terça-feira, 27 de setembro de 2016

Hubble avista possíveis plumas de água em Europa

Usando o telescópio epacial Hubble da NASA, astrônomos captaram o que podem ser plumas de vapor de água em erupção à superfície da lua de Júpiter, Europa.

plumas em Europa

© STScI/Hubble (plumas em Europa)

A imagem de Europa, sobreposta nos dados do Hubble, foi construída com dados das sondas Galileo e das Voyager.

Este achado reforça outras observações do Hubble que sugerem que a lua gelada tem plumas de vapor de água de alta altitude. A observação aumenta a possibilidade de que missões a Europa sejam capazes de explorar o oceano da lua sem ter que perfurar quilômetros de gelo.

"O oceano de Europa é considerado um dos lugares mais promissores que podem, potencialmente, abrigar vida no Sistema Solar," afirma Geoff Yoder, administrador associado do Diretorado de Missões Científicas da NASA em Washington, EUA. "Estas plumas, se realmente existem, podem fornecer outra maneira de 'provar' a subsuperfície de Europa."

As plumas têm uma altura estimada em 200 km antes de, presumivelmente, choverem de volta para a superfície de Europa. Europa tem um enorme oceano global que contém o dobro da água dos oceanos da Terra, mas está protegido por uma camada de gelo extremamente frio e duro e de espessura desconhecida. As plumas oferecem uma oportunidade tentadora para recolher amostras provenientes do subsolo sem ter que pousar ou perfurar o gelo.

A equipe, liderada por William Sparks do Space Telescope Science Institute (STScI), viu estas projeções enquanto observava o limbo de Europa à medida que a lua passava em frente de Júpiter.

O objetivo original da proposta de observação era determinar se Europa tem uma atmosfera fina e estendida, ou exosfera. Usando o mesmo método de observação que detecta atmosferas em torno de planetas em órbita de outras estrelas,  percebeu-se que se houvesse liberação de vapor de água a partir da superfície de Europa, esta observação seria uma excelente maneira de a captar.

"A atmosfera de um exoplaneta bloqueia parte da luz estelar que está por trás," explica Sparks. "Se houver uma fina atmosfera ao redor de Europa, tem potencial para bloquear alguma da luz de Júpiter, e podíamos vê-la como uma silhueta. E assim fomos à procura de características de absorção em torno do limbo de Europa, enquanto o satélite passava em frente de Júpiter."

Em 10 ocorrências separadas abrangendo 15 meses, a equipe observou Europa passando em frente de Júpiter. Eles viram o que podem ser plumas em erupção em três dessas ocasiões.

Este trabalho fornece elementos comprovativos para plumas de água em Europa. Em 2012, a equipe liderada por Lorenz Roth do Southwest Research Institute (SwRI) detectou evidências de vapor de água em erupção a partir das frias regiões polares sul de Europa e alcançando mais de 160 km para o espaço. Embora ambas as equipes tenham usado o instrumento Space Telescope Imaging Spectrograph (STIS) do Hubble, cada uma usou um método independente para chegar à mesma conclusão.

Mas, até agora, as duas equipes ainda não detectaram as plumas usando as suas técnicas independentes simultaneamente. As observações sugerem que as plumas podem ser altamente variáveis, o que significa que podem entrar esporadicamente em erupção por algum tempo e depois desaparecer. Por exemplo, as observações da equipe de Roth, separadas das detecções da equipe de Sparks por menos de uma semana, não detectaram quaisquer plumas.

A ser confirmado, Europa será a segunda lua no Sistema Solar em que se sabe existirem plumas de vapor de água. Em 2005, a sonda Cassini detectou jatos de vapor de água e poeira expelidos a partir da superfície da lua de Saturno, Encélado.

Os cientistas podem usar a visão infravermelha do telescópio Espacial James Webb da NASA, com lançamento previsto para 2018, para confirmar a atividade de plumas em Europa. A NASA também está formulando uma missão a Europa com uma carga que poderá confirmar a presença de plumas e estudá-las de perto durante vários voos rasantes.

O trabalho de Sparks e colegas será publicado na edição de 29 de setembro da revista The Astrophysical Journal.

Fonte: Space Telescope Science Institute

O possível oceano subterrâneo de Plutão

Desde que a sonda New Horizons da NASA passou por Plutão no ano passado que existem cada vez mais evidências de que o planeta anão poderá ter um oceano líquido por baixo da sua concha gelada.

Plutão

© NASA/APL/SwRI (Plutão)

Agora, através de modelos da dinâmica do impacto que criou uma grande cratera à superfície de Plutão, uma equipe de pesquisadores fez uma nova estimativa da espessura dessa camada de líquido.

Os pesquisadores, liderado pelo geólogo Brandon Johnson da Universidade de Brown, descobriram uma probabilidade alta para a existência de uma camada de água líquida com mais de 100 km por baixo da superfície de Plutão. A pesquisa também fornece pistas sobre a composição desse oceano, sugerindo que tem provavelmente um teor de sal semelhante ao do Mar Morto.

"Os modelos térmicos do interior de Plutão e evidências tectônicas descobertas à superfície sugerem a existência de um oceano subsuperficial, mas não é fácil inferir o seu tamanho ou qualquer outra característica," afirma Johnson. "Temos sido capazes de colocar algumas restrições na espessura e obter algumas pistas sobre a composição."

A pesquisa focou-se em Sputnik Planum, uma bacia com 900 km de diâmetro que compõe o lóbulo oeste da famosa característica em forma de coração revelada durante o voo rasante da New Horizons. A bacia parece ter sido criada por um impacto, provavelmente por um objeto com 200 km de diâmetro ou maior.

A história de como a bacia está relacionada com o hipotético oceano de Plutão começa com a sua posição no planeta relativamente à maior lua de Plutão, Caronte. Plutão e Caronte sofrem de bloqueio de marés, o que significa que mostram sempre a mesma face, um ao outro, à medida que giram. Sputnik Planum está posicionada diretamente no eixo das marés que liga os dois mundos. Esta posição sugere que a bacia tem o que se chama de anomalia positiva de massa, ou seja, tem mais massa do que a média da crosta gelada de Plutão. À medida que a gravidade de Caronte atrai Plutão, puxaria proporcionalmente mais as áreas com mais massa, o que inclinaria o planeta até que Sputnik Planum se tornasse alinhada com o eixo das marés.

Mas uma anomalia positiva de massa tornaria Sputnik Planum uma espécie de característica bizarra no que toca a crateras.

"Uma cratera de impacto é basicamente um buraco no chão," comenta Johnson. "Pegamos num monte de material e lançamo-lo fora, por isso seria de esperar uma anomalia negativa de massa, mas não é o que vemos com Sptunik Planum. Isto levou as pessoas a pensar como é que se podia obter esta anomalia positiva de massa."

Parte da resposta é que, depois da formação, a bacia foi parcialmente preenchida por nitrogênio gelado. A camada de gelo adiciona alguma massa à bacia, mas não é espessa o suficiente, por si só, para fazer com que Sputnik Planum tenha massa positiva, realça Johnson. O resto da massa pode ser gerada por um líquido oculto sob a superfície.

Como uma bola de boliche deixada cair sobre um trampolim, um grande impacto cria uma depressão à superfície do planeta, seguida por um ressalto. Este ressalto puxa material para cima a partir do interior do planeta. Se esse material reemergido é mais denso do que o que foi expelido pelo impacto, a cratera acaba por ter a mesma massa que tinha antes do impacto. Este é um fenômeno que os geólogos chamam de compensação isostática.

A água é mais densa que o gelo. Portanto, caso exista uma camada de água líquida por baixo da concha gelada de Plutão, esta poderá ter brotado após o impacto de Sputnik Planum, equilibrando a massa da cratera. Caso a bacia tenha começado com massa neutra, então a camada de nitrogênio depositada mais tarde seria suficiente para criar uma anomalia positiva de massa.

"Este cenário requer um oceano líquido," afirma Johnon. "Queríamos correr modelos de computador do impacto para ver se isto é algo que realmente podia acontecer. O que descobrimos é que a produção de uma anomalia positiva de massa é realmente muito sensível à espessura da camada oceânica. É também sensível ao teor de sal desse oceano, pois o teor de sal afeta a densidade da água."

Os modelos simularam o impacto de um objeto grande o suficiente para formar uma bacia do tamanho de Sputnik Planum que atingia Plutão a uma velocidade esperada para esta zona do Sistema Solar. A simulação assumiu várias espessuras da camada de água por baixo da crosta, desde a ausência de água até uma camada com 200 km de espessura.

O cenário que melhor reconstruiu o tamanho e profundidade observada de Sputnik Planum, além de produzir uma cratera com massa compensada, foi o cenário no qual Plutão tem uma camada oceânica com mais de 100 km de espessura e uma salinidade de aproximadamente 30%.

À medida que os cientistas continuam a estudar os dados enviados pela New Horizons, Johnson espera que surja uma imagem mais clara do possível oceano de Plutão.

O estudo foi publicado na revista Geophysical Research Letters.

Fonte: Brown University

sábado, 24 de setembro de 2016

As observações milimétricas mais profundas do Universo primordial

Duas equipes internacionais de astrônomos utilizaram o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) para explorar o Universo distante revelado pela primeira vez nas icônicas imagens do Hubble Ultra Deep Field (HUDF).

o ALMA explora o Campo Ultra Profundo do Hubble

© ESO/NAOJ/NRAO/NASA/ESA (o ALMA explora o Campo Ultra Profundo do Hubble)

Estas novas observações do ALMA são significativamente mais profundas e nítidas do que rastreios anteriores feitos nos comprimentos de onda milimétricos e mostram claramente a relação inequívoca que existe entre a taxa de formação estelar em galáxias jovens e a sua massa total de estrelas. As observações mostram igualmente as anteriormente desconhecidas abundâncias do gás que está formando estrelas em diferentes épocas, fornecendo assim novos conhecimentos sobre a “Idade de Ouro” da formação de galáxias, a qual ocorreu há aproximadamente 10 bilhões de anos.

Os resultados estão entre os que serão apresentados esta semana na conferência Half a Decade of ALMA (Meia Década com o ALMA), realizada em Palm Springs, Califórnia, nos EUA.

Em 2004, as imagens do HUDF, pioneiras nas observações de campo profundo do telescópio espacial Hubble da NASA/ESA, foram publicadas. Estas imagens exploravam o céu muito mais profundamente do que o que tinha sido feito até então e revelavam uma enorme quantidade e variedade de galáxias que podiam ser vistas até menos de um bilhão de anos depois do Big Bang. Esta área do céu foi observada várias vezes pelo Hubble e por muitos outros telescópios, o que resultou na imagem mais profunda do Universo obtida até então.

Astrônomos usaram agora o ALMA para mapear, pela primeira vez na região dos comprimentos de onda do milímetro, esta janela para o Universo distante, correspondente uma área do céu aparentemente comum mas muito estudada. Os astrônomos escolheram especificamente uma região do espaço situada na tênue constelação austral da Fornalha como área de estudo, de modo a que telescópios terrestres colocados no hemisfério sul, como é o caso do ALMA, pudessem observar a região, expandindo assim o nosso conhecimento do Universo muito longínquo. Este mapeamento foi feito de modo profundo e bastante nítido, o que permitiu observar o fraco brilho emitido pelas nuvens de gás e também a emissão da poeira quente existente nas galáxias do Universo primordial.

O ALMA observou o HUDF cerca de 50 horas no total até agora, o que corresponde à maior quantidade de tempo de observação do ALMA passado numa única região do céu.

Uma das equipes, liderada por Jim Dunlop (University of Edinburgh, Reino Unido), utilizou o ALMA para obter a primeira imagem profunda e homogênea de uma região tão grande como o HUDF. Estes dados permitiram ajustar claramente as galáxias detectadas pelo ALMA com objetos já observados pelo Hubble ou por outras infraestruturas.

Este estudo mostrou claramente pela primeira vez que a massa estelar de uma galáxia é o fator que melhor prevê a taxa de formação estelar no Universo com elevado desvio para o vermelho. A equipe detectou essencialmente todas as galáxias de elevada massa e virtualmente mais nada.

Jim Dunlop, enfatiza a importância desta descoberta: “Este é um avanço revolucionário, pois pela primeira vez conseguimos ligar claramente as imagens visíveis e ultravioletas do Universo distante observadas pelo Hubble com as imagens  no infravermelho longínquo e milímetro obtidas com o ALMA.”

A segunda equipe, liderada por Manuel Aravela do Núcleo de Astronomía, Universidad Diego Portales, Santiago do Chile, e por Fabian Walter do Instituto Max Planck de Astronomia em Heidelberg, na Alemanha, conduziu uma busca mais profunda em cerca de um sexto do campo total do HUDF. Esta região do céu é cerca de 700 vezes menor que a área do disco da Lua Cheia vista a partir da Terra. Um dos aspectos mais surpreendentes do HUDF foi o vasto número de galáxias encontradas numa fração tão pequena do céu.

“Realizamos a primeira busca tridimensional feita sem focar em nenhum objeto em particular de gás frio no Universo primordial,” disse Chris Carilli, astrônomo do National Radio Astronomy Observatory (NRAO), em Socorro, Novo Mexico, EUA, e membro da equipe de pesquisadores. “Deste modo, descobrimos uma população de galáxias que não apareceu de forma nada evidente em qualquer outro rastreio profundo do céu.”

Algumas das novas observações ALMA foram especificamente concebidas para detectar galáxias ricas em monóxido de carbono, o qual indica regiões onde se prepara a formação estelar. Estes reservatórios de gás molecular, que dão origem a formação estelar nas galáxias, são muitas vezes difíceis de detectar com o Hubble. O ALMA pode por isso ajudar a revelar a “metade que falta” do processo de formação e evolução das galáxias.

“Os novos resultados do ALMA apontam para um rápido aumento no conteúdo de gás das galáxias à medida que olhamos para trás no tempo,” acrescenta Manuel Aravela. “Este aumento do conteúdo de gás é provavelmente a causa principal do aumento das taxas de formação estelar durante a época principal de formação de galáxias, a qual ocorreu há cerca de 10 bilhões de anos atrás.”

Os resultados apresentados agora são apenas o início de uma série de observações futuras do ALMA para investigar o Universo distante. Por exemplo, está planejada uma campanha de observação de 150 horas do HUDF para termos mais indícios sobre a potencial história de formação estelar no Universo.

Este trabalho foi descrito em vários artigos científicos que serão publicados nas revistas especializadas Monthly Notices of the Royal Astronomical Society e Astrophysical Journal.

Fonte: ESO

sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Encontrado exoplaneta em sistema binário por microlente gravitacional

Um planeta distante em órbita de duas estrelas, descoberto pela sua distorção do espaço-tempo, foi confirmado usando observações do telescópio espacial Hubble da NASA/ESA.

ilustração de um gigante gasoso em órbita de um par de anãs vermelhas

© STScI/G. Bacon (ilustração de um gigante gasoso em órbita de um par de anãs vermelhas)

A massa do planeta provocou o que é conhecido como evento de microlente gravitacional, onde a luz é "dobrada" pelo campo gravitacional de um objeto. O evento foi observado em 2007, fazendo deste evento o primeiro planeta circumbinário confirmado após a detecção deste fenômeno.

A maioria dos exoplanetas detectados até agora orbitam estrelas individuais. Até à data só foram descobertos alguns planetas circumbinários, planetas em órbita de duas estrelas. A maioria destes foram detectados pela missão Kepler da NASA, que usa o método de trânsito para a detecção.

Este recém-descoberto planeta, no entanto, é muito invulgar. "O exoplaneta foi observado como um evento de microlente em 2007. Uma análise detalhada revelou um terceiro corpo de lente para além da estrela e do planeta, bastante óbvios nos dados," afirma David Bennett do NASA Goddard Space Flight Center da NASA, EUA, autor principal do estudo.

O evento, OGLE-2007-BLG-349, foi detectado usando a experiência OGLE (Optical Gravitational Lensing Experiment), que procura e observa os efeitos de pequenas distorções do espaço-tempo, provocadas por estrelas e exoplanetas, que foram previstas por Einstein na sua teoria da Relatividade Geral. Estas pequenas distorções são conhecidas como microlentes gravitacionais.

O sistema binário está localizado a 8.000 anos-luz de distância na direção do centro da Via Láctea. O planeta orbita a aproximadamente 480 milhões de quilômetros da dupla estelar, mais ou menos a distância do Cinturão de Asteroides ao Sol. Completa uma órbita em torno das estrelas a cada sete anos. As duas anãs vermelhas estão separadas por apenas 11 milhões de quilômetros, ou 14 vezes o diâmetro da órbita da Lua ao redor da Terra.

No entanto, a observação OGLE não podia confirmar os detalhes do evento OGLE-2007-BLG-349 por si só, especialmente a natureza do terceiro corpo desconhecido. Um número de modelos podia ter explicado a curva de luz observada. Os dados adicionais do Hubble foram essenciais para permitir com que os cientistas fixassem um planeta circumbinário como a única explicação possível tanto para a curva de luz OGLE como para as observações do Hubble.

"O OGLE já detectou mais de 17.000 eventos de microlente gravitacional, mas esta é a primeira vez que tal evento foi provocado por um sistema planetário circumbinário," explica Andrzej Udalski da Universidade de Varsóvia, na Polônia.

Esta descoberta pioneira sugere algumas possibilidades intrigantes. Enquanto o Kepler tende a detectar planetas com órbitas pequenas, e todos os planetas circumbinários que descobriu estão muito perto do limite inferior de uma órbita estável, as microlentes gravitacionais permitem encontrar planetas a distâncias muito maiores em relação às suas estrelas hospedeiras.

"Esta descoberta sugere que precisamos de repensar a nossa estratégia de observação no que se refere a eventos de lentes binárias estelares," explica Yiannis Tsapras, do Astronomisches Recheninstitut em Heidelberg, Alemanha. "Esta é uma emocionante nova descoberta para o campo das microlentes."

Agora que a equipe mostrou que as microlentes gravitacionais podem detectar com êxito os eventos provocados por planetas circumbinários, o Hubble poderá desempenhar um papel essencial neste novo reino da busca por exoplanetas.

Fonte: ESA

quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Os segredos de uma bolha espacial gigante

Uma equipe internacional de astrônomos usou o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), o Very Large Telescope (VLT) do ESO e outros telescópios, para descobrir a verdadeira natureza de um objeto raro no Universo distante, chamado Bolha de Lyman-alfa.

simulação de computador de uma Bolha de Lyman-alfa

© J.Geach/D.Narayanan/R.Crain (simulação de computador de uma Bolha de Lyman-alfa)

Até agora, os astrônomos não compreendiam o que é que fazia estas enormes nuvens de gás brilhar tão intensamente, mas o ALMA viu agora duas galáxias no coração de um destes objetos, galáxias estas que estão formando estrelas a um ritmo muito acelerado, fazendo brilhar todo o meio ao seu redor. Estas enormes galáxias estão por sua vez no centro de um conjunto de galáxias menores, no que parece ser a fase inicial de formação de um aglomerado de galáxias massivo. As duas fontes ALMA deverão evoluir numa única galáxia elíptica gigante.

As Bolhas de Lyman-alfa são enormes nuvens de hidrogênio gasoso com dimensões que podem ir até às centenas de milhares de anos-luz e que se encontram a grandes distâncias cósmicas. O nome reflete o comprimento de onda característico da radiação ultravioleta que emitem, conhecida por radiação de Lyman-alfa.

Os elétrons carregados negativamente que orbitam os núcleos carregados positivamente de um átomo possuem níveis de energia quantificados, isto é, apenas podem existir em determinados estados de energia, e apenas podem transitar entre os diversos níveis ganhando ou perdendo quantidades precisas de energia. A radiação de Lyman-alfa é produzida quando elétrons nos átomos de hidrogênio descem do segundo nível de energia mais baixo para o primeiro nível mais baixo. A quantidade exata de energia perdida é emitida sob a forma de radiação num comprimento de onda particular, na região ultravioleta do espectro, a qual os astrônomos conseguem detectar com telescópios no espaço ou com telescópios na Terra, no caso de objetos que se encontrem desviados para o vermelho. Desde a descoberta destes objetos, os processos que lhes dão origem têm constituído um quebra-cabeças astronômico. Novas observações obtidas agora com o ALMA acabam de resolver o mistério.

Uma das maiores Bolhas de Lyman-alfa conhecidas e estudadas com muito detalhe é a SSA22-Lyman-alfa 1, ou LAB-1. Situada no núcleo de um enorme aglomerado de galáxias na fase inicial de formação, este foi o primeiro objeto do tipo a ser descoberto, em 2000, e localiza-se tão longe que a sua luz demorou 11,5 bilhões de anos para chegar até nós. Para LAB-1, com um desvio para o vermelho de z ~ 3, a radiação de Lyman-alfa é observada na região do visível.

Uma equipe de astrônomos, liderada por Jim Geach, do Centre for Astrophysics Research of the University of Hertfordshire, RU, utilizou a capacidade sem precedentes do ALMA para investigar a LAB-1, observando a radiação emitida por nuvens de poeira fria em galáxias distantes, o que permitiu localizar e resolver várias fontes de emissão submilimétrica.

A equipe combinou em seguida as imagens ALMA com observações obtidas com o instrumento Multi Unit Spectroscopic Explorer (MUSE), montado no VLT, as quais mapeiam a radiação Lyman-alfa. Isto mostrou que as fontes ALMA estão localizadas mesmo no centro da Bolha de Lyman-alfa, onde se encontram formando estrelas a uma taxa cerca de 100 vezes maior que a da Via Láctea.

Adicionalmente, imagens profundas obtidas com o telescópio espacial Hubble da NASA/ESA e espectroscopia do observatório W. M. Keck mostraram que as fontes ALMA estão rodeadas por numerosas galáxias companheiras muito fracas, que podem estar bombardeando-as com material, ajudando assim a aumentar as taxas de formação estelar nas fontes ALMA centrais.

A equipe fez em seguida uma sofisticada simulação de formação galáctica para demonstrar que a enorme nuvem brilhante de emissão Lyman-alfa pode ser explicada se radiação ultravioleta produzida pela formação estelar nas fontes ALMA for dispersada pelo hidrogênio gasoso ao seu redor. Este efeito daria origem à Bolha de Lyman-alfa que observamos.

Jim Geach, autor principal do novo estudo, explica: “Pensemos nas luzes da rua numa noite de nevoeiro, vemos um brilho difuso porque a luz é dispersada pelas minúsculas gotas de água. Algo semelhante acontece aqui, exceto que a luz da rua é uma galáxia formando estrelas com muita intensidade e o nevoeiro é uma enorme nuvem de gás intergaláctico. As galáxias iluminam o meio ao seu redor.”

Compreender como é que as galáxias se formam e evoluem é um enorme desafio. Os astrônomos pensam que as Bolhas de Lyman-alfa são importantes porque parecem ser os locais onde a maioria das galáxias massivas do Universo se formam. Em particular, o brilho extenso de Lyman-alfa fornece informações sobre o que está acontecendo nas nuvens de gás primordial que rodeiam as jovens galáxias, uma região muito difícil de estudar, mas critica para a compreensão destes fenômenos.

Jim Geach conclui, “O que é excitante nestas Bolhas é que estamos vendo o que se passa em torno destas jovens galáxias em crescimento. Durante muito tempo, a origem desta radiação extensa de Lyman-alfa permaneceu controversa. No entanto, combinando novas observações e simulações de vanguarda, pensamos ter resolvido um mistério de 15 anos: a Bolha de Lyman-alfa 1 é o local de formação de uma galáxia elíptica gigante, que um dia será o coração de um enorme aglomerado de galáxias. Estamos vendo uma fotografia da formação dessa galáxia há 11,5 bilhões de anos atrás.”

Este trabalho foi descrito no artigo científico intitulado “ALMA observations of Lyman-α Blob 1: Halo sub-structure illuminated from within” de J. Geach et al., que será publicado na revista especializada Astrophysical Journal.

Fonte: ESO

terça-feira, 20 de setembro de 2016

A Nebulosa da Hélice em infravermelho

O que faz este olho cósmico parecer tão vermelho? Poeira.

NGC 7293

© Spitzer/Judy Schmidt (NGC 7293)

A imagem acima foi feita pelo telescópio espacial Spitzer e mostra a luz infravermelha da bem estudada Nebulosa da Hélice, a NGC 7293, localizada a cerca de 700 anos-luz de distância da Terra na constelação de Aquarius.

O escudo de poeira e gás com dois anos-luz de diâmetro ao redor da anã branca central é considerado um belo exemplo de uma nebulosa planetária, que representa os estágios finais da evolução de estrelas parecidas com o Sol. Mas os dados do Spitzer mostram que a estrela central da nebulosa está imersa num surpreendente brilho infravermelho intenso.

Os modelos sugerem que o brilho é produzido por um disco de detritos de poeira. Mesmo que o material nebular tenha sido ejetado da estrela a muito milhares de anos atrás, a poeira pode ter sido gerada por colisões ocorridas em reservatórios de objetos análogos ao Cinturão de Kuiper ou à Nuvem de Oort do Sistema Solar.

Se os objetos parecidos com cometas tivessem se formado no distante sistema planetário, eles teriam sobrevivido até mesmo aos dramáticos estágios finais da evolução da estrela.

Fonte: NASA

domingo, 18 de setembro de 2016

M33: a Galáxia do Triângulo

A pequena constelação do Triângulo reside nos céus do hemisfério norte e hospeda a magnifica galáxia espiral M33, cuja face está voltada para a Terra.

M33

© Giovanni Benintende (M33)

A M33 (NGC 598) também é denominada Galáxia do Catavento ou Galáxia do Triângulo. A galáxia espiral M33 foi descoberta por Giovanni Battista Hodierna antes de 1654, juntamente com o aglomerado aberto NGC 752.

A M33 possui mais de 50.000 anos-luz de diâmetro, e é a terceira maior do Grupo Local de galáxias após a galáxia de Andrômeda (M31) e a nossa própria Via Láctea. A cerca de 3 milhões de anos-luz da Via Láctea, a M33 é provavelmente um satélite da Galáxia de Andrômeda. É provável que tenha uma galáxia satélite, a galáxia anã de Pisces, embora também seja provável que a própria Galáxia do Triângulo esteja ligada gravitacionalmente a Andrômeda.

A M33 está se aproximando radialmente do Sistema Solar a uma velocidade de 182 km/s; descontando a velocidade orbital do Sol em torno da Via-Láctea, a galáxia do Triângulo está se aproximando de nossa galáxia a 24 km/s. A sua maior e mais brilhante região HII, uma nebulosa difusa contendo hidrogênio ionizado, é a NGC 604.

A imagem composta nítida mostra aglomerados de estrelas azuis e regiões rosadas de formação estelar ao longo dos braços espirais da M33.

Como a M31, a população de estrelas variáveis contidas na M33 tornou-a um marco de medida cósmica no estabelecimento das escalas de distância do Universo.

Fonte: NASA

sábado, 17 de setembro de 2016

Conheça a estrela, conheça o planeta

No que se refere a exoplanetas, os astrônomos perceberam que só conhecem bem as propriedades dos planetas que descobrem se conhecerem, igualmente bem, as propriedades das estrelas que orbitam.

ilustração de planetas ao redor de uma anã vermelha

© NASA/JPL-Caltech (ilustração de planetas ao redor de uma anã vermelha)

Para o tamanho de um planeta, a caracterização precisa da sua estrela hospedeira pode significar a diferença entre distinguirmos um mundo distante como sendo pequeno como a Terra ou grande como Júpiter.

A determinação do tamanho de um exoplaneta depende, decisivamente, não só do raio da sua estrela progenitora mas também se a estrela está sozinha ou se tem uma companheira estelar próxima. Considerando que metade das estrelas no céu não são uma, mas duas estrelas que se orbitam uma à outra, isto torna bastante importante o conhecimento das propriedades binárias de uma estrela.

Uma estrela particularmente interessante e relativamente próxima, de nome TRAPPIST-1, chamou recentemente a atenção de uma equipe de pesquisadores. Eles queriam determinar se TRAPPIST-1, que é o lar de três pequenos planetas potencialmente rochosos - um dos quais orbita na zona habitável onde a água líquida pode existir à sua superfície - era uma única estrela como o Sol, ou se tinha uma estrela companheira. Caso TRAPPIST-1 tivesse uma companheira, os planetas descobertos teriam tamanhos maiores, possivelmente grandes o suficiente para serem considerados gigantes gelados parecidos como Netuno.

Caso um exoplaneta orbite uma estrela num sistema binário, mas a luz estelar captada pelo telescópio seja originária de uma única estrela, o raio real do planeta será maior do que o medido. A diferença no tamanho medido do exoplaneta pode ser pequena, variando por 10%, ou superior a um fator de dois, dependendo do brilho da estrela companheira do sistema.

Para confirmar ou negar a natureza singular de TRAPPIST-1, Steve Howell, cientista do Ames Research Center da NASA, liderou uma investigação da estrela. Usando uma câmara especialmente desenhada, chamada DSSI (Differential Speckle Survey Instrument), Howell e equipe mediram as rápidas alterações na luz emitida pela estrela provocadas pela atmosfera da Terra e corrigiram-nas. A imagem resultante, de alta-resolução, revelou que a luz do sistema TRAPPIST-1 é emitida apenas por uma estrela.

Com a confirmação de que nenhuma outra estrela companheira reside nas imediações de TRAPPIST-1, o resultado valida não só que os planetas em trânsito são responsáveis pelas diminuições periódicas de brilho estelar, mas que são realmente do tamanho da Terra e, provavelmente, mundos rochosos.

"Saber que um planeta de tamanho terrestre, potencialmente rochoso, orbita na zona habitável de uma estrela a apenas 40 anos-luz da Terra, é uma descoberta incrível," comenta Howell. "O sistema TRAPPIST-1 continuará sendo estudado em grande detalhe enquanto estes exoplanetas em trânsito proporcionam uma das melhores oportunidades para caracterizar a atmosfera de um mundo alienígena."

Acoplado ao telescópio Gemini Sul de 8 metros, no Chile, a DSSI forneceu as imagens de mais alta-resolução, disponíveis atualmente, obtidas por um único telescópio terrestre. A proximidade de TRAPPIST-1 permitiu com que os astrônomos perscrutassem profundamente o sistema, observando, em termos equivalentes, mais perto do que a órbita de Mercúrio em torno do nosso Sol.

A TRAPPIST-1 é uma fraca estrela do tipo-M que, em relação à maioria das estrelas, é muito pequena e fria, mas torna mais fácil a detecção exoplanetária pelo método de trânsito.

Ainda este ano terão início medições mais detalhadas dos trânsitos planetários ao redor do sistema TRAPPIST-1, quando o telescópio espacial Kepler da NASA, atualmente na sua missão K2, monitorar com precisão mudanças minúsculas na luz emitida pela estrela durante um período de aproximadamente 75 dias.

As observações espaciais com o Kepler vão fornecer medições extremamente precisas das formas dos trânsitos planetários, permitindo refinar os raios e os períodos orbitais. A detecção de variações nos tempos dos eventos também poderá auxiliar  na determinação das massas dos planetas. Adicionalmente, as novas observações serão examinadas para procurar mais planetas em trânsito no sistema TRAPPIST-1.

A técnica usada pela DSSI é um trunfo poderoso de ferramentas utilizada pelos astrônomos, pois proporciona uma capacidade única para caracterizar o ambiente em torno de estrelas distantes. A técnica fornece imagens de altíssima resolução, obtendo múltiplas exposições com muito pouco tempo de exposição (40-60 milissegundos) a fim de captar os finos detalhes na luz recebida e "congelar" a turbulência provocada pela atmosfera da Terra.

Combinando os milhares de exposições e usando técnicas matemáticas para remover as distorções momentâneas provocadas pela atmosfera da Terra, o resultado final fornece uma resolução igual ao limite teórico do que o telescópio Gemini produziria caso não existisse uma atmosfera.

Howell e a sua equipe estão atualmente realizando a construção de dois novos instrumentos de interferometria. Um dos novos instrumentos será entregue ao telescópio WIYN de 3,5 metros localizado no Observatório Nacional de Kitt Peak perto de Tucson, Arizona, onde será usado no programa de investigação NN-EXPLORE. O outro está sendo desenvolvido para o telescópio Gemini Norte localizado em Mauna Kea, no Havaí.

Um artigo que dilvulga o resultado foi publicado na revista The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: Gemini Observatory

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

O mapa de bilhões de estrelas sugere um tesouro vindouro

O primeiro catálogo do satélite Gaia da ESA de bilhões de estrelas retrata a maior pesquisa de objetos celestes por todo o céu até à data.

versão anotada do mapa de estrelas da Via Láctea

© ESA/Gaia/DPAC (versão anotada do mapa de estrelas da Via Láctea)

A caminho de reunir o mais detalhado mapa 3D alguma vez composto da nossa Via Láctea, o Gaia já determinou a posição precisa no céu e o brilho de 1,142 bilhões de estrelas.

Como uma mostra do catálogo mais rico que virá ainda num futuro próximo, o lançamento divulgado esta semana apresenta as distâncias e os movimentos através do céu de mais de dois milhões de estrelas.

"O Gaia está na vanguarda da astrometria, cartografando o céu com precisões que nunca antes foram alcançadas", diz Álvaro Giménez, Diretor de Ciência da ESA.

Este trabalho fornece uma primeira impressão dos dados extraordinários que irão revolucionar a compreensão de como as estrelas estão distribuídas e se movem por toda a nossa Galáxia.

Lançado há 1.000 dias atrás, o Gaia iniciou os seus trabalhos científicos em julho de 2014. Esta primeira versão é baseada nos dados recolhidos durante os seus primeiros 14 meses de rastreamento do céu, até setembro de 2015.

As riscas e outros artefatos na imagem refletem como o Gaia rastreia o céu, e irão gradualmente desaparecer à medida que mais rastreamentos forem feitos durante a missão de cinco anos.

Transformar a informação bruta em posições estelares úteis e confiáveis para um nível de precisão nunca antes possível é um procedimento extremamente complexo.

Após processar o catálogo completo de bilhões de estrelas, os cientistas analisaram em detalhe os cerca de dois milhões de estrelas em comum entre os resultados do primeiro ano de Gaia e os Catálogos anteriores do Hipparcos e Tycho-2, ambos derivados da missão Hipparcos da ESA, que cartografou o céu há mais de duas décadas atrás.

Ao combinar os dados do Gaia com informações a partir desses catálogos menos precisos, foi possível começar a desembaraçar os efeitos de 'paralaxe' e 'movimento próprio', mesmo a partir do primeiro ano de observações. Paralaxe é um pequeno movimento na posição aparente de uma estrela causada pelo movimento anual da Terra em torno do Sol e depende da distância de uma estrela até nós, enquanto o movimento próprio é devido ao movimento físico das estrelas através da Galáxia.

Desta forma, os cientistas foram capazes de estimar distâncias e movimentos para os dois milhões de estrelas espalhados por todo o céu na combinação Tycho–Gaia Astrometric Solution (TGAS).

Este novo catálogo é duas vezes mais preciso e contém quase 20 vezes tantas estrelas como a anterior referência definitiva para a astrometria, o catálogo Hipparcos.

Como parte do seu trabalho em validar o catálogo, os cientistas Data Processing and Analysis Consortium (DPAC) têm realizado um estudo sobre aglomerados estelares abertos, grupos de estrelas relativamente jovens que nasceram juntas, que demonstra claramente a melhoria permitida pelos novos dados.

"Com o Hipparcos, só pudemos analisar a estrutura 3D e dinâmica de estrelas nas Híades, o aglomerado aberto mais próximo do Sol, e medir distâncias para cerca de 80 aglomerados até 1.600 anos-luz de nós", diz Antonella Vallenari do Instituto Nacional de Astrofísica (INAF) e do Observatório Astronómico de Pádua, Itália.

"Mas, com os primeiros dados do Gaia, é agora possível medir as distâncias e movimentos de estrelas em cerca de 400 aglomerados de até 4.800 anos-luz de distância.

Para os 14 aglomerados abertos mais próximos, os novos dados revelam muitas estrelas surpreendentemente longe do centro do aglomerado progenitor, provavelmente fugindo para preencher outras regiões da Galáxia.

Muitos mais aglomerados estelares serão descobertos e analisados em maior detalhe com os extraordinários dados que o Gaia continua recolhendo.

O novo censo estelar contém também 3.194 estrelas variáveis, estrelas que ritmicamente aumentam e diminuem de tamanho, levando a mudanças periódicas de brilho.

Muitas das variáveis observadas pelo Gaia encontram-se na Grande Nuvem de Magalhães, um dos nossos vizinhos galácticos, uma região que foi digitalizada várias vezes durante o primeiro mês de observações, permitindo uma medição precisa da mudança do seu brilho.

Detalhes sobre as variações de brilho destas estrelas, 386 das quais são novas descobertas, encontram-se publicadas como parte do lançamento, juntamente com um primeiro estudo para testar o potencial dos dados.

"Estrelas variáveis, tais como Cefeidas e RR Lyraes, são indicadores valiosos de distâncias cósmicas", explica Gisella Clementini do INAF e do Observatório Astronómico de Bolonha, Itália.

Enquanto a paralaxe é usada diretamente para medir distâncias de grandes amostras de estrelas na Via Láctea, as estrelas variáveis fornecem um passo indireto, mas crucial na nossa 'escala de distância cósmica', o que nos permite estendê-la a galáxias distantes.

Isto é possível porque alguns tipos de estrelas variáveis são especiais. Por exemplo, no caso das estrelas Cefeidas, quanto mais brilhantes são intrinsecamente, mais lenta será a variação no seu brilho. O mesmo é verdade para as RR Lyrae quando observadas à luz infravermelha. O padrão de variabilidade é fácil de medir e pode ser combinado com o brilho aparente de uma estrela para inferir o seu verdadeiro brilho.

É aqui que o Gaia entra em cena: no futuro, os cientistas serão capazes de determinar distâncias muito precisas para uma grande amostra de estrelas variáveis através de medições de paralaxe do Gaia. Com estas medições, os cientistas irão calibrar e melhorar a relação entre o período e o brilho dessas estrelas, e aplicá-lo para medir distâncias para além da nossa Galáxia. Uma aplicação preliminar dos dados do TGAS parece ser muito promissora.

Conhecer as posições e movimentos das estrelas no céu com uma surpreendente precisão é uma parte fundamental do estudo das propriedades e dos antecedentes da Via Láctea e para medir distâncias a estrelas e galáxias, mas tem também uma variedade de aplicações mais perto de casa, por exemplo, no Sistema Solar.

Em julho, Plutão passou à frente de uma estrela distante e fraca, oferecendo uma rara oportunidade para estudar a atmosfera do planeta anão à medida que a estrela desapareceu gradualmente e depois reapareceu atrás de Plutão.

Esta ocultação estelar foi apenas visível a partir de uma estreita faixa que se estende por toda a Europa, semelhante ao caminho total que um eclipse solar estabelece na superfície do nosso planeta. O conhecimento preciso da posição da estrela foi crucial para apontar os telescópios na Terra; assim, a excecional publicação antecipada da posição da estrela pelo Gaia, que foi 10 vezes mais precisa do que anteriormente disponível, foi fundamental para a monitorização bem-sucedida deste evento raro.

Os primeiros resultados sugerem uma pausa no intrigante aumento da pressão da tênue atmosfera de Plutão, algo que tem sido registado desde 1988, apesar do planeta anão estar se afastando do Sol, o que sugere uma queda de pressão devido ao arrefecimento da atmosfera.

Esta primeira versão de dados mostra que a missão está no bom caminho para atingir o seu objetivo final: cartografar as posições, distâncias e movimentos de bilhões de estrelas, cerca de 1% do conteúdo estelar da Via Láctea, em três dimensões e numa precisão sem precedentes.

Fonte: ESA

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Buraco negro esfomeado devolve galáxia brilhante à escuridão

O mistério da estranha mudança de comportamento de um buraco negro supermassivo situado no centro de uma galáxia distante foi resolvido por uma equipe internacional de astrônomos com o auxílio do Very Large Telescope (VLT) do ESO, do telescópio espacial Hubble da NASA/ESA e do observatório de raios X Chandra da NASA.

Markarian 1018

© ESO (Markarian 1018)

A equipe concluiu que o buraco negro está atravessando um período difícil, não sendo alimentado o suficiente para poder brilhar.

Muitas galáxias possuem um núcleo extremamente brilhante alimentado por um buraco negro supermassivo. Estes núcleos fazem das “galáxias ativas” uns dos objetos mais brilhantes do Universo. Pensa-se que resplandecem porque material quente brilha intensamente à medida que cai no buraco negro, um processo conhecido por acreção. Esta luz brilhante varia imensamente entre diferentes galáxias ativas, por isso os astrônomos classificaram-nas em diversos tipos segundo as propriedades da radiação que emitem. As galáxias ativas mais brilhantes são os quasares, objetos onde o núcleo brilhante ofusca completamente o resto da galáxia. Outra classe de galáxias menos extremas são as galáxias Seyfert. Originalmente, foi desenvolvido um método que usava o brilho e o espectro de emissão, o gráfico da intensidade da radiação emitida a diferentes comprimentos de onda, para distinguir entre dois tipos de galáxias Seyfert, os Tipos 1 e 2, mas posteriormente foram introduzidas classificações adicionais como, por exemplo, Seyferts de Tipo 1,9.

Observou-se que algumas destas galáxias variam drasticamente em períodos de apenas 10 anos; um piscar de olhos em termos astronômicos. No entanto, a galáxia ativa deste estudo, Markarian 1018, destaca-se por ter mudado de tipo uma segunda vez, voltando à sua classificação original nos últimos 5 anos. Observaram-se já algumas galáxias que apresentam também uma mudança completa de ciclo, no entanto nunca nenhuma tinha sido estudada em tantos detalhes.

A natureza instável de Markarian 1018 foi descoberta por acaso no rastreio CARS (Close AGN Reference Survey), um projeto de colaboração entre o ESO e outras organizações, que pretendeu juntar informação sobre 40 galáxias próximas com núcleos ativos. As observações de rotina de Markarian 1018 com o instrumento MUSE (Multi-Unit Spectroscopic Explorer), instalado no VLT revelaram uma mudança surpreendente na emissão de radiação da galáxia.

“Ficamos espantados com a mudança rara e drástica de Markarian 1018”, disse Rebecca McElroy, autora principal do artigo científico que descreve estes resultados e estudante de doutoramento da Universidade de Sydney e do ARC Centre of Excellence for All Sky Astrophysics (CAASTRO).

A observação ocasional desta galáxia tão perto da época em que começou a se apagar deu-nos a oportunidade inesperada de compreender como funcionam estas galáxias, como Bernd Husemann, líder do projeto e autor principal de dois artigos associados à descoberta, explica: ”Tivemos sorte em detectar este evento apenas 3 ou 4 anos após o início do declínio, o que nos possibilitou organizar campanhas de monitoramento para estudar os detalhes da física de acreção em galáxias ativas que, de outro modo, não poderiam ser estudados.”

A equipe de pesquisadores aproveitou esta oportunidade, tentando descobrir prioritariamente o processo que faz com que o brilho de Markarian 1018 varie de modo tão rápido. Este fenômeno pode ser causado por vários eventos astrofísicos, mas a equipe já descartou o efeito do buraco negro ter sugado e consumido uma estrela, assim como é pouco provável que esteja acontecendo obscurecimento por parte de gás ao seu redor. Um evento de perturbação de maré deste tipo ocorre quando uma estrela se aproxima muito de um buraco negro supermassivo, sendo destruída pelas enormes forças da gravidade. Isto resulta num forte aumento do brilho nas regiões centrais, que decai depois lentamente ao longo de alguns anos. As variações de brilho de Markarian 1018 não correspondem ao perfil deste evento. O obscurecimento por parte de gás pode afetar a classificação de uma galáxia ativa ao bloquear a linha de visão, num efeito semelhante ao de nevoeiro em frente aos faróis de um carro, atenuando assim a luz que passa através do gás. Este fenômeno afeta também o espectro da galáxia, podendo por isso modificar a sua classificação. O verdadeiro mecanismo responsável pela surprendente variação de Markarian 1018 permaneceu um mistério após a primeira rodada de observações.

No entanto, a equipe conseguiu coletar dados adicionais com tempo de observação no telescópio espacial Hubble e no observatório de raios X Chandra. Com estes novos dados o mistério acabou sendo resolvido; o buraco negro está se apagando lentamente porque já não tem material para acretar.

“É possível que esta falta de matéria se deva ao fato da entrada de combustível ter sido interrompida”, disse Rebecca McElroy. “Uma possibilidade intrigante é este efeito ser devido a interações com um segundo buraco negro supermassivo”. A existência de um tal sistema binário de buracos negros é uma possibilidade clara em Markarian 1018, já que esta galáxia resulta da fusão entre duas galáxias, cada uma das quais conteria muito provavelmente um buraco negro supermassivo no seu centro.

As pesquisas sobre os mecanismos que atuam em galáxias ativas que mudam de aparência, assim como Markarian 1018, continuam. “A equipe teve que trabalhar rapidamente para determinar o que é que estava fazendo com que Markarian 1018 voltasse à escuridão,” comentou Bernd Husemann. “Campanhas de monitoramento atualmente em curso com os telescópios do ESO e outras infraestruturas permitirão explorar com muito mais detalhe o extraordinário mundo dos buracos negros “esfomeados” e das galáxias ativas varáveis.”

Este trabalho foi descrito em dois artigos científicos intitulados “Mrk 1018 returns to the shadows after 30 years as a Seyfert 1” e “What is causing Mrk 1018’s return to the shadows after 30 years?”, que serão ambos publicados como Cartas na revista especializada Astronomy & Astrophysics.

Fonte: ESO

Um raro renascimento estelar

Uma equipe internacional de astrônomos conseguiu observar através do telescópio espacial Hubble a evolução de uma estrela em tempo real e captar pela primeira vez os períodos de aquecimento e esfriamento de seu renascimento.

nebulosa Stingray

© Hubble (nebulosa Stingray)

No núcleo da nebulosa Stingray, uma nebulosa planetária localizada a 2.700 anos-luz da Terra, está uma pequena e antiga estrela conhecida como SAO 244567. Os astrônomos têm observado ela por décadas, e agora foi possível confirmar o renascimento de uma estrela, algo que nunca foi visto antes.

Entre 1971 e 2002, a temperatura da superfície da estrela SAO 244566 aumentou de 20.000°C para 60.000°C; ao mesmo tempo, a estrela contraiu. O seu tamanho era quatro vezes maior do que nosso Sol e ficou com apenas um terço do diâmetro dele. Agora, observações efetuadas pelo telescópio espacial Hubble revelaram que a estrela começou a esfriar e a expandir novamente; nos últimos anos, a sua superfície estava com uma temperatura de 50.000°C.

A astrônoma Nicole Reindl, da Universidade de Leicester, no Reino Unido, que tem estudado a estrela SAO 244567 por anos, acredita que nós vimos o antes e depois de um “flash” de hélio, um fenômeno astronômico que acredita-se que ocorre com gigantes vermelhas de pouca massa.

Eventos de flash de hélio ocorrem tardiamente na evolução de cerca de 25% de estrelas de baixa massa. Depois de evoluir fora da sequência principal, estas estrelas entram na fase de gigante vermelha, onde a estrela se expande dramaticamente. Várias alterações ocorrem na composição química e física da estrela durante esta fase, até que tenha a queima do hélio disponível no seu núcleo, o qual é então composto por carbono e oxigênio. A fusão do hélio continua em uma casca fina em torno do núcleo, mas, em seguida, desliga-se quando o hélio se esgota. Isso permite que a fusão do hidrogênio começe em uma camada acima da camada de hélio. Após acumular hélio adicional, a fusão do hélio se reacende, levando a um pulso térmico que eventualmente faz com que a estrela se expanda, resfrie e ilumine temporariamente.

Essencialmente, como o hidrogênio no núcleo das estrelas é esgotado, o hélio desperdiçado é deixado de lado, aumentando a temperatura e a densidade do núcleo até que ele se torne quente o suficiente para o hélio queimar.

Então, ocorrerá um período intenso e curto de fusão de hélio que faz com que a estrela se expanda e brilhe consideravelmente. A liberação da energia nuclear pela força do flash numa estrela compacta propicia o início de uma nova expansão em dimensões gigantes, caracterizando o cenário de renascimento.

Esta não é a primeira vez que astrônomos estudaram estrelas deste tipo. No entanto, é a primeira oportunidade que foi testemunhada as fases de aquecimento e refrigeração da transformação. O processo de evolução estelar tipicamente leva de milhões a bilhões de anos.

Apesar de ainda não ser possível explicar totalmente seu comportamento, o aperfeiçoamento dos cálculos poderia ajudar a entender não só essa estrela, mas proporcionar uma visão mais profunda da evolução das estrelas centrais de nebulosas planetárias.

Fonte: ESA

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Química diz que Lua é o manto da proto-Terra, realocado

Medições de um elemento em rochas terrestres e lunares refutou as hipóteses principais para a origem da Lua.

ilustração do impacto que criou a Lua da Terra

© SwRI/Dana Berry (ilustração do impacto que criou a Lua da Terra)

Pequenas diferenças na segregação dos isótopos de potássio entre a Lua e a Terra estavam, até recentemente, escondidas abaixo dos limites de detecção de técnicas analíticas. Mas em 2015, o geoquímico Kun Wang da Universidade de Washington, e Stein Jacobsen, professor de geoquímica da Universidade de Harvard, desenvolveram uma técnica para analisar estes isótopos que consegue atingir precisões dez vezes superiores ao melhor método anterior.

Wang e Jacobsen relatam agora diferenças isotópicas entre as rochas lunares e terrestres que fornecem a primeira evidência experimental que pode discriminar entre os dois modelos principais para a origem da Lua. Num modelo, um impacto de baixa energia deixa a proto-Terra e a Lua envoltas numa atmosfera de silicatos; no outro, um impacto muito mais violento vaporiza o bólido e a maior parte da proto-Terra, expandindo-se para formar um enorme disco superfluido a partir do qual a Lua, eventualmente, cristaliza.

"Os nossos resultados fornecem as primeiras evidências sólidas de que o impacto realmente (em grande parte) vaporizou a Terra," afirma Wang, professor assistente de Ciências da Terra e Planetárias.

Em meados da década de 1970, dois grupos de astrofísicos propuseram, independentemente, que a Lua tinha sido formada pela colisão "raspante" entre um corpo do tamanho de Marte e a proto-Terra. A hipótese de impacto gigante, que explica muitas observações, como por exemplo o grande tamanho da Lua em relação à Terra e velocidade de rotação da Terra e da Lua, eventualmente tornou-se a principal hipótese para a origem da Lua.

No entanto, em 2001 um grupo de cientistas relatou que as composições isotópicas de uma variedade de elementos em rochas terrestres e lunares são quase idênticas. As análises de amostras trazidas de volta pelas missões Apollo na década de 1970 mostraram que a Lua tem as mesmas abundâncias dos três isótopos estáveis de oxigênio que a Terra.

Isto era muito estranho. Simulações numéricas do impacto previam que a maioria do material (60 a 80%) que coalesceu para formar a Lua veio do objeto, ao invés da Terra. Mas corpos planetários que se formaram em diferentes partes do Sistema Solar têm geralmente composições isotópicas diferentes, tão diferentes que as assinaturas isotópicas servem como "impressões digitais" para planetas e meteoritos de um mesmo corpo.

A probabilidade de o corpo ter, por acaso, a mesma assinatura isotópica que a Terra, era muito pequena.

Assim, a hipótese de impacto gigante ficou com um grande problema. Explicava muitas características físicas do sistema Terra-Lua mas não a sua geoquímica. Os estudos de composição isotópica haviam criado uma "crise isotópica" para a hipótese.

No início, os cientistas pensavam que medidas mais precisas fossem resolver esta crise. Mas as medições mais precisas dos isótopos de oxigênio só confirmaram que as composições isotópicas não são distinguíveis. "Estas são as medições mais precisas que podemos fazer e, mesmo assim, são idênticas," comenta Wang.

"Então, as pessoas decidiram alterar a hipótese de impacto gigante," realça Wang. "O objetivo era encontrar uma maneira de fazer a Lua principalmente a partir da Terra, em vez de majoritariamente a partir do impactante. Existem muitos modelos, mas dois têm sido muito influentes."

No modelo original de impacto gigante, a colisão derreteu uma parte da Terra e a totalidade do corpo impactante, atirando para fora algum deste material derretido, como barro numa roda de oleiro.

Um modelo proposto em 2007 acrescenta uma atmosfera de vapor de silicato ao redor da Terra e o disco lunar (o disco de magma, resíduo do bólido). A ideia é que o vapor de silicato permite a troca entre a Terra, o vapor e o material no disco, antes da Lua se condensar a partir do disco derretido.

Estes modelos tentam explicar as semelhanças isotópicas pela adição desta atmosfera, mas ainda começam com um impacto de baixa energia como o modelo original.

Porém, a troca de material através de uma atmosfera é um processo muito lento. Nunca haveria tempo suficiente para o material se misturar bem antes de cair de volta para a Terra.

Por isso, outro modelo, proposto em 2015, assume que o impacto foi extremamente violento, tão violento que o objeto e o manto da Terra vaporizaram-se e misturaram-se para formar uma massa fundida densa/manto atmosférico sob a forma de vapor que se expandiu para preencher um espaço 500 vezes superior à Terra de hoje. À medida que esta atmosfera arrefecia, a Lua condensava-se.

A mistura completa desta atmosfera explica a composição isotópica idêntica da Terra e da Lua. O manto atmosférico era um "fluido supercrítico", sem fases líquidas e gasosas distintas. Os fluídos supercríticos podem passar através de sólidos como um gás e dissolver materiais como um líquido.

O estudo relata dados isotópicos de alta-precisão do potássio para uma amostra representativa de rochas lunares e terrestres. O potássio tem três isótopos estáveis, mas só dois deles, os isótopos  39K e 41K, são suficientemente abundantes para serem medidos com precisão neste estudo.

Wang e Jacobsen examinaram sete rochas lunares obtidas por missões lunares diferentes e compararam as suas taxas de isótopos de potássio com os de oito rochas terrestres representativas do manto da Terra. Descobriram que as rochas lunares eram enriquecidas com cerca de 0,4 partes por mil no isótopo mais pesado de potássio (41K).

O único processo a altas temperaturas que poderia separar os isótopos de potássio desta maneira, salienta Wang, é uma condensação incompleta do potássio a partir da fase de vapor durante a formação da Lua. Em comparação com o isótopo mais leve, o isótopo mais pesado cairia, preferencialmente, para fora do vapor e seria condensado.

Os cálculos mostram que se este processo tivesse acontecido num vácuo absoluto, levaria a um enriquecimento de isótopos pesados de potássio nas amostras lunares na ordem das 100 partes por mil, muito maior do que o valor encontrado por Wang e Jacobsen. Mas uma pressão mais alta suprimiria o fracionamento. Por esta razão, os pesquisadores preveem que a Lua condensou-se numa pressão superior a 10 bars, ou cerca de 10 vezes a pressão atmosférica da Terra ao nível do mar.

A descoberta de que as rochas lunares são enriquecidas com o isótopo mais pesado de potássio não favorece o modelo de atmosfera de silicato, que prevê que as rochas lunares conteriam menos do isótopo pesado do que as rochas terrestres, o oposto do que os cientistas descobriram.

Em vez disso, suporta o modelo de atmosfera do manto que prevê que as rochas lunares incluiriam mais deste isótopo mais pesado do que as rochas terrestres.

Silenciosos durante bilhões de anos, os isótopos de potássio encontraram finalmente uma voz, e têm bastante para contar.

Um artigo sobre a pesquisa foi publicado na revita Nature.

Fonte: Washington University

A galáxia espiral barrada NGC 1672

Muitas galáxias espirais possuem barras que cruzam os seus centros. Mesmo na nossa Via Láctea acredita-se que exista uma barra modesta.

NGC 1672

© Hubble/Steve Cooper (NGC 1672)

A galáxia espiral NGC 1672 mostrada acima, foi registrada com detalhes espetaculares pelo telescópio espacial Hubble, e possui uma proeminente barra central.

Visível na imagem acima estão os filamentos escuros formados pelas linhas de poeira, os jovens aglomerados de estrelas azuis, as nebulosas de emissão vermelhas formadas por gás hidrogênio brilhante, uma longa barra espiral brilhante de estrelas através do centro e um núcleo ativo brilhante que provavelmente é o lar de um buraco negro supermassivo.

A luz leva cerca de 60 milhões de anos para chegar até a Terra quando é emitida da NGC 1672, que se espalha por 75.000 anos-luz de diâmetro.

A NGC 1672 que aparece na direção da constelação de Dorado, está sendo estudada para que se possa descobrir como uma barra espiral contribui para o processo de formação de estrelas nas regiões centrais da galáxia.

Fonte: NASA

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Espreitando uma tormenta na Grande Nuvem de Magalhães

A imagem abaixo efetuada pela Advanced Camera for Surveys a bordo do telescópio espacial Hubble, mostra um turbilhão de gás brilhante e poeira escura dentro de uma das galáxias satélites da Via Láctea, a Grande Nuvem de Magalhães.

N159

© Hubble (N159)

Esta cena tempestuosa mostra um berçário estelar conhecido como N159, uma região HII com mais de 150 anos-luz de diâmetro. A N159 contém muitas estrelas jovens e quentes. Estas estrelas estão emitindo intensa radiação ultravioleta, que faz com que o gás hidrogênio próximo brilhe intensamente e os torrenciais ventos estelares possam cavar arcos, cadeias e filamentos no materal ao redor.

No interior desta nuvem cósmica localiza-se a Nebulosa Papillon, uma região de nebulosidade em forma de borboleta. Esse objeto pequeno e denso é classificado como uma Bolha de Alta-Excitação, e acredita-se que ela esteja ligada às fases iniciais da formação de estrelas massivas.

A N159 localiza-se a mais de 160.000 anos-luz de distância. Ela reside logo ao sul da Nebulosa da Tarântula, outro complexo de formação de estrelas massivas dentro da Grande Nuvem de Magalhães.

Fonte: ESA

A distribuição cronológica dos astros da Via Láctea

Usando cores para identificar as idades aproximadas de milhares de estrelas no halo da Via Láctea, astrônomos produziram a imagem mais nítida de como a nossa galáxia se formou a 13,5 bilhões de anos atrás.

distribuição cronológica dos astros da Via Láctea

© IAG-USP/U. Notre Dame/V. Placco (distribuição cronológica dos astros da Via Láctea)

Um grupo de pesquisadores incluindo Rafael Miloni Santucci e Silvia Cristina Fernandes Rossi, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP), Vinicius Moris Placco, Timothy Beers e Daniela Carolloda, da University of Notre Dame e outros pesquisadores nos Estados Unidos efetuaram a pesquisa.

Num estudo anterior, publicado no The Astrophysical Journal Letters, os pesquisadores destacavam que a Via Láctea formou estrelas de dentro para fora. Depois do colapso gravitacional que produziu estrelas na região central, o processo deslocou-se paulatinamente para a periferia, chegando aos limites extremos do halo galáctico.

O novo estudo utilizou uma base de dados quase 30 vezes mais robusta do que o anterior. Em vez de 4,7 mil estrelas, cerca de 130 mil astros foram considerados. A abundância de pontos possibilitou produzir um mapa detalhado, mostrando a distribuição cronológica das estrelas da Via Láctea.

Os cerca de 130 mil astros mapeados, localizados no halo da Via Láctea, pertencem à classe das Estrelas Azuis de Ramo Horizontal (BHBs, sigla para Blue Horizontal-Branch Stars). São estrelas antigas, em etapa bastante avançada de sua evolução, na qual brilhos intensos e constantes são gerados pela fusão de hélio em carbono. O Sol do sistema que compreende a Terra, que está em uma fase muito mais jovem do ciclo evolutivo, pertence a outro conjunto, conhecido como Sequência Principal (SP), cujas estrelas transformam hidrogênio em hélio, uma etapa anterior do processo de fusão nuclear.

Deve-se ressalvar que as expressões “Sequência Principal” e “Ramo Horizontal” não têm a ver com a posição espacial das estrelas, mas com o posicionamento no chamado Diagrama de Hertzsprung–Russell, criado por volta de 1910 pelo químico e astrônomo dinamarquês Ejnar Hertzsprung e pelo astrônomo norte-americano Henry Norris Russell para classificar as estrelas segundo sua etapa evolutiva. O diagrama relaciona a luminosidade da estrela com sua cor, sendo esta um indicador da temperatura. O Ramo Horizontal corresponde a uma fase que se estende por cerca de 10% do tempo total de vida da estrela.

Uma das grandes perguntas que permaneceu por muito sem resposta entre os estudiosos da Via Láctea era se a Galáxia havia se formado de fora para dentro ou de dentro para fora. Dois cenários competiam na descrição do processo. O “cenário monolítico” afirmava que as galáxias se formam a partir do colapso gravitacional súbito de uma gigantesca nuvem gasosa, originando enorme quantidade de protoestrelas ao mesmo tempo. O “cenário hierárquico” partia de uma galáxia relativamente pequena, que crescia à medida que outras galáxias ainda menores, atraídas por sua força gravitacional, se fundiam com ela.

Este estudo não confirmou, de maneira exclusiva, um ou outro cenário. Mas sugere que houve uma formação em grande escala de objetos de dentro para fora. Ou seja, que a força gravitacional colapsou inicialmente o gás existente no centro, dando origem a uma primeira geração de estrelas, e que, ao longo de um intervalo de tempo da ordem de 3 bilhões de anos, essa formação estelar chegou às regiões mais periféricas.

A amostra utilizada, que reúne estrelas disseminadas por todas as direções do halo, foi extraída da base de dados do SDSS (Sloan Digital Sky Survey). No conjunto de estrelas registradas nessa coleção, foram selecionadas aquelas previamente identificadas como estando na fase evolutiva de interesse.

Na avaliação das distâncias e das cores dos objetos, foi verificado que as estrelas BHBs mais azuladas do halo estavam concentradas predominantemente na região central. E que a cor ficava ligeiramente avermelhada conforme a distância entre a estrela e o centro da galáxia aumentava. A variação é extremamente sutil, mas as medidas de cor com filtros especiais mostraram que ela existe.

Na tentativa de explicar essa sutilíssima variação de cor, os pesquisadores descartaram as possíveis causas para o avermelhamento descritas na literatura, como a existência de poeira no meio interestelar ou composições químicas diferentes para as estrelas, que poderiam mudar ligeiramente suas cores.

O avermelhamento também não tem a ver com o Efeito Doppler, que desvia o espectro luminoso para o azul quando o astro se aproxima do observador, e para o vermelho quando ele se afasta. Tal efeito só se torna relevante quando a velocidade de aproximação ou de afastamento é muito maior, o que ocorre apenas para estrelas situadas em outras galáxias que não a Via Láctea.

O único fator que restou para explicar a variação de cor encontrada foi a idade do objeto. Sendo que, neste caso, e somente para esta fase evolutiva, quanto mais vermelha a estrela, mais jovem ela é. Por isso, o estudo sugere uma formação de dentro para fora. Descartados todos os outros fatores, é a ilação que decorre do fato de as estrelas mais azuladas ocuparem posição central, e as mais avermelhadas, posição periférica.

É importante ressaltar que a associação entre vermelhidão e juventude vale apenas para o estágio evolutivo considerado. Normalmente, as estrelas mais vermelhas são também as mais velhas. Mas, no Ramo Horizontal, o fenômeno se apresenta de forma diferente. É o único estágio evolutivo na vida das estrelas em que a vermelhidão é indicativa de juventude. Nossa hipótese é que exista uma pequena variação na massa desses objetos ao longo do tempo. Os objetos mais jovens teriam massa um pouco maior, consequentemente emitiriam luz mais avermelhada.

Convém lembrar que o tempo de evolução das estrelas depende da massa. As mais massivas ficam menos tempo na Sequência Principal, em que se dá a fusão de hidrogênio em hélio, e passam mais rapidamente para o Ramo Horizontal, onde ocorre a fusão do hélio em carbono. Também permanecem menos tempo nessa segunda fase evolutiva, porque os processos nucleares que ocorrem em seu interior são muito mais intensos.

As estrelas de tipo BHB mais antigas, e por isso mais azuladas, cujas idades são estimadas em cerca de 12 bilhões de anos, situam-se na região central da Galáxia. E, à medida que se distanciam do centro, as estrelas BHBs vão sutilmente se avermelhando, por apresentarem idades menores que, no limite do halo, são estimadas em 9,5 bilhões de anos; estrelas de outras classes podem apresentar idades muito menores, como o próprio Sol, que possui supostamente 4,6 bilhões de anos.

Uma constatação surpreendente, é o fato de a região onde se encontram os objetos mais velhos ocupar uma vasta extensão ao redor do núcleo galáctico, chegando até mesmo ao setor do halo próximo ao Sol, que está cerca de 28 mil anos-luz distante do centro galáctico.

Essa região antiga reúne um precioso acervo de estrelas velhas, cujo estudo pode trazer informações extremamente importantes para o entendimento da composição química do Universo jovem e de sua evolução ao longo do tempo. Ela também mostra que podemos encontrar estrelas muito velhas e, por isso, pobres em metais, mesmo nas regiões próximas do Sistema Solar. Ou seja, que podemos incluir objetos brilhantes nas buscas pelos primeiros astros do Universo.

Com relação à metalicidade das estrelas, é preciso lembrar que o enriquecimento químico do Universo, isto é, a incorporação de elementos químicos de maior massa, decorre do processo de fusão nuclear que ocorre nos núcleos das estrelas.

Em geral, as estrelas passam cerca de 90% de seu tempo total de vida fundindo hidrogênio em hélio. Depois que o hidrogênio se exaure no núcleo, a estrela se rearranja para fundir hélio em carbono. E esse novo estágio se prolonga por quase todo o resto de vida do astro. Porém, dependendo da massa da estrela, elementos ainda mais pesados que o carbono (nitrogênio, oxigênio, silício e ferro) podem ser fundidos em etapas avançadas do ciclo. E são ejetados ao meio exterior quando as estrelas muito massivas explodem como supernovas.

Esses elementos são incorporados por estelas de gerações posteriores. O Sol é considerado uma estrela de terceira geração. Todos os elementos mais pesados do que o hidrogênio e o hélio existentes no Sistema Solar, inclusive no corpo humano, foram herdados dos processos nucleares de estrelas das gerações anteriores.

As estrelas BHBs estão presentes em todos os ambientes e em todas as direções do céu. Novos levantamentos de dados, como o projeto S-PLUS, um importante mapeamento realizado pelo telescópio brasileiro situado em Cerro Tololo, no Chile, fornecerá informações sobre dezenas de milhares de BHBs situadas no céu do hemisfério Sul da Terra, que o SDSS não consegue observar. Estruturas ainda desconhecidas de nossa galáxia poderão ser reveladas.

Atualmente, só é possível usar estas técnicas na nossa própria Galáxia e nas galáxias satélites e anãs que a rodeiam. No entanto, espera-se que o James Webb Space Telescope (JWST), com lançamento previsto para 2018, recolha muitos mais dados sobre galáxias distantes, incluindo os primeiros brilhos do Big Bang.

A imagem no topo mostra o plano XY contendo o disco da Via Láctea (onde se situa o Sistema Solar) e o eixo Z representando a distância das estrelas até o plano. As distâncias são computadas em kiloparsecs (kpc), sendo que 1kpc corresponde a aproximadamente a 3,26 mil anos-luz e 1 ano-luz vale cerca de 10 trilhões de quilômetros. A posição do Sol não está destacada na animação, mas corresponde às coordenadas (X, Y, Z) = (8,5; 0; 0). A variação de cor descrita pela variável (g-r) possui um equivalente de idade entre parênteses, em unidades de bilhões de anos. Nota-se, portanto, que as regiões centrais da Galáxia são mais velhas (~12 bilhões de anos) e os objetos vão ficando mais jovens conforme aumenta a distância em relação ao centro, até atingir ~9.5 bilhões de anos de idade. Para construir este mapa de idade, os pesquisadores usaram a média da cor das estrelas em pequenos espaços. Cada ponto colorido visto dentro do cubo transparente revela a média de cor em um volume menor que 1kpc cúbico, onde existem ao menos três estrelas. As projeções vistas nas faces do cubo, cujas variações de cor foram suavizadas para destacar o fenômeno, representam visões em 2D nos diferentes planos de visada.

Fonte: Nature Physics