Usando o telescópio espacial Hubble da NASA/ESA, astrônomos descobriram inesperadamente a galáxia mais distante que atua como lente cósmica de aumento.
© Hubble (aglomerado de galáxias IRC 0128)
Vista na imagem como era há 9,6 bilhões de anos atrás, esta gigantesca galáxia elíptica quebra o recorde anterior por 200 milhões de anos.
Estas galáxias são tão grandes que a sua gravidade dobra, amplia e distorce a luz de objetos para trás delas, um fenômeno chamado lente gravitacional. A descoberta de um destes objetos, numa área tão pequena do céu, é um evento tão raro que normalmente precisariamos de estudar uma região centenas de vezes maior para apenas encontrar uma.
O objeto atrás desta lente cósmica é uma pequena galáxia espiral que está passando por um surto rápido de formação estelar. A sua luz demorou 10,7 bilhões de anos até chegar aqui, e observar um alinhamento como este, a uma grande distância da Terra, é realmente um achado raro. A localização de mais destas galáxias distantes que atuam como lentes vai fornecer informações sobre como as galáxias no início do Universo se tornaram nas gigantescas galáxias dominadas por matéria escura de hoje em dia. A matéria escura não pode ser vista, mas representa a maior parte da matéria do Universo.
"Quando observamos mais de 9 bilhões de anos para trás no Universo, não esperamos encontrar este tipo de lente," explicou Kim-Vy Tran da Universidade A&M do Texas em College Station, EUA. "É muito difícil ver um alinhamento entre duas galáxias no Universo jovem. Imagine segurar numa lupa e movê-la para mais longe. Quando olhamos pela lupa à distância do braço esticado, as hipóteses de vermos um objeto ampliado são altas. Mas se movermos a lupa para o outro lado do ambiente, as nossas hipóteses de ver a lupa quase perfeitamente alinhada com outro objeto diminuem."
Os membros da equipe, Kenneth Wong e Sherry Suyu da ASIAA (Academia Sinica Institute of Astronomy & Astrophysics) em Taipé, Taiwan, usaram a lente gravitacional do alinhamento fortuito para medir a massa total da galáxia gigante, incluindo a quantidade de matéria escura, ao avaliar a intensidade dos seus efeitos de lente sobre a luz da galáxia de fundo. A galáxia em primeiro plano tem mais de 180 bilhões de vezes a massa do Sol e, para a época, é uma galáxia gigante. É também um dos membros mais brilhantes de um aglomerado de galáxias distante, chamado IRC 0128.
"Conhecemos centenas de galáxias que atuam como lentes, mas quase todas são relativamente próximas, em termos cósmicos," afirma Wong, primeiro autor do artigo científico da equipe. "A descoberta de uma lente tão distante quanto esta é muito especial porque podemos aprender mais sobre o conteúdo de matéria escura de galáxias no passado distante. Ao comparar a nossa análise desta galáxia com outras mais próximas, podemos começar a compreender como o conteúdo de matéria escura evoluiu ao longo do tempo."
A equipe suspeita que a galáxia continuou crescendo ao longo dos últimos 9 bilhões de anos, ganhando estrelas e matéria escura ao canibalizar galáxias vizinhas. Os estudos recentes sugerem que estas galáxias massivas ganham mais matéria escura que estrelas à medida que continuam a crescer. Os astrônomos tinham assumido que a matéria escura e a matéria normal acumulavam-se igualmente numa galáxia ao longo do tempo, mas sabemos agora que a proporção de matéria escura para matéria normal muda com o tempo. Esta galáxia recém-descoberta vai eventualmente tornar-se muito mais massiva que a Via Láctea e terá também mais matéria escura.
Tran e a sua equipe estavam estudando a formação estelar em dois aglomerados de galáxias distantes, incluindo IRC 0218, quando se depararam com a lente gravitacional. Enquanto analisava dados espectrográficos do Observatório W. M. Keck no Havaí, Tran avistou uma forte detecção de hidrogênio gasoso quente que parecia surgir de uma galáxia elíptica gigante e distante. A detecção foi surpreendente porque o hidrogênio gasoso e quente é uma assinatura clara de nascimento estelar. As observações anteriores mostraram que a gigante elíptica, que residia no aglomerado galáctico IRC 0128, era uma galáxia velha e calma, que tinha parado de fabricar estrelas há muito tempo atrás. Outra descoberta intrigante foi que as jovens estrelas estavam muito mais distantes do que a galáxia elíptica. Tran ficou muito surpreendida e preocupada, e pensou que a sua equipe tinha feito um grande erro com as suas observações.
A astrônoma logo percebeu que não tinha cometido um erro quando estudou imagens do Hubble obtidas em comprimentos de onda azul, que revelou o brilho das estrelas incipientes. As imagens, obtidas com a câmara ACS (Advanced Camera for Surveys) e WFC3 (Wide Field Camera 3) do Hubble, revelaram um objeto azul e com a forma de uma sobrancelha perto de um ponto azul manchado ao redor da elíptica gigante. Tran reconheceu as características invulgares como as imagens ampliadas e distorcidas de uma galáxia ainda mais distante por trás da galáxia elíptica, a assinatura de uma lente gravitacional.
Para confirmar a sua hipótese de lente gravitacional, a equipe analisou dados de arquivo de dois programas de observação do Hubble, o 3D-HST, um estudo espectroscópico perto do infravermelho com o instrumento WFC3, e o CANDELS (Cosmic Assembly Near-infrared Deep Extragalactic Legacy Survey), um grande programa de céu profundo do Hubble. Os dados mostraram outra impressão digital de gás quente ligado à galáxia mais distante.
A galáxia distante é demasiado pequena e longínqua para o Hubble determinar a sua estrutura. Por isso, foi analisada a distribuição de luz no objeto para inferir a sua forma espiral. Além disso, as galáxias espirais são mais abundantes durante estes primeiros tempos. As imagens do Hubble também revelaram pelo menos uma região compacta e brilhante perto do centro. A equipe suspeita que a região brilhante é devido a uma onda de formação estelar e é provavelmente constituída por hidrogênio gasoso, aquecido pelas estrelas jovens e massivas. À medida que o grupo de pesquisadores continua o seu estudo de formação estelar em aglomerados galácticos, estará à procura de mais assinaturas de lentes gravitacionais.
Os resultados da equipe foram publicados na edição de 10 de Julho da revista The Astrophysical Journal Letters.
Fonte: NASA