sábado, 26 de outubro de 2024

Descoberto o primeiro buraco negro num sistema triplo

Muitos dos buracos negros detectados até o momento parecem fazer parte de um par.

© Jorge Lugo (estrela distante e buraco negro consumindo estrela próxima)

Estes sistemas binários são constituídos por um buraco negro e um objeto secundário, como uma estrela, uma muito mais densa estrela de nêutrons ou outro buraco negro, que giram em volta um do outro, atraídos pela gravidade do buraco negro para formar um par orbital íntimo.

Agora, uma descoberta surpreendente está expandindo a nossa imagem dos buracos negros, dos objetos que podem abrigar e da maneira como se formam. Num estudo, físicos do MIT (Massachusetts Institute of Technology) e do Caltech (California Institute of Technology) afirmam ter observado pela primeira vez um sistema triplo que conta com a presença de um buraco negro. O novo sistema contém um buraco negro central que está consumindo uma pequena estrela e que completa uma órbita a cada 6,5 dias, uma configuração semelhante à maioria dos sistemas binários. 

Mas, surpreendentemente, uma segunda estrela parece estar também orbitando o buraco negro, embora a uma distância muito maior. Os físicos estimam que esta companheira distante complete uma órbita em torno do buraco negro a cada 70.000 anos. O fato de o buraco negro parecer ter influência gravitacional sobre um objeto tão distante está levantando questões sobre as origens do próprio buraco negro. 

Pensa-se que os buracos negros se formam a partir da explosão violenta de uma estrela moribunda, um processo conhecido como supernova, através do qual uma estrela libera uma enorme quantidade de energia e luz numa explosão final antes de colapsar para formar um buraco negro invisível. No entanto, a descoberta da equipe sugere que, se o buraco negro recém-observado resultasse de uma supernova típica, a energia que teria liberado antes de entrar em colapso teria ejetado quaisquer objetos fracamente ligados na sua periferia.

A segunda estrela, a mais externa, não deveria, portanto, estar ainda por perto. Ao invés, suspeita-se que o buraco negro se formou através de um processo mais gentil de "colapso direto", no qual uma estrela simplesmente colapsa sobre si própria, formando um buraco negro sem um último dramático fulgor. 

Uma origem tão gentil dificilmente perturbaria quaisquer objetos distantes e fracamente ligados pela gravidade. Como o novo sistema triplo inclui uma estrela muito distante, isto sugere que o buraco negro do sistema nasceu através de um colapso mais gentil e direto. E embora os astrônomos já observem há séculos supernovas mais violentas, a equipe afirma que o novo sistema triplo pode ser a primeira evidência de um buraco negro que se formou a partir deste processo mais moderado. 

Este sistema é muito interessante para a evolução dos buracos negros e também levanta a questão de saber se existem mais triplos por aí. A descoberta do buraco negro neste sistema triplo surgiu quase por acaso. Os físicos descobriram-no enquanto pesquisavam no Aladin Lite, um repositório de observações astronômicas, agregadas a partir de telescópios no espaço e em todo o mundo. Os astrônomos podem utilizar a ferramenta online para procurar imagens da mesma parte do céu, tiradas por diferentes telescópios que estão sintonizados para vários comprimentos de onda de energia e luz. 

A equipe tem vindo a procurar sinais de novos buracos negros na Via Láctea. Por curiosidade, foi analisada uma imagem de V404 Cygni, um buraco negro a cerca de 8.000 anos-luz da Terra que foi um dos primeiros objetos a ser confirmado como buraco negro, em 1992. Desde então, V404 Cygni tornou-se um dos buracos negros mais estudados, tendo sido documentado em mais de 1.300 artigos científicos. 

Ao olhar para as imagens ópticas de V404 Cygni, astrônomos viram o que pareciam ser duas manchas de luz, surpreendentemente próximas uma da outra. A primeira mancha era o que outros determinaram ser o buraco negro e uma estrela interior, que orbitava muito perto. A estrela está tão próxima que está derramando algum do seu material sobre o buraco negro, emitindo a luz que pode ser observada. A segunda mancha de luz, no entanto, foi algo que os cientistas não investigaram rigorosamente, até agora. 

A estrela exterior está a 3.500 UA do buraco negro (1 UA, ou unidade astronômica, é a distância entre a Terra e o Sol, cerca de 150 milhões de quilômetros), que é também igual a 100 vezes a distância entre Plutão e o Sol. 

A questão que se colocou então foi a de saber se a estrela exterior estaria ligada ao buraco negro e à sua estrela interior. Para responder a esta questão, os pesquisadores recorreram ao Gaia, um satélite que, desde 2014, tem seguido com precisão os movimentos de muitas estrelas da nossa Galáxia. A equipe analisou os movimentos da estrela interior e da exterior ao longo dos últimos 10 anos de dados do Gaia e descobriu que as estrelas se moviam exatamente em conjunto, em comparação com outras estrelas vizinhas. Foi calculado que a probabilidade deste tipo de movimento em conjunto é de cerca de uma em 10 milhões.

Como é que o sistema foi formado? Se o buraco negro tivesse surgido de uma supernova típica, a explosão violenta teria ejetado a estrela exterior há muito tempo. Para realmente testar esta ideia, foram efetuadas simulações para ver como um tal sistema triplo poderia ter evoluído e retido a estrela exterior. No início de cada simulação, introduziu três estrelas (sendo a terceira o buraco negro, antes de se tornar um buraco negro). Em seguida, executou milhares de simulações, cada uma com um cenário ligeiramente diferente de como a terceira estrela poderia ter-se tornado um buraco negro, afetando subsequentemente os movimentos das outras duas estrelas.

Por exemplo, simulou uma supernova, variando a quantidade e a direção da energia que liberava. Simulou também cenários de colapso direto, em que a terceira estrela simplesmente colapsava sobre si própria para formar um buraco negro, sem emitir qualquer energia.

Para além de dar pistas sobre as origens do buraco negro, a estrela exterior também revelou a idade do sistema. Os físicos observaram que a estrela exterior está no processo de se tornar uma gigante vermelha, uma fase que ocorre no fim da vida de uma estrela. Com base nesta transição estelar, determinou-se que a estrela exterior tem cerca de 4 bilhões de anos. Dado que as estrelas vizinhas nascem mais ou menos no mesmo momento, conclui-se que o sistema triplo tem também 4 bilhões de anos.

Um artigo foi publicado na revista Nature.

Fonte: Massachusetts Institute of Technology

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