quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

Cientistas medem toda a luz estelar já produzida pelo Universo observável

A partir dos seus laboratórios, num planeta rochoso superado pela vastidão do espaço, cientistas da Universidade de Clemson conseguiram medir toda a luz estelar já produzida ao longo da história do Universo observável.

mapa do céu em raios gama

© NASA/LAT (mapa do céu em raios gama)

Este mapa construído através de observações pelo Large Area Telescope (LAT) do Fermi mostra como o céu em raios gama aparece em energias acima dos 10 bilhões eV (elétron-volt). O plano da Via Láctea percorre o meio da imagem. As cores mais brilhantes indicam fontes mais brilhantes de raios gama.

Os astrofísicos pensam que o nosso Universo, que tem cerca de 13,7 bilhões de anos, começou a formar as primeiras estrelas quando tinha algumas centenas de milhões de anos. Desde então, o Universo tornou-se numa verdadeira máquina de fazer estrelas. Existem agora aproximadamente 2 trilhões (2x1012) de galáxias e um septilhão (1x1024) de estrelas. Usando novos métodos de medição de luz estelar, o astrofísico Marco Ajello e a sua equipe analisaram dados do telescópio espacial de raios gama Fermi da NASA para determinar a história da formação estelar durante a maior parte do tempo de vida do Universo.

Colocar um número na quantidade de luz estelar já produzida tem várias variáveis que dificultam a quantificação em termos simples. Mas, de acordo com a nova medição, o número de fótons (partículas de luz visível) que escaparam para o espaço após serem emitidos pelas estrelas traduz-se em 4x1084!

Apesar deste número estupendamente grande, é interessante notar que, à exceção da luz que vem do nosso próprio Sol e da Galáxia, o resto da luz estelar que alcança a Terra é extremamente fraca, equivalente a uma lâmpada de 60 watts, vista em completa escuridão, a cerca de 4 km de distância. Isto porque o Universo é quase incompreensivelmente grande. É também por isso que o Universo é escuro à noite, além da luz da Lua, das estrelas visíveis do brilho fraco da Via Láctea.

O telescópio espacial de raios gama Fermi foi lançado em órbita no dia 11 de junho de 2008 e recentemente comemorou o seu 10.º aniversário. É um poderoso observatório que forneceu quantidades enormes de dados sobre raios gama (a forma mais energética de luz) e sobre a sua interação com a luz extragalática de fundo, que é uma névoa cósmica composta por toda a luz ultravioleta, visível e infravermelha emitida por estrelas ou poeira na sua vizinhança. Ajello e o colega de pós-doutoramento Vaidehi Paliya analisaram quase nove anos de dados referentes a sinais de raios gama de 739 blazares.

Os blazares são galáxias contendo buracos negros que são capazes de liberar jatos estreitamente colimados de partículas energéticas que saltam das suas galáxias e cruzam o cosmos quase à velocidade da luz. Quando um destes jatos está, fortuitamente, apontado diretamente para a Terra, é detectável mesmo quando tem uma origem muito distante. Os fótons de raios gama produzidos dentro dos jatos eventualmente colidem com a névoa cósmica, deixando uma impressão observável. Isso permitiu que a equipe de Ajello medisse a densidade do nevoeiro, não apenas num determinado local, mas também num determinado momento da história do Universo.

Ao medir o número de fótons absorvidos, os pesquisadores foram capazes de medir a espessura da névoa e medir também, em função do tempo, quanta luz havia em toda a faixa de comprimentos de onda.

Usando levantamentos galácticos, a história da formação estelar do Universo é estudada há décadas. Mas um obstáculo enfrentado por pesquisas anteriores era que algumas galáxias estavam muito distantes, ou eram muito fracas, para qualquer telescópio atual as detectar. Isto obrigou os cientistas a estimar a luz das estrelas produzida por estas galáxias distantes, em vez de a registar diretamente.

A equipe de Ajello conseguiu contornar isso usando os dados do LAT do Fermi para analisar a luz extragalática de fundo. A luz estelar que escapa das galáxias, incluindo as mais distantes, acaba eventualmente por se tornar parte da luz extragalática de fundo. Portanto, as medições precisas desta névoa cósmica, que só recentemente foram possíveis, eliminaram a necessidade de estimar as emissões de luz de galáxias ultradistantes.

Paliya realizou a análise de raios gama de todos os 739 blazares, cujos buracos negros são milhões a bilhões de vezes mais massivos que o nosso Sol.

Quando os raios gama altamente energéticos colidem com luz visível de baixa energia, transformam-se em pares de elétrons e pósitrons. Segundo a NASA, a capacidade do Fermi em detectar raios gama através de uma ampla gama de energias torna-o especialmente adequado para mapear a névoa cósmica. Estas interações de partículas ocorrem ao longo de distâncias cósmicas imensas, o que permitiu que o grupo de Ajello investigasse mais profundamente do que nunca a produtividade de formação estelar no Universo.

Os cientistas há muito tempo que tentam medir a luz extragalática de fundo. No entanto, fontes muito luminosas no plano da frente, como a luz zodiacal (que é luz espalhada pela poeira no Sistema Solar) tornavam esta medição muito complexa.

A formação estelar, que ocorre quando regiões densas de nuvens moleculares colapsam e formam estrelas, atingiu o pico há 11 bilhões de anos. Mas embora o nascimento de novas estrelas tenha diminuído desde então, nunca cessou. Por exemplo, na nossa Via Láctea nascem cerca de sete novas estrelas por ano.

A formação estelar é um grande ciclo cósmico de reciclagem de energia, matéria e metais. É o motor do Universo. Sem a evolução estelar, não teríamos os elementos fundamentais necessários para a existência da vida.

A compreensão da formação estelar também tem ramificações para outras áreas de estudo astronômico, incluindo pesquisas sobre a poeira cósmica, evolução galáctica e matéria escura. A análise da equipe irá fornecer missões futuras com uma diretriz para explorar os primeiros dias da evolução estelar, como o telescópio espacial James Webb, com lançamento previsto para 2021 e que vai permitir com que os cientistas busquem a formação de galáxias primordiais.

Um artigo foi publicado na revista Science.

Fonte: Clemson University

segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

Estrelas parecidas com cometas

Esta imagem foi criada a partir de dados obtidos com o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) no Chile, combinados com dados do telescópio espacial Hubble, e mostra um aglomerado de estrelas chamado Westerlund 1, um dos jovens aglomerados estelares mais massivos da nossa Via Láctea.

Comet-like stars

© ALMA/Hubble (Westerlund 1)

Curiosamente, a imagem mostra igualmente algumas “caudas” de matéria parecidas às dos cometas, que se estendem para o exterior de algumas estrelas gigantes do Westerlund 1. Estas caudas formaram-se nos ventos intensos soprados pelas residentes do aglomerado, levando a matéria para o exterior das estrelas.

Este fenômeno assemelha-se ao modo como os cometas obtêm as suas bonitas e famosas caudas. As caudas dos cometas no Sistema Solar são lançadas para fora do núcleo do seu cometa progenitor por um vento de partículas ejetado pelo Sol. Consequentemente, as caudas dos cometas apontam sempre no sentido contrário ao do Sol. Similarmente, as caudas das enormes estrelas vermelhas que vemos nesta imagem apontam no sentido contrário ao do núcleo do aglomerado, muito provavelmente resultado de poderosos ventos do aglomerado gerados por centenas de estrelas quentes e massivas que se situam na direção do centro de Westerlund 1.

Estas estruturas massivas cobrem grandes distâncias e mostram-nos o efeito dramático que o meio pode ter no modo como as estrelas se formam e evoluem.

Estas caudas parecidas às dos cometas foram detectadas durante um estudo que o ALMA fez do Westerlund 1, com o intuito de explorar as estrelas constituintes do aglomerado e descobrir como, e a que taxa, é que perdem massa. Este aglomerado é conhecido por abrigar uma enorme quantidade de estrelas massivas, muitas das quais são de tipo raro, o que o torna de grande interesse e utilidade para os astrônomos que procuram compreender a grande variedade de estrelas existentes na nossa Galáxia.

Fonte: ESO

Aglomerados dentro de aglomerados

Esta imagem, da Advanced Camera for Surveys (ACS) do telescópio espacial Hubble, revela milhares de aglomerados globulares localizados no núcleo de um aglomerado de galáxias.

Clusters within clusters

© Hubble (aglomerado de Coma)

Foi criado por uma pesquisa do Hubble que se baseou em dados de três dos programas de observação separados do telescópio para explorar o centro do aglomerado de Coma, uma enorme aglomeração de mais de 1.000 galáxias unidas pela gravidade, a cerca de 320 milhões de anos-luz de distância da Terra.

Os astrônomos detectaram mais de 22.000 aglomerados globulares, alguns dos quais formaram uma ponte ligando um par de galáxias interagindo bem conhecidas (NGC 4889 e NGC 4874). Um aglomerado globular é um grupo esférico de estrelas que geralmente orbita uma galáxia como um satélite independente. No entanto, os aglomerados globulares aqui estudados são de um tipo diferente, aglomerados globulares intraclasses. Especificamente, estes são aglomerados globulares que não estão ligados a uma galáxia individual, mas a um aglomerado de galáxias; neste caso, o aglomerado de Coma.

Enquanto os aglomerados globulares orbitando nossa Via Láctea se revelam como conjuntos esféricos cintilantes de estrelas densamente compactadas, à distância do aglomerado de Coma, eles aparecem apenas como minúsculos pontos de luz, até mesmo para a visão avançada do telescópio espacial Hubble.

No entanto, uma característica dos aglomerados globulares é sua cor; como as estrelas de um determinado aglomerado são formadas aproximadamente na mesma época e do mesmo “material”, elas geralmente têm uma cor consistente. Desta forma, os astrônomos foram capazes de identificar os aglomerados, e descartar galáxias de fundo na mesma região do céu, analisando sua cor e tamanho.

Com a ajuda dos aglomerados globulares identificados, os astrônomos podem mapear a distribuição de matéria e da matéria escura no aglomerado de Coma. O aglomerado de Coma foi um dos primeiros lugares onde anomalias gravitacionais observadas indicaram a existência de matéria escura.

Fonte: ESA

Em demanda das relíquias galácticas do Universo primordial

São massivas, são muito pequenas e são extremamente raras, mas podem abrigar os segredos de como as galáxias se formam e evoluem.

galáxias massivas ultracompactas

© ESO/VST/KiDS (galáxias massivas ultracompactas)

Um novo estudo desvenda a vida tímida das galáxias massivas ultracompactas. Foi produzido por uma equipe internacional liderada por Fernando Buitrago, do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) e da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL).

As galáxias massivas ultracompactas têm várias vezes mais estrelas do que a Via Láctea, mais do que o equivalente a 80 bilhões de sóis, e são por isso muito brilhantes, mas as suas estrelas estão densamente empacotadas num tamanho muito menor do que o da nossa Galáxia. Os pesquisadores identificaram um novo conjunto de 29 galáxias com estas características, a distâncias entre 2 e 5 bilhões de anos-luz da Terra.

Sete destes modestos pesos pesados são de fato galáxias primordiais que permaneceram intactas, sem interagir com outras desde a sua formação, há mais de dez bilhões de anos. Estas relíquias abrem janelas sobre o aspeto e a constituição das galáxias nas primeiras idades do Universo, embora estejam na nossa vizinhança galáctica.

"Quando estudamos objetos muito pequenos e os estudamos no Universo distante, é muito difícil dizer o que quer que seja sobre eles," disse Fernando Buitrago. "Como este conjunto de galáxias que estudamos está no Universo próximo e relativamente perto de nós, mesmo sendo verdadeiramente pequenas, temos melhores condições para sondá-las."

Um dos avanços deste estudo é a apresentação da densidade destas galáxias massivas ultracompactas no Universo, no seu conjunto, relíquias e as que o não são. Os pesquisadores encontraram apenas 29 no mais completo rastreio de galáxias no Universo local. São tão raras que é necessário um volume com quase 500 milhões de anos-luz de lado a lado para encontrar uma delas apenas.

Os pesquisadores determinaram a idade das estrelas nas galáxias, separando as galáxias vermelhas e antigas das azuis e jovens. Como puderam estas relíquias ser preservadas intactas através do tempo cósmico é algo ainda por compreender.

De acordo com o paradigma da formação e evolução das galáxias, estas relíquias ultracompactas só poderiam ser poupadas à fusão com outras galáxias e impedidas de evoluir se residissem em aglomerados galácticos sobrepovoados. Poderá soar contraintuitivo já que se esperaria que em tais ambientes elas mais facilmente interagissem e perdessem as suas propriedades originais.

"Num lugar onde existem muitas galáxias, haverá também muita atração gravitacional e as velocidades relativas das galáxias serão muito elevadas. Por isso, elas irão passar umas pelas outras sem tempo suficiente para interagirem significativamente," disse Buitrago.

Neste estudo, os pesquisadores tentaram medir algumas das propriedades destes objetos, como os seus tamanhos e idades, mas estão pedindo tempo de observação com grandes telescópios para apontar diretamente para eles. De modo a compreender o seu passado, querem estudar em maior detalhe os lugares onde se encontram, as outras galáxias à sua volta, e as suas posições relativas no espaço.

"As galáxias massivas evoluem de forma acelerada quando comparadas com outras galáxias no Universo. Ao tentarmos entender as propriedades das galáxias mais massivas, poderemos vir a entender o eventual destino de todas as outras galáxias, incluindo o da própria Via Láctea," comenta Buitrago.

O estudo foi publicado na revista científica Astronomy & Astrophysics.

Fonte: Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço

terça-feira, 27 de novembro de 2018

Um astrônomo amador descobre uma galáxia anã

Uma equipe internacional, em que há membros do Instituto de Astrofísica das Canárias (IAC) confirmou a descoberta da galáxia Donatiello 1, nomeado em homenagem ao astrônomo amador Giuseppe Donatiello, que encontrou enquanto ele estava analisando as imagens que ele tinha tomado da galáxia de Andrômeda entre 2010 e 2013 do Parque Nacional Pollino, no sul da Itália.

galáxia anã Donatiello 1

© IAC (galáxia anã Donatiello 1)

David Martínez Delgado, pesquisador da Universidade de Heidelberg (Alemanha) relata a descoberta e as características desta galáxia anã esferoidal, que é encontrada no lado mais distante da galáxia de Andrômeda.

“É muito interessante para a teoria da formação de galáxias realizar um inventário completo das galáxias anãs na vizinhança do Grupo Local. As imagens extremamente profundas de grandes áreas do céu obtidas através do uso de pequenos telescópios por astrofotógrafos amadores pode nos ajudar a completar o censo de galáxias de baixa luminosidade superficial, até então desconhecidas, que atualmente não podem ser detectadas em levantamentos baseados em contagens individuais de estrelas ou usando emissão de hidrogênio atômico neutro,” disse Martínez Delgado.

As observações realizadas com o Gran Telescopio Canarias (GTC) no Observatório Roque de los Muchachos (Garafía, La Palma) mostram que Donatiello 1 fica a uma distância de 9,78 milhões de anos-luz, mais distante que as galáxias espirais que formam nosso Grupo Local (dominado pela nossa galáxia e a galáxia de Andrômeda). A posição e a distância de Donatiello 1 sugerem que é um satélite anão da galáxia elíptica próxima, conhecida como O Fantasma de Mirach, porque está perto da estrela Mirach (a segunda estrela mais brilhante da constelação de Andrômeda). No entanto, Donatiello 1 poderia ser uma das galáxias anãs esferoidais mais isoladas e conhecidas na atualidade, situada atrás da galáxia de Andrômeda.

Estes dados, juntamente com aqueles recolhidos pelo Telescopio Nazionale Galileo (TNG), também no Observatório Roque de los Muchachos, mostram que esta galáxia anã recém-descoberta é composta principalmente de estrelas antigas e que o seu conteúdo estelar é semelhante a outras galáxias que são companheiras da Via Láctea, como as galáxias Draco e Ursa Menor.

“A ausência de estrelas jovens e a falta de gás são típicas de galáxias anãs esferoidais, que pararam de formar estrelas há milhares de milhões de anos,” explica Mike Beasley, pesquisador do IAC.

Fonte: Instituto de Astrofísica de Canarias

segunda-feira, 26 de novembro de 2018

Uma teia escura e emaranhada na Grande Nuvem de Magalhães

Essa teia escura e emaranhada é um objeto chamado SNR 0454-67.2.

Tangled — cosmic edition

© Hubble (SNR 0454-67.2)

Ele é um remanescente de supernova que se formou de uma maneira muito violenta, criado depois que uma estrela massiva terminou sua vida em uma explosão cataclísmica e jogou seu material constituinte no espaço circundante. Isso criou a formação confusa que vemos nesta imagem do telescópio espacial Hubble, com fios vermelhos serpenteando  em meio a nuvens escuras e turbulentas.

O SNR 0454-67.2 está situado na Grande Nuvem de Magalhães, uma galáxia espiral anã que fica perto da Via Láctea. O remanescente é provavelmente o resultado de uma explosão de supernova Tipo Ia; essa categoria de supernova é formada a partir da morte de uma estrela anã branca, que cresce e se expande ao extrair material de uma companheira estelar até atingir uma massa crítica e depois explodir.

Como elas sempre se formam através de um mecanismo específico, quando a anã branca atinge uma massa específica, essas explosões sempre têm uma luminosidade conhecida e são usadas como marcadores (velas padrão) para os astrônomos obterem e medirem distâncias em todo o Universo.

Fonte: ESA

sábado, 24 de novembro de 2018

O Aglomerado do Pato Selvagem

O Aglomerado do Pato Selvagem (M11 ou NGC 6705) é uma das vistas telescópicas mais atraentes do céu com seu labirinto estelar.

Aglomerado do Pato Selvagem

© ESO (Aglomerado do Pato Selvagem)

Existem cerca de 2.900 estrelas aqui, um rico conjunto de sóis que para alguns se assemelha a um bando de patos em vôo. O Aglomerado do Pato Selvagem é um aglomerado aberto de estrelas na constelação de Escudo. Foi descoberto pelo astrônomo alemão Gottfried Kirch em 1681, e o francês Charles Messier incluiu o objeto em seu catálogo em 1764.

Os astrônomos há muito acreditam que aglomerados abertos como o M11 se formam durante o colapso gravitacional de uma grande nuvem de poeira e gás. Uma vez que os recém-nascidos começam a lançar seus ventos estelares limpando o acúmulo de gás remanescente. Embora suas massas possam diferir e os caminhos evolutivos divergirem, acredita-se que quase todos os membros do aglomerado tenham nascido em uma única geração e tenham uma idade próxima.

A maior parte da vida de uma estrela é gasta na "sequência principal" que queima o hidrogênio em seu núcleo, produzindo a energia para brilhar, bem como para resistir à força esmagadora da gravidade. Quando seu núcleo de hidrogênio se esgota, a estrela muda para outros combustíveis e estratégias de queima, fazendo com que ela se expanda e deixe a sequência principal. Aglomerados jovens podem começar quentes e azuis, mas suas estrelas ficam vermelhas com o tempo. Como regra geral, a cor de uma estrela é um bom indicador de sua idade.

É por isso que os astrônomos não conseguiam entender por que estrelas de brilho semelhante (e presumivelmente de massa semelhante) no Aglomerado do Pato Selvagem exibiam cores diferentes. Se os aglomerados abertos forem compostos por uma única geração de estrelas com aproximadamente a mesma idade, por que a cor se espalhou? Ou M11 deu origem a uma segunda geração de sóis ou algo está faltando em nossa compreensão de como os aglomerados se formam.

Os astrônomos usaram o Multiple Mirror Telescope, no Arizona, para examinar os espectros de estrelas no M11 usando o Hectochelle, um instrumento que pode captar espectros de múltiplas estrelas simultaneamente. Para sua surpresa, não foram as idades das estrelas que causaram a variedade espectral, mas a sua rotação.

Quando uma estrela gira, um dos lados gira em direção à Terra e o outro se afasta. A luz que vem do lado em nossa direção é comprimida e deslocada em direção ao extremo azul do espectro; a luz que se afasta de nossa direção é esticada e deslocada em direção ao vermelho. Compressão e alongamento fazem com que lacunas no espectro da estrela se espalhem por uma faixa mais ampla de comprimentos de onda (cores) em vez de se registrar como uma única tonalidade.

Os espectros revelaram que as estrelas estão girando em taxas diferentes. Quanto mais rápido uma estrela girar, melhor ela mistura hidrogênio em seu núcleo e quanto mais tempo ela pode permanecer na sequência principal, de 15% a 62%, em comparação com seus primos rotativos mais lentos de massa semelhante.

Contudo, o fato de que muitas estrelas ficam vermelhas à medida que evoluem para fora da sequência principal, as que giram rápidas têm uma vantagem inicial, parecendo mais vermelhas do que as que giram lentamente, enquanto ainda se aquecem na sequência principal. A rotação rápida também deforma a forma de uma estrela em uma elipse, à medida que seu diâmetro equatorial se expande, as regiões equatoriais esfriam e avermelham.

Assim, vemos que uma série de taxas de rotação estelares leva a diferenças na cor da estrela e, por fim, na vida estelar. O Aglomerado do Pato Selvagem conseguiu imitar duas populações estelares quando apenas uma existe.

As descobertas foram publicadas na Nature Astronomy.

Fonte:

sexta-feira, 23 de novembro de 2018

Detectada uma irmã gêmea do Sol

Uma equipe internacional usou um novo método para detectar irmãs do Sol.

aglomerado aberto de estrelas Trumpler 14

© ESO/H. Sana (aglomerado aberto de estrelas Trumpler 14)

A imagem acima mostra o aglomerado aberto de estrelas Trumpler 14, um aglomerado com mais de duas mil estrelas, semelhante àquele onde terá nascido o Sol.

Estima-se que serão milhares as estrelas irmãs do Sol que se formaram no mesmo aglomerado juntamente com a nossa estrela, há cerca de 4,6 bilhões de anos. Com o passar do tempo, as estrelas do aglomerado espalharam-se pela nossa Galáxia, o que dificulta a sua detecção.

A equipe foi liderada pelo pesquisador Vardan Adibekyan, do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) e Universidade do Porto. "Como não há muita informação acerca do passado do Sol, estudar estas estrelas pode ajudar-no a perceber onde na Galáxia, e em que condições, se formou o Sol," disse Adibekyan.

"Com a colaboração de Patrick de Laverny e Alejandra Recio-Blanco, do Observatório da Côte d'Azur, obtivemos uma amostra de 230.000 espectros, do Projeto AMBRE," acrescenta Adibekyan.

AMBRE é um projeto de arqueologia galáctica, montado pelo ESO e pelo Observatório da Côte d’Azur, para determinar os parâmetros estelares dos espectros em arquivo, provenientes dos espectrógrafos FEROS, HARPS, UVES e GIRAFFE do ESO.

Em seguida, a equipe usou estes espectros do AMBRE, em conjunto com dados astrométricos muito precisos da missão GAIA da ESA, de modo a fazer uma seleção de estrelas com composições químicas semelhantes à do Sol, seguido de um cálculo das suas idades e propriedades cinemáticas.

Apesar de terem descoberto apenas uma irmã do Sol nesta pesquisa, a HD186302, esta é muito especial. Esta estrela de tipo G3 da sequência principal não é só uma irmã do Sol, tendo em conta as suas idades e composição química, como é também uma irmã gêmea.

As estrelas irmãs do Sol podem ser boas candidatas à procura de vida, pois há a possibilidade da vida ter sido transportada entre planetas das estrelas do aglomerado solar. Esta transferência de vida entre sistemas exoplanetários é conhecida por litopanspermia.

"Alguns modelos teóricos mostram uma probabilidade não negligenciável da vida se ter espalhado a partir da Terra, até outros planetas ou sistemas exoplanetários, durante o período de bombardeamento tardio do Sistema Solar. Se tivermos sorte, e a nossa estrela irmã do Sol tiver um planeta, e o planeta for rochoso, na zona de habitabilidade, e finalmente, se este planeta tiver sido 'contaminado' pelas sementes de vida da Terra, então temos o que nós sempre sonhamos, uma Terra 2.0, orbitando um Sol 2.0," complementou Adibekyan.

A equipe do IA planeja agora começar uma campanha de busca de planetas em volta desta estrela, recorrendo aos espectrógrafos HARPS e ESPRESSO. Encontrar e caracterizar sistemas planetários em volta de estrelas irmãs do Sol pode revelar informação extremamente importante acerca do resultado de formação planetária num ambiente partilhado.

O artigo foi publicado na revista Astronomy & Astrophysics.

Fonte: Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço

quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Um caso de nebulosa variável

Há uma classe intrigante de objetos conhecidos como nebulosas variáveis, dos quais o mais famoso é provavelmente a Nebulosa Variável de Hubble.

McNeil's Nebula in Messier 78

© ESO/A. Rector (Nebulosa de McNeil)

Estas duas imagens destacam a variabilidade da Nebulosa de McNeil. A imagem (topo) tirada em 2006 com o telescópio de 2,2 metros do ESO no Observatório de La Silla, no Chile, mostra a distinta forma da ventoinha da nebulosa. A nebulosa mal era visível dois anos antes, em uma imagem (abaixo) tirada dois anos antes no Telescópio Mayall de 4 metros em Kitt Peak.

As nebulosas variáveis São principalmente nebulosas de reflexão iluminadas por estrelas variáveis, com variações de brilho ocorrendo em escalas de tempo tão curtas quanto semanas ou meses.

Em 23 de janeiro de 2004, o astrônomo amador Julian “Jay” McNeil descobriu uma nova nebulosa com um refrator de 3 polegadas de seu quintal em Paducah, Kentucky. Ele a viu em uma imagem CCD que ele havia tirado da conhecida nebulosa de reflexão M78 em Órion. Embora não seja visível em várias placas fotográficas que datam de 1951, esta nova nebulosa está presente em uma imagem de 1966, fornecendo indícios antecipados de sua variabilidade. Na época da descoberta de McNeil, a nebulosa ainda não havia sido catalogada.

A Nebulosa de McNeil, como veio a ser chamada, é iluminada pela explosiva protoestrela V164 Orionis. As protoestrelas deste tipo são propensas às erupções como o objeto estelar jovem evolui para uma estrela completamente inchada, e são estas erupções que iluminam a nebulosa circundante. Algumas protoestrelas podem até passar por estas erupções periodicamente.

Assim, quando a Nebulosa de McNeil foi identificada em 2004, os astrônomos amadores e profissionais anteciparam que ela iria desvanecer e então se avivar por volta de 2042, com base no intervalo entre 1966 e 2004. Na verdade, a nebulosa surpreendeu observadores com outro episódio de clareamento em 2008. Até hoje, embora o brilho da nebulosa tenha variado, ela não desapareceu completamente desde 2004.

Em 5 de novembro, o astrônomo britânico Mike Harlow, da Orwell Astronomical Society, observou com o telescópio de 500 mm da Universidade de Iowa, que a Nebulosa de McNeil havia desaparecido.

Quem sabe quando a Nebulosa de McNeil será iluminada novamente? Será que nos surpreenderá reaparecendo daqui a algumas semanas (ou meses)? Será que vamos ter que continuar monitorando este local por anos antes de decidir se mostrar de novo? Ou vimos o seu último suspiro, para nunca mais ser vista?

Fonte: Sky & Telescope

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

Uma serpente cósmica

Esta espiral serpenteante, captada pelo instrumento VISIR montado no Very Large Telescope (VLT) do ESO (VLT), enfrenta um futuro explosivo; trata-se de um sistema de estrelas Wolf-Rayet, uma fonte provável de um dos fenômenos mais energéticos do Universo, uma explosão de raios gama de longa duração.

Coils of Apep

© ESO/VLT (espirais de Apep)

O sistema, que compreende um ninho de estrelas massivas rodeado por um “catavento” de poeira, está catalogado como 2XMM J160050.7-514245, no entanto os astrônomos optaram por lhe dar o nome de “Apep”.

Apep era uma antiga divindade egípcia, uma serpente gigantesca que personificava o caos,  o que se adequa perfeitamente a um sistema estelar tão violento e com uma forma sinuosa, reminiscente de uma serpente enroscada em torno das estrelas centrais. Os antigos egípcios acreditavam que Rá, o Deus-Sol, combatia com Apep todas as noites; rezar e venerar Rá garantia a sua vitória e o regresso do Sol.

As explosões de raios gama encontram-se entre as mais poderosas do Universo. Com uma duração de alguns milésimos de segundo a algumas horas, estas explosões podem liberar tanta energia como a que o Sol liberará durante toda a sua vida. Pensa-se que as explosões de raios gama de longa duração, as que duram mais de 2 segundos, são causadas por estrelas Wolf-Rayet em rotação rápida que explodem sob a forma de supernovas.

Algumas das estrelas mais massivas evoluem para estrelas Wolf-Rayet no final das suas vidas. Esta fase dura pouco, sendo que as Wolf-Rayet sobrevivem neste estado durante apenas algumas centenas de milhares de anos. Durante este tempo, estas estrelas liberam enormes quantidades de matéria sob a forma de poderosos ventos estelares, lançando a matéria para o exterior com velocidades de milhões de km por hora; os ventos estelares de Apep estão viajando à incrível velocidade de 12 milhões de km por hora.

Estes ventos estelares deram origem a elaboradas plumas que rodeiam o sistema estelar triplo, constituído por um sistema estelar binário e uma estrela individual companheira ligados gravitacionalmente. Apesar de apenas dois objetos do tipo estelar serem visíveis na imagem, a fonte inferior é de fato um binário Wolf-Rayet não resolvido. É precisamente este binário que é responsável por esculpir as espirais serpenteantes que rodeiam Apep, as quais se formam a partir dos ventos estelares em colisão das duas estrelas Wolf-Rayet.

Comparada com a velocidade extraordinária dos ventos de Apep, o catavento de poeira espirala para o exterior mais lentamente, com uma velocidade inferior a dois milhões de km por hora. Pensa-se que esta discrepância entre a velocidade dos ventos rápidos de Apep e da roda de poeira se deve a uma das estrelas do binário estar lançando, em direções diferentes, tanto um vento rápido como um mais lento.

Isto significaria que a estrela apresenta uma rotação muito próxima da rotação crítica; isto é, gira tão rapidamente que está quase se autodestruindo neste processo. Pensa-se que uma estrela Wolf-Rayet com tão elevada rotação produza explosões de raios gama de longa duração quando o seu núcleo colapsa no final da sua vida.

Este trabalho foi publicado na revista Nature Astronomy.

Fonte: ESO

Correntes galácticas alimentam a galáxia mais luminosa do Universo

De acordo com observações do ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array), a galáxia mais luminosa do Universo foi apanhada no ato de despir quase metade da massa de pelo menos três das suas galáxias vizinhas mais próximas.

ilustração de W2246-0526

© NRAO/S. Dagnello (ilustração de W2246-0526)

A luz desta galáxia, conhecida como W2246-0526, demorou 12,4 bilhões de anos para chegar até nós, de modo que a vemos como era quando o nosso Universo tinha apenas um-décimo da sua idade atual.

As novas observações com o ALMA revelam correntes distintas de material sendo puxado de três galáxias menores e fluindo para a galáxia mais massiva, que foi descoberta em 2015 pelo WISE (Wide-field Infrared Survey Explorer) da NASA. Não é de forma alguma a maior galáxia que conhecemos, mas não tem rival no que toca ao seu brilho, emitindo o equivalente em luz infravermelha a 350 trilhões de sóis.

Os tentáculos de ligação entre galáxias contêm tanto material quanto as próprias galáxias. A incrível resolução e sensibilidade do ALMA permitiu que os pesquisadores detectassem estas correntes trans-galácticas notavelmente fracas e distantes.

O canibalismo galáctico não é incomum, embora esta seja a galáxia mais distante na qual tal comportamento foi observado, e os autores do estudo não estão cientes de quaisquer outras imagens diretas de uma galáxia se alimentando simultaneamente de material de múltiplas fontes naqueles primeiros tempos cósmicos.

Os pesquisadores enfatizam que a quantidade de gás que está sendo devorado por W2246-0526 é suficiente para mantê-la formando estrelas e alimentando o seu buraco negro central por centenas de milhões de anos.

A luminosidade surpreendente desta galáxia não se deve às suas estrelas individuais. Ao invés, o seu brilho é abastecido por um pequeno disco de gás, fantasticamente energético, que é superaquecido à medida que espirala para o buraco negro supermassivo. A luz deste incrivelmente brilhante disco de acreção é então absorvida pela poeira ao redor, que reemite a energia sob a forma de luz infravermelha.

O material do disco de acreção cai sobre o buraco negro, alimentando o Núcleo Galáctico Ativo (NGA), o que coloca esta galáxia numa rara classe de quasares conhecidos como "Hot DOGs" (Hot, Dust-Obscured Galaxies). Apenas cerca de um em cada 3.000 quasares observados pelo WISE pertence a esta classe.

Grande parte da poeira e do gás desviado das três galáxias menores está provavelmente sendo convertido em novas estrelas e alimentando o buraco negro supermassivo central. A gula desta galáxia, no entanto, pode levar à autodestruição. Estudos anteriores sugerem que a energia do NGA acabará por descartar muito, se não todo o combustível de formação estelar da galáxia.

Um trabalho anterior, liderado pelo autor Chao-Wei Tsai, estima que o buraco negro no centro de W2246-0526 tem cerca de 4 bilhões de vezes a massa do Sol. A massa do buraco negro influencia diretamente o brilho do NGA, mas o artigo mostra que W2246-0526 é cerca de três vezes mais luminoso do que deveria ser possível. A resolução desta aparente contradição exigirá mais observações.

A pesquisa foi publicada na revista Science.

Fonte: National Radio Astronomy Observatory

domingo, 18 de novembro de 2018

Aglomerados de galáxias em colisão

Escondidos em uma colisão distante de aglomerados de galáxias, há fragmentos de gás que lembram a nave estelar Enterprise, a nave espacial icônica da franquia "Star Trek".

Abell 1033

© Chandra/LOFAR/SDSS (Abell 1033)

Esta imagem do aglomerado de galáxias Abell 1033 fornece um exemplo de "pareidolia", um fenômeno psicológico em que formas e padrões familiares são vistos em dados aleatórios.

Os aglomerados de galáxias são estruturas cósmicas contendo centenas ou milhares de galáxias, sendo os maiores objetos do Universo unidos pela gravidade. O gás de vários milhões de graus preenche o espaço entre as galáxias individuais. A massa do gás quente é cerca de seis vezes maior que a de todas as galáxias combinadas. Esse gás superaquecido é invisível para os telescópios ópticos, mas brilha intensamente nos raios X, por isso é necessário um telescópio de raios X como o observatório de raios X Chandra da NASA para estudá-lo.

Combinando raios X com outros tipos de luz, como ondas de rádio, pode-se obter um quadro mais completo desses importantes objetos cósmicos. Uma nova imagem composta do aglomerado de galáxias Abell 1033, incluindo raios X de Chandra (roxo) e emissão de rádio da rede Low-Frequency Array (LOFAR) na Holanda (azul), faz exatamente isso. A emissão óptica do Sloan Digital Sky Survey também é mostrada. O aglomerado de galáxias Abell 1033 está localizado a cerca de 1,6 bilhão de anos-luz da Terra.

Usando dados de raios X e rádio, os cientistas determinaram que o Abell 1033 é na verdade dois aglomerados de galáxias no processo de colisão. Esse evento extraordinariamente energético, ocorrendo de cima para baixo na imagem, produziu ondas de choque e turbulência, semelhantes aos estrondos sônicos produzidos por um avião que se movia mais rápido que a velocidade do som.

No Abell 1033, a colisão interage com outro processo cósmico energético, a produção de jatos de partículas de alta velocidade por matéria espiralando em um buraco negro supermassivo, neste caso localizado em uma galáxia em um dos aglomerados. Esses jatos são revelados por emissão de rádio para os lados esquerdo e direito da imagem. A emissão de rádio é produzida por elétrons espiralando ao redor das linhas do campo magnético, um processo chamado de emissão síncrotron.

Os elétrons nos jatos estão viajando muito próximos da velocidade da luz. À medida que a galáxia e seu buraco negro se moviam em direção à parte inferior da imagem, o jato da direita reduziu a velocidade ao colidir com gás quente no outro aglomerado de galáxias. O jato da esquerda não diminuiu porque encontrou muito menos gás quente, dando uma aparência distorcida para os jatos, em vez da linha reta que é normalmente vista.

Isso sugere que os elétrons são reenergizados, presumivelmente quando os jatos interagem com ondas de choque no gás quente. Os elétrons que produzem a emissão de rádio normalmente perderão quantidades substanciais de energia em dezenas a centenas de milhões de anos à medida que vão irradiando. A emissão de rádio seria então indetectável. No entanto, a emissão de rádio amplamente observada em Abell 1033, que se estende por cerca de 500.000 anos-luz, implica que os elétrons energéticos estão presentes em maiores quantidades e com energias mais altas do que se pensava anteriormente. Um motivo é que os elétrons receberam um aumento adicional de energia devido as ondas de choques e turbulência.

Outras fontes de emissão de rádio na imagem além do objeto em forma de nave espacial são os jatos mais curtos de outra galáxia e uma "fênix de rádio" consistindo de uma nuvem de elétrons que desapareceu na emissão de rádio, mas foi reenergizada quando ondas de choque comprimiam a nuvem. Isso fez com que a nuvem brilhasse mais uma vez nas frequências de rádio, conforme reportado em 2015.

A equipe que fez este estudo utilizará observações com o Chandra e o LOFAR para procurar exemplos adicionais de aglomerados de galáxias em colisão com emissões de rádio distorcidas, para aprofundar sua compreensão desses objetos energéticos.

Um artigo descrevendo esse resultado foi publicado na Science Advances.

Fonte: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics

sábado, 17 de novembro de 2018

A dança das galáxias pequenas que rodeiam a Via Láctea

Uma equipe internacional, liderada por pesquisadores do Instituto de Astrofísica das Canárias (IAC), usou dados do satélite Gaia da ESA para medir o movimento de 39 galáxias anãs. Estes dados fornecem informações sobre a dinâmica destas galáxias, as suas histórias e as suas interações com a Via Láctea.

galáxias anãs em movimento

© ESA/Gaia/DPAC (galáxias anãs em movimento)

No fundo vemos a imagem construída a partir de fontes pontuais pelo Gaia. Só podemos ver as galáxias anãs mais brilhantes, e até elas são pouco visíveis. As galáxias estão legendadas com os seus nomes e as setas mostram a direção do seu movimento em relação ao centro da Via Láctea. A cor indica a direção radial: aquelas em azul estão se aproximando do centro, aquelas em vermelho estão se afastando.

Em torno da Via Láctea existem muitas galáxias anãs, que podem ser dezenas de milhares de vezes ou até milhões de vezes menos luminosas do que a Via Láctea. Em comparação com galáxias normais ou gigantes, as galáxias anãs contêm muito menos estrelas e, portanto, a sua luminosidade é menor.

Estas galáxias anãs foram objeto de estudo por parte de uma equipe internacional de astrônomos liderada por Tobias K. Fritz e Giuseppina Battaglia, ambos do IAC. Graças a dados obtidos pela missão espacial Gaia da ESA, que se tornaram disponíveis no seu segundo lançamento em abril de 2018, os cientistas puderam medir o movimento no céu de 39 galáxias anãs, determinando a sua direção e velocidade.

Antes do segundo lançamento de dados do satélite Gaia, não era possível realizar estas medições para 29 das galáxias analisadas. Os pesquisadores descobriram que muitas delas estão se movendo num plano conhecido como vasta estrutura polar.

Battaglia destaca que a origem da vasta estrutura polar não é ainda totalmente compreendida, mas as suas características parecem desafiar os modelos cosmológicos de formação galáctica. A Grande Nuvem de Magalhães também pode ser encontrada nesta estrutura plana, o que pode significar uma ligação.

Através da análise dos dados relativos aos movimentos, foi descoberto que várias das galáxias anãs têm órbitas que as aproximam das regiões internas da Via Láctea. A atração gravitacional que a Via Láctea exerce sobre estas galáxias pode ser comparada à ação das marés.

Consequentemente, é possível explicar as propriedades observadas de alguns destes objetos, como Hercules e Crater II. Por outro lado, surgem novas questões. Ao longo dos anos, observou-se que algumas galáxias têm características peculiares que podem, potencialmente, ter sido provocadas por perturbações de maré pela Via Láctea (por exemplo, Carina I), mas as suas órbitas não parecem confirmar esta hipótese.

As órbitas determinadas permitiram detectar que a maioria das galáxias estudadas se encontram próximo do pericentro da sua órbita (o ponto mais próximo do centro da Via Láctea). No entanto, a física básica explica que devem passar a maior parte do tempo perto do apocentro (o ponto mais distante do centro da Via Láctea). Isto sugere que devem existir muitas mais galáxias anãs que ainda precisam ser descobertas e que se escondem a grandes distâncias do centro da Via Láctea.

As galáxias anãs, além de serem interessantes por si só, são um dos poucos indicadores de matéria escura que podem ser usados nas partes mais externas da Via Láctea. Pensa-se que este tipo de matéria é responsável por cerca de 80% da massa total do Universo. No entanto, não pode ser observada diretamente, portanto, a sua detecção é difícil. Os movimentos de corpos celestes como as galáxias anãs podem ser usados para medir a massa total de matéria dentro de um volume. Para este objetivo, subtrai-se a massa destes objetos luminosos detectados e obtemos uma estimativa da quantidade de matéria escura. A partir destes dados, os pesquisadores podem inferir que a quantidade de matéria escura na Via Láctea é grande, aproximadamente 1,6 trilhões de massas solares.

Fonte: Instituto de Astrofísica de Canarias

Uma enorme galáxia "fantasma" situada nos arredores da Via Láctea

O satélite Gaia avistou uma enorme galáxia "fantasma" situada nos arredores da Via Láctea.

Antlia 2

© ESO/S. Brunie/G. Torrealba (Antlia 2)

a imagem mostra Antlia 2 (canto superior esquerdo), escondida no lado oposto da Via Láctea, é tão grande quanto a Grande Nuvem de Magalhães (canto inferior direito), mas muito mais fraca. Uma bolha brilhante e artificial representando Antlia 2 foi adicionada para mostrar sua localização.

Uma equipe internacional de astrônomos descobriu o objeto massivo quando vasculhava dados da missão da ESA.

O objeto, de nome Antlia 2 (ou Ant 2), tem evitado a detecção até agora devido à sua densidade extremamente baixa, bem como devido ao seu esconderijo perfeito, atrás do manto do disco da Via Láctea.

A Ant 2 é conhecida como uma galáxia anã. À medida que as estruturas surgiram no início do Universo, as anãs foram as primeiras galáxias formadas, de modo que a maioria das suas estrelas são velhas, de baixa massa e pobres em metal. Mas, em comparação com as outras satélites anãs conhecidas da nossa Galáxia, a Ant 2 é enorme: é tão grande quanto a Grande Nuvem de Magalhães e tem um-terço do tamanho da própria Via Láctea.

O que torna a Ant 2 ainda mais incomum é a pouca luz que fornece. Em comparação com a Grande Nuvem de Magalhães, outro satélite da Via Láctea, a Ant 2 é 10.000 vezes mais tênue. Por outras palavras, ou é demasiado larga para a sua luminosidade ou demasiado fraca para o seu tamanho.

A missão Gaia da ESA produziu o mais rico catálogo estelar até à data, incluindo medições de alta precisão de quase 1,7 bilhões de estrelas e revelando detalhes inéditos da nossa Galáxia. No início deste ano, o segundo lançamento de dados Gaia disponibilizou novos detalhes sobre as estrelas da Via Láctea.

Os cientistas examinaram os novos dados do Gaia em busca de satélites da Via Láctea usando estrelas RR Lyrae. Estas estrelas são velhas e pobres em metais, típicas das encontradas numa galáxia anã. As estrelas RR Lyrae mudam de brilho com um período de meio dia e podem ser localizadas graças a estes pulsos bem definidos.

A equipe contactou colegas do Anglo-Australian Telescope (AAT) na Austrália, mas quando verificaram as coordenadas de Ant 2, perceberam que tinham apenas uma janela limitada de oportunidades para obter dados de acompanhamento. Foram capazes de medir o espectro de mais de 100 estrelas gigantes vermelhas pouco antes do movimento da Terra ao redor do Sol tornar Ant 2 inobservável durante meses.

Os espectros permitiram a confirmação de que o objeto fantasmagórico que haviam avistado era real: todas as estrelas se movimentavam juntas. A Ant 2 nunca chega muito perto da Via Láctea, ficando sempre pelo menos a 40 kpc (kiloparsecs, cerca de 130.000 anos-luz) de distância. Os pesquisadores também foram capazes de obter a massa da galáxia, que é muito menor do que o esperado para um objeto deste tamanho.

Se é impossível "inchar" a anã removendo-lhe matéria, então Ant 2 deve ter nascido enormíssima. A equipe ainda precisa de descobrir o processo exato que tornou Ant 2 tão estendida. Embora objetos deste tamanho e luminosidade não tenham sido previstos pelos modelos atuais de formação galáctica, especulou-se recentemente que algumas anãs podem ser inchadas por vigorosa formação estelar. Os ventos estelares e as explosões de supernova afastariam o gás não utilizado, enfraquecendo a gravidade que une a galáxia e permitindo que a matéria escura também se desvie.

Alternativamente, a baixa densidade de Ant 2 pode significar que é necessária uma modificação nas propriedades da matéria escura. A teoria atualmente favorecida prevê que a matéria escura se acumule nos centros das galáxias. Dada a aparência leve da nova anã, poderá ser necessária uma partícula de matéria escura que gosta menos de se agrupar.

O espaço entre Ant 2 e o resto das galáxias anãs é tão grande que isso poderá ser um indício de que falta alguma física importante nos modelos de formação das galáxias anãs. Resolver o enigma de Ant 2 pode ajudar a entender como surgiram as primeiras estruturas do Universo primitivo. A descoberta de mais objetos como Ant 2 mostrará quão comuns são estas galáxias fantasmagóricas, e a equipe está ocupada em procurar outras galáxias semelhantes nos dados do Gaia.

Fonte: University of Cambridge

quinta-feira, 15 de novembro de 2018

Uma super-Terra orbita a Estrela de Barnard

Foi detectado um planeta em órbita da Estrela de Barnard, a uns meros 6 anos-luz de distância da Terra.

ilustração de uma super-Terra em órbita da Estrela de Barnard

© ESO/M. Kornmesser (ilustração de uma super-Terra em órbita da Estrela de Barnard)

Esta descoberta é o resultado das campanhas Pontos Vermelhos e CARMENES, cuja busca de planetas rochosos próximos revelou já um novo mundo em órbita da nossa vizinha mais próxima, a Proxima Centauri.

O planeta, designado Estrela de Barnard b, ocupa o lugar de segundo exoplaneta conhecido mais próximo da Terra. As estrelas mais próximas do Sol constituem o sistema estelar triplo de Alfa Centauri, sendo Proxima Centauri a estrela mais próxima da Terra deste sistema.

Os dados colectados indicam que o planeta pode ser uma super-Terra, com uma massa de, pelo menos, 3,2 vezes a massa da Terra, e que orbita a sua estrela hospedeira com um período de cerca de 233 dias. A Estrela de Barnard é uma anã vermelha, ou seja, uma estrela fria de pequena massa que ilumina pouco o mundo agora descoberto. A luz da estrela dá ao seu planeta apenas 2% da energia que a Terra recebe do Sol.

Apesar de se encontrar relativamente perto da sua estrela progenitora, a uma distância de apenas 0,4 vezes a distância entre a Terra e o Sol, o exoplaneta situa-se próximo da linha de neve, a região onde compostos voláteis, tais como a água, podem condensar-se em gelo sólido. Este mundo gelado e sombrio pode ter uma temperatura de -170º C, o que o tornaria hostil para a vida tal como a conhecemos.

Retirando o seu nome do astrônomo E. E. Barnard, a Estrela de Barnard é a estrela individual situada mais próximo do Sol. Apesar da estrela propriamente dita ser antiga, terá provavelmente o dobro da idade do Sol, e relativamente inativa, é na realidade a estrela com o movimento aparente mais rápido de todo o céu noturno. A velocidade total da Estrela de Barnard relativamente ao Sol é de cerca de 500.000 km/h. Apesar de ser muito rápida, esta não é no entanto a estrela mais rápida conhecida. O que torna o movimento de uma estrela digno de nota é o quão rápido esta parece mover-se no céu noturno vista a partir da Terra, o chamado movimento aparente. A Estrela de Barnard cobre uma distância equivalente ao diâmetro da Lua no céu em 180 anos.

As super-Terras são o tipo mais comum de planeta que se forma em torno de estrelas de pequena massa como a Estrela de Barnard, o que dá credibilidade ao recentemente descoberto candidato a planeta. Adicionalmente, as atuais teorias de formação planetária prevêem que a linha de neve é o local ideal para a formação de tais planetas.

Buscas anteriores de um planeta em torno da Estrela de Barnard tiveram resultados decepcionantes, esta descoberta foi agora possível apenas porque se combinaram medições de diversos instrumentos de alta precisão montados em telescópios de todo o mundo. Entre os instrumentos usados estão os famosos caçadores de planetas do ESO, os espectrógrafos HARPS e UVES.

Os astrônomos usaram o efeito Doppler para encontrar o candidato a exoplaneta. À medida que o planeta orbita a estrela, a sua atração gravitacional faz com que a estrela oscile ligeiramente. Quando a estrela se afasta da Terra, o seu espectro desvia-se para o vermelho, ou seja, desloca-se para os maiores comprimentos de onda. Do mesmo modo, quando a estrela se aproxima da Terra, a sua luz é desviada para os comprimentos de onda menores, mais azuis.

Por intermédio do efeito Doppler foi possível medir, com uma precisão extraordinária, as variações na velocidade da estrela devido à existência de um planeta em sua órbita. O HARPS consegue detectar variações na velocidade de uma estrela tão pequenas quanto 3,5 km/hora, o que equivale à velocidade de passo de uma pessoa. Este método de procura de exoplanetas é conhecido por método das velocidades radiais e, até agora, nunca tinha sido usado para detectar um exoplaneta do tipo super-Terra numa órbita tão extensa em torno da sua estrela.

Este trabalho foi publicado hoje na revista Nature.

Fonte: ESO