sábado, 27 de abril de 2024

Nebulosa de emissão bipolar do Ovo de Dragão

Como uma estrela formou esta linda nebulosa?

© Rowan Prangley (NGC 6164)

No meio da nebulosa de emissão NGC 6164 está uma estrela invulgarmente massiva. A estrela central foi comparada a uma pérola de ostra e a um ovo protegido pelos míticos dragões celestes de Ara. 

A nebulosa Ovo de Dragão foi descoberta em 1834 pelo astrônomo John Herschel.

A estrela, visível no centro da imagem em destaque e catalogada como HD 148937, é tão quente que a luz ultravioleta que emite aquece o gás que a rodeia. Esse gás provavelmente foi expelido da estrela anteriormente, possivelmente como resultado de uma interação gravitacional com uma companheira estelar em loop. O material expelido pode ter sido canalizado pelo campo magnético da estrela massiva, criando a forma simétrica da nebulosa bipolar. 

Nota-se nessa nebulosa uma esfera de hidrogênio ionizado (H II), denominada esfera de Strömgren.

A NGC 6164 se estende por cerca de quatro anos-luz e está localizada a cerca de 3.600 anos-luz de distância, em direção à constelação sul de Norma.

Fonte: NASA

Galáxia fotografada em placas de vidro

Esta imagem obtida pelo telescópio espacial Hubble mostra a galáxia espiral ESO 422-41, que fica a cerca de 34 milhões de anos-luz da Terra, na constelação de Columba.

© Hubble (ESO 422-41)

A estrutura irregular e repleta de estrelas dos braços espirais da galáxia e o brilho do seu núcleo denso são apresentados aqui com detalhes intrincados pela Advanced Camera for Surveys do Hubble. 

As imagens desta galáxia têm, no entanto, uma história de décadas. O nome ESO 422-41 vem da sua identificação no Atlas do Céu Austral do Observatório Europeu do Sul (ESO). Nos tempos anteriores aos levantamentos automatizados do céu com observatórios espaciais como o Gaia da ESA, muitas estrelas, galáxias e nebulosas foram descobertas através de grandes levantamentos fotográficos. Os astrônomos usaram os grandes telescópios mais avançados da época para produzir centenas de fotografias, cobrindo uma área do céu. Mais tarde estudaram as fotografias resultantes, tentando catalogar todos os novos objetos astronômicos revelados. 

Na década de 1970, um novo telescópio instalado nas instalações do ESO em La Silla, no Chile, realizou um levantamento deste tipo do céu meridional, que ainda não tinha sido examinado com tanta profundidade como o céu do norte. Na época, a principal tecnologia para gravação de imagens eram placas de vidro tratadas com produtos químicos. A coleção resultante de chapas fotográficas tornou-se o Atlas do Céu Austral do ESO. 

Astrônomos do ESO e de Uppsala, na Suécia, colaboraram no estudo das placas, registando centenas de galáxias, sendo a ESO 422-41 apenas uma delas, aglomerados estelares e nebulosas. Desde então, o levantamento astronômico do céu passou por pesquisas digitais auxiliadas por computador, como o Sloan Digital Sky Survey e o Legacy Surveys, para pesquisas feitas por telescópios espaciais, incluindo Gaia e o Wide-Field Infrared Survey Explorer. 

Mesmo assim, os levantamentos fotográficos do céu contribuíram imensamente para o conhecimento astronômico durante décadas, e os arquivos de placas de vidro servem como uma importante referência histórica para grandes áreas do céu. Alguns ainda são usados ativamente hoje, por exemplo, para estudar estrelas variáveis ao longo do tempo. E os objetos que estas pesquisas revelaram, incluindo o ESO 422-41, podem agora ser estudados em profundidade por telescópios como o Hubble.

Fonte: ESA

Como o potássio é destruído nas estrelas

Se quisermos saber de onde vêm os elementos químicos, há que olhar para as estrelas.

© Hubble (NGC 2419)

Os aglomerados globulares, como NGC 2419, visível nesta imagem obtida pelo telescópio espacial Hubble, não são apenas bonitos, mas também fascinantes. São grupos esféricos de estrelas que orbitam o centro de uma galáxia; no caso de NGC 2419, essa galáxia é a Via Láctea. O NGC 2419 encontra-se a cerca de 300.000 anos-luz do Sistema Solar, na direção da constelação do Lince.

Quase todos os elementos mais pesados que o hélio são formados através de reações nucleares nas estrelas. Mas que processos estelares são responsáveis por estes elementos? Será que podemos encontrar padrões na quantidade de cada elemento que observamos em diferentes ambientes astrofísicos, como estrelas, galáxias ou aglomerados globulares?

Recentemente, uma equipe de pesquisadores da Universidade do Estado da Carolina do Norte, nos EUA, focou-se no processo de destruição do potássio (K) em aglomerados globulares, analisando um aglomerado em particular: NGC 2419. 

Os aglomerados globulares são grupos de estrelas ligadas gravitacionalmente. Os astrônomos observaram padrões claros nas quantidades relativas de diferentes elementos de estrela para estrela. Um desses padrões é entre o oxigênio e o sódio: as estrelas dos aglomerados globulares que têm mais sódio têm menos oxigênio, e vice-versa. Isto é conhecido como a anticorrelação sódio-oxigênio (Na-O). 

Foram também descobertas várias outras anticorrelações, o que indica que ocorrem processos únicos (por vezes desconhecidos) em aglomerados globulares específicos. Em 2012, a primeira anticorrelação magnésio-potássio (Mg-K) foi descoberta no aglomerado globular NGC 2419. Um excedente global de potássio foi associado a reações de queima de hidrogênio em temperaturas entre 80 e 260 milhões kelvin.

Mas o mais intrigante é que as estrelas do aglomerado que mostraram esta anticorrelação são estrelas gigantes vermelhas relativamente jovens. Os núcleos destas estrelas não deveriam ser suficientemente quentes para que as reações nucleares alterassem a quantidade de Mg e K. A principal teoria envolvia a mistura com K e Mg de estrelas antigas do aglomerado, mas o que permaneceu incerto foi a velocidade da reação de destruição do potássio. 

Assim, a equipa tentou recriar a reação de destruição do potássio realizando uma experiência sobre uma reação nuclear semelhante (39K + 3He => 40Ca + d), no TUNL (Triangle Universities Nuclear Laboratory). Esta reação é de transferência de prótons, em que um próton do hélio-3 (3He) é transferido para o potássio-39 (39K), formando cálcio-40 (40Ca).

Esta reação experimental permite imitar a reação real que ocorre numa estrela onde o potássio é destruído. Descobriu-se que o potássio não só pode ser destruído em temperaturas mais baixas, como é destruído 13 vezes mais depressa do que se pensava nessas temperaturas. 

Esta descoberta poderá alterar a forma como modelamos a criação de elementos nas estrelas, não só para este caso específico de NGC 2419, mas também para outros modelos astrofísicos que incluam reações sobre o potássio.

Um artigo foi publicado no periódico Physical Review Letters.

Fonte: North Carolina State University

sábado, 20 de abril de 2024

Telescópio Fermi não detecta raios gama de supernova próxima

Uma supernova próxima, em 2023, forneceu aos astrofísicos uma excelente oportunidade para testar ideias sobre a forma como este tipo de explosões impulsiona partículas, designadas por raios cósmicos, até perto da velocidade da luz.

© STScI (supernova SN 2023ixf na galáxia M101)

O telescópio de 48 polegadas do Observatório Fred Lawrence Whipple captou esta imagem, no visível, da galáxia Messier 101 em junho de 2023. A localização da supernova 2023ixf está assinalada com um círculo. O observatório, situado no Monte Hopkins, no estado norte-americano do Arizona, é operado pelo Centro de Astrofísica do Harvard & Smithsonian. 

Mas, surpreendentemente, o telescópio espacial de raios gama Fermi da NASA não detectou os raios gama altamente energéticos que os raios cósmicos deveriam produzir.

No dia 18 de maio de 2023 apareceu uma supernova na vizinha galáxia do Cata-vento (Messier 101), situada a cerca de 22 milhões de anos-luz de distância na direção da constelação da Ursa Maior. Designada SN 2023ixf, é a supernova mais luminosa descoberta nas proximidades da Via Láctea desde o lançamento do Fermi em 2008.

Estima-se que as supernovas convertem cerca de 10% da sua energia total na aceleração de raios cósmicos. Mas nunca foi observado este processo diretamente. Com as novas observações de SN 2023ixf, os nossos cálculos resultam numa conversão de energia tão baixa quanto 1% poucos dias após a explosão. Isto não exclui a possibilidade de as supernovas serem fábricas de raios cósmicos, mas significa que há necessidade de aprendermos sobre a sua produção. 

Todos os dias, trilhões de raios cósmicos colidem com a atmosfera da Terra. Cerca de 90% são núcleos de hidrogênio (prótons) e os restantes são elétrons ou núcleos de elementos mais pesados. Os cientistas têm vindo a investigar as origens dos raios cósmicos desde o início do século XX, mas não é possível identificar as suas fontes. Como são eletricamente carregados, os raios cósmicos mudam de rumo quando chegam à Terra, graças aos campos magnéticos que encontram. Os raios cósmicos produzem raios gama quando interagem com a matéria no seu ambiente. 

O Fermi é o telescópio de raios gama mais sensível em órbita, por isso, quando não detecta um sinal esperado, os cientistas têm de explicar a sua ausência. A resolução deste mistério permitirá construir uma imagem mais exata das origens dos raios cósmicos. 

Os astrofísicos há muito que suspeitam que as supernovas são as principais contribuintes dos raios cósmicos. Estas explosões ocorrem quando uma estrela com pelo menos oito vezes a massa do Sol fica sem combustível. O núcleo colapsa e depois recupera, impulsionando uma onda de choque para o exterior através da estrela. A onda de choque acelera as partículas, criando os raios cósmicos. Quando os raios cósmicos colidem com outra matéria e com a luz que rodeia a estrela, geram raios gama. 

As supernovas têm um grande impacto no ambiente interestelar de uma galáxia. As suas ondas de explosão e a nuvem de detritos em expansão podem persistir durante mais de 50.000 anos. Em 2013, as medições do Fermi mostraram que os remanescentes de supernova na nossa Galáxia, a Via Láctea, estavam acelerando os raios cósmicos, que geravam raios gama quando atingiam a matéria interestelar. 

Mas os astrônomos dizem que os remanescentes não estão produzindo partículas altamente energéticas suficientes para corresponder às medições dos cientistas na Terra. Uma teoria propõe que as supernovas podem acelerar os raios cósmicos mais energéticos da nossa Galáxia nos primeiros dias e semanas após a explosão inicial. Mas as supernovas são raras, ocorrendo apenas algumas vezes por século numa galáxia como a Via Láctea. Até distâncias de cerca de 32 milhões de anos-luz, uma supernova ocorre, em média, apenas uma vez por ano. 

Após um mês de observações, a partir do momento em que os telescópios ópticos viram pela primeira vez SN 2023ixf, o Fermi não tinha detectado raios gama. Têm que ser analisadas todas as hipóteses subjacentes aos mecanismos de aceleração e às condições ambientais para converter a ausência de raios gama num limite superior para a produção de raios cósmicos. Os pesquisadores propõem alguns cenários que podem ter afetado a capacidade do Fermi para ver raios gama do evento, como por exemplo a forma como a explosão distribuiu os detritos e a densidade do material em torno da estrela. As observações do Fermi constituem a primeira oportunidade para estudar as condições imediatamente após a explosão de supernova. 

Observações adicionais de SN 2023ixf em outros comprimentos de onda, novas simulações e modelos baseados neste acontecimento e estudos futuros de outras supernovas jovens ajudarão na descoberta das misteriosas fontes de raios cósmicos do Universo.

Um artigo foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics.

Fonte: NASA

quarta-feira, 17 de abril de 2024

Identificado o buraco negro estelar mais massivo da nossa Galáxia

Os astrônomos identificaram o buraco negro estelar mais massivo descoberto até à data na Via Láctea.


© ESO (oscilação de estrela devido ao buraco negro Gaia BH3)

A imagem mostra as órbitas da estrela (em azul) e do buraco negro (em vermelho), designado Gaia BH3, em torno do seu centro de massa comum. Este buraco negro foi detectado em dados da missão Gaia da Agência Espacial Europeia (ESA) através de um movimento de "oscilação" estranho que este objeto impõe à estrela companheira que o orbita. 

Foram utilizados dados do Very Large Telescope (VLT) do Observatório Europeu do Sul (ESO) e de outros observatórios terrestres para calcular que a massa deste buraco negro é 33 vezes superior à do Sol. 

Os buracos negros estelares formam-se a partir do colapso de estrelas de grande massa e os anteriormente identificados na Via Láctea são, em média, cerca de 10 vezes mais massivos que o Sol. O buraco negro estelar mais massivo que conhecíamos na nossa Galáxia, Cygnus X-1, atinge apenas 21 massas solares, o que torna esta nova observação de 33 massas solares algo verdadeiramente excepcional. 

Mas, este não é o buraco negro mais massivo existente na nossa Galáxia, este título pertence a Sagitário A*, o buraco negro supermassivo situado no centro da Via Láctea, que tem cerca de quatro milhões de vezes a massa do Sol. No entanto, este é o buraco negro de maior massa conhecido na Via Láctea que se formou a partir do colapso de uma estrela. 

Curiosamente, este buraco negro encontra-se também extremamente próximo de nós, a apenas 2.000 anos-luz de distância, na constelação da Águia, sendo o segundo buraco negro mais próximo da Terra que conhecemos. Denominado Gaia BH3 foi encontrado quando a equipe analisava as observações de Gaia em preparação para uma próxima publicação de dados. 

Para confirmar a descoberta, a colaboração Gaia utilizou dados de observatórios terrestres, incluindo o instrumento UVES (Ultraviolet and Visual Echelle Spectrograph) montado no VLT do ESO, no deserto chileno do Atacama. Estas observações revelaram propriedades chave da estrela companheira, que, juntamente com os dados de Gaia, permitiram aos astrônomos medir com precisão a massa de Gaia BH3. 

Os astrônomos tinham já encontrado buracos negros igualmente massivos fora da nossa Galáxia (utilizando um método de detecção diferente), tendo teorizado que estes objetos poderão ser formados a partir do colapso de estrelas cuja composição química apresente pouquíssimos elementos mais pesados que o hidrogênio e o hélio. 

Pensa-se que estas estrelas, pobres em metais, perdem menos massa ao longo da sua vida e, portanto, possuem mais matéria, o que dará origem, após a sua morte, a buracos negros de elevada massa. No entanto, e até agora, não existiam provas que ligassem diretamente estrelas pobres em metais a buracos negros de elevada massa. As estrelas em pares tendem a ter composições químicas semelhantes, o que significa que a companheira de BH3 contém pistas importantes sobre a estrela que colapsou e formou este buraco negro. 

Os dados do UVES mostraram que a companheira é uma estrela muito pobre em metais, o que sugere que a estrela que colapsou para formar o Gaia BH3 seria também pobre em metais, tal como previsto pela teoria.

A disponibilização antecipada dos dados permitirá que outros astrônomos comecem a estudar este buraco negro desde já, sem esperar pela publicação dos dados completos, prevista para finais de 2025, na melhor das hipóteses. Outras observações deste sistema poderão revelar mais sobre a sua história e sobre o próprio buraco negro. O instrumento GRAVITY montado no Interferômetro do VLT do ESO poderá ajudar na compreensão deste objeto, analisando, por exemplo, se este buraco negro está atraindo matéria da sua vizinhança.

Um artigo foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics.

Fonte: ESO

domingo, 14 de abril de 2024

Detectado um notável sinal de ondas gravitacionais

Em maio de 2023, pouco depois do início da quarta série de observações LIGO-Virgo-KAGRA, o detetor LIGO em Livingston observou um sinal de ondas gravitacionais resultante da colisão do que é muito provavelmente uma estrela de nêutrons com um objeto compacto que tem 2,5 a 4,5 vezes a massa do nosso Sol.

© K. Gill (ilustração de uma estrela de nêutrons)

As estrelas de nêutrons e os buracos negros são ambos objetos compactos, os remanescentes densos de explosões estelares massivas. O que torna este sinal, chamado GW230529, intrigante é a massa do objeto mais pesado. Está dentro de um possível intervalo de massa entre as estrelas de nêutrons mais pesadas conhecidas e os buracos negros mais leves. 

O sinal de ondas gravitacionais, por si só, não pode revelar a natureza deste objeto. Futuras detecções de eventos semelhantes, especialmente os acompanhados por explosões de radiação eletromagnética, poderão ser a chave para resolver este mistério cósmico.

Existe uma lacuna de massa entre as estrelas de nêutrons e os buracos negros.  Antes da detecção de ondas gravitacionais em 2015, as massas dos buracos negros de massa estelar eram determinadas principalmente através de observações de raios X, enquanto as massas das estrelas de nêutrons eram determinadas através de observações de rádio. 

As medições resultantes dividiam-se em dois intervalos distintos, com uma diferença entre eles de cerca de 2 a 5 vezes a massa do nosso Sol. Ao longo dos anos, um pequeno número de medições tem-se aproximado deste intervalo de massa, que continua a ser altamente debatido entre os astrofísicos. A análise do sinal GW230529 mostra que este provém da fusão de dois objetos compactos, um com uma massa entre 1,2 e 2,0 vezes a do nosso Sol e o outro com um pouco mais do dobro da massa. 

Embora o sinal das ondas gravitacionais não forneça informação suficiente para determinar com certeza se estes objetos compactos são estrelas de nêutrons ou buracos negros, parece provável que o objeto mais leve seja uma estrela de nêutrons e o objeto mais massivo um buraco negro. 

Os cientistas da Colaboração LIGO-Virgo-KAGRA estão confiantes de que o objeto mais massivo está dentro da lacuna de massa. As observações de ondas gravitacionais já forneceram quase 200 medições das massas de objetos compactos. Destas, apenas uma outra fusão pode ter envolvido um objeto compacto na lacuna de massa, o sinal GW190814 veio da fusão de um buraco negro com um objeto compacto que excede a massa das estrelas de nêutrons mais pesadas conhecidas e está, possivelmente, dentro deste intervalo de massa. A observação deste sistema tem implicações importantes tanto para as teorias da evolução dos binários como para os homólogos eletromagnéticos das fusões de objetos compactos. 

A terceira série de observações dos detectores de ondas gravitacionais, muito bem-sucedida, terminou na primavera de 2020, elevando para 90 o número de detecções de ondas gravitacionais conhecidas. Antes do início da quarta série de observação, O4, em 24 de maio de 2023, os pesquisadores do LIGO-Virgo-KAGRA introduziram melhorias nos detectores, na infraestrutura e no software de análise que lhes permitem detectar sinais de mais longe e extrair mais informações sobre os eventos extremos em que as ondas são geradas. 

No dia 29 de maio de 2023, o sinal de ondas gravitacionais GW230529 passou pelo detector LIGO em Livingston. Em poucos minutos, os dados do detector foram analisados e foi emitido um alerta (designado S230529ay) anunciando publicamente o sinal. Os astrônomos que receberam o alerta foram informados de que uma estrela de nêutrons e um buraco negro se fundiram muito provavelmente a cerca de 650 milhões de anos-luz da Terra. Infelizmente, a direção da fonte não pôde ser determinada porque apenas um detector de ondas gravitacionais estava observando no momento do sinal. 

A quarta série de observações está planejada para durar 20 meses, incluindo uma pausa de dois meses para realizar a manutenção dos detectores e para fazer uma série de melhorias necessárias. Até 16 de janeiro de 2024, quando começou a pausa de comissionamento, tinham sido identificados um total de 81 candidatos a sinais significativos. GW230529 é o primeiro destes a ser publicado após uma investigação pormenorizada. A quarta série de observações foi retomada no passado dia 10 de abril de 2024 com os detectores LIGO em Hanford, LIGO em Livingston e Virgo funcionando em conjunto. A série continuará até fevereiro de 2025, cujo número total de sinais de ondas gravitacionais observados deverá ultrapassar os 200.

Fonte: Max Planck Institute for Gravitational Physics

Uma "nova" estrela na constelação de Coroa Boreal

Prevê-se que um sistema estelar, localizado a 3.000 anos-luz da Terra, se torne em breve visível a olho nu.

© NASA (anã branca acompanhada de gigante vermelha)

Esta poderá ser uma oportunidade única de observação, uma vez que a nova só ocorre de 80 em 80 anos. O sistema estelar T Coronae Borealis, ou T CrB, explodiu pela última vez em 1946 e os astrônomos pensam que voltará a fazê-lo até setembro de 2024. 

O sistema estelar, normalmente de magnitude 10, que é demasiado tênue para ser visto a olho nu, saltará para magnitude 2 durante o evento. O seu brilho será semelhante ao da Estrela Polar. Uma vez atingido o pico de brilho, deverá ser visível a olho nu durante vários dias e durante pouco mais de uma semana através de binóculos, antes de voltar a escurecer, possivelmente durante outros 80 anos. 

O brilho aparecerá na constelação de Coroa Boreal, ou Coroa do Norte, um pequeno arco semicircular perto das constelações de Boieiro e Hércules. É aqui que a explosão aparecerá como uma "nova" estrela brilhante. 

Esta nova recorrente é apenas uma de cinco na nossa Galáxia. Acontece porque T CrB é um sistema binário com uma anã branca e uma gigante vermelha. As estrelas estão suficientemente próximas para que, à medida que a gigante vermelha se torna instável devido ao aumento da temperatura e da pressão e começa a ejetar as suas camadas exteriores, a anã branca recolha essa matéria para a sua superfície. A atmosfera pouco densa da anã branca acaba por aquecer o suficiente para provocar uma reação termonuclear descontrolada, que produz a nova que vemos da Terra.

Fonte: NASA

sexta-feira, 12 de abril de 2024

Totalidade do Ecplise Solar Total

As contas de Baily aparecem frequentemente nos limites da fase total de um eclipse do Sol.

© Daniel Korona (Eclipse Solar Total)

Pérolas de luz solar ainda brilhando através de lacunas no terreno acidentado ao longo da silhueta lunar, sua aparência é registrada nesta dramática composição de lapso de tempo.

As contas de Baily, nomeadas em homenagem ao astrônomo Francis Baily, são um tipo de fenômeno óptico dos eclipses solares totais e anulares. Trata-se de “pontos” brilhantes ao redor da sombra da Lua devido ao terreno irregular da superfície lunar. A Lua é coberta de crateras que, além de profundas, também possuem verdadeiras montanhas ao seu redor, formando suas bordas. Essas estruturas aparecem ao redor do disco lunar em imagens ampliadas do eclipse. 

A cromosfera, parte da atmosfera solar que pode ser observada em eclipses totais e anulares, se destaca ao atravessar entre as elevações da borda lunar, criando um efeito colorido em fotografias. Então, as contas de Baily vão desaparecendo atrás da sombra lunar, até restar uma fina borda avermelhada formada pela cromosfera solar, anunciando a totalidade que virá a seguir. 

Apesar de ter origem no mesmo fenômeno que cria as contas de Baily, o anel de diamante é algo diferente, porque ocorre quando apenas uma das contas de luz permanece visível. Enquanto a sombra da Lua avança para cobrir o Sol por completo, as contas desaparecem gradualmente até a última delas se transformar em um ponto brilhante. Junto, dela, surge um arco luminoso. O efeito espetacular e breve ganhou o nome de anel de diamante e é o indicador de que a totalidade (o ápice de um eclipse total ou anular) está prestes a acontecer.

A série de imagens segue a borda da Lua do início ao fim da totalidade durante o eclipse solar de 8 de abril em Durango, no México. Elas também captam proeminências rosadas de plasma formando arcos bem acima da borda do Sol ativo. Um dos primeiros locais da América do Norte visitados pela sombra da Lua em 8 de abril, a totalidade em Durango durou cerca de 3 minutos e 46 segundos.

O próximo eclipse solar total acontecerá no dia 12 de agosto de 2026 e não será visível no Brasil. Sua rota de totalidade passará pelo norte da Espanha, por Portugal, pela Islândia, pela Groelândia e pela Rússia. O próximo eclipse solar total visível no Brasil está previsto para 12 de agosto de 2045.

Fonte: NASA

Choque de estrelas em nebulosa desvenda mistério estelar

Quando observaram um par de estrelas no coração de uma nuvem de gás e poeira, os astrônomos ficaram surpreendidos.

© ESO (nebulosa Ovo de Dragão que rodeia o sistema HD 148937)

Normalmente, os pares de estrelas apresentam-se tipicamente muito semelhantes, um pouco como gêmeos, no entanto, no caso de HD 148937, uma das estrelas parece ser mais jovem que a sua companheira e, também ao contrário da companheira, apresenta-se magnética.

Novos dados obtidos no Observatório Europeu do Sul (ESO) sugerem que teriam existido originalmente três estrelas neste sistema, tendo duas delas chocado entre si e se fundido. Este evento violento deu origem a uma nuvem circundante e alterou para sempre o destino do sistema. 

O sistema HD 148937, situado a aproximadamente 3.800 anos-luz de distância da Terra, na direção da constelação da Régua, é constituído por duas estrelas muito mais massivas do que o Sol e encontra-se rodeado por uma nebulosa, uma nuvem de gás e poeira. Encontrar uma nebulosa em torno de duas estrelas massivas é algo bastante raro, levando os astrônomos a pensar que alguma coisa de diferente devia ter acontecido neste sistema.

A diferença de idades das estrelas, uma parece ser pelo menos 1,5 milhões de anos mais nova do que a outra, sugere que algo deve ter rejuvenescido a estrela mais massiva. Outro detalhe importante é a nebulosa que rodeia as estrelas, NGC 6164/6165, também conhecida por Ovo de Dragão. Esta nebulosa tem uma idade de 7.500 anos, o que significa que é centenas de vezes mais nova do que ambas as estrelas, e apresenta também quantidades muito elevadas de nitrogênio, carbono e oxigênio. Este fato é bastante surpreendente, uma vez que estes são elementos que esperamos ver normalmente no interior de uma estrela, e não no exterior, o que nos sugere que tenham sido liberados no seguimento de algum acontecimento violento. 

Para desvendar este mistério, a equipe juntou nove anos de dados dos instrumentos PIONIER e GRAVITY, ambos montados no Interferômetro do Very Large Telescope (VLTI) do ESO, situado no deserto do Atacama, no Chile. Foram também utilizados dados de arquivo do instrumento FEROS, no Observatório de La Silla do ESO. 

Pensava-se que este sistema era originalmente composto por, pelo menos, três estrelas; duas delas deviam estar muito próximas uma da outra em determinado ponto da órbita, enquanto a terceira estaria muito mais afastada. As duas estrelas interiores fundiram-se de forma violenta, criando uma estrela magnética e ejetando material, o qual deu origem à nebulosa. A estrela mais distante formou uma nova órbita com a estrela magnética recém fundida, criando o binário que é observado atualmente no centro da nebulosa. 

Este cenário explica também porque é que uma das estrelas do sistema é magnética e a outra não, outra característica peculiar de HD 148937 detectada nos dados do VLTI. Ao mesmo tempo, este resultado ajuda a resolver um mistério de longa data da astronomia: como é que as estrelas massivas obtêm os seus campos magnéticos. Embora os campos magnéticos sejam uma característica comum às estrelas de pequena massa, como o nosso Sol, as estrelas mais massivas não conseguem manter campos magnéticos da mesma forma.

No entanto, algumas estrelas de grande massa são magnéticas. Os astrônomos já suspeitavam desde há algum tempo que as estrelas massivas poderiam adquirir campos magnéticos aquando da fusão de duas estrelas entre si, no entanto, esta é a primeira vez que se encontram provas diretas deste acontecimento. No caso de HD 148937, a fusão deve ter ocorrido recentemente.

Não se espera que o magnetismo em estrelas massivas dure muito tempo em comparação com o tempo de vida da estrela, por isso é provável que este acontecimento raro ocorreu muito pouco tempo depois. O Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, atualmente em construção no deserto chileno do Atacama, permitirá aos pesquisadores descobrir com mais detalhe o que aconteceu neste sistema e talvez até revelar mais surpresas.

Um artigo foi publicado na revista Science.

Fonte: ESO

Escondida em uma nuvem escura

Esta imagem obtida pelo telescópio espacial Hubble é a galáxia espiral IC 4633, localizada a 100 milhões de anos-luz de distância de nós, na constelação de Apus.

© Hubble (IC 4633)

A IC 4633 é uma galáxia rica em atividade de formação de estrelas, além de abrigar um núcleo galáctico ativo (AGN) em seu núcleo. 

Do nosso ponto de vista, a galáxia está principalmente inclinada na nossa direção, dando aos astrônomos uma visão bastante boa dos seus bilhões de estrelas. No entanto, não podemos apreciar totalmente as características desta galáxia, pelo menos na luz visível, porque está parcialmente escondida por uma camada de poeira escura. 

Esta nebulosa escura faz parte da região de formação estelar Chamaeleon, localizada a apenas cerca de 500 anos-luz de nós, numa parte próxima da Via Láctea. As nuvens escuras na região do Chamaeleon ocupam uma grande área do céu meridional, cobrindo a constelação homônima, mas também invadindo constelações próximas, como Apus. 

A nuvem é bem estudada pelo seu tesouro de estrelas jovens, particularmente a nuvem Cha I, que foi fotografada pelo telescópio espacial Hubble e também pelo telescópio espacial James Webb. A nuvem sobreposta IC 4633 fica a leste do conhecido Cha I, II e III, e foi chamada de MW9 ou Serpente Celestial do Sul. 

Um vasto e estreito rasto de gás fraco que serpenteia sobre o polo celeste meridional, tem uma aparência muito mais moderada do que os seus vizinhos. É classificada como uma nebulosa de fluxo integrado (IFN), uma nuvem de gás e poeira na Via Láctea que não está próxima de nenhuma estrela e é apenas fracamente iluminada pela luz total de todas as estrelas da galáxia. 

O Hubble não tem problemas em distinguir a Serpente Celestial do Sul, embora esta imagem capture apenas uma pequena parte dela. Para um objeto astronômico vistoso como o IC 4633, entre as espirais da Serpente Celestial do Sul claramente não é um mau lugar para se esconder.

Fonte: ESA

sábado, 6 de abril de 2024

Novo comportamento de buraco negro em galáxia distante

No núcleo de uma galáxia longínqua, um buraco negro supermassivo parece ter tido um caso de "soluços".

© P. Sukova (simulação de um buraco negro liberando plumas de gás)

Astrônomos do MIT (Massachusetts Institute of Technology) e de outros países descobriram que um buraco negro anteriormente calmo, que se situa no centro de uma galáxia a cerca de 800 milhões de anos-luz de distância, entrou subitamente em erupção, liberando plumas de gás a cada 8,5 dias antes de voltar ao seu estado normal e calmo. 

Os soluços periódicos são um novo comportamento que até agora não tinha sido observado em buracos negros. Os cientistas pensam que a explicação mais provável para os surtos provém de um segundo buraco negro menor que está a girando em torno do buraco negro supermassivo central e lançando material do disco de gás do buraco negro maior a cada 8,5 dias. 

As descobertas desafiam a imagem convencional dos discos de acreção dos buracos negros, que os cientistas supunham serem discos de gás relativamente uniformes. Os novos resultados sugerem que os discos de acreção podem ser mais variados no seu conteúdo, possivelmente contendo outros buracos negros e até estrelas inteiras.

As descobertas resultaram de uma detceção automática pelo ASAS-SN (All Sky Automated Survey for SuperNovae), uma rede de 20 telescópios robóticos situados em vários locais dos hemisférios norte e sul. Os telescópios fazem um levantamento automático de todo o céu, uma vez por dia, em busca de sinais de supernovas e outros fenômenos transientes. Em dezembro de 2020, o levantamento detectou uma explosão de luz numa galáxia a cerca de 800 milhões de anos-luz de distância. Essa parte específica do céu tinha estado relativamente calma e escura até à detecção pelos telescópios, quando a galáxia subitamente se iluminou por um fator de 1000.

Logo após, a erupção foi focada com o NICER (Neutron star Interior Composition Explorer) da NASA, um telescópio de raios X a bordo da Estação Espacial Internacional que monitora continuamente o céu em busca de explosões de raios X que possam assinalar atividade de estrelas de nêutrons, buracos negros e outros fenômenos gravitacionais extremos. 

A explosão durou cerca de quatro meses antes de se extinguir. Notou-se um padrão curioso na erupção: quedas sutis, numa banda muito estreita de raios X, cuja explosão de energia oriunda da galáxia diminuía periodicamente a cada 8,5 dias. O sinal é semelhante quando um planeta em órbita passa em frente da sua estrela hospedeira, bloqueando brevemente a luz da estrela. Mas nenhuma estrela seria capaz de bloquear uma erupção de uma galáxia inteira.

Isso poderia ser explicado, se um buraco negro supermassivo central de uma galáxia abrigasse um segundo buraco negro muito menor. Esse buraco negro menor poderia orbitar a um ângulo do disco de acreção do seu companheiro maior. O buraco negro secundário perfuraria periodicamente o disco do buraco negro primário à medida que orbitasse. No processo, liberaria uma pluma de gás.

Especificamente, a equipe descobriu que a galáxia estava relativamente calma antes da detecção de dezembro de 2020. Estima-se que o buraco negro supermassivo central da galáxia tenha uma massa equivalente a 50 milhões de sóis. Antes da explosão, o buraco negro pode ter tido um disco de acreção tênue e difuso ao seu redor, enquanto um segundo buraco negro menor, com 100 a 10.000 massas solares, orbitava em relativa obscuridade. Os pesquisadores suspeitam que, em dezembro de 2020, um terceiro objeto, provavelmente uma estrela, se aproximou demasiado do sistema e foi dilacerada pela imensa gravidade do buraco negro supermassivo, um evento denominado "evento de perturbação de marés". 

O súbito fluxo de material estelar iluminou momentaneamente o disco de acreção do buraco negro, à medida que os detritos estelares se precipitavam no buraco negro. Ao longo de quatro meses, o buraco negro alimentou-se dos detritos enquanto o segundo buraco negro continuava orbitando. Ao perfurar o disco, ejetava uma pluma muito maior do que normalmente faria, que por acaso foi liberada diretamente na direção do telescópio NICER. 

Este resultado mostra que binários de buracos negros supermassivos muito íntimos podem ser comuns nos núcleos galácticos, o que é um desenvolvimento muito excitante para futuros detectores de ondas gravitacionais. 

Um artigo foi publicado na revista Science Advances.

Fonte: Massachusetts Institute of Technology

Sol emitiu excesso de raios gama no último pico de atividade

Por sua proximidade e importância para a manutenção da vida na Terra, o Sol é a estrela mais pesquisada pelos astrofísicos.

© NASA (linhas do complexo campo magnético na superfície do Sol)

Esta situação de objeto de estudo preferencial não significa que há pouco a se descobrir sobre o astro. Ao contrário, alguns tipos de pesquisa, como as de longo prazo, só podem ser realizados porque nosso planeta está, sempre, nas vizinhanças do Sol. Assim, é possível observá-lo de forma contínua e perceber detalhes que não podem ser conferidos em estrelas mais distantes. Foi justamente essa particularidade que permitiu um achado recente. 

O estudo realizado pelo brasileiro Bruno Arsioli e a italiana Elena Orlando relata que o Sol emitiu um excesso inesperado de raios gama de alta energia em seus polos. A maior concentração de radiação ocorreu durante seu último período mais ativo, o chamado máximo solar, em junho de 2014. 

Como a Terra, o Sol gira em torno de um eixo, cujas extremidades definem os polos. A rotação gera o campo magnético, de forma que os polos magnéticos coincidem com as pontas do eixo de rotação. Segundo os autores do trabalho, o esperado era que, quando houvesse variações no nível das emissões de raios gama, tais flutuações se manifestassem com a mesma intensidade em todas as áreas do Sol, de forma mais ou menos homogênea, em vez de se concentrarem exageradamente nas zonas de alta latitude. Essa maior concentração de emissões de raios gama foi observada no momento em que ocorreu a inversão dos polos magnéticos do Sol. Por isso, suspeita-se que a reconfiguração magnética esteja relacionada com a produção excessiva de radiação gama nos polos. A troca faz com que o polo magnético do sul migre para o norte do disco solar e vice-versa. Tal inversão ocorre em média a cada onze anos, durante o máximo solar. 

Atualmente, Bruno Arsioli é pesquisador no Instituto de Astrofísica e Ciências Espaciais da Universidade de Lisboa, em Portugal. Elena Orlando é pesquisadora da Universidade de Trieste, Itália. Arsioli iniciou o estudo com dados do Fermi em 2021, quando passou um ano associado ao grupo da italiana na Universidade de Trieste. 

Inédito, o resultado foi obtido a partir da análise de dados referentes a 13 anos e meio de observação do Sol, entre agosto de 2008 e janeiro de 2022, pelo telescópio espacial Fermi, que é dedicado a registrar emissões em frequências da radiação gama, a porção mais energética do espectro eletromagnético. Recentemente foi usado também para estudar uma misteriosa explosão de raios gama, a segunda mais intensa que se observou no espaço, ocasionada provavelmente pela rara fusão de duas estrelas de nêutrons. 

O trabalho de análise das emissões do Sol foi feito em etapas. Primeiramente, Arsioli e Orlando dividiram os dados coletados, que abrangeram um ciclo solar inteiro, em intervalos menores, de 400 a 700 dias. Em seguida, com o emprego de ferramentas de análise de dados por eles desenvolvidas, compararam as emissões de raios gama com energia acima de 5 gigaelétron-volt (GeV) de cada subperíodo em todas as regiões do disco solar. Dessa forma, notaram a concentração de produção de emissões de altas energias nas zonas polares durante o máximo solar. A constatação é amparada por testes estatísticos, descritos no trabalho, que indicam a relevância dos sinais observados. 

Considerado um astro comum entre as mais de 100 bilhões de estrelas da Via Láctea, o Sol se formou há cerca de 4,5 bilhões de anos. Diferente da Terra e da Lua, ele não é um corpo sólido. É uma bola de plasma quente (matéria ionizada, com partículas carregadas eletricamente), constituída pelos gases hidrogênio e hélio. O nível de atividade solar (produção de energia) varia ao longo do tempo de forma mais ou menos regular, em ciclos. 

A duração média de um ciclo solar é de 11 anos, mas pode variar entre 9 e 14 anos. A formação de manchas solares, pontos pretos associadas a áreas mais frias na superfície, é um termômetro da atividade solar. Ocasionalmente, as maiores manchas são visíveis da Terra sem a necessidade de recorrer a telescópios. Mais manchas sinalizam que o astro está funcionando em ritmo acelerado. A dinâmica energética do Sol também está associada a outros fenômenos, como a ocorrência de flares (erupções) e ejeções de massa coronal. 

Entre o momento de maior e o de menor atividade, a diferença de brilho, ou seja, de produção de energia, do Sol é muito pequena, de no máximo 0,1%. Por isso, os climatologistas descartam que variações na atividade solar possam influir de forma significativa no aumento do aquecimento global. Segundo cálculos da NASA, ao longo dos dois últimos séculos, o peso acumulado das emissões de gases de efeito estufa provenientes de atividades humanas sobre a temperatura média da Terra é pelo menos 270 vezes maior do que a possível influência de qualquer alteração de luminosidade do Sol. 

Ainda assim, as alterações em seu regime de funcionamento produzem impactos evidentes na aparência e no comportamento da estrela. Além de gerar conhecimento básico sobre a física estelar, os estudos sobre a atividade solar são úteis para entender os impactos reais que o astro pode ter sobre diferentes aspectos da vida cotidiana na Terra. Ao emitir mais radiação e matéria na direção do Sistema Solar, a estrela pode afetar os sistemas de navegação terrestre, como o GPS, e as telecomunicações no planeta. Para o astrofísico Rodrigo Nemmen, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP), que não participou do artigo, os dados do trabalho de Arsioli e Orlando são importantes para melhorar o entendimento sobre o funcionamento da superfície do Sol. 

Um dos desafios de Arsioli e Orlando é tentar observar novamente o pico de emissão de raios gama nas regiões polares do Sol durante o próximo máximo solar, que deve ocorrer em 2025. Se a estrela se comportar novamente como em junho de 2014, a ideia de que a produção excessiva de raios gama decorre da inversão periódica dos polos magnéticos se torna mais robusta.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal

Fonte: Revista FAPESP