entram deste ponto de vista perfeito para ver a Terra transitar o Sol a um ritmo rápido. 

Dos 2.034 sistemas estelares que passam pela Zona de Trânsito da Terra ao longo do período examinado de 10.000 anos, 117 objetos estão a cerca de 100 anos-luz do Sol e 75 destes estão na Zona de Trânsito da Terra desde que as estações comerciais de rádio na Terra começaram a transmitir para o espaço há cerca de um século. As ondas de rádio transmitidas da Terra são uma assinatura da nossa civilização tecnologicamente avançada e os exoplanetas dentro desse alcance podem tê-las captado.

Incluídos no catálogo de 2.034 sistemas estelares estão sete conhecidos por hospedar exoplanetas. Cada um destes mundos teve ou terá a oportunidade de detectar a Terra, assim como os cientistas da Terra já encontraram milhares de mundos em órbita de outras estrelas usando o método de trânsito. 

Ao observar o trânsito de exoplanetas distantes, ou seja, a passagem em frente da sua estrela, os astrônomos podem interpretar as atmosferas iluminadas por esta estrela. Caso os exoplanetas possuam vida inteligente, podem observar a Terra iluminada pelo Sol e ver as assinaturas químicas da vida na nossa atmosfera. 

O sistema Ross 128, com uma estrela anã vermelha localizada na direção da constelação de Virgem, fica a cerca de 11 anos-luz e é o segundo sistema mais próximo com um exoplaneta do tamanho da Terra (cerca de 1,8 vezes o tamanho do nosso planeta). Qualquer habitante deste exoplaneta poderia ter visto a Terra cruzando em frente do nosso próprio Sol durante 2.158 anos, começando há cerca de 3.057 anos; perderam o seu ponto de vista há cerca de 900 anos.

O sistema TRAPPIST-1, a 45 anos-luz da Terra, hospeda sete planetas do tamanho da Terra em trânsito, quatro deles na zona habitável temperada daquela estrela. Embora tenhamos descoberto estes exoplanetas em torno de TRAPPIST-1, eles não serão capazes de nos localizar até que o seu movimento os leve para a Zona de Trânsito da Terra daqui a 1.642 anos. Potenciais observadores no sistema TRAPPIST-1 permanecerão no lugar cósmico de destaque durante 2.371 anos. 

Esta análise mostra que mesmo as estrelas mais próximas geralmente passam mais de 1.000 anos num ponto de vista onde podem ver um trânsito da Terra pelo Sol. Se for assumido que o inverso é verdadeiro, isto fornece uma saudável linha temporal para que civilizações identifiquem a Terra como um planeta interessante. 

O telescópio espacial James Webb vai observar vários exoplanetas em trânsito para caracterizar as suas atmosferas e, finalmente, procurar por sinais de vida. A iniciativa Breakthrough Starshot é um projeto ambicioso em andamento que visa lançar uma nanosonda em direção ao exoplaneta mais próximo detectado em torno de Proxima Centauri, a cerca de 4,2 anos-luz de distância, e caracterizar completamente este mundo.

A pesquisa foi publicada na revista Nature.

Fonte: Cornell University

terça-feira, 29 de junho de 2021

Amanhecer cósmico ocorreu 250 a 350 milhões de anos após o Big Bang

De acordo com um novo estudo liderado por pesquisadores da University College London e da Universidade de Cambridge, o amanhecer cósmico, quando as estrelas se formaram pela primeira vez, ocorreu 250 milhões a 350 milhões de anos após o início do Universo.

© Hubble (galáxia MACS0416-JD)

Imagem a cores falsas do aglomerado de galáxias usado para detectar uma das seis galáxias, MACS0416-JD. Esta galáxia tem uma idade estimada em 351 milhões de anos, o que significa que foi formada 178 milhões de anos após o Big Bang. A massa estelar desta galáxia é um bilhão de vezes a massa do nosso Sol. Este objeto é atualmente a galáxia mais distante já detectada com o ALMA.

O estudo sugere que o telescópio espacial James Webb da NASA, com lançamento previsto para novembro, será sensível o suficiente para observar diretamente o nascimento das galáxias. Analisando imagens dos telescópios espaciais Hubble e Spitzer, os pesquisadores calcularam que a idade destas galáxias varia entre 200 a 300 milhões de anos, permitindo uma estimativa de quando as suas estrelas se formaram pela primeira vez.

A equipe do Reino Unido examinou seis das galáxias mais distantes atualmente conhecidas, cuja luz levou a maior parte da vida do Universo para chegar até nós. Foi descoberto que a distância destas galáxias correspondia a olhar para trás no tempo, até mais de 13 bilhões de anos, quando o Universo tinha apenas 550 milhões de anos.

O Universo era um lugar escuro nas primeiras centenas de milhões de anos, antes da formação das primeiras estrelas e galáxias. Testemunhar o momento em que o Universo foi banhado pela primeira vez pela luz das estrelas é um dos grandes objetivos da astronomia.

Os pesquisadores analisaram a luz estelar das galáxias, conforme registrada pelos telescópios espaciais Hubble e Spitzer, examinando um marcador na sua distribuição de energia indicativo da presença de hidrogênio atômico nas suas atmosferas estelares. Isto fornece uma estimativa da idade das estrelas que contêm. Esta assinatura de hidrogênio aumenta em força à medida que a população estelar envelhece, mas diminui quando a galáxia tem mais de um bilhão de anos. A dependência da idade surge porque as estrelas mais massivas que contribuem para este sinal queimam o seu combustível nuclear mais rapidamente e, portanto, morrem primeiro.

Ao analisarem os dados do Hubble e do Spitzer, os astrônomos precisaram estimar o "desvio para o vermelho" de cada galáxia, o que indica a sua distância cosmológica e, portanto, a época em que existiam no Universo. Para conseguir isto, realizaram medições espectroscópicas usando o arsenal completo de poderosos telescópios terrestres: o ALMA (Atacama Large Millimetre Array), o VLT (Very large Telescope) e o telescópio Gemini-Sul no Chile e os telescópios gêmeos Keck no Havaí. 

Na última década, os astrônomos empurraram para trás as fronteiras do que podemos observar até uma época em que o Universo tinha apenas 4% da sua idade atual. No entanto, devido à transparência limitada da atmosfera da Terra e às capacidades dos telescópios espaciais Hubble e Spitzer, atingimos o nosso limite, que poderá ser ultrapassado com o futuro telescópio espacial James Webb. 

A busca para ver este momento importante na história do Universo tem sido um Santo Graal na Astronomia durante décadas. Uma vez que somos feitos de material processado nas estrelas, constituindo a busca pelas nossas próprias origens.

O estudo foi publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: University College London

segunda-feira, 28 de junho de 2021

Uma dispersão de estrelas

Esta imagem mostra o aglomerado de estrelas aberto NGC 330, que está na constelação de Tucana (O Tucano) e fica a cerca de 180.000 anos-luz de distância dentro da Pequena Nuvem de Magalhães.

© Hubble (NGC 330)

O aglomerado contém uma infinidade de estrelas, muitas das quais estão espalhadas por esta imagem impressionante obtida pelo telescópio espacial Hubble que nos mostram algo novo sobre o Universo.

Esta imagem também contém pistas sobre o funcionamento interno do próprio Hubble. Os padrões entrecruzados em torno das estrelas nesta imagem, conhecidos como picos de difração, foram criados quando a luz das estrelas interagiu com as quatro aletas finas que sustentam o espelho secundário do Hubble.

Como os aglomerados de estrelas se formam a partir de uma única nuvem primordial de gás e poeira, todas as estrelas que eles contêm têm aproximadamente a mesma idade. Isso os torna laboratórios naturais úteis para os astrônomos aprenderem como as estrelas se formam e evoluem. 

Esta imagem usa observações da Wide Field Camera 3 do Hubble e incorpora dados de duas investigações astronômicas muito diferentes. A primeira teve como objetivo entender por que estrelas em aglomerados de estrelas parecem evoluir de forma diferente de estrelas em outros lugares, uma peculiaridade observada pela primeira vez pelo telescópio espacial Hubble. A segunda teve como objetivo determinar o quão grandes as estrelas podem ser antes de se tornarem condenadas a acabar com suas vidas em explosões cataclísmicas de supernova.

Fonte: ESA

sexta-feira, 25 de junho de 2021

Relação da massa estelar com discos de formação planetária

Usando dados de mais de 500 estrelas jovens observadas com o ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array), os cientistas descobriram uma ligação direta entre as estruturas do disco protoplanetário e a demografia planetária.

© ALMA/S. Dagnello (discos protoplanetários em anel, transição e estendido)

Os discos protoplanetários são formadores de planetas que rodeiam as estrelas, e são classificados em três categorias: anel, transição ou estendido. Estas imagens de cores falsas do ALMA mostram estas classificações em contraste absoluto. À esquerda: o disco em anel de RU Lup é caracterizado por lacunas estreitas que se pensa serem esculpidas por planetas gigantes com massas que variam entre uma massa de Netuno e uma massa de Júpiter. No meio: o disco de transição de J1604.3-2130 é caracterizado por uma grande cavidade interna que se pensa ser esculpida por planetas mais massivos que Júpiter, também conhecidos como planetas Super-Jovianos. À direita: pensa-se que o disco compacto de Sz104 não contenha planetas gigantes, já que não possui as lacunas e cavidades associadas com a presença de planetas gigantes. 

A pesquisa prova que estrelas com maior massa são mais propensas a estar rodeadas por discos com lacunas e que estas lacunas estão diretamente correlacionadas com a alta ocorrência de exoplanetas gigantes observados em torno delas. Estes resultados fornecem uma janela através do tempo, permitindo prever o aspeto dos sistemas exoplanetários em cada estágio da sua formação.

As lacunas nos discos protoplanetários há muito que são consideradas evidências gerais da formação planetária. No entanto, tem havido algum ceticismo devido à distância orbital observada entre os exoplanetas e as suas estrelas. Uma das principais razões é que exoplanetas em órbitas largas de dezenas de unidades astronômicas são raros. Porém, exoplanetas em órbitas menores, entre uma e dez unidades astronômicas, são muito mais comuns. 

O novo estudo é o primeiro a mostrar que o número de discos com lacunas nestas regiões corresponde ao número de exoplanetas gigantes num sistema estelar. A correlação também se aplica a sistemas estelares com estrelas de baixa massa, onde são mais propensos a encontrar exoplanetas rochosos massivos, também conhecidos como super-Terras. Estrelas de menor massa têm mais super-Terras rochosas, entre uma massa terrestre e uma massa de Netuno. Discos sem lacunas, mais compactos, levam à formação de super-Terras.

Esta ligação entre a massa estelar e a demografia planetária pode ajudar os cientistas a identificar quais as estrelas a ter como alvo na busca por planetas rochosos pela Via Láctea.

Um elemento importante da formação planetária é a influência da evolução da poeira. Sem planetas gigantes, a poeira irá sempre mover-se para dentro, criando condições ideais para a formação de planetas rochosos, menores e perto da estrela.

A pesquisa atual foi realizada usando dados de mais de 500 objetos observados em estudos anteriores usando as antenas do ALMA na Banda 6 e 7. Atualmente, o ALMA é o único telescópio que pode obter imagens da distribuição de poeira milimétrica em resolução angular alta o suficiente para resolver os discos de poeira e revelar a sua subestrutura, ou a falta dela. 

Nos últimos cinco anos, o ALMA produziu muitas pesquisas instantâneas de regiões de formação estelar próximas, resultando em centenas de medições da massa, do tamanho e da morfologia do disco de poeira. O grande número de propriedades do disco observadas permitiu fazer uma comparação estatística de discos protoplanetários com os milhares de exoplanetas descobertos. Esta é a primeira vez que uma dependência de massa estelar de discos com lacunas e discos compactos foi demonstrada com sucesso usando o telescópio ALMA. 

Estas novas descobertas ligam as belas estruturas das lacunas nos discos observados diretamente com o ALMA às propriedades de milhares de exoplanetas pela missão Kepler da NASA e a outros levantamentos exoplanetários. Os exoplanetas e a sua formação auxiliam a situar as origens da Terra e do Sistema Solar no contexto do que é visto acontecer em torno de outras estrelas.

Fonte: National Radio Astronomy Observatory

terça-feira, 22 de junho de 2021

Um berçário planetário caótico

A formação planetária ainda é um mistério. Os astrônomos estudam discos protoplanetários há décadas, tentando resolver os detalhes da gênese planetária.

© NRAO/B. Saxton (disco ao redor de Elias 2-27)

Vários rastreadores moleculares ajudaram os cientistas a melhor compreender os gases presentes no disco que rodeia Elias 2-27. Visível nesta animação, os dados do contínuo de poeira em 0,87mm (azul), a emissão de C18O (amarelo), e a emissão de 13CO (vermelho), cada camada vista individualmente e em composição.

Graças ao ALMA, uma equipe de cientistas, pela primeira vez, explorou fundo nas estruturas espirais do enorme disco protoplanetário de Elias 2-27, uma estrela jovem a 378 anos-luz de distância na direção da constelação de Ofiúco. A equipe pensa que as instabilidades gravitacionais são a origem das espirais, e não a interação com um planeta ou estrela companheira. 

Discos de gás e poeira rodeiam estrelas jovens recém-formadas. São chamados de discos protoplanetários, e os astrônomos esperam que os planetas se desenvolvam aí nos primeiros 10 milhões de anos de vida das estrelas.

Um dos mecanismos fundamentais que impulsionam este processo são as instabilidades gravitacionais, que ocorre quando o disco é massivo o suficiente para que a sua gravidade se torne relevante na forma como as partículas interagem entre elas. As instabilidades gravitacionais podem fazer com que o disco se fragmente em pequenos aglomerados, que podem tornar-se em planetas gigantes muito rapidamente. 

As características únicas de Elias 2-27 tornaram-na popular entre os cientistas do ALMA por mais de meia década. Uma equipe liderada por Laura Perez da Universidade do Chile descobriu, também usando o ALMA, as espirais no disco de Elias 2-27 em 2016. Mas não foram capazes de determinar o que gerou as instabilidades gravitacionais. Foram necessárias outras observações em várias bandas do ALMA e rastreadores de gás para explorar a estrutura das espirais tanto em gás como em poeira.

Descobriram em 2016 que o disco de Elias 2-27 tinha uma estrutura diferente de outros sistemas já estudados. Algo não observado num disco protoplanetário antes: dois braços espirais de grande escala. A origem destas estruturas permaneceu um mistério, por isso foram necessárias mais observações. Foi realizada uma exploração simultânea tanto da emissão de gás como da emissão da poeira neste sistema. 

Embora as instabilidades gravitacionais possam agora ser confirmadas para explicar as estruturas espirais no contínuo de poeira em torno da estrela, há também uma divisão interna, ou material ausente no disco, para o qual não há uma explicação clara. As imagens de alta resolução angular obtidas com o ALMA em vários comprimentos de onda foram fundamentais para estudar a morfologia do disco e as propriedades da poeira. A localização espacial das partículas de diferentes tamanhos permite entender os processos de crescimento da poeira e inferir a origem da morfologia espiral.

Além disso, a alta sensibilidade do ALMA permitiu à equipe estudar as perturbações cinemáticas e os processos dinâmicos rastreados pela emissão molecular. Usando duas moléculas como rastreadores (13CO e C18O), descobriram que o disco estava altamente perturbado e rodeado por emissões de gás em grande escala produzidas por material além da extensão do disco principal de poeira e gás.

As perturbações são grandes demais para serem explicadas por uma companheira. A estrutura vertical assimétrica do disco está provavelmente relacionada com a queda contínua de material, mostrando como os locais de formação planetária são caóticos. Uma das barreiras para entender a formação planetária era a falta de medições diretas da massa dos discos formadores de planetas. A alta sensibilidade do ALMA permitiu estudar mais de perto os processos dinâmicos, a densidade e até mesmo a massa do disco. 

Este achado é a base para o desenvolvimento de um método para medir a massa do disco que permitirá quebrar uma das maiores e mais insistentes barreiras no campo da formação planetária. O conhecimento da massa presente nos discos de formação de planetas possibilita determinar a quantidade de material disponível para a formação dos sistemas planetários e melhor entender o processo pelo qual se formam.

Embora a equipe tenha respondido a muitas perguntas críticas sobre o papel da instabilidade gravitacional e da massa do disco na formação planetária, o trabalho ainda não terminou. O estudo de como os planetas se formam é difícil porque demoram milhões de anos para serem constituídos.

Os resultados deste estudo foram publicados no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: National Radio Astronomy Observatory

Galáxias com matéria escura em falta

A medição de distância mais precisa, até à data, da galáxia ultradifusa (UDG) NGC 1052-DF2 (DF2) confirma, sem sombra de dúvida, que lhe falta matéria escura.

© STScI/Hubble (estrelas vermelhas velhas na galáxia ultradifusa DF2)

Esta imagem pelo Hubble fornece uma amostra de estrelas vermelhas velhas na galáxia ultradifusa DF2. A ampliação à direita revela as muitas estrelas gigantes vermelhas velhas nos limites da galáxia, usadas como marcadores intergalácticos de distância. 

Os pesquisadores calcularam uma distância mais precisa de DF2 usando o Hubble para observar cerca de 5.400 gigantes vermelhas. Estas estrelas mais velhas alcançam todas o mesmo pico de brilho, de modo que são "réguas" confiáveis para medir distâncias a galáxias. Estima-se que a DF2 esteja a 72 milhões de anos-luz da Terra. 

Dizem que a medição de distância solidifica a afirmação que DF2 tem matéria escura em falta. A galáxia contém no máximo 1/400 da quantidade de matéria escura que os astrônomos esperavam, com base na teoria e em observações de muitas outras galáxias. Chamada uma galáxia ultradifusa, esta galáxia estranha tem quase o diâmetro da Via Láctea mas contém apenas 1/200 do seu número de estrelas. A galáxia fantasmagórica não parece ter uma região central perceptível, braços espirais ou um disco. As observações foram feitas entre dezembro de 2020 e março de 2021 com o instrumento ACS (Advanced Camera for Surveys) do Hubble. 

A distância recentemente medida de 22,1 +/-1,2 megaparsecs foi obtida por uma equipe internacional de pesquisadores liderados por Zili Shen e Pieter van Dokkum da Universidade de Yale e Shany Danieli, ligada ao Hubble no IAS (Institute for Advanced Study). A nova medição relatada neste estudo tem implicações cruciais para estimar as propriedades físicas da galáxia, confirmando assim a sua falta de matéria escura.

Os resultados são baseados em 40 órbitas do telescópio espacial Hubble, com imagens pelo instrumento ACS e uma análise TRGB ("tip of the red giant branch"), o padrão de ouro para estas medições refinadas. Em 2019, a equipe publicou resultados medindo a distância à vizinha UDG NGC 1052-DF4 (DF4) com base em 12 órbitas do Hubble e numa análise TRGB, que forneceu evidências convincentes da ausência de matéria escura. 

Este método preferido expande os estudos da equipe de 2018 que se baseavam em "flutuações de brilho da superfície" para medir a distância. Ambas as galáxias foram descobertas com o Dragonfly Telephoto Array no observatório New Mexico Skies.

Além de confirmar as descobertas de distância anteriores, os resultados do Hubble indicaram que as galáxias estavam localizadas um pouco mais longe do que se pensava anteriormente, reforçando o caso de que contêm pouca ou nenhuma matéria escura. Se DF2 estivesse mais perto da Terra, como afirmam alguns astrônomos, seria intrinsecamente mais fraca e menos massiva, e a galáxia precisaria de matéria escura para explicar os efeitos observados da massa total. 

A matéria escura é amplamente considerada um ingrediente essencial das galáxias, mas este estudo fornece mais evidências de que a sua presença pode não ser inevitável. Embora a matéria escura ainda não tenha sido observada diretamente, a sua influência gravitacional é como uma cola que mantém as galáxias unidas e governa o movimento da matéria visível.

No caso de DF2 e DF4, foi possível explicar o movimento das estrelas com base apenas na massa estelar, sugerindo uma falta ou ausência de matéria escura. Ironicamente, a detecção de galáxias deficientes em matéria escura provavelmente ajudará a revelar a sua natureza intrigante e fornecerá novas informações sobre a evolução galáctica. Apesar de DF2 e DF4 serem ambas comparáveis em tamanho à Via Láctea, as suas massas totais são apenas cerca de um por cento da massa da nossa Galáxia. Também se descobriu que estas galáxias ultradifusas têm uma grande população de aglomerados globulares especialmente luminosos. 

Esta pesquisa gerou um grande interesse acadêmico, bem como um debate energético entre os proponentes de teorias alternativas para a matéria escura, como a teoria MOND (Modified Newtonian Dynamics). No entanto, com as descobertas mais recentes, incluindo as distâncias relativas das duas UDGs a NGC1052, tais teorias alternativas parecem menos prováveis. Além disso, agora há pouca incerteza nas medições de distância, dada a utilização do método TRGB. Com base na física fundamental, este método depende da observação de estrelas gigantes vermelhas que emitem um flash depois de queimar o seu reservatório de hélio que sempre ocorre com o mesmo brilho. 

Seguindo em frente, os pesquisadores vão continuar caçando mais destas galáxias estranhas, enquanto consideram uma série de questões: como é que as UDGs são formadas? O que nos dizem sobre os modelos cosmológicos padrão? Quão comuns são estas galáxias, e que outras propriedades únicas têm? Será necessário descobrir muitas mais galáxias sem matéria escura para resolver estes mistérios e a questão final sobre o que realmente é a matéria escura.

Os resultados foram publicados periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: Institute for Advanced Study

segunda-feira, 21 de junho de 2021

Fúria de Titãs

Uma colisão cósmica cataclísmica ocupa o centro do palco nesta imagem.

© Hubble (IC 1623)

A imagem mostra o par de galáxias IC 1623 interagindo, que fica a cerca de 275 milhões de anos-luz de distância da Terra na constelação de Cetus (A Baleia).

As duas galáxias estão nos estágios finais de fusão, e espera-se que um poderoso influxo de gás acione uma explosão frenética de formação de estrelas na galáxia compacta resultante.

Este par de galáxias interagindo é uma visão familiar; o telescópio espacial Hubble captou o par de galáxias IC 1623 em 2008 usando dois filtros em comprimentos de onda ópticos e infravermelhos através da Advanced Camera for Surveys (ACS). 

Esta nova imagem incorpora novos dados da Wide Field Camera 3 e combina observações feitas em oito filtros abrangendo comprimentos de onda infravermelho a ultravioleta para revelar os detalhes mais tênues do par de galáxias IC 1623. 

Observações futuras do par de galáxias com o telescópio espacial James Webb possibilitará analisar os processos que alimentam a formação extrema de estrelas em ambientes como esta dupla de galáxias.

Fonte: ESA

sábado, 19 de junho de 2021

Matéria escura está diminuindo a rotação da barra da Via Láctea

De acordo com um novo estudo realizado por pesquisadores da University College London (UCL) e da Universidade de Oxford, a rotação da barra galáctica da Via Láctea, que é composta por bilhões de estrelas agrupadas, diminuiu cerca de um-quarto desde a sua formação.

© P. C. Budassi (ilustração da Via Láctea)

Durante 30 anos, os astrofísicos previram esta desaceleração, mas esta é a primeira vez que foi medida. Os pesquisadores afirmam que fornece um novo tipo de visão sobre a natureza da matéria escura, que atua como um contrapeso, desacelerando a rotação.

No estudo, os pesquisadores analisaram observações do telescópio espacial Gaia de um grande grupo de estrelas, a corrente de Hércules, que estão em ressonância com a barra, isto é, giram em torno da Galáxia à mesma velocidade que a barra.

Estas estrelas estão capturadas gravitacionalmente pela barra giratória. O mesmo fenômeno ocorre com os asteroides gregos e troianos de Júpiter, que orbitam nos pontos Lagrange de Júpiter (à frente e atrás de Júpiter). Se a rotação da barra diminuir, espera-se que estas estrelas se movam para mais longe na Galáxia, mantendo o seu período orbital igual à rotação da barra. 

Os cientistas descobriram que as estrelas na corrente transportam uma impressão digital química, são mais ricas em elementos mais pesados (metais), provando que se afastaram do centro galáctico, onde as estrelas e os gases que as formam são cerca de 10 vezes mais ricos em metais em comparação com as seções exteriores da nossa Galáxia.

Usando estes dados, a equipe inferiu que a barra, composta por bilhões de massas solares, diminuiu a sua rotação em pelo menos 24% desde que se formou. Os astrofísicos há muito que suspeitam que a barra giratória no centro da nossa Galáxia está diminuindo de velocidade, mas só agora foi encontrada as primeiras evidências de tal acontecimento. O contrapeso que reduz esta rotação deve ser a matéria escura. Até agora, só foi possível inferir a matéria escura mapeando o potencial gravitacional das galáxias e subtraindo a contribuição da matéria visível.

Este estudo fornece um novo tipo de medição da matéria escura, não da sua energia gravitacional, mas da sua massa inercial, ou seja, a resposta dinâmica, que diminui a velocidade de rotação da barra.

Pensa-se que a Via Láctea, como as outras galáxias, esteja embebida num "halo" de matéria escura que se estende bem além da sua orla visível. A matéria escura é invisível e a sua natureza é desconhecida, mas a sua existência é inferida de galáxias que se comportam como se estivessem envoltas numa massa significativamente maior do que aquilo que é possível ver. Existe cerca de cinco vezes mais matéria escura no Universo do que matéria visível comum.

As teorias alternativas da gravidade, como a dinâmica Newtoniana modificada, rejeitam a ideia de matéria escura, e ao invés procuram explicar as discrepâncias ajustando a teoria da relatividade geral de Einstein. 

A Via Láctea é uma galáxia espiral barrada, com uma espessa barra de estrelas no meio e braços espirais que se estendem pelo disco. A barra gira na mesma direção que a Galáxia.

O estudo foi publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: University College London

A diversidade de galáxias formadoras de estrelas

Usando o ALMA, cientistas concluíram um censo de quase uma centena de galáxias no Universo próximo, mostrando os seus comportamentos e aparências.

© ALMA (NGC 4254 e NGC 4535)

Uma equipe de astrônomos, recorrendo ao ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array), concluiu o primeiro censo de nuvens moleculares no Universo próximo, revelando que, ao contrário da opinião científica anterior, nem todos estes berçários estelares têm o mesmo aspeto e comportamento. 

As estrelas são formadas por nuvens de poeira e gás chamadas nuvens moleculares, ou berçários estelares. Cada berçário estelar no Universo pode formar milhares ou até dezenas de milhares de novas estrelas durante a sua vida. 

Entre 2013 e 2019, astrônomos do projeto PHANGS (Physics at High Angular Resolution in Nearby GalaxieS) realizaram o primeiro levantamento sistemático de 100.000 berçários estelares em 90 galáxias no Universo próximo para obter uma melhor compreensão da sua relação com as galáxias onde vivem.

Esta é a primeira vez que a equipe obteve imagens de ondas milimétricas de muitas galáxias próximas com a mesma nitidez e qualidade das imagens ópticas. E enquanto as imagens ópticas mostram a luz das estrelas, estas novas imagens inovadoras mostram as nuvens moleculares que formam estas estrelas.

Para melhor entender a formação estelar em diferentes tipos de galáxias, a equipe observou semelhanças e diferenças nas propriedades moleculares do gás e nos processos de formação estelar nos discos galácticos, barras estelares, braços espirais e centros de galáxias. Confirmaram que a localização, ou vizinhança, desempenha um papel crítico na formação das estrelas.

Ao mapear diferentes tipos de galáxias e a diversidade de ambientes que existem dentro das galáxias, possibilita rastrear toda a gama de condições sob as quais nuvens de gás, formadoras de estrelas, vivem no Universo atual. Isto permite medir o impacto que muitas variáveis diferentes têm na formação estelar. 

O modo como as estrelas se formam, e como a sua galáxia afeta esse processo, são aspetos fundamentais da astrofísica. Foi descoberto que as propriedades das nuvens de formação estelar dependem de onde estão localizadas: as nuvens nas densas regiões centrais das galáxias tendem a ser mais densas, mais massivas e mais turbulentas do que as nuvens que residem nos arredores tranquilos de uma galáxia. O ciclo de vida das nuvens também depende do seu ambiente. A rapidez com que uma nuvem forma estrelas e o processo que em última análise acaba por destruí-la parecem depender de onde esta nuvem está localizada.

Esta não é a primeira vez que o ALMA observa berçários estelares em outras galáxias, mas quase todos os estudos anteriores focaram-se em galáxias individuais ou em parte de uma. Durante um período de cinco anos, o PHANGS montou uma visão completa da população de galáxias próximas. O projeto PHANGS é uma nova forma de cartografia cósmica que nos permite ver a diversidade das galáxias com outras características. 

O novo atlas não significa o fim da viagem. Embora o levantamento tenha respondido a perguntas sobre o quê e onde, levantou outras. Ainda não é conhecido porquê ou como estas variações afetam as estrelas e os planetas formados.

Dez artigos que relatam os resultados do levantamento PHANGS foram apresentados na 238.ª reunião da Sociedade Astronômica Americana.

Fonte: National Radio Astronomy Observatory

sexta-feira, 18 de junho de 2021

Região colorida em Sagitário

O campo da NGC 6559 em Sagitário mostra nebulosas de emissão brilhantes vermelhas, nebulosas de absorção escuras e nebulosas de reflexão azul de poeira, rodeadas pelas estrelas formadas a partir delas.

© Miguel Claro (NGC 6559, IC 1274, IC 1275 e B91)

No centro da cena estão IC 1274 e IC 1275, regiões circulares vermelhas separadas por uma borda de nebulosidade de reflexão azul apresentada acima da grande nebulosa escura B91. 

No canto superior direito está NGC 6559, uma região de nuvens rica em gás quente brilhante. A nebulosa azul visível está refletindo a luz de um grupo de enormes estrelas azuis.

Fonte: Astronomy

Resolvido o mistério da diminuição de brilho de Betelgeuse

Quando Betelgeuse, uma estrela brilhante de cor laranja da constelação de Órion, se tornou visivelmente mais escura no final de 2019 e início de 2020, a comunidade astronômica ficou intrigada.

© ESO/VLT (Betelgeuse)

Uma equipe de astrônomos acaba de publicar novas imagens da superfície da estrela, obtidas com o auxílio do Very Large Telescope (VLT) do ESO, que mostram claramente como é que o brilho desta estrela variou. Esta nova pesquisa revela que a estrela esteve parcialmente escondida por uma nuvem de poeira, uma descoberta que desvenda finalmente o mistério da “Grande Diminuição de Brilho” de Betelgeuse. A diminuição de brilho de Betelgeuse, uma variação observada, inclusive, a olho nu. 

Na ocasião, a equipe de Miguel Montargès, do Observatoire de Paris, França, apontou o Very Large Telescope (VLT) do ESO em direção desta estrela no final de 2019. Uma imagem de dezembro 2019, quando comparada com uma imagem anterior da estrela obtida em janeiro do mesmo ano, mostrou que a superfície estelar se encontrava significativamente mais escura, especialmente na região sul.

No entanto, os astrônomos não sabiam o porquê. A equipe continuou observando a estrela durante a sua “Grande Diminuição de Brilho”, captando duas novas imagens, nunca antes vistas, em janeiro de 2020 e em março de 2020. Em abril de 2020, Betelgeuse já havia retornado ao seu brilho normal.

As imagens são as únicas que possuímos que mostram a superfície de Betelgeuse variando de brilho ao longo do tempo. No novo estudo, a equipe revelou que a misteriosa diminuição de brilho foi causada por um véu de poeira que cobriu a estrela, o que, que por sua vez foi o resultado de uma queda na temperatura na superfície estelar de Betelgeuse. 

A superfície de Betelgeuse varia regularmente à medida que bolhas de gás se movem, encolhem e aumentam dentro da estrela. A equipe concluiu que algum tempo antes da Grande Diminuição de Brilho, a estrela ejetou uma enorme bolha de gás que se deslocou para longe. Quando uma parte da superfície esfriou pouco tempo depois, esta diminuição de temperatura foi suficiente para permitir a condensação deste gás em poeira sólida.

A poeira expelida por estrelas evoluídas frias, tais como esta ejeção, pode se transformar nos blocos constituintes de planetas terrestres e de vida. Em vez de ser apenas o resultado de uma ejeção de poeira, houve algumas especulações de que a queda de brilho de Betelgeuse poderia ser um sinal da sua morte iminente na forma de uma explosão de supernova.

Uma supernova não tem sido observada em nossa galáxia desde o século XVII, então os astrônomos atuais não têm certeza do que esperar de uma estrela na fase que antecede este evento explosivo. No entanto, este novo trabalho de pesquisa confirmou que a Grande Diminuição de Brilho de Betelgeuse não foi um sinal precoce de que a estrela estava caminhando para seu destino dramático.

A equipe usou o instrumento SPHERE (Spectro-Polarimetric High-contrast Exoplanet REsearch) montado no VLT do ESO para obter imagens de forma direta da superfície de Betelgeuse, juntamente com dados coletados pelo instrumento GRAVITY montado no Interferômetro do Very Large Telescope (VLTI), para monitorar a estrela ao longo da sua diminuição de brilho.

O estudo de Betelgeuse, uma estrela supergigante vermelha, poderá evoluir com o futuro Extremely Large Telescope (ELT) do ESO. 

Esta pesquisa foi apresentada no artigo “A dusty veil shading Betelgeuse during its Great Dimming” publicado na revista Nature.

Fonte: ESO

quarta-feira, 16 de junho de 2021

Água líquida em exoluas de planetas "fugitivos"

A água, no estado líquido, é o elixir da vida. Tornou a vida possível na Terra e é indispensável para a continuidade de sistemas vivos no planeta.

© Tommaso Grassi (ilustração de um exoplaneta fugitivo e sua exolua)

Isto explica a razão porque os cientistas estão constantemente à procura de evidências de água em outros corpos sólidos no Universo. No entanto, até agora a existência de água líquida em outros planetas além da Terra não está comprovada diretamente. Existem indícios de que várias luas nos confins do nosso próprio Sistema Solar, mais especificamente, Encélado em Saturno e três das luas de Júpiter (Ganimedes, Calisto e Europa) podem abrigar oceanos subterrâneos.

Quais são, então, as perspetivas para a detecção de água nas luas de planetas localizados além do nosso Sistema Solar? Em cooperação com colegas da Universidade de Concepción, no Chile, os físicos Barbara Ercolano e Tommaso Grassi da Universidade de Munique usaram métodos matemáticos para modelar a atmosfera e a fase gasosa química de uma lua em órbita de um planeta "fugitivo". Estes são planetas não associados a uma estrela (também chamados planetas interestelares).

Os planetas interestelares são de interesse principalmente porque as evidências indicam que existem muitos por aí. Estimativas conservadoras sugerem que a nossa própria Galáxia hospeda pelo menos tantos planetas "fugitivos" do tamanho de Júpiter quanto estrelas, e a própria Via Láctea é o lar de mais de 100 bilhões de estrelas.

Ercolano e Grassi utilizaram um modelo de computador para simular a estrutura térmica da atmosfera de uma exolua do mesmo tamanho da Terra em órbita de um planeta nômade. Os seus resultados sugerem que a quantidade de água presente à superfície da lua seria cerca de 10.000 vezes menor do que o volume total dos oceanos do nosso planeta, mas 100 vezes mais do que a encontrada na atmosfera da Terra. Isto seria suficiente para permitir que a vida evoluísse e prosperasse. 

O modelo do qual esta estimativa foi derivada consiste de uma lua do tamanho da Terra e de um planeta interestelar do tamanho de Júpiter. Espera-se que tal sistema, que não tem nenhuma companheira estelar nas proximidades, seja escuro e frio. Ao contrário do nosso Sistema Solar, não existe uma estrela central que possa servir como uma fonte confiável de energia para impulsionar as reações químicas. Em vez disso, no modelo dos pesquisadores, os raios cósmicos fornecem o impulso químico necessário para converter o hidrogênio molecular e o dióxido de carbono em água e outras substâncias. 

Para manter o sistema "agitado", os autores invocam as forças das marés exercidas pelo planeta sobre a sua lua como uma fonte de calor, e assumindo que o dióxido de carbono é responsável por 90% da atmosfera da lua, o efeito estufa resultante reteria efetivamente uma grande parte do calor gerado na lua. Juntas, estas fontes energéticas seriam suficientes para manter a água no estado líquido.

Um artigo foi publicado no periódico International Journal of Astrobiology.

Fonte: Universität München

terça-feira, 15 de junho de 2021

Descoberta a mais antiga "tempestade" de um buraco negro

Pesquisadores, recorrendo ao ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array), descobriram um vento galáctico titânico impulsionado por um buraco negro supermassivo há 13,1 bilhões de anos.

© ALMA (galáxia J1243+0100)

A distribuição do gás "calmo" na galáxia é vista a amarelo, e a distribuição do vento galáctico de alta velocidade é mostrado a azul. O vento está localizado no centro da galáxia, o que indica que o buraco negro supermassivo impulsiona-o.

Este é o exemplo mais antigo até agora observado de tal vento e é um sinal revelador de que os buracos negros enormes têm um efeito profundo no crescimento das galáxias desde o início da história do Universo. No centro de muitas galáxias grandes esconde-se um buraco negro supermassivo que é milhões a bilhões de vezes mais massivo do que o Sol.

Curiosamente, a massa do buraco negro é aproximadamente proporcional à massa da região central (bojo) da galáxia no Universo próximo. À primeira vista, isto pode parecer óbvio, mas na realidade é muito estranho. A razão é que os tamanhos das galáxias e dos buracos negros diferem em cerca de dez ordens de magnitude. Com base nesta relação proporcional entre as massas de dois objetos de tamanhos tão diferentes, os astrônomos pensam que as galáxias e os buracos negros cresceram e evoluíram juntos (coevolução) por meio de algum tipo de interação física. 

Um vento galáctico pode fornecer este tipo de interação física entre buracos negros e galáxias. Um buraco negro supermassivo engole uma grande quantidade de matéria. Conforme esta matéria começa a mover-se a alta velocidade devido à gravidade do buraco negro, ela emite energia intensa, que pode empurrar a matéria circundante para fora. É assim que o vento galáctico é criado.

"A questão é saber quando os ventos galácticos passaram a existir no Universo," diz Takuma Izumi, autor principal do artigo científico e pesquisador do NAOJ (National Astronomical Observatory of Japan). "Esta é uma questão importante porque está relacionada com um problema importante na astronomia: como é que as galáxias e os buracos negros supermassivos coevoluíram?"

Os pesquisadores usaram primeiro o telescópio Subaru do NAOJ para procurar buracos negros supermassivos. Graças à sua capacidade de observação de campo amplo, encontraram mais de 100 galáxias com buracos negros supermassivos no Universo há mais de 13 bilhões de anos.

Em seguida, foi usada a alta sensibilidade do ALMA para investigar o movimento do gás nas galáxias hospedeiras dos buracos negros. O ALMA observou a galáxia HSC J124353.93+010038.5 (J1243+0100 para abreviar), descoberta pelo telescópio Subaru, e captou ondas de rádio emitidas pela poeira e por íons de carbono na galáxia.

A análise detalhada dos dados do ALMA revelou que em J1243+0100 existe um fluxo de gás de alta velocidade, movendo-se a 500 km por segundo. Este fluxo gasoso tem energia suficiente para afastar o material estelar da galáxia e interromper a atividade de formação estelar. 

O fluxo de gás encontrado neste estudo é verdadeiramente um vento galáctico, e é o exemplo mais antigo observado de uma galáxia com um vento enorme de tamanho galáctico. O detentor anterior do recorde era uma galáxia há cerca de 13 bilhões de anos, de modo que esta observação empurra o início outros 100 milhões de anos.

A equipe também mediu o movimento do gás silencioso em J1243+0100 e estimou a massa do bojo da galáxia, com base no seu equilíbrio gravitacional, em cerca de 30 bilhões de massas solares. A massa do buraco negro supermassivo da galáxia, estimada por outro método, equivale a 1% deste valor. 

A proporção da massa do bojo para a do buraco negro supermassivo nesta galáxia é quase idêntica à proporção da massa dos buracos negros para a das galáxias no Universo moderno. Isto implica que a coevolução dos buracos negros supermassivos e das galáxias vem ocorrendo desde menos de um bilhão de anos após o nascimento do Universo.

"As nossas observações suportam recentes simulações de computador de alta precisão que previram que as relações coevolucionárias existiam mesmo há cerca de 13 bilhões de anos," comenta Izumi. "Estamos planejando observar um grande número de tais objetos no futuro e esperamos esclarecer se a coevolução primordial vista neste objeto é ou não uma imagem precisa do Universo naquela época."

Fonte: National Astronomical Observatory of Japan