sexta-feira, 26 de julho de 2019

Como os buracos negros moldam galáxias

Dados do observatório de raios X XMM-Newton da ESA revelaram como os buracos negros supermassivos moldam as suas galáxias hospedeiras com ventos fortes que varrem a matéria interestelar.


© ESA (ilustração de ventos ultrarrápidos soprados por um buraco negro supermassivo)

Num novo estudo, os cientistas analisaram oito anos de observações do XMM-Newton do buraco negro no centro de uma galáxia ativa conhecida como PG 1114+445, mostrando como os ventos ultrarrápidos, fluxos de gás emitidos do disco de acreção muito próximo do buraco negro, interagem com a matéria interestelar nas partes centrais da galáxia. Estes fluxos já tinham sido vistos antes, mas o novo estudo identifica claramente, e pela primeira vez, três fases da sua interação com a galáxia hospedeira.

"Estes ventos podem explicar algumas correlações surpreendentes que os cientistas conhecem há anos, mas que não conseguiam explicar," disse Roberto Serafinelli do Instituto Nacional de Astrofísica de Milão, Itália, que realizou a maior parte do trabalho como parte do seu doutoramento na Universidade de Roma Tor Vergata.

"Por exemplo, vemos uma correlação entre as massas de buracos negros supermassivos e a dispersão de velocidade das estrelas nas partes internas das suas galáxias hospedeiras. Mas não há como tal se deva ao efeito gravitacional do buraco negro. O nosso estudo mostra, pela primeira vez, como estes ventos de buracos negros impactam a galáxia em maior escala, possivelmente fornecendo o elo que faltava."

Os astrônomos já haviam detectado dois tipos de fluxos nos espectros de raios X emitidos pelos núcleos ativos das galáxias, as densas regiões centrais das galáxias conhecidas por conter buracos negros supermassivos. Os chamados fluxos ultrarrápidos (em inglês "ultra-fast outflows", ou UFOs), feitos de gás altamente ionizado, viaja a velocidades de até 40% da velocidade da luz e são observáveis nas proximidades do buraco negro central.

Os fluxos mais lentos, conhecidos como absorvedores quentes, viajam a velocidades muito mais baixas, de centenas de quilômetros por segundo, e possuem características físicas semelhantes - como densidade de partículas e ionização - à matéria interestelar circundante. É mais provável que estes fluxos mais lentos sejam detectados a distâncias maiores dos centros das galáxias.

No novo estudo, os cientistas descrevem um terceiro tipo de fluxo que combina características dos dois anteriores: a velocidade de um UFO e as propriedades físicas de um absorvedor quente.

Este arrasto acontece a uma distância de dezenas a centenas de anos-luz do buraco negro. O UFO gradualmente empurra a matéria interestelar para longe das partes centrais da galáxia, limpando-a do gás e diminuindo a acreção da matéria em torno do buraco negro supermassivo.

Embora os modelos já tenham previsto antes este tipo de interação, o estudo atual é o primeiro a apresentar observações reais das três fases.

Esta primeira interação acontece muitos anos depois do UFO ter deixado o buraco negro. Mas a energia do UFO permite que o buraco negro relativamente pequeno tenha impacto sobre o material muito além do alcance da sua força gravitacional.

De acordo com os cientistas, os buracos negros supermassivos transferem a sua energia para o ambiente circundante através destes fluxos e gradualmente limpam as regiões centrais da galáxia de gás, o que pode então interromper a formação estelar. A galáxias de hoje produzem estrelas com muito menos frequência do que costumavam nos estágios iniciais da sua formação.

A resolução de energia sem precedentes do XMM-Newton foi fundamental para diferenciar os três tipos de características correspondentes aos três tipos de fluxos. No futuro, com observatórios novos e mais poderosos, como o ATHENA (Advanced Telescope for High ENergy Astrophysics) da ESA, os astrônomos poderão observar centenas de milhares de buracos negros supermassivos, detectando estes fluxos mais facilmente. O ATHENA, que será mais de 100 vezes mais sensível do que o XMM-Newton, deverá ser lançado no início da década de 2030.

Mais dados, no futuro, vão ajudar a desvendar as complexas interações entre os buracos negros supermassivos e as suas galáxias hospedeiras em detalhe e a explicar a diminuição na formação estelar que que tem ocorrido ao longo de bilhões de anos.

Um artigo foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics.

Fonte: ESA

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