quinta-feira, 26 de julho de 2012

As estrelas mais brilhantes não vivem sozinhas

Um novo estudo que utilizou o Very Large Telescope (VLT) do ESO mostrou que a maioria das estrelas brilhantes de elevada massa, responsáveis pela evolução das galáxias, não vivem isoladas.

ilustração de uma estrela vampira e sua vítima

© ESO (ilustração de uma estrela vampira e sua vítima)

Quase três quartos destas estrelas têm uma companheira próxima, muito mais do que o suposto anteriormente. Surpreendentemente, a maior parte destes pares interagem de modo violento, ocorrendo, por exemplo, transferência de massa de uma estrela para a outra. Pensa-se que cerca de um terço destes pares acabará por se fundir, formando uma única estrela.

O Universo é um lugar muito diverso e muitas das estrelas são bastante diferentes do Sol. Uma equipe internacional utilizou o VLT para estudar estrelas do tipo O, as quais apresentam temperaturas, massas e luminosidades muito elevadas. A maioria das estrelas são classificadas de acordo com o seu tipo espectral ou cor. Este parâmetro está, por sua vez, relacionado com a massa das estrelas e a sua temperatura superficial. Partindo da mais azul (e portanto da mais quente e de maior massa) até a mais vermelha (e portanto a mais fria e de menor massa), a sequência de classificação mais comum é O, B, A, F, G, K e M. As estrela do tipo O têm uma temperatura superficial de cerca de 30.000 ºC ou mais, e possuem coloração azul pálido brilhante. A sua massa é 15 ou mais vezes a massa do Sol e e podem ser até um milhão de vezes mais brilhantes. Estas estrelas têm vidas curtas e violentas, desempenhando um papel fundamental na evolução das galáxias. Estão também ligadas a fenômenos extremos, tais como "estrelas vampiras", onde a estrela menor suga matéria da superfície da companheira maior, e explosões de raios gama.

estrelas quentes e brilhantes do tipo O em regiões de formação estelar

© ESO (estrelas quentes e brilhantes do tipo O)

Os astrônomos estudaram uma amostra de 71 estrelas de tipo O, tanto isoladas como em sistemas binários em seis aglomerados estelares jovens próximos na Via Láctea. A maior parte das observações utilizou os telescópios do ESO, incluindo o VLT.

Ao analisar a radiação emitida por estes objetos com um detalhamento inédito, a equipe descobriu que 75% de todas as estrelas do tipo O fazem parte de um sistema binário, uma proporção mais elevada do que a suposta até agora, e a primeira determinação precisa deste valor. Mais importante ainda, a equipe descobriu que a proporção destes pares onde as estrelas se encontram suficientemente próximas uma da outra para que haja interação entre elas (quer através de fusão estelar quer através de transferência de massa pelas chamadas estrelas vampiras) é muito mais elevada do que a esperada, resultado que tem implicações profundas na nossa compreensão da evolução de galáxias.

As estrelas do tipo O constituem apenas uma fração de um por cento das estrelas no Universo, mas os fenômenos violentos a que estão associadas significam que têm um efeito desproporcional em seu meio circundante. Os ventos e choques que vêm destas estrelas podem tanto dar origem como interromper a formação estelar, a sua radiação faz com que as nebulosas brilhem, as suas supernovas enriquecem as galáxias com elementos pesados essenciais à vida, estando ainda associadas às explosões de raios gama, as quais se contam entre os fenômenos mais energéticos no Universo. As estrelas de tipo O estão por isso implicadas em muitos dos mecanismos que fazem evoluir as galáxias.

As fusões entre estrelas, as quais a equipe estima que serão o destino final de cerca de 20 a 30% das estrelas de tipo O, são fenômenos violentos. Mas mesmo o cenário comparativamente calmo de estrelas vampiras, que acontece em 40 a 50% dos casos, tem efeitos profundos no modo como as estrelas evoluem.

Até agora, os astrônomos pensavam que os sistemas binários de estrelas de elevada massa, onde as componentes orbitam muito próximo uma da outra, eram uma exceção, algo apenas necessário para explicar fenômenos exóticos, tais como binárias de raios X, pulsares duplos ou buracos negros binários. Este novo estudo mostra que, para interpretar corretamente o Universo, não podemos fazer esta simplificação: estas estrelas duplas de elevada massa não são apenas comuns, as suas vidas são também fundamentalmente diferentes daquelas que existem enquanto estrelas isoladas.

Por exemplo, no caso das estrelas vampiras, a estrela menor, de massa menor, rejuvenesce ao sugar hidrogênio fresco da sua companheira. A sua massa irá aumentar substancialmente e irá sobreviver à sua companheira, vivendo muito mais tempo do que uma estrela isolada com a mesma massa. Entretanto, a estrela vítima fica sem o seu envelope antes de ter oportunidade de se tornar numa supergigante vermelha luminosa. Em vez disso, o seu núcleo azul quente fica exposto. Deste fenômeno resulta que a população estelar de uma galáxia distante poderá parecer muito mais jovem do que é na realidade: tanto as estrelas vampiras rejuvenescidas como as estrela vítimas diminuídas tornam-se mais quentes e azuis em termos de cor, ficando portanto com a aparência de estrelas mais jovens. Saber a verdadeira proporção das estrelas binárias de elevada massa em interação é por isso crucial para se poder caracterizar corretamente estas galáxias longínquas. A existência deste número enorme de estrelas vampiras está de acordo com um outro fenômeno anteriormente inexplicável. Cerca de um terço das estrelas que explodem como supernovas têm, surpreendentemente, muito pouco hidrogênio. No entanto, a proporção de supernovas pobres em hidrogênio está de acordo com a proporção de estrelas vampiras encontradas neste estudo. Espera-se que as estrelas vampiras dêem origem a supernovas pobres em hidrogênio nas suas vítimas, uma vez que as camadas exteriores ricas em hidrogênio terão sido arrancadas pela gravidade da estrela vampira antes da vítima ter tido oportunidade de explodir como supernova.

A única informação que os astrônomos têm das galáxias distantes é fornecida pela radiação que chega aos telescópios. Sem fazer suposições sobre o que é responsável por esta radiação, não podemos tirar conclusões sobre a galáxia, tais como quão massiva ou jovem ela é. Este estudo mostra que a suposição frequente de que a maioria das estrelas existem de forma isolada pode levar a tirar as conclusões erradas.

Para compreender qual a proporção estes efeitos e como é que esta nova perspectiva afetará a nova visão da evolução galáctica, temos novos estudos deverão ser aplicados. Fazer a modelagem de estrelas binárias é algo complicado, por isso demorará algum tempo até que estas considerações sejam incluídas nos modelos de formação galáctica.

Os resultados serão publicados na edição de amanhã na revista Science.

Fonte: ESO

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