sexta-feira, 10 de setembro de 2021

Surpresa: a Via Láctea não é homogênea

Astrônomos da Universidade de Genebra observaram a composição dos gases na nossa Galáxia e mostraram que, ao contrário dos modelos estabelecidos até agora, não se misturam homogeneamente.

© Mark A. Garlick (nuvens e fluxos de gás cósmico pristino)

A ilustração mostra nuvens e fluxos de gás cósmico pristino (magenta) que acretam na Via Láctea, mas este gás não se mistura de forma eficiente no disco galáctico, como destacado para a vizinhança solar (ampliação).

Para melhor entender a história e a evolução da Via Láctea, os astrônomos estão estudando a composição dos gases e dos metais que compõem uma parte importante da nossa Galáxia. Destacam-se três componentes principais: o gás inicial oriundo do exterior da Via Láctea, o gás entre as estrelas, no seu interior enriquecido com elementos químicos, e a poeira gerada pela condensação dos metais presentes neste gás.

Até agora, os modelos teóricos presumiam que estes três componentes se misturavam homogeneamente por toda a Via Láctea e que atingiam um nível de enriquecimento químico semelhante ao da atmosfera do Sol, denominado metalicidade solar. 

Os astrônomos demonstram que estes gases não se misturam tanto quanto se pensava, o que tem um forte impacto na compreensão atual da evolução galáctica. Como resultado, as simulações da evolução da Via Láctea terão que ser modificadas. 

As galáxias são coleções gigantes de estrelas e são formadas pela condensação do gás do meio intergaláctico composto principalmente de hidrogênio e um pouco de hélio. Enquanto que as estrelas queimam o hidrogênio que as constitui ao longo da sua vida e formam outros elementos por meio da nucleossíntese. Quando uma estrela que chegou ao fim da sua vida explode, expele os metais que produziu, como ferro, zinco, carbono e silício, adicionando estes elementos ao gás da galáxia. Estes átomos podem então condensar-se em poeira, especialmente nas partes mais frias e densas da galáxia.

Inicialmente, quando a Via Láctea foi formada, há mais de 10 bilhões de anos, não tinha metais. A partir daí, as estrelas enriqueceram gradualmente o ambiente com os metais que produziam. O ambiente que compõe a Via Láctea, portanto, reúne os metais produzidos pelas estrelas, as partículas de poeira que se formaram a partir destes metais, mas também os gases de fora da Galáxia que regularmente entram nela.

Até agora, os modelos teóricos consideravam que estes três componentes se misturavam homogeneamente e atingiam a composição solar na nossa Galáxia, com um ligeiro aumento da metalicidade no centro, onde as estrelas são mais numerosas. 

Os astrônomos observaram em detalhes este aspecto usando um espectrógrafo ultravioleta no telescópio espacial Hubble. A espetroscopia permite que a luz das estrelas seja separada nas suas cores ou frequências individuais, um pouco como um prisma ou um arco-íris. Nesta luz decomposta, notam-se as linhas de absorção que permitem verificar a existência de metais. 

Durante 25 horas, a equipe de cientistas observou a atmosfera de 25 estrelas usando o telescópio espacial Hubble e o Very Large Telescope (VLT) no Chile. O problema? A poeira não pode ser contada com estes espectrógrafos, embora contenha metais. Portanto, a equipe desenvolveu uma nova técnica de observação. Trata-se de levar em consideração a composição total do gás e da poeira observando simultaneamente vários elementos como o ferro, zinco, titânio, silício e oxigênio. Em seguida é possível rastrear a quantidade de metais presentes na poeira e adicioná-la àquela já quantificada pelas observações anteriores para obter o total. Graças a esta dupla técnica de observação, os astrônomos descobriram que não só o ambiente da Via Láctea não é homogêneo, mas que algumas das áreas estudadas atingem apenas 10% da metalicidade solar.

Esta descoberta desempenha um papel fundamental na concepção de modelos teóricos sobre a formação e evolução das galáxias. Agora, os astrônomos pretendem refinar as simulações aumentando a resolução, para incluir estas mudanças na metalicidade em diferentes locais da Via Láctea. Estes resultados têm um forte impacto na compreensão da evolução das galáxias. Contudo, os metais desempenham uma função primordial na formação das estrelas, da poeira cósmica, das moléculas e dos planetas. E sabemos agora que podem ser formadas hoje novas estrelas e planetas a partir de gases com composições muito diferentes.

Um artigo sobre o assunto foi publicado na revista Nature.

Fonte: Université de Genève

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