sábado, 1 de janeiro de 2022

A assinatura de um campo magnético num exoplaneta

Uma equipe internacional de astrônomos utilizou dados do telescópio espacial Hubble para descobrir a assinatura de um campo magnético num exoplaneta.

© D. Bajram/U. de Genebra (ilustração do exoplaneta HAT-P-11b)

A descoberta assinala a primeira vez que tal característica foi vista num exoplaneta. Um campo magnético é o que melhor explica as observações de uma extensa região de partículas de carbono carregadas que rodeiam o planeta e viajam para longe numa longa cauda. 

Os campos magnéticos desempenham um papel crucial na proteção das atmosferas planetárias, pelo que a capacidade de detectar os campos magnéticos dos exoplanetas é um passo significativo para uma melhor compreensão do aspeto destes mundos alienígenas.

Os astrônomos observaram o planeta HAT-P-11b, que possui o tamanho de Netuno, a 123 anos-luz da Terra, passando diretamente pela face (trânsito) da sua estrela hospedeira seis vezes. As observações foram feitas no ultravioleta, comprimento de onda que está imediatamente abaixo do que o olho humano pode ver. 

O Hubble detectou íons de carbono na magnetosfera do planeta. Uma magnetosfera é uma região em torno de um objeto celeste (como a Terra) que é formada pela interação do objeto com o vento solar emitido pela sua estrela hospedeira. Esta é a primeira vez que a assinatura do campo magnético de um exoplaneta é diretamente detectada. 

Um forte campo magnético num planeta como a Terra pode proteger a sua atmosfera e superfície do bombardeamento direto das partículas energéticas que compõem o vento solar. Estes processos afetam fortemente a evolução da vida num planeta como a Terra, porque o campo magnético protege os organismos destas partículas energéticas.

A descoberta da magnetosfera de HAT-P-11b é um passo significativo para uma melhor compreensão da habitabilidade de um exoplaneta. Nem todos os planetas e luas no nosso Sistema Solar têm os seus próprios campos magnéticos, e os pesquisadores dizem que a ligação entre campos magnéticos e a habitabilidade de um planeta ainda precisa de mais estudos.

Uma descoberta fundamental foi a observação de íons de carbono não só numa região em torno do planeta, mas também estendendo-se numa longa cauda que se afasta do planeta a velocidades médias de cerca de 160.000 km/h. A cauda estende-se pelo menos por 1 unidade astronômica, a distância entre a Terra e o Sol. 

Os pesquisadores utilizaram depois simulações computorizadas 3D para modelar as interações entre as regiões atmosféricas mais elevadas do planeta e o campo magnético com o vento estelar. Tal como o campo magnético da Terra e o seu ambiente espacial imediato interagem com o vento solar, que consiste em partículas carregadas que viajam a quase 1,5 milhões de quilômetros por hora, existem interações entre o campo magnético de HAT-P-11b e o seu ambiente espacial imediato com o vento solar da sua estrela progenitora, e estas são muito complexas. 

A física nas magnetosferas da Terra e de HAT-P-11b é a mesma; no entanto, a proximidade do planeta à sua estrela, apenas um-vigésimo da distância da Terra ao Sol, faz com que a sua atmosfera superior seja aquecida, resultando na formação da magnetocauda.

Os cientistas também descobriram que a metalicidade da atmosfera de HAT-P-11b é inferior ao esperado. No nosso Sistema Solar, os planetas gelados e gasosos, Netuno e Urano, são ricos em metais, mas têm campos magnéticos fracos, enquanto os planetas gasosos maiores, Júpiter e Saturno, têm baixa metalicidade e fortes campos magnéticos. 

A baixa metalicidade atmosférica de HAT-P-11b desafia os modelos atuais de formação exoplanetária. Embora a massa de HAT-P-11b seja apenas 8% da de Júpiter, é possível que o exoplaneta se assemelhe mais a um mini-Júpiter do que a Netuno.

Um artigo foi na revista Nature Astronomy.

Fonte: University of Arizona

Encontrada análoga da Via Láctea no Universo jovem

Uma equipe internacional, que inclui pesquisadores do Instituto de Astrofísica das Canárias (IAC), utilizou dados combinados de diferentes radiotelescópios localizados na Espanha para estudar o modo de formação estelar numa galáxia quando o Universo tinha menos de 30% da sua idade atual.

© ESA/Hubble (Cavalo Marinho Cósmico)

Revelaram que as propriedades do reservatório molecular de gás são semelhantes às do nosso próprio reservatório na Via Láctea, algo nunca visto até agora no Universo distante.

Uma questão importante no estudo das galáxias é o modo de formação estelar, quão eficiente é a conversão do gás frio em estrelas. Até agora, as galáxias no início do Universo pareciam formar estrelas de uma forma diferente da observada na nossa própria Galáxia, o que é intrigante. 

Para lançar luz sobre esta questão, o gás molecular frio, o combustível para a formação das estrelas, é observado com radiotelescópios. Devido às propriedades físicas do gás hidrogênio molecular (H2), não pode ser observado diretamente no rádio, mas pode ser rastreado através da molécula de monóxido de carbono (CO). Primeiro, os pesquisadores selecionaram uma galáxia cujo brilho é potenciado por lentes gravitacionais graças a um aglomerado interveniente de galáxias. Em seguida, procuraram dados de arquivo de missões espaciais infravermelhas em combinação com imagens pelo telescópio espacial Hubble. A galáxia descoberta sofre fortes efeitos de lentes gravitacionais por um fator de aproximadamente 10 e assim a sua morfologia assemelha-se a um cavalo marinho.

A distância desta galáxia foi revelada (notou-se que a luz viajou durante 9,6 bilhões de anos) graças a observações das linhas de monóxido de carbono com o radiotelescópio de 30 metros do IRAM (Instituto de Radioastronomía Milimétrica) localizado na Sierra Nevada. Juntamente com observações do radiotelescópio Yebes de 40 metros localizado em Yebes, 50 km para nordeste de Madrid e operado pelo IGN (Instituto Geográfico Nacional), as propriedades físicas do combustível da formação estelar através das observações de várias linhas moleculares de gás também puderam ser derivadas. É a galáxia mais distante detectada até agora com o radiotelescópio Yebes de 40 metros.

Através da análise do gás molecular frio, os cientistas também descobriram a presença de um mecanismo de formação estelar previamente invisível e de atividade de buracos negros no Universo.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: Instituto de Astrofísica de Canarias

terça-feira, 28 de dezembro de 2021

Encontrados braços espirais fósseis na Via Láctea

Uma equipe internacional de astrônomos, liderada pelo pesquisador Chervin Laporte do Instituto de Ciências do Cosmos da Universidade de Barcelona, utilizou dados da missão espacial Gaia para criar um novo mapa do disco externo da Via Láctea.


© C. laporte/Gaia (mapa celeste mostrando o movimento da Via Láctea)

A imagem acima mostra um mapa de todo o céu evidenciando o movimento da Via Láctea, através dos dados do Gaia. As áreas com movimento significativo são mostradas em preto/púrpura e aquelas com movimento relativamente baixo em amarelo. Várias estruturas de discos filamentosos de grande escala são evidentes sobre o plano médio. O mapa também mostra as nuvens de Magalhães e a sua ponte estelar de ligação à esquerda, enquanto a galáxia anã de Sagitário, atualmente sendo dilacerada, pode ser vista à direita.

Curiosamente, as estruturas recentemente encontradas incluem provas de braços espirais fósseis. A equipa analisou os dados de movimento recolhidos pelo Gaia, disponíveis desde dezembro de 2020, para identificar estruturas coerentes. O seu mapa resultante revelou a existência de muitas estruturas filamentosas e giratórias anteriormente desconhecidas na orla do disco. Também deu uma visão global mais nítida de estruturas anteriormente conhecidas.

As simulações numéricas preveem que tais estruturas filamentares se formem no disco externo a partir de interações passadas com galáxias satélites, mas a enorme quantidade de subestruturas reveladas por este mapa não era esperada e permanece um mistério. O que podem ser estas estruturas? Uma possibilidade é que são os remanescentes de braços do disco da Via Láctea excitados em diferentes momentos por várias galáxias satélites. 

A Via Láctea está agora rodeada por 50 destas galáxias satélites e já absorveu várias outras galáxias no seu passado. Atualmente, pensa-se que a Via Láctea esteja sendo perturbada pela galáxia anã de Sagitário, mas no seu passado mais distante interagiu com outra intrusa, de nome Salsicha Gaia, que agora dispersou os seus detritos na periferia da nossa Galáxia.

Num estudo anterior, a mesma equipe mostrou que uma das estruturas filamentares no disco externo, a Corrente do Anticentro, tinha estrelas predominantemente com mais de 8 bilhões de anos. Isto torna-a potencialmente demasiado velha para ter sido excitada apenas por Sagitário e, ao invés, aponta para a Salsicha Gaia. Outra possibilidade é que nem todas estas estruturas sejam verdadeiros braços espirais fósseis, mas em vez disso formem as "cristas" de distorções verticais em grande escala no disco da Via Láctea.

"Pensamos que os discos respondem aos impactos de galáxias satélites, o que cria ondas verticais que se propagam como ondulações num lago," diz Laporte. Para tentar distinguir entre as duas explicações, a equipe assegurou agora um programa dedicado de acompanhamento com o telescópio William Herschel nas Ilhas Canárias a fim de estudar as propriedades das populações estelares em cada subestrutura. Os futuros levantamentos vão ajudar a esclarecer a natureza e a origem destas finas estruturas celestes.

Tipicamente, esta região da Via Láctea tem permanecido pouco explorada devido à poeira interveniente que obscurece severamente a maior parte do plano Galáctico. Ao passo que a poeira afeta a luminosidade de uma estrela, o seu movimento permanece inalterado. Resta agora o desafio de descobrir o que são exatamente estas coisas, a sua origem, porque é que existem em tão grande número, e o que nos podem dizer sobre a Via Láctea, sobre a sua formação e evolução.

Um artigo foi publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society

Fonte: Royal Astronomical Society

quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

Descoberto o maior grupo de planetas errantes

Planetas errantes, nômades ou livres, são objetos cósmicos elusivos que apresentam massas comparáveis às dos planetas do nosso Sistema Solar mas que não orbitam estrela alguma, vagueando livremente por conta própria.

© ESO/M. Kornmesser (ilustração de um planeta nômade em Rho Ophiuchi)

Até agora não se conheciam muitos objetos deste tipo, mas, utilizando dados de vários telescópios do ESO e de outros observatórios, uma equipe de astrônomos acaba de descobrir pelo menos 70 novos planetas errantes na nossa Galáxia. Trata-se do maior grupo deste tipo de planetas já descoberto, o que corresponde a um passo importante para a nossa compreensão das origens e estrutura destes misteriosos nômades galácticos. 

Planetas nômades, que se deslocam longe de qualquer estrela que os ilumine, seriam normalmente impossíveis de observar. No entanto, os astrônomos tiraram proveito do fato de, alguns milhões de anos após a sua formação, estes planetas estarem ainda suficientemente quentes para brilharem, o que os torna diretamente detectáveis pelas câmaras sensíveis dos grandes telescópios. Estes novos planetas errantes com massas comparáveis à de Júpiter estão numa região de formação estelar próxima do nosso Sol, na direção das constelações do Escorpião e de Ofiúco. 

O número exato de planetas errantes descoberto pela equipe é difícil de determinar porque as observações não permitem aos pesquisadores medir as massas dos objetos estudados. Objetos com massas superiores a 13 vezes a massa de Júpiter provavelmente não são planetas, por isso não podem ser incluídos na contagem. Então, o brilho dos planetas forneceu um limite superior para o número de planetas nômades observados. O brilho está relacionado com a idade dos próprios planetas, uma vez que quanto mais velho for o planeta há mais tempo ele está esfriando e consequentemente diminuindo de brilho. Se a região estudada for antiga, então os objetos mais brilhantes do grupo têm provavelmente mais que 13 massas de Júpiter. Dada a incerteza da idade da região estudada, este método nos dá um número de planetas errantes entre 70 e 170. 

Para encontrar tantos planetas nômades, foi utilizado dados de um número de telescópios colocados tanto no solo como no espaço, que cobrem um intervalo temporal de 20 anos. A equipe usou observações do Very Large Telescope (VLT), do Visible and Infrared Survey Telescope for Astronomy (VISTA), do VLT Survey Telescope (VST) e do telescópio MPG/ESO de 2,2 metros, todos do ESO e localizados no Chile, junto com outras instalações. A equipe usou também dados do satélite Gaia, da Agência Espacial Europeia (ESA), marcando assim o enorme sucesso de colaboração entre telescópios no solo e no espaço na exploração e compreensão do nosso Universo. O estudo sugere que poderão existir muito mais destes planetas errantes que ainda não foram descobertos.

O estudo destes planetas livres recentemente descobertos poderá dar aos astrônomos pistas de como é que estes objetos misteriosos se formam. Alguns cientistas acreditam que os planetas nômades se formam a partir do colapso de uma nuvem de gás que é muito pequena para levar à formação de uma estrela, ou então que estes planetas poderão ter sido ejetados do seu sistema original. Mas, qual mecanismo é mais provável permanece desconhecido.

Outros avanços na tecnologia serão a chave para desvendar o mistério desses planetas nômades. A equipe espera continuar a estudá-los com mais detalhe com o futuro Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, atualmente em construção no deserto chileno do Atacama e que deverá começar a operar mais para o final desta década. 

Esta pesquisa foi apresentada no artigo intitulado “A rich population of free-floating planets in the Upper Scorpius young stellar association” publicado na revista Nature Astronomy

Fonte: ESO

segunda-feira, 20 de dezembro de 2021

Uma pitada de estrelas

O aglomerado de estrelas aberto NGC 1755 se assemelha a uma pitada de sal espalhada em uma toalha de mesa preta nesta imagem do telescópio espacial Hubble.

© Hubble (NGC 1755)

Esta coleção de estrelas reside em um dos vizinhos próximos da Via Láctea, a Grande Nuvem de Magalhães, e mede 120 anos-luz de diâmetro. Apesar de sua amplitude impressionante, o NGC 1755 é um membro da classe menor de aglomerados de estrelas.

Aglomerados de estrelas são coleções de estrelas ligadas gravitacionalmente e possuem duas variedades principais: aglomerados abertos menores como NGC 1755, que hospeda estrelas mais jovens, e aglomerados globulares gigantescos, que podem conter milhões de estrelas mais velhas. 

O telescópio espacial Hubble olhou para o coração do NGC 1755 para entender melhor como diferentes populações de estrelas podem coexistir em um único aglomerado. Uma população de estrelas é um grupo de estrelas com propriedades semelhantes, como idade ou composição química, e estas populações fornecem aos astrônomos informações valiosas sobre o nascimento, a vida e a morte de estrelas.

Os aglomerados nas Nuvens de Magalhães são laboratórios naturais particularmente úteis graças à proximidade das Nuvens com a Via Láctea. A visão de olho de águia do Hubble foi um recurso vital ao observar o aglomerado NGC 1755, com tantas estrelas compactadas em uma pequena área do céu, a Advanced Camera for Surveys e a Wide Field Camera 3 do Hubble permitiram que estrelas individuais no aglomerado fossem distinguidas. 

Fonte: NASA

domingo, 19 de dezembro de 2021

Exoplaneta feito de metais pesados orbita estrela próxima

Cinco mil mundos. Este é o próximo e mais almejado marco na busca contínua por exoplanetas.

© NASA/G. Bacon (exoplaneta orbitando estrela anã vermelha)

E o seu total confirmado nos catálogos está apenas a algumas centenas antes dele. Entretanto, mais importante do que os próprios números, é a diversidade que eles revelam. Uma fração dos mundos se assemelham aos que orbitam nosso Sol. Mas a maioria são muito mais alienígenas: gigantes gasosos chamuscados que circulam sua estrela a cada alguns dias, do tamanho de Netuno com a densidade de algodão doce, e séries de planetas pequenos esmagados como sardinhas ao redor de minúsculas estrelas geladas.

O mais novo exoplaneta esquisito a desafiar nossas preconcepções e reforçar o quanto ainda temos para descobrir é GJ 367b. Ele é um mundo tão estranho que parece se encaixar melhor em uma capa de álbum de heavy metal ou nas páginas de uma história de ficção científica de baixa qualidade do que na realidade.

Anunciado em 2 de dezembro no periódico Science, este planeta pode ser, essencialmente, uma esfera brilhante de ferro meio derretido com três quartos do tamanho da Terra. Foi descoberto por Kristine Lame, do Centro Alemão Aeroespacial (DLR), usando o Transiting Exoplanet Survey Satellite (TESS) da NASA, o GJ 367b é um mundo “sub-Terra” peculiar localizado relativamente próximo, ao redor de uma pequena anã vermelha a aproximadamente 31 anos-luz de distância de nós.

As medições do TESS mostraram que o planeta possui 9.000 quilômetros de diâmetro, aproximadamente um terço maior que Marte, e observações subsequentes usando outra instalação, o High Accuracy Radial Velocity Planet Searcher (HARPS), do Observatório Europeu do Sul (ESO), revelou que ele possui metade da massa da Terra. Desta forma, ao considerá-los em conjunto, estes resultados sugerem uma densidade espantosa, cerca de oito gramas por centímetro cúbico, próxima da do ferro, com o resto do planeta envolto de um manto rochoso de silicatos, uma estrutura similar a Mercúrio, no nosso Sistema Solar. Mas, ao contrário de Mercúrio, que gira a 58 quilômetros do Sol em uma órbita de 88 dias, GJ 367b é muito mais próximo de sua estrela, completando uma órbita em apenas 7,7 horas em uma distância de somente um milhão de quilômetros. Isto significa que a temperatura da superfície banhada de luz pode ser tão alta quanto 1.500°C, o suficiente para derreter tanto rochas como metais.

Cerca de 100 destes exoplanetas rochosos de período ultracurto foram encontrados, mas GJ 367b se destaca entre eles como o menor e menos massivo já visto. Sua proximidade com a sua estrela significa que ele muito provavelmente teve sua rotação travada pelos efeitos gravitacionais, significando que ele sempre tem o mesmo hemisfério voltado na direção da estrela, como a Lua faz com a Terra. 

As enormes temperaturas no lado do dia podem indicar que esta metade do planeta está coberta de um oceano de magma. Enquanto isto, o lado da noite do planeta teria temperaturas imensamente menores, onde ele deve ser sólido. Esta diferença pode resultar em ventos tempestuosos se o planeta tiver qualquer coisa semelhante a uma atmosfera. Mas a maioria dos especialistas acreditam que a proximidade estelar extrema do GJ 367b o deixou sem qualquer atmosfera há muito tempo. Como o planeta alcançou este estado abismal é um mistério que pode conter implicações importantes para nosso próprio Sistema Solar.

As mesmas forças gravitacionais que levaram GJ 367b a travar sua rotação deveriam ter impedido o processo de formação planetária em primeiro lugar. Acredita-se que planetas não podem se formar extremamente perto de suas estrelas. Ao contrário, eles provavelmente migraram de fora para dentro, um processo que algumas vezes leva a choques interplanetários espetaculares quando mundos literalmente colidem. Impactos gigantes semelhantes podem ter dado a forma ao planeta Mercúrio, que, talvez, um dia pode ter tido uma estrutura mais semelhante à da Terra.

Planetas semelhantes a Netuno ainda são notavelmente ausentes nestes arredores extremos. A explicação pode ser que estes planetas, empurrados para dentro por outro planeta no sistema, perdem suas atmosferas de hidrogênio e hélio enquanto eles se aproximam das estrelas, deixando apenas seus interiores rochosos para trás.

Para Mercúrio, dada sua distância comparavelmente maior do Sol, uma história de origem tão exótica é improvável. Mas estudos futuros de Mercúrio, ao lado de mais observações e descobertas de planetas de período ultracurto com instalações da próxima geração, como o telescópio espacial James Webb, podem nos trazer mais perto de responder como tais mundos surgiram. Mais do que qualquer coisa, este trabalho continua destacando que, entre os milhares de planetas localizados além do Sistema Solar que hoje conhecemos, continuamos encontrando mundos estranhos.

Fonte: Scientific American

quarta-feira, 15 de dezembro de 2021

Uma estrela jovem parecida com o Sol

Espiando um sistema estelar localizado a dúzias de anos-luz da Terra, os astrônomos observaram, pela primeira vez, uma estrela chamada EK Draconis que ejetou uma quantidade gigantesca de energia e partículas carregadas num evento muito mais poderoso do que qualquer evento do gênero já visto no nosso próprio Sistema Solar.

© NAOJ (ilustração da estrela EK Draconis ejetando massa coronal)

O estudo explora um fenômeno estelar denominado "ejeção de massa coronal", também conhecido como tempestade solar. O nosso Sol emite este tipo de erupções regularmente. São compostas por nuvens de partículas extremamente quentes, ou plasma, que podem viajar pelo espaço a velocidades de milhões de quilômetros por hora. As ejeções de massa coronal podem ter um sério impacto na Terra e na sociedade humana, se uma ejeção de massa coronal atingir a Terra, pode danificar satélites em órbita e afetar as redes de energia que servem cidades inteiras.

O novo estudo, liderado por Kosuke Nakemata do NAOJ (National Astronomical Observatory of Japan) também sugere que as explosões podem ficar muito piores. Os pesquisadores usaram telescópios no solo e no espaço para espiar EK Draconis, que parece uma versão jovem do Sol. Em abril de 2020, a equipe observou EK Draconis ejetando uma nuvem de plasma escaldante com uma massa de um quatrilhão de quilogramas, mais de 10 vezes maior do que a ejeção de massa coronal mais poderosa já registada numa estrela parecida com o Sol. O evento pode servir como um aviso de quão perigoso pode ser o clima espacial.

As ejeções de massa coronal geralmente ocorrem logo depois que uma estrela libera uma proeminência, ou uma explosão repentina e brilhante de radiação que pode estender-se para o espaço. No entanto, pesquisas recentes sugeriram que, no Sol, esta sequência de eventos pode ser relativamente tranquila. Em 2019, por exemplo, um estudo mostrou que jovens estrelas semelhantes ao Sol, na Galáxia, parecem ter superproeminências frequentes, como as nossas próprias proeminências solares, mas dezenas ou até centenas de vezes mais poderosas. Tal superproeminência também pode ocorrer no Sol, mas não com muita frequência, talvez uma vez a cada vários milhares de anos. Ainda assim, uma superproeminência também poderia levar a uma superejeção de massa coronal?

Para descobrir, os pesquisadores voltaram-se para EK Draconis. A curiosa estrela tem quase o mesmo tamanho que o nosso Sol mas, com apenas 100 milhões de anos, é relativamente jovem no sentido cósmico. O nosso Sol era assim há 4,5 mil milhões de anos. Os pesquisadores observaram a estrela durante 32 noites no inverno e na primavera de 2020 usando o TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA e o telescópio SEIMEI da Universidade de Kyoto. E, no dia 5 de abril, os pesquisadores observaram em EK Draconis a liberação de uma superproeminência realmente grande. Cerca de 30 minutos depois, a foi observado o que parecia ser uma ejeção de massa coronal voando para longe da superfície da estrela. Foi captada apenas a primeira etapa deste fenómeno, chamada fase de "erupção do filamento". Mas, mesmo assim, era um monstro, movendo-se a uma velocidade máxima de 1,6 milhões de quilômetros por hora.

O Sol também pode ser capaz de tais eventos extremos. Mas, tal como as superproeminências, as superejeções de massa coronal são provavelmente raras para estrelas com a idade do nosso Sol. Ainda assim, as grandes ejeções de massa podem ter sido muito mais comuns nos primeiros anos do Sistema Solar. As ejeções gigantescas de massa coronal podem ter ajudado a moldar planetas como a Terra e Marte.

Os resultados foram publicados na revista Nature Astronomy.

Fonte: National Astronomical Observatory of Japan

O flash óptico mais rápido emitido por uma supernova recém-nascida

Uma equipe de astrônomos descobriu o flash óptico mais rápido de uma supernova Tipo Ia.

© U. Kyoto (ilustração de supernova após explosão de anã branca)

Muitas estrelas terminam as suas vidas por meio de uma explosão espetacular. A maioria das estrelas massivas explodirá como uma supernova. Embora uma estrela anã branca seja o remanescente de uma estrela de massa intermediária como o nosso Sol, ela pode explodir se a estrela fizer parte de um sistema estelar binário íntimo, onde duas estrelas se orbitam uma à outra. Este tipo de supernova é classificado como supernova Tipo Ia. 

Por causa do brilho uniforme e extremamente alto das supernovas Tipo Ia, cerca de 5 bilhões de vezes mais brilhantes que o nosso Sol, são amplamente usadas como uma vela padrão para medições de distância em astronomia. Como exemplo de maior sucesso, as supernovas Tipo Ia ajudaram os cientistas a descobrir a expansão acelerada do Universo. 

Mas, apesar do grande sucesso da cosmologia das supernovas Tipo Ia, os pesquisadores ainda debatem questões básicas como o aspeto dos sistemas progenitores das supernovas Tipo Ia e o modo como as explosões das supernovas Tipo Ia são iniciadas. Para resolver estes problemas de longa data, uma equipe de astrônomos liderada por Ji-an Jiang, do Instituto Kavli para Física e Matemática do Universo, tentou captar supernovas Tipo Ia até um dia após as suas explosões, de nome supernovas Tipo Ia de fase inicial, usando novas instalações de levantamento de campo amplo, incluindo a câmara Tomo-e Gozen, o primeiro gerador, do mundo, de mosaicos de campo amplo com sensor CMOS. 

Ao verificar regularmente as candidatas a supernova Tipo Ia de fase inicial descobertas pelo levantamento de transientes Tomo-e, uma candidata chamada Tomo-e202004aaelb chamou a atenção de Jiang. "Tomo-e202004aaelb foi descoberta como tendo alto brilho no dia 21 de abril de 2020. Surpreendentemente, o seu brilho mostrou uma variação significativa nos dois dias seguintes e depois comportou-se como uma supernova Tipo Ia de fase inicial normal. Descobrimos várias supernovas Tipo Ia de fase inicial que mostram um excesso de emissão interessante nos primeiros dias das suas explosões, mas nunca tínhamos visto uma emissão precoce tão rápida e proeminente em comprimentos de onda ópticos. Graças ao modo de levantamento de alta cadência e ao excelente desempenho da Tomo-e Gozen, pudemos capturar perfeitamente esta característica pela primeira vez. Um flash precoce tão rápido deve ter origem diferente em comparação com as supernovas Tipo Ia em excesso anteriormente descobertas," disse Jiang. 

As simulações computacionais pelo professor Keiichi Maeda, da Universidade de Kyoto, mostraram que a origem do misterioso e rápido flash óptico pode ser explicada pela energia liberada a partir de uma interação entre o material ejetado da supernova e um material circunstelar denso e confinado logo após a explosão de supernova.

Por meio de observações espectroscópicas pelo telescópio Seimei da Universidade de Kyoto, a equipe descobriu que a supernova é uma variante das supernovas Tipo Ia mais brilhantes. Na primeira análise do espectro obtido logo o flash inicial, destacou-se como algo diferente das supernovas normais. Foi notado que uma classe mais brilhante de supernovas Tipo Ia poderia parecer-se com esta se fossem observadas numa fase tão inicial. A classificação foi subsequentemente confirmada à medida que o espectro evoluía para se parecer cada vez mais com as brilhantes supernovas Tipo Ia.

O resultado mostra que pelo menos uma fração das supernovas Tipo Ia têm origem num ambiente circunstelar denso, o que fornece uma restrição estrita ao sistema progenitor destes fenômenos espetaculares no nosso Universo. Tendo em que conta que Tomo-e202004aaelb (SN 2020hvf) é muito mais brilhante do que as típicas supernovas Tipo Ia usadas como indicador de distância, a descoberta permitirá que os astrônomos testem várias teorias propostas para estas peculiares supernovas superluminosas Tipo Ia.

"Construímos anteriormente modelos teóricos de anãs brancas giratórias de massa super-Chandrasekhar e das suas explosões. Estes modelos massivos podem ser consistentes com o brilho máximo de SN 2020hvf, mas é necessário mais trabalho teórico para explicar as propriedades observacionais detalhadas. A SN 2020hvf forneceu uma oportunidade maravilhosa de colaboração entre a teoria e as observações," disse Ken'ichi Nomoto, cientista sênior do Instituto Kavli para Física e Matemática do Universo. 

Os pesquisadores continuarão procurando a resposta para a questão de longa data da origem das supernovas Tipo Ia, realizando levantamentos transientes com telescópios por todo o mundo. "Usamos as supernovas Tipo Ia para medir a expansão do Universo, embora as suas origens não sejam bem compreendidas. A fotometria das supernovas Tipo Ia de fase inicial fornece informações únicas para entender as suas origens e, portanto, deve contribuir para medições mais precisas da expansão do Universo no futuro próximo," disse o professor Mamoru Doi, da Universidade de Kyoto e cientista do Instituto Kavli para Física e Matemática do Universo.

O estudo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: Kavli Institute for the Physics and Mathematics of the Universe

terça-feira, 14 de dezembro de 2021

Estrelas se movendo ao redor do buraco negro supermassivo da Via Láctea

O Interferômetro do Very Large Telescope (VLTI) do Observatório Europeu do Sul (ESO) captou as imagens mais profundas e nítidas obtidas até hoje da região em torno do buraco negro supermassivo localizado no centro da nossa Galáxia.


© ESO/VLTI (estrelas no centro da Via Láctea)

As novas imagens nos permitiram ver 20 vezes mais perto do buraco negro do que o que era possível anteriormente sem o VLTI e ajudaram os astrônomos a encontrar uma estrela previamente desconhecida perto deste objeto supermassivo. Ao seguir as órbitas das estrelas no centro da Via Láctea, a equipe fez a medição mais precisa já feita da massa do buraco negro. 

“Queremos saber mais sobre Sagitário A*, o buraco negro situado no centro da Via Láctea: Qual a sua massa? Será que gira? As estrelas em seu torno se comportam exatamente como o previsto pela Teoria da Relatividade Geral de Einstein? A melhor maneira de responder a estas questões é seguir estrelas que se deslocam em órbitas próximas do buraco negro supermassivo. E aqui demonstramos que podemos fazer isso com uma precisão maior do que nunca,” explica Reinhard Genzel, diretor do Instituto Max Planck de Física Extraterrestre (MPE), na Alemanha, que recebeu o Prêmio Nobel em 2020 pelo seu trabalho de pesquisa sobre Sagitário A*. 

Em uma busca para encontrar ainda mais estrelas perto do buraco negro, a equipe, conhecida como colaboração GRAVITY, desenvolveu uma nova técnica de análise para obter as imagens ainda mais profundas e nítidas do nosso Centro Galáctico. 

Curiosamente, a equipe descobriu uma estrela, a S300, que ainda não tinha sido observada anteriormente, mostrando assim quão potente é este método quando se trata de detectar objetos muito tênues próximos de Sagitário A*. Com suas últimas observações, conduzidas entre março e julho de 2021, a equipe se concentrou em fazer medições precisas das estrelas à medida que se aproximavam do buraco negro, o que incluiu a estrela recordista S29, que se aproximou mais do buraco negro no final de maio de 2021. Ela o ultrapassou a uma distância de apenas 13 bilhões de quilômetros, cerca de 90 vezes a distância Sol-Terra, à impressionante velocidade de 8.740 km/s. Nenhuma outra estrela foi observada passando tão perto ou viajando tão rápido ao redor do buraco negro.

As medições e as imagens obtidas pela equipe foram possíveis graças ao GRAVITY, um instrumento único que a colaboração desenvolveu para o VLTI do ESO. O GRAVITY combina a radiação colectada pelos quatro telescópios principais de 8,2 metros do Very Large Telescope (VLT), usando uma técnica chamada interferometria. Esta técnica é complexa, mas ela fornece uma imagem 20 vezes mais nítida do que as obtidas pelos telescópios individuais, revelando os segredos do Centro Galáctico.

Seguir estrelas em órbitas próximas ao redor de Sagitário A * nos permite sondar com precisão o campo gravitacional ao redor do buraco negro massivo mais próximo da Terra, para testar a Relatividade Geral e determinar as propriedades do buraco negro. As novas observações, combinadas com dados anteriores obtidos da equipe, confirmam que as estrelas seguem percursos exatamente como os previstos pela Relatividade Geral para objetos que se deslocam em torno de um buraco negro com uma massa de 4,3 milhões de vezes a massa solar. Esta é a estimativa mais precisa da massa do buraco negro central da Via Láctea até o momento. 

Os pesquisadores também conseguiram ajustar a distância para Sagitário A*, chegando ao valor de 27.000 anos-luz. Para obter as novas imagens, os astrônomos usaram uma técnica de aprendizagem de máquina, chamada Teoria do Campo de Informação. Foi feito um modelo de como seriam as fontes reais, simularam como o GRAVITY as veria e compararam esta simulação com as observações do GRAVITY. Deste modo foi possível encontrar e seguir estrelas em torno de Sagitário A* com uma profundidade e precisão sem precedentes.

Além das observações GRAVITY, a equipe utilizou também dados do NACO e do SINFONI, dois instrumentos anteriores do VLT, assim como medições do Observatório Keck e do Observatório Gemini do NOIRLab nos EUA. No final desta década, o GRAVITY será atualizado para GRAVITY+ e o instrumento melhorado será também instalado no VLTI do ESO. Pretendendo-se assim aumentar ainda mais a sensibilidade deste instrumento para revelar estrelas ainda mais tênues e ainda mais próximas do buraco negro central. 

A equipe pretende eventualmente descobrir estrelas tão próximas deste objeto que as suas órbitas sentirão os efeitos gravitacionais causados pela rotação do buraco negro. O futuro Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, atualmente em construção no deserto chileno do Atacama, permitirá à equipe medir a velocidade destas estrelas com elevado grau de precisão. Com o poder combinado do GRAVITY+ e do ELT, será possível descobrir a velocidade de rotação do buraco negro, ainda desconhecida.

Este trabalho de pesquisa foi apresentado em dois artigos científicos da Colaboração GRAVITY publicados na revista Astronomy & Astrophysics

Fonte: ESO

segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

Uma galáxia espiral barrada vista de lado

Nesta imagem, o telescópio espacial Hubble capta uma visão lateral de NGC 3568, uma galáxia espiral barrada a aproximadamente 57 milhões de anos-luz da Via Láctea na constelação de Centaurus.

© Hubble (NGC 3568)

Em 2014, a luz de uma explosão de supernova em NGC 3568 atingiu a Terra, uma explosão repentina de luz causada pela explosão titânica que acompanhou a morte de uma estrela massiva. 

Enquanto a maioria das descobertas astronômicas são devido ao trabalho de equipes de astrônomos profissionais, esta supernova foi descoberta por astrônomos amadores do Backyard Observatory Supernova Search na Nova Zelândia. Astrônomos amadores dedicados costumam fazer descobertas intrigantes, particularmente de fenômenos astronômicos fugazes, como supernovas.

Esta observação do Hubble vem de um tesouro de dados construído para preparar o caminho para a ciência futura com o próximo telescópio espacial James Webb . Ao combinar observações terrestres com dados da Advanced Camera for Surveys do Hubble e Wide Field Camera 3, os astrônomos construíram informações sobre as conexões entre as estrelas jovens e as nuvens de gás frio em que se formam.

Um dos principais objetivos científicos do Webb é explorar o ciclo de vida das estrelas, particularmente como e onde as estrelas nascem. Uma vez que Webb observa em comprimentos de onda infravermelhos, ele será capaz de espiar através das nuvens de gás e poeira em berçários estelares e observar as estrelas novatas em seu interior. A excelente sensibilidade do Webb permitirá até mesmo aos astrônomos investigarem diretamente núcleos protoestelares tênues, ou seja, os primeiros estágios do nascimento de estrelas. 

Fonte: ESA

sexta-feira, 10 de dezembro de 2021

Nova técnica revela a idade de estrela do Cruzeiro do Sul

Uma equipe internacional de astrônomos da Austrália, dos EUA e da Europa desbloqueou pela primeira vez a estrutura interna de Beta Crucis, uma brilhante estrela gigante azul que aparece nas bandeiras da Austrália, do Brasil, da Nova Zelândia, Papua Nova Guiné e Samoa.


© ESO (Mimosa, NGC 4755 e Nebulosa do Saco de Carvão)

A imagem acima mostra Mimosa, a estrela mais brilhante à esquerda, e também o aglomerado aberto NGC 4755 (ou Kappa Crucis) no centro e a Nebulosa do Saco de Carvão à direita.

Com uma abordagem inteiramente nova, foi descoberto que a estrela tem 14,5 vezes a massa do Sol e apenas 11 milhões de anos, o que a torna a estrela mais massiva a ter a sua idade determinada através de asterosismologia.

As descobertas vão fornecer novos detalhes sobre como as estrelas vivem, como morrem e como afetam a evolução química da Galáxia. Para decifrar a idade e a massa da estrela, a equipe combinou a asterosismologia, o estudo dos movimentos regulares de uma estrela, com polarimetria, a medição da orientação das ondas de luz. A asterosismologia baseia-se em ondas sísmicas que saltam em torno do interior de uma estrela e que produzem mudanças mensuráveis na sua luz. O estudo dos interiores de estrelas massivas, que mais tarde explodirão como supernovas, tem sido tradicionalmente difícil. Previu-se em 1979 que a polarimetria tinha o potencial para medir os interiores de estrelas massivas, mas isso não foi possível até agora. 

O estudo de Beta Crucis, também conhecida como Mimosa, combina três tipos diferentes de medições da sua luz: medições espaciais da intensidade da sua luz, obtidas pelos satélites WIRE (Wide-Field Infrared Explorer) e TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA, 13 anos de espectroscopia terrestre de alta resolução do ESO e polarimetria obtida no solo pelo Observatório Siding Spring e pelo Observatório Penrith.

A análise dos três tipos de dados de longo prazo, juntos, permitiu identificar as geometrias de modo dominante de Mimosa. Isto abriu caminho para medir a massa e datar a idade da estrela usando métodos sísmicos. Este estudo polarimétrico de Mimosa abre um novo caminho para a asterosismologia de estrelas massivas brilhantes. Embora estas estrelas sejam as fábricas químicas mais produtivas da nossa Galáxia, até agora são as menos analisadas pela asterosismologia, dado o grau de dificuldade de tais estudos.

Um artigo foi publicado na revista Nature Astronomy.

Fonte: Australian National University

Descoberto exoplaneta em torno do par de estrelas mais massivo

O Very Large Telescope (VLT) do Observatório Europeu do Sul (ESO) captou uma imagem de um planeta em órbita de b Centauri, um sistema de duas estrelas que pode ser visto a olho nu.

© ESO/VLT (par estelar b Centauri e o exoplaneta b Centauri b)

Esta imagem mostra o par de estrelas mais massivo observado até hoje que acolhe um possui em sua órbita, b Centauri, e o seu planeta gigante b Centauri b. O par estelar é o objeto brilhante que vemos no canto superior esquerdo da imagem, sendo que os anéis brilhantes e escuros são artefatos ópticos. O planeta é visível como um ponto brilhante na parte inferior direita da imagem. O outro ponto brilhante em cima e á direita da imagem é de uma estrela de fundo. Ao captar diferentes imagens em momentos diferentes, os astrônomos conseguiram separar e distinguir o planeta das estrelas de fundo. 

Este sistema estelar trata-se do mais quente e mais massivo descoberto até hoje que abriga planetas, tendo o planeta sido encontrado a uma distância das suas estrelas equivalente a 100 vezes a distância à qual Júpiter orbita o nosso Sol. 

Alguns astrônomos acreditavam que planetas não poderiam existir em torno de estrelas tão massivas e tão quentes, até agora. 

Localizado a aproximadamente 325 anos-luz de distância da Terra na constelação do Centauro, o sistema duplo b Centauri, também conhecido como HIP 71865, tem pelo menos seis vezes a massa do Sol, o que o torna no sistema mais massivo em torno do qual foi confirmada a presença de um planeta. Até agora não tinha ainda sido descoberto nenhum planeta em órbita de estrelas mais massivas do que três massas solares.

A maioria das estrelas massivas são também muito quentes e este sistema não é exceção: a estrela principal é do tipo B e é mais de três vezes mais quente que o Sol. Devido à sua temperatura intensa, a estrela emite grandes quantidades de radiação ultravioleta e raios X.

A elevada massa e temperatura deste tipo de estrelas tem um forte impacto no gás que as rodeia, o que deveria ir contra a formação planetária. Em particular, quanto mais quente a estrela, mais radiação de alta energia é produzida, o que faz com que o material circundante se evapore mais depressa. As estrelas do tipo B são geralmente consideradas muito destrutivas para o meio que as rodeia, por isso é que se acreditava que que deveria ser extremamente difícil formar grandes planetas ao seu redor.

No entanto, esta nova descoberta veio mostrar que os planetas se podem de fato formar em sistemas estelares bastante severos. O planeta descoberto, chamado b Centauri (AB)b ou apenas b Centauri b, é bastante extremo, com dez vezes mais massa que Júpiter, o que o torna num dos planetas mais massivos descoberto até hoje. Além disso, orbita em torno do sistema estelar percorrendo uma das maiores órbitas já descobertas, a uma impressionante distância das suas estrelas de 100 vezes mais do que a distância entre Júpiter e o Sol. EsTa enorme distância ao par de estrelas central pode ser a chave da sobrevivência deste planeta.

Estes resultados foram possíveis graças ao SPHERE (Spectro-Polarimetric High-contrast Exoplanet REsearch), um sofisticado instrumento montado no VLT, no Chile. E com o auxílio de um coronógrafo, que bloqueou a radiação emitida pelo sistema estelar massivo permitiu aos astrônomos detectar o tênue planeta. O SPHERE tem obtido imagens de vários planetas em órbita de estrelas que não o Sol, incluindo a primeira imagem de dois planetas que orbitam uma estrela do tipo solar. O SPHERE não é, curiosamente, o primeiro instrumento a captar a imagem deste planeta. Como parte de seu estudo, a equipe analisou os dados de arquivo do sistema b Centauri e descobriu que este planeta tinha sido já observado há mais de 20 anos com o telescópio de 3,6 metros do ESO, embora não fosse reconhecido como um planeta na época. Com o Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, que deve iniciar as observações no final desta década, e com atualizações ao VLT, os astrônomos poderão descobrir mais sobre a formação e características deste planeta. 

Esta pesquisa foi apresentada em um artigo intitulado "A wide-orbit giant planet in the high-mass b Centauri binary system" e publicado na revista Nature

Fonte: ESO

quarta-feira, 8 de dezembro de 2021

Uma coleção de nebulosas planetárias

Às vezes, os nomes dos objetos são profundamente enganosos. Por exemplo, estrelas-do-mar não são realmente peixes (são equinodermos) e os porquinhos-da-índia não são aparentados com porcos de forma alguma (são roedores).

© Chandra (nebulosas planetárias)

Da mesma forma, as nebulosas planetárias não têm nada a ver com planetas. Eles foram nomeados erroneamente quando cientistas olhando através de pequenos telescópios no século 19 pensaram que estes objetos se pareciam com planetas. Hoje, os astrônomos sabem que uma nebulosa planetária na verdade representa uma fase que estrelas como o nosso Sol experimentam depois de usarem muito de seu combustível.

Após resfriar e expandir através de uma fase de “gigante vermelha”, quando começa a expelir suas camadas externas, esta estrela deixa para trás um tipo de estrela densa e menor chamada anã branca. As conchas de gás previamente lançadas permanecem por um tempo relativamente curto em termos cósmicos - dezenas de milhares de anos - antes de se dissiparem no espaço. Enquanto isso, elas são iluminadas e energizadas pela anã branca no centro do sistema. Isto acontecerá com nosso Sol, mas cerca de 5 bilhões de anos ou mais.

O observatório de raios X Chandra da NASA contribui para a compreensão das nebulosas planetárias ao estudar os processos mais quentes e energéticos ainda em funcionamento nestes belos objetos. Dados de raios X do Chandra revelam ventos sendo afastados da anã branca tão rapidamente que eles criam ondas de choque durante colisões com material de movimento mais lento anteriormente ejetado pela estrela.

A visão excepcional em raios X contribui para a compreensão deste breve, mas importante, estágio da vida das estrelas. Esta galeria contém meia dúzia de nebulosas planetárias que foram observadas tanto pelo Chandra quanto pelo telescópio espacial Hubble, com o último detectando as delicadas estruturas de gás que foram expelidas da estrela.

As cores dos dados do Chandra nas seis nebulosas planetárias foram selecionadas de forma que os raios X sejam claramente distintos dos dados ópticos. A lista de nebulosas planetárias e as cores usadas para os dados do Chandra são as seguintes: NGC 6302 (magenta), IC 418 (ciano), NGC 3242 (azul), NGC 7662 (azul), NGC 7027 (magenta) e NGC 2371 (roxa). 

As nebulosas planetárias variam em distâncias de cerca de 2.200 a 5.700 anos-luz da Terra. Embora todas as seis nebulosas tenham se originado de condições físicas semelhantes e evoluído por processos semelhantes, atualmente elas parecem um pouco diferentes das outras. As diferenças nas formas e estruturas destas nebulosas planetárias podem ser devido às complexidades de uma série de propriedades físicas, incluindo quanto dos ventos da estrela fluem de seus polos, se a estrela efetua precessão enquanto gira, se a estrela tem companheira ou não, e outros fatores.

Fonte: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics

terça-feira, 7 de dezembro de 2021

Um ano de oito horas

No que diz respeito aos exoplanetas, GJ 367 b não é um "peso-pesado", mas um "peso-pena".

GJ 367 b

© P. Glein (GJ 367 b)

Com metade da massa da Terra, o planeta recém-descoberto é um dos mais leves entre os quase 5.000 exoplanetas conhecidos até agora. 

O exoplaneta leva aproximadamente oito horas para orbitar a sua estrela progenitora. Com um diâmetro de pouco mais de 9.000 quilômetros, GJ 367 b é ligeiramente maior que Marte. O sistema planetário está localizado a pouco menos de 31 anos-luz da Terra e, portanto, é ideal para futuras investigações.

A descoberta demonstra que é possível determinar com precisão as propriedades dos exoplanetas até menores e menos massivos. Estes estudos fornecem uma chave para entender como os planetas terrestres se formam e evoluem. 

Com um período orbital de apenas um-terço do dia terrestre, GJ 367 b é veloz. A partir da determinação precisa do seu raio e massa, GJ 367 b está classificado como um planeta rochoso. Parece ter semelhanças com Mercúrio. Isto coloca-o entre os planetas terrestres de tamanho inferior à Terra.

Um quarto de século após a primeira descoberta de um exoplaneta, o foco mudou para a caracterização mais precisa destes planetas, além do crescimento numérico da lista. Atualmente, é possível construir um perfil muito mais detalhado para a maioria dos exoplanetas conhecidos. Muitos foram descobertos usando o método de trânsito, ou seja, a medição das diferenças na luz emitida, ou magnitude aparente, de uma estrela quando um planeta passa à sua frente. 

O GJ 367 b também foi descoberto usando este método, com a ajuda do TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA. GJ 367 b pertence ao grupo de exoplanetas de período muito curto que orbitam a sua estrela em menos de 24 horas.

Após a descoberta deste planeta usando o TESS e o método de trânsito, foi estudado o espectro da sua estrela a partir do solo usando o método de velocidade radial. Determinou-se a massa usando o instrumento HARPS no telescópio de 3,6 metros do ESO. A partir do estudo meticuloso e da combinação de diferentes métodos de avaliação, foram determinados o raio e a massa do planeta: o seu raio corresponde a 72% do raio da Terra e a sua massa equivale a 55% da do nosso planeta. Ao determinar o seu raio e massa com uma precisão de 7 e 14 por cento, respectivamente, os pesquisadores também foram capazes de tirar conclusões sobre a estrutura interna do exoplaneta. É um planeta rochoso de baixa massa, mais é mais denso que a Terra. A alta densidade indica que o planeta é dominado por um núcleo de ferro. 

Estas propriedades são semelhantes às de Mercúrio, com o seu núcleo desproporcionalmente grande de ferro e níquel que o diferencia de outros corpos terrestres do Sistema Solar. No entanto, a proximidade do planeta à sua estrela implica que está exposto à níveis extremamente elevados de radiação, mais de 500 vezes mais fortes do que os níveis a que a Terra recebe. A temperatura da superfície pode chegar aos 1.500º C, uma temperatura na qual todas as rochas e metais seriam derretidos.

A estrela hospedeira deste exoplaneta recém-descoberto, uma anã vermelha chamada GJ 367, tem apenas cerca de metade do tamanho do Sol. Isto é benéfico para esta descoberta pois o sinal de trânsito do planeta em órbita é particularmente significativo. As anãs vermelhas não são apenas menores, como também mais frias do que o Sol. Isto torna os seus planetas associados mais fáceis de encontrar e caracterizar. Estão entre os objetos estelares mais comuns na nossa vizinhança cósmica e, portanto, são alvos adequados para a pesquisa exoplanetária. Os cientistas estimam que estas anãs vermelhas, também conhecidas como "estrelas de classe M", sejam orbitadas por uma média de dois a três planetas.

Um artigo foi publicado na revista Science.

Fonte: Massachusetts Institute of Technology

Quatro filtros diferentes para colorir esta galáxia

Este redemoinho estelar é uma galáxia espiral chamada NCG 7329, que foi fotografada pela Wide Field Camera 3 (WFC3) do telescópio espacial Hubble.

© Hubble (NGC 7329)

Criar uma imagem colorida como esta usando um telescópio como o Hubble não é tão simples quanto apontar e clicar em uma câmera. Normalmente, as câmeras comerciais tentam coletar o máximo possível de luz de todos os comprimentos de onda visíveis, para criar as imagens mais vibrantes possíveis. Em contraste, as imagens brutas coletadas pelo Hubble são sempre monocromáticas, porque os astrônomos geralmente desejam captar faixas muito específicas de comprimentos de onda de luz a qualquer momento, a fim de fazer a ciência melhor e mais precisa possível. 

Para controlar quais comprimentos de onda de luz serão coletados, as câmeras do Hubble são equipadas com uma ampla variedade de filtros, que permitem apenas que determinados comprimentos de onda de luz alcancem os sensores de luz das câmeras (CCDs).

Como as imagens coloridas do Hubble são possíveis, dado que as imagens brutas geradas por ele são monocromáticas? Isso é feito combinando várias observações diferentes do mesmo objeto, obtidas por meio de filtros diferentes. 

Esta imagem, por exemplo, foi processada a partir de observações do Hubble feitas usando quatro filtros diferentes, cada um dos quais abrange uma região diferente do espectro de luz, do ultravioleta ao óptico e infravermelho. Processadores de imagem especializados após  análise podem caracterizar quais cores ópticas melhor correspondem a cada filtro usado, e colorindo a imagem. Finalmente, as imagens tiradas com diferentes filtros são empilhadas. A imagem colorida de uma galáxia distante está completa, com cores tão representativas quanto possível da realidade.

Fonte: ESA