sábado, 21 de novembro de 2020

Lentes gravitacionais podem estimar a expansão do Universo

O Universo está se expandindo, mas há certeza de quão rápida esta expansão está acontecendo.

© Hubble (aglomerado de galáxias SDSS J1038+4849)

Agora, Simon Birrer, pós-doutorado da Universidade de Stanford e do Instituto Kavli para Física de Partículas e Astrofísica do Laboratório Nacional do Acelerador SLAC pertencente ao Departamento de Energia dos EUA, e uma equipe internacional de pesquisadores têm uma nova resposta que pode, uma vez aprimorada com mais dados, ajudar a resolver o debate. 

Esta nova resposta é o resultado de revisitar um método com décadas chamado cosmografia de atraso de tempo com novas suposições e dados adicionais para derivar uma nova estimativa da constante de Hubble, uma medida da expansão do Universo. 

Sabe-se há quase um século que o cosmos está expandindo e, durante este tempo, foram estabelecidas duas formas principais de medir esta expansão. Um método é a escada de distâncias cósmicas, uma série de etapas que ajudam a estimar a distância até supernovas distantes. Ao examinar o espectro de luz destas supernovas, os cientistas podem calcular a rapidez com que estão se afastando de nós e, em seguida, dividir pela distância para estimar a constante de Hubble. 

A constante de Hubble também pode ser estimada a partir de ondulações na radiação cósmica de fundo em micro-ondas (CMB, do inglês Cosmic Microwave Background radiation). Estas ondulações resultam de ondas sonoras que viajam pelo plasma no início do Universo.

Ao medir o tamanho das ondulações, podem inferir há quanto tempo e a que distância esta CMB que vemos hoje foi criada. Baseando-se numa teoria cosmológica bem estabelecida, os pesquisadores podem estimar a velocidade de expansão do Universo. No entanto, ambas as abordagens têm desvantagens. 

Os métodos de ondas sonoras dependem muito de como o som viajou no início do Universo, o que depende por sua vez da mistura particular de tipos de matéria no momento, de quanto tempo as ondas sonoras viajaram antes de deixar a sua marca na CMB e em suposições sobre a expansão do Universo desde aquela época. 

Entretanto, os métodos de escada de distâncias cósmicas encadeiam uma série de estimativas, começando com estimativas de radar da distância ao Sol e estimativas de paralaxe da distância até estrelas pulsantes chamadas cefeidas. Isto introduz uma cadeia de calibrações e medições, cada uma das quais necessita de ser precisa e sensível o suficiente para garantir uma estimativa confiável da constante de Hubble. 

Mas existe uma maneira de medir distâncias mais diretamente, com base no que chamamos de lentes gravitacionais fortes. A gravidade curva o próprio espaço-tempo e, com ele, o percurso que a luz faz através do cosmos. Um caso especial é quando um objeto muito massivo, como uma galáxia, curva a luz de um objeto muito distante de forma que a luz nos alcance por vários percursos diferentes, criando efetivamente várias imagens do mesmo objeto de fundo. 

Na década de 1960, através da teoria da relatividade de Einstein, foi possível usar as lentes gravitacionais fortes e a luz que curvam possibilitando medir mais diretamente as distâncias cósmicas. Ao longo da última década as medições tornaram-se precisas o suficiente para levar este método, cosmografia de atraso de tempo, da ideia à realidade. 

Medições sucessivas e um esforço dedicado pelas equipes H0LiCOW, COSMOGRAIL, STRIDES e SHARP, agora sob a alçada conjunta da organização TDCOSMOS, culminaram numa medição da constante de Hubble de aproximadamente 73 km/s/MPc (quilômetros por segundo por megaparsec) com uma precisão de 2%. Isto está de acordo com as estimativas feitas com o método local de escada de distâncias cósmicas, mas em tensão com as medições da radiação cósmica de fundo em micro-ondas sob as suposições do modelo cosmológico padrão. 

Com base nesta nova análise, com significativamente menos suposições aplicadas às sete galáxias influenciadas  por lentes gravitacionais com atraso de tempo que a equipe analisou em estudos anteriores, chegou-se a um valor mais alto da constante de Hubble, cerca de 74 km/s/MPc, mas com uma maior incerteza, o suficiente para que o seu valor fosse consistente com as estimativas altas e baixas da constante de Hubble. 

No entanto, quando foram adicionadas 33 lentes gravitacionais com propriedades semelhantes,mas sem uma fonte variável para trabalhar diretamente a cosmografia de atraso de tempo, usadas para estimar a estrutura galáctica, a estimativa da constante de Hubble caiu para cerca de 67 km/s/MPc, com 5% de incerteza, em boa concordância com as estimativas das ondas sonoras como as da CMB, mas também estatisticamente consistente com as determinações anteriores, dadas as incertezas. 

Esta mudança substancial não significa que o debate sobre o valor da constante de Hubble acabou, longe disso. Por um lado, o seu método introduz uma nova incerteza na estimativa associada às 33 lentes gravitacionais adicionadas na análise, e a TDCOSMO precisará de mais dados para confirmar os seus resultados, embora possam não demorar muito a chegar. 

Olhando mais adiante, novas imagens serão obtidas de mais galáxias com o LSST (Legacy Survey of Space and Time) do Observatório Vera Rubin para melhorar tais estimativas. 

Os resultados foram publicados no periódico Astronomy & Astrophysics.

Fonte: Stanford University

quinta-feira, 19 de novembro de 2020

Uma nebulosa intrigante revela o elo perdido estelar

Localizada a cerca de 6.300 anos-luz de distância, a TYC 2597-735-1 parecia uma estrela como outra qualquer, dentro de uma nebulosa esquisita. Porém, dados do observatório espacial Galaxy Evolution Explorer (GALEX) mostram que a nebulosa, conhecida como Blue Ring Nebula, está cercada por um anel azul difuso.

© NASA/JPL-Caltech (Blue Ring Nebula)

Mark Seibert, astrofísico do Carnegie Institution for Science e membro da equipe GALEX, foi um dos primeiros a encontrar a Nebulosa do Anel Azul nos dados do GALEX em 2004.

Nos últimos 16 anos, foram usados vários telescópios para identificar a causa do anel misterioso. Em 2006, foi usado o telescópio Hale da Caltech no Observatório Palomar, e o Observatório W. M. Keck, no Havaí, para encontrar evidências de uma onda de choque ao redor da estrela. A presença de tal onda de choque sugere que uma nuvem de gás foi ejetada para o espaço. Por um tempo, pensou-se que a estrela poderia estar destruindo um planeta invisível, mas, em 2017, dados do Habitable Zone Planet Finder no telescópio Hobby-Eberly no Texas confirmaram que não havia nenhum objeto compacto orbitando a estrela.

Dados de arquivo do telescópio espacial Spitzer e do Wide-field Survey Explorer (WISE) da NASA, junto com outros observatórios infravermelhos anteriores, ajudaram a estabelecer que a estrela foi circundada por um disco de poeira. Dados adicionais também desempenharam um papel na resolução do caso, incluindo aqueles de um grupo de ciência cidadã chamado American Association of Variable Star Observers (AAVSO).

As novas observações mostraram que existem curvas finas de material em cada lado do anel, formado por gás hidrogênio. Estas curvas são mais quentes e mais densas, e revelaram que o anel é uma estrutura ainda mais complexa em forma de dois cones, um de cada lado da estrela. Parece um anel porque neste ângulo estamos olhando para a abertura mais larga de um dos cones. 

Mas o que poderia ter criado uma estrutura como esta? Um estudo apresenta uma hipótese bastante convincente de que se trata de um caso de canibalismo estelar, ou seja, um antigo sistema binário de estrelas que orbitavam entre si até que uma delas devorou sua companheira. 

Uma delas seria semelhante ao Sol, embora mais velha, enquanto a segunda teria massa muito inferior, provavelmente uma anã vermelha com cerca de 1/10 de massa solar. Toda estrela semelhante ao Sol está destinada a envelhecer e inchar, tornando-se uma gigante vermelha, e foi isso o que aconteceu no caso deste sistema. Enquanto se expandia, sua superfície ficou cada vez mais perto da anã vermelha. Isso vez com que todo o material de expansão da gigante vermelha começasse a ser puxado para a estrela secundária. 

Acontece que este fluxo foi tão forte que a anã vermelha não conseguia absorver tudo, e este gás acabou formando um disco circumbinário, ou seja, um disco largo ao redor de ambas as estrelas. O processo roubou a energia rotacional da dupla, e assim a estrela secundária começou a espiralar rumo à primária, até que elas colidiram, resultando em uma fusão. 

A colisão entre duas estrelas costuma ser um evento cataclísmico, mesmo quando elas não são muito grandes. Após devorar sua companheira, a estrela primária acabou explodindo, ejetando uma quantidade de gás e poeira 

Quando os astrônomos olham agora para a TYC 2597-735-1, estão provavelmente vendo como ela estava há cerca de mil anos após o evento da fusão. Com a colisão, ela passou a girar mais rápido e sua superfície se agita com toda a atividade que acontece por lá, como o material do disco caindo sobre ela. Além disso, ela sopra um vento de gás gerando uma onda de choque que está se movendo a 400 km/s.

A onda de choque aqueceu as moléculas de hidrogênio nos escombros, o que fez com que adquirissem fluorescência na luz ultravioleta. Este processo de fluorescência é semelhante ao que causou o brilho de uma longa cauda atrás da estrela Mira, fotografada pelo GALEX em 2007.

© NASA/JPL-Caltech (estrela Mira)

Então, o vento desviou, fluindo para cima e para baixo, perpendicular ao disco. O resultado é o gás formando a nebulosa na forma de dois cones apontados para fora. Descobrir a real forma daquilo que antes parecia um anel foi um grande passo para a astronomia, e marca o fim de um mistério que durou 16 anos, desde que os astrônomos ficaram perplexos com a nebulosa. 

Este é o mais jovem caso conhecido de duas estrelas em processo de fusão. As fusões estelares podem ocorrer uma vez a cada 10 anos na Via Láctea, e isso significa que muitas estrelas que vemos hoje no céu já era um sistema binário, muito tempo atrás. Também já conhecemos muitos sistemas binários que podem se fundir algum dia, mas pouco se sabe sobre o que acontece logo após a colisão. 

O estudo foi publicado na revista Nature.

Fonte: California Institute of Technology

terça-feira, 17 de novembro de 2020

O colapso da nuvem que deu origem ao Sistema Solar

Há muito tempo o nosso Sol e Sistema Solar formaram-se no curto espaço de tempo de 200.000 anos.

© NASA (ilustração da poeira e do gás em torno de sistema planetário recém-formado)

Esta é a conclusão de um grupo de cientistas do Laboratório Nacional Lawrence Livermore após observarem isótopos do elemento molibdênio encontrados em meteoritos. O material que compõe o Sol e o resto do Sistema Solar veio do colapso de uma grande nuvem de gás e poeira há cerca de 4,5 bilhões de anos. 

Ao observarem outros sistemas estelares que se formaram de forma semelhante ao nosso, os astrônomos estimam que provavelmente são necessários cerca de 1 a 2 milhões de anos para o colapso de uma nuvem e a ignição de uma estrela, mas este é o primeiro estudo que pode fornecer números para o nosso próprio Sistema Solar. 

Os sólidos mais antigos do Sistema Solar são as inclusões ricas em cálcio e alumínio (CAIs, em inglês "calcium-aluminum–rich inclusions"), e estas amostras fornecem um registo direto da formação do Sistema Solar. Estas inclusões de tamanho micrométrico a centimétrico nos meteoritos formaram-se num ambiente de alta temperatura (mais de 1.300 Kelvin), provavelmente perto do jovem Sol. 

Foram então transportadas para a região onde os meteoritos condritos carbonáceos se formaram, onde podem ser encontrados hoje. A maioria das CAIs foram formadas há 4,567 bilhões de anos, durante um período de aproximadamente 40.000 a 200.000 anos. 

É aqui que entra a equipe do Laboratório Nacional Lawrence Livermore. Ela mediu as composições isotópicas e traços de uma variedade de CAIS obtidas de meteoritos condritos carbonáceos, incluindo o meteorito Allende, o maior condrito carbonáceo encontrado na Terra. 

Como descobriram que as composições isotópicas distintas de molibdênio cobrem grande quantidade de material que se formou no disco protoplanetário em vez de apenas uma pequena faixa, estas inclusões devem ter sido formadas dentro do intervalo de tempo do colapso da nuvem. 

Uma vez que o período de tempo observado de acreção estelar é muito mais longo do que o tempo que as CAIs levaram para se formar, a equipe foi capaz de identificar qual a fase astronômica da formação do Sistema Solar registrada pela formação das CAIs e, finalmente, quão depressa o material que compõe o Sistema Solar se acretou.

Um artigo sobre o estudo foi publicado na revista Science.

Fonte: Lawrence Livermore National Laboratory

segunda-feira, 16 de novembro de 2020

Uma ametista cósmica numa estrela moribunda

Na Terra, as ametistas podem se formar quando bolhas de gás na lava esfriam sob as condições certas. No espaço, uma estrela moribunda com massa semelhante à do Sol é capaz de produzir uma estrutura equivalente ao apelo destas lindas gemas.

© Chandra/Hubble (IC 4593)

À medida que estrelas como o Sol consomem seu combustível, suas camadas externas se desprendem e o núcleo da estrela encolhe. Usando o observatório de raios X Chandra da NASA, os astrônomos encontraram uma bolha de gás muito quente no centro de uma destas estrelas em extinção, uma nebulosa planetária em nossa galáxia chamada IC 4593. A uma distância de cerca de 7.800 anos-luz da Terra, a IC 4593 é a nebulosa planetária mais distante já detectada com o Chandra. 

Esta nova imagem da IC 4593 evidenciam os raios X (em roxo) obtido pelo Chandra. A bolha detectada pelo Chandra é de um gás que foi aquecido a mais de um milhão de graus. Estas altas temperaturas provavelmente foram geradas por material que explodiu do núcleo encolhido da estrela e se chocou com o gás que havia sido ejetado anteriormente pela estrela. 

Esta imagem composta também contém dados de luz visível (rosa e verde) do telescópio espacial Hubble. As regiões rosa na imagem do Hubble são a sobreposição da emissão do gás mais frio composto por uma combinação de nitrogênio, oxigênio e hidrogênio, enquanto a emissão verde é principalmente do nitrogênio. 

A IC 4593 é chamada de "nebulosa planetária", um nome que parece enganador porque esta classe de objetos não tem nada a ver com planetas. O nome foi dado cerca de dois séculos atrás porque elas tinham aparência de um planeta quando vistos através de um pequeno telescópio. Na verdade, uma nebulosa planetária é formada após o interior de uma estrela com aproximadamente a massa do Sol se contrair e suas camadas externas se expandem e esfriam. No caso do Sol, suas camadas externas podem se estender até a órbita de Vênus durante sua fase de gigante vermelha daqui aproximadamente 5 bilhões de anos. 

Além do gás quente, também é encontrada evidências de uma fonte de raios X semelhante a um ponto no centro da IC 4593. Esta emissão de raios X tem energias mais altas do que a bolha de gás quente. A fonte pontual pode ser da estrela que descartou suas camadas externas para formar a nebulosa planetária ou pode ser de uma possível estrela companheira neste sistema. 

Um artigo que descreve estes resultados foi publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics

Uma galáxia com braços espirais camuflados

Observada com o telescópio espacial Hubble, a galáxia tênue apresentada nesta imagem é conhecida como UGC 12588.

© Hubble (UGC 12588)

Ao contrário de muitas galáxias espirais, a UGC 12588 não exibe uma barra de estrelas em seu centro nem o padrão clássico de braço espiral proeminente. Em vez disso, para o observador, seu centro circular, branco e quase todo não estruturado torna esta galáxia menos reminiscente que uma megaestrutura de estrelas e gás no espaço. 

Situada na constelação de Andrômeda, no hemisfério norte, esta galáxia é classificada como uma galáxia espiral. Ao contrário da imagem clássica de uma galáxia espiral, no entanto, os enormes braços com estrelas e gás na UGC 12588 são muito tênues, indistintos e firmemente enrolados em seu centro. 

A visão mais clara dos braços espirais vem das estrelas mais azuis espalhadas ao redor das bordas da galáxia que destacam as regiões onde a formação de novas estrelas está provavelmente ocorrendo.

Fonte: NASA

sexta-feira, 13 de novembro de 2020

Primeira detecção direta de uma anã marron com um radiotelescópio

Pela primeira vez, os astrônomos usaram observações de um radiotelescópio e de um par de observatórios em Maunakea, Havaí, para descobrir e caracterizar uma anã marrom fria, também conhecida como estrela falhada.

©  ASTRON/Danielle Futselaar (ilustração de uma anã marrom)

A anã marron, designada BDR J1750+3809, é o primeiro objeto subestelar detectado por meio de observações no rádio; até agora, as anãs marrons foram amplamente descobertas em levantamentos infravermelhos do céu. 

A BDR J1750+3809, apelidada "Elegast" pela equipe de descoberta, foi identificada pela primeira vez usando dados do telescópio LOFAR (Low-Frequency Array) na Europa, e depois confirmada usando telescópios no cume do Maunakea, nomeadamente o Observatório Gemini e o IRTF (InfraRed Telescope Facility) da NASA. 

A descoberta direta destes objetos, com radiotelescópios sensíveis como o LOFAR, é um avanço significativo, porque demonstra que é possível detectar objetos que são demasiado frios e tênues para serem encontrados em levantamentos infravermelhos e talvez até mesmo detectar exoplanetas gigantes gasosos que flutuam livremente pelo espaço, sem estarem ligados gravitacionalmente a estrelas. 

Este trabalho abre um método totalmente novo para encontrar os objetos mais frios flutuando na vizinhança do Sol, que de outra forma seriam demasiado fracos para serem descobertos com os métodos usados nos últimos 25 anos. 

As anãs marrons ocupam a fronteira entre os maiores planetas e as estrelas menores. Elas não têm massa suficiente para desencadear a fusão do hidrogênio nos seus núcleos e, ao invés, brilham em comprimentos de onda infravermelhos com o calor remanescente da sua formação. Também apelidadas de "super-planetas", as anãs marrons possuem atmosferas gasosas que se assemelham mais aos planetas gigantes do nosso Sistema Solar do que a qualquer estrela. 

Embora as anãs marrons não possuam as reações de fusão que mantêm o Sol brilhando, podem emitir radiação em comprimentos de onda de rádio. O processo subjacente que alimenta estas emissões de rádio é conhecido, pois também ocorre no maior planeta do Sistema Solar. O poderoso campo magnético de Júpiter acelera partículas carregadas, como elétrons, que por sua vez produzem radiação, neste caso, ondas de rádio e auroras. 

O fato de as anãs marrons serem emissoras de rádio permitiu que os astrônomos através deste resultado desenvolvesse uma nova estratégia de observação. As emissões de rádio foram detectadas anteriormente apenas em algumas anãs marrons frias, que foram descobertas e catalogadas por levantamentos infravermelhos antes de serem observadas com radiotelescópios. 

Os astrônomos decidiram inverter esta estratégia, usando um radiotelescópio sensível para descobrir fontes de rádio frias e fracas, e em seguida realizar observações infravermelhas de acompanhamento com telescópios do Maunakea para categorizá-las. 

Além de ser um resultado empolgante por si só, a descoberta de BDR J1750+3809 pode fornecer um vislumbre tentador de um futuro quando for possível medir as propriedades dos campos magnéticos dos exoplanetas. As anãs marrons frias são os astros mais parecidos com os exoplanetas que podem atualmente serem detectados com radiotelescópios, e esta descoberta pode ser usada para testar teorias que preveem a força do campo magnético dos exoplanetas. Os campos magnéticos são um fator importante na determinação das propriedades atmosféricas e da evolução a longo prazo dos exoplanetas.

A pesquisa foi publicada no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: Gemini Observatory

Os anéis das árvores e o impacto de supernovas distantes na Terra

De acordo com uma nova pesquisa do geocientista Robert Brakenridge da Universidade do Colorado, em Boulder, EUA, explosões massivas de energia, a milhares de anos-luz da Terra, podem ter deixado vestígios na biologia e geologia do nosso planeta.

© You-Hua Chu/R. M. Williams (Supernova N 63A)

O estudo analisa a os impactos das supernovas, alguns dos eventos mais violentos do Universo conhecido. Em apenas alguns meses, uma única destas erupções pode liberar tanta energia quanto o Sol durante toda a sua vida, sendo muito brilhantes. Através de um telescópio, uma galáxia é uma pequena mancha difusa. Então, de repente, aparece uma estrela e pode ser tão brilhante quanto o resto da galáxia.

Uma supernova muito próxima pode ser capaz de varrer a civilização humana da face da Terra. Mas mesmo de longe, estas explosões podem ainda provocar danos, banhando o nosso planeta em radiação perigosa e danificando a camada protetora de ozônio. Para estudar estes possíveis impactos, Brakenridge estudou registos de anéis de árvores em busca das impressões digitais destas distantes explosões cósmicas. 

Os seus achados sugerem que as supernovas relativamente próximas podem, teoricamente, ter provocado pelo menos quatro perturbações no clima da Terra ao longo dos últimos 40.000 anos. Os resultados estão longe de ser conclusivos, mas fornecem dicas tentadoras de que, quando se trata da estabilidade da vida na Terra, o que acontece no espaço nem sempre fica no espaço. "Estes são eventos extremos, e os seus potenciais efeitos parecem corresponder aos registos dos anéis de árvores," disse Brakenridge. 

A sua investigação gira em torno do caso de um átomo curioso. O carbono-14, também conhecido como radiocarbono, é um isótopo do carbono que ocorre apenas em pequenas quantidades na Terra. Também não é daqui. O radiocarbono é formado quando os raios cósmicos do espaço bombardeiam a atmosfera do nosso planeta num ritmo quase constante.

As árvores captam dióxido de carbono e parte deste carbono será radiocarbono. No entanto, às vezes a quantidade de radiocarbono que as árvores recolhem não é constante. Os cientistas descobriram vários casos em que a concentração deste isótopo nos anéis das árvores aumentou subitamente e sem razão terrestre aparente. Muitos cientistas levantaram a hipótese de que estes picos de vários anos podem ser provocados por explosões solares ou enormes liberações de energia da superfície do Sol. 

Na verdade, existem apenas duas possibilidades: uma proeminência solar ou uma supernova. Os cientistas registaram supernovas em outras galáxias que podem ter produzido uma quantidade estupenda de radiação gama, o mesmo tipo de radiação que pode desencadear a formação de átomos de radiocarbono na Terra. Embora estes isótopos não sejam propriamente perigosos, um pico nos seus níveis pode indicar que a energia de uma supernova distante viajou centenas ou milhares de anos-luz até ao nosso planeta. 

Para testar esta hipótese, Brakenridge voltou-se para o passado. Ele reuniu uma lista de supernovas que ocorreram relativamente perto da Terra ao longo dos últimos 40.000 anos. Os cientistas podem estudar estes eventos observando as nebulosas que deixam para trás. Ele então comparou as idades estimadas destes fogos-de-artifício galácticos com o registo de anéis de árvores no solo. Descobriu que das oito supernovas mais próximas estudadas, todas pareciam estar associadas a picos inexplicáveis no registo de radiocarbono na Terra. 

Ele considera quatro delas candidatos especialmente promissores. Veja-se o caso de uma ex-estrela na constelação de Vela. Este corpo celeste, que no passado esteve a cerca de 815 anos-luz da Terra, tornou-se uma supernova há cerca de 13.000 anos. Não muito depois, os níveis de radiocarbono aumentaram quase 3% na Terra, um aumento impressionante. 

Estas evidências estão longe de serem irrefutáveis. Os cientistas ainda têm problemas em datar as supernovas do passado, tornando incerto o momento da explosão de Vela e com um erro de até 1.500 anos. Também não está claro quais foram os impactos de tal perturbação nas plantas e animais da Terra nessa época. 

Foram avistados sinais de que Betelgeuse, uma estrela gigante vermelha na constelação de Órion, pode estar à beira de entrar em colapso e de se transformar em supernova. E só está a 642,5 anos-luz da Terra, muito mais perto do que a supernova de Vela.

O estudo foi publicado na revista International Journal of Astrobiology.

Fonte: University of Colorado Boulder

sábado, 7 de novembro de 2020

A atmosfera de "Netuno quente" que não devia existir

Uma equipe liderada por um astrônomo da Universidade do Kansas analisou dados dos telescópios espaciais TESS e Spitzer da NASA para retratar pela primeira vez a atmosfera de um tipo altamente incomum de exoplaneta "Neptuno quente".


© E. Schmidt (ilustração do exoplaneta LTT 9779b perto da estrela que orbita)

A pesquisa detalha a primeira caracterização espectral atmosférica de qualquer planeta descoberto pelo TESS, o primeiro mapa de temperatura global de qualquer planeta do TESS com uma atmosfera e um Netuno quente cujo espectro de emissão é fundamentalmente diferente dos muito maiores "Júpiteres quentes" anteriormente estudados.

Este exoplaneta é tão intensamente irradiado pela sua estrela que a sua temperatura está próxima de 1.700º C e a sua atmosfera pode ter-se evaporado completamente. Ainda assim, as observações com o Spitzer mostram a sua atmosfera por meia da luz infravermelha que o planeta emite.

Este exoplaneta não tem uma superfície sólida e é muito mais quente do que Mercúrio no nosso Sistema Solar, não só o chumbo seria derretido nesta atmosfera, como também a platina, crômio e aço inoxidável. 

O Netuno quente LTT 9779b foi descoberto no ano passado, tornando-se um dos primeiros planetas do tamanho de Netuno descobertos pela missão TESS da NASA. Os astrônomos usaram uma técnica chamada "curva de fase" para analisar a composição atmosférica do exoplaneta. 

Foi medida a quantidade de radiação infravermelha emitida pelo planeta enquanto girava 360º no seu eixo. A luz infravermelha informa-nos sobre a temperatura de algo e onde estão as partes mais quentes e frias deste planeta. As leituras da temperatura do planeta são vistas como uma forma de caracterizar a sua atmosfera. 

"O planeta é muito mais frio do que esperávamos, o que sugere que está refletindo muita da luz estelar incidente que o atinge, provavelmente devido às nuvens diurnas," disse Nicolas Cowan do iREx (Institute for Research on Exoplanets) e da Universidade McGill em Montreal, que ajudou na análise e interpretação das medições da curva de fase térmica. "O planeta também não transporta muito calor para o lado noturno, mas achamos que compreendemos isso: a luz estelar que é absorvida é provavelmente absorvida no alto da atmosfera, de onde a energia é rapidamente irradiada de volta para o espaço." 

O que as medições até agora mostram são o que características de absorção espectral, indicando a presença de monóxido de carbono e/ou dióxido de carbono na atmosfera.

Um estudo complementar desta pesquisa, investiga a composição atmosférica do exoplaneta por meio de observações de eclipses secundários com o instrumento IRAC (Spitzer Infrared Array Camera) do Netuno quente. 

Como é que este planeta é capaz de reter a sua atmosfera? Como é que se formou? Será que já foi maior, mas perdeu parte da atmosfera original? Se sim, então porque é que a sua atmosfera não é apenas uma versão em escala reduzida das atmosferas dos exoplanetas maiores e ultraquentes? E o que mais pode estar escondido na sua atmosfera? 

Estas perguntas poderão ser respondidas com o advento do futuro telescópio espacial James Webb, onde o exoplaneta LTT 9779b será um alvo muito interessante de se observar.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: University of New Mexico

Ventos supersônicos e chuva de rochas em planeta de lava

Entre os exoplanetas mais extremos descobertos, estão os planetas de lava: mundos escaldantes que orbitam tão perto da sua estrela hospedeira que algumas regiões são provavelmente oceanos de lava derretida.

© U. McGill/J. Roussy (ilustração do exoplaneta de lava K2-141b)

De acordo com cientistas da Universidade McGill, da Universidade de York e do IISER (Indian Institute of Science Education and Research), a atmosfera e o ciclo climático de pelo menos um destes exoplanetas são ainda mais estranhos, com evaporação e precipitação de rochas, ventos supersônicos que atingem mais de 5.000 km/h e um oceano de magma com 100 km de profundidade. 

Num estudo, os cientistas usam simulações de computador para prever as condições em K2-141b, um exoplaneta do tamanho da Terra com uma superfície, oceano e atmosfera compostos dos mesmos ingredientes: rochas. A meteorologia extrema, prevista na sua análise, pode mudar permanentemente a superfície e atmosfera de K2-141b ao longo do tempo. 

Ao analisar o padrão de iluminação do exoplaneta, descobriu-se que em cerca de dois-terços de K2-141b é dia perpétuo, em vez do ciclo dia-noite a que estamos habituados na Terra. O K2-141b pertence a um subconjunto de planetas rochosos que orbitam muito perto da sua estrela. Esta proximidade mantém o exoplaneta gravitacionalmente bloqueado, o que significa que o mesmo lado está sempre voltado para a estrela. O lado noturno sofre temperaturas frias abaixo dos -200º C. O lado diurno do exoplaneta, com uns estimados 3.000º C, é quente o suficiente não apenas para derreter rochas, mas também para as vaporizar, criando em algumas áreas uma atmosfera fina. 

Notavelmente, a atmosfera de vapor de rocha criada pelo calor extremo sofre precipitação. Assim como o ciclo da água na Terra, onde a água evapora, sobe para a atmosfera, condensa-se e cai de volta como chuva, o mesmo ocorre com o sódio, monóxido de silício e dióxido de silício em K2-141b. 

Na Terra, a chuva regressa aos oceanos, onde evapora mais uma vez e o ciclo da água se repete. Em K2-141b, o vapor mineral formado pela rocha evaporada é varrida para o lado noturno frio pelos ventos supersônicos e as rochas "chovem" de volta para o oceano de magma. As correntes resultantes deslocam-se de volta para o lado diurno infernal do exoplaneta, onde a rocha é evaporada mais uma vez. 

Ainda assim, o ciclo de K2-141b não é tão estável quanto o da Terra. O fluxo de retorno do oceano de magma para o lado diurno é lento e, como resultado, preveem que a composição mineral mudará com o tempo, eventualmente modificando a própria superfície e atmosfera de K2-141b. 

Todos os planetas rochosos, incluindo a Terra, começaram como mundos de lava, mas rapidamente arrefeceram e solidificaram. Os planetas de lava dão-nos um raro vislumbre deste estágio da evolução planetária. 

Os cientistas dizem que o próximo passo será testar se estas previsões estão corretas. A equipe tem agora dados do telescópio espacial Spitzer que deverão dar-lhes um primeiro vislumbre das temperaturas diurnas e noturnas do exoplaneta. Com o lançamento do telescópio espacial James Webb, previsto para 2021, serão capazes de verificar se a atmosfera se comporta como previsto.

Um artigo foi publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Royal Astronomical Society

sexta-feira, 6 de novembro de 2020

A habitabilidade dos planetas em torno de anãs vermelhas velhas

Os planetas que orbitam perto das estrelas mais abundantes e duradouras da nossa Via Láctea podem ser menos hospitaleiros para a vida do que se pensava.


© NASA (ilustração da Estrela de Barnard)

Um novo estudo usando o observatório de raios X Chandra e o telescópio espacial Hubble da NASA examinou a anã vermelha chamada Estrela de Barnard, que tem mais ou menos 10 bilhões de anos, mais do dobro da idade atual do Sol. 

As anãs vermelhas são muito mais frias e menos massivas do que o Sol, e espera-se que vivam muito mais tempo porque não consomem o seu combustível tão depressa. A Estrela de Barnard é uma das estrelas mais próximas, a uma distância de apenas 6 anos-luz. 

As anãs vermelhas jovens, com idades inferiores a alguns bilhões de anos, são conhecidas como fortes fontes de radiação altamente energética, incluindo rajadas de radiação ultravioleta e raios X. No entanto, os cientistas sabem menos sobre quanta radiação prejudicial as anãs vermelhas emitem mais tarde nas suas vidas. 

As novas observações concluíram que aproximadamente 25% do tempo, a Estrela de Barnard libera proeminências escaldantes, que podem danificar a atmosfera dos planetas que orbitam perto. Embora o seu único planeta conhecido não tenha temperaturas habitáveis, este estudo acrescenta evidências de que as anãs vermelhas podem apresentar sérios desafios para a vida nos seus planetas. 

As anãs vermelhas são os tipos mais comuns de estrelas, e os seus tamanhos pequenos tornam-nas favoráveis para o estudo de planetas em órbita. A Estrela de Barnard é um ótimo estudo de caso para aprender o que acontece em particular com as anãs vermelhas mais velhas. 

As observações da Estrela de Barnard com o telescópio espacial Hubble, realizadas em março de 2019, revelaram duas proeminências ultravioletas altamente energéticas, e as observações do Chandra em junho de 2019 revelaram uma em raios X. Ambas as observações duraram cerca de 7 horas. 

Esta alta atividade é surpreendente para uma anã vermelha velha. Os astrônomos então estudaram o que estes resultados significam para planetas rochosos que orbitam na zona habitável de uma anã vermelha como a Estrela de Barnard. 

Qualquer atmosfera formada no início da história de um planeta na zona habitável provavelmente sofreu erosão devido à radiação altamente energética da estrela durante a sua juventude volátil. Mais tarde, no entanto, as atmosferas dos planetas podem regenerar-se à medida que a estrela se torna menos ativa com a idade. Este processo de regeneração pode ocorrer por gases liberados por impactos de material sólido ou gases liberados por processos vulcânicos. 

No entanto, a investida de proeminências poderosas como as aqui relatadas, ocorrendo repetidamente ao longo de centenas de milhões de anos, pode erodir qualquer atmosfera regenerada em planetas rochosos na zona habitável. Isto reduziria a hipótese destes mundos suportarem vida. 

Devido a estas descobertas surpreendentes de proeminências, os pesquisadores consideraram outras possibilidades de vida em planetas que orbitam anãs vermelhas velhas como a Estrela de Barnard. 

Embora os planetas na zona habitável tradicional possam não ser capazes de manter a sua atmosfera devido ao clima estelar, os astrônomos podem estender as suas buscas por planetas a distâncias maiores da estrela hospedeira, onde as doses de radiação altamente energética são mais baixas. A estas distâncias maiores, é possível que o efeito estufa de gases que não o dióxido de carbono, como o hidrogênio, permita a existência de água líquida. 

Até agora foram confirmados mais de 4.000 exoplanetas, e muitos orbitam anãs vermelhas. Entender o que torna os planetas habitáveis é do interesse dos cientistas no campo da astrobiologia, que estuda a origem da vida na Terra e onde pode existir no Sistema Solar e além. Os pesquisadores está atualmente estudando a radiação altamente energética de muitas outras anãs vermelhas para determinar se a Estrela de Barnard é típica. 

Se a maioria das anãs vermelhas seja hostil à vida, conclui-se que pode ser que planetas em torno de estrelas mais massivas, como o nosso próprio Sol, podem ser o local ideal para procurar mundos habitados com a próxima geração de telescópios. 

A Estrela de Barnard tem 16% da massa do Sol e o seu planeta conhecido tem um massa três vezes a da Terra, orbitando a uma distância mais ou menos equivalente à separação Mercúrio-Sol. 

O artigo que descreve estes resultados foi publicado no periódico The Astronomical Journal.

Fonte: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics

terça-feira, 3 de novembro de 2020

Metade das estrelas parecidas do Sol podem hospedar planetas rochosos

Desde que os astrônomos confirmaram a presença de exoplanetas que a humanidade se pergunta quantos podem abrigar vida.


© NASA/JPL-Caltech (ilustração do exoplaneta Kepler-425b)

Agora, estamos um pouco mais perto de encontrar a resposta. De acordo com uma nova pesquisa usando dados da missão Kepler da NASA, cerca de metade das estrelas semelhantes em temperatura com o nosso Sol podem ter um planeta rochoso capaz de suportar água líquida à sua superfície.

A nossa Galáxia possui cerca de 300 milhões destes mundos potencialmente habitáveis. Alguns destes exoplanetas podem até ser nossos vizinhos interestelares, com quatro potencialmente a 30 anos-luz do nosso Sol e o mais próximo provavelmente a cerca de 20 anos-luz.

Esta pesquisa ajuda-nos a entender o potencial destes planetas em ter os elementos para sustentar a vida. Esta é uma parte essencial da astrobiologia, o estudo das origens e do futuro da vida no nosso Universo.

A NASA reformou o telescópio espacial em 2018, depois de ter ficado sem combustível. Nove anos de observações do telescópio revelaram que existem bilhões de planetas na nossa Galáxia, ou seja, mais planetas do que estrelas.

Embora este resultado esteja longe de ser definitivo, e a água à superfície de um planeta seja apenas um dos muitos fatores que sustentam a vida, é extremamente importante calcular que estes mundos são tão comuns com tanta confiança e precisão.

Para fins de cálculo desta taxa de ocorrência, a equipe analisou exoplanetas com raios entre 0,5 e 1,5 vezes o da Terra, focando-se em planetas que são provavelmente rochosos. Também inspecionaram estrelas semelhantes ao nosso Sol em idade e temperatura, com uma diferença (mais quentes ou mais frias) de 800º C. 

Trata-se de uma ampla gama de estrelas diferentes, cada uma com as suas próprias propriedades particulares, influenciando se os planetas rochosos em órbita são capazes de suportar água líquida. Estas complexidades são, em parte, o motivo pelo qual é tão difícil calcular quantos planetas potencialmente habitáveis existem, especialmente quando até os nossos telescópios mais poderosos mal conseguem detectar estes planetas pequenos.

Esta nova descoberta é um passo significativo em direção à missão original do Kepler de entender quantos mundos potencialmente habitáveis existem na nossa Galáxia. Estimativas anteriores da frequência, também conhecida como taxa de ocorrência, de tais planetas ignoravam a relação entre a temperatura das estrelas e os tipos de luz emitidos pela estrela e absorvidos pelo planeta. 

A nova análise é responsável por estas relações e fornece uma compreensão mais completa de se um determinado planeta pode ser capaz ou não de suportar água líquida. Esta abordagem é possível combinando o conjunto final de dados do Kepler de sinais planetários com dados sobre a produção energética de cada estrela recolhidos pela missão Gaia da ESA. 

O Gaia forneceu informações sobre a quantidade de energia que cai num planeta da estrela com base no fluxo estelar, ou a quantidade total de energia que é emitida numa determinada área durante um determinado espaço de tempo.

Embora o efeito exato ainda esteja a ser investigado, a atmosfera de um planeta também entra no cálculo da quantidade de luz necessária para permitir água líquida à superfície. Usando uma estimativa conservadora do efeito da atmosfera, estima-se uma taxa de ocorrência de aproximadamente 50%, ou seja, cerca de metade das estrelas semelhantes ao Sol têm planetas rochosos capazes abrigar água líquida à superfície. Uma definição alternativa otimista da zona habitável estima cerca de 75%. 

Este resultado baseia-se num longo legado de trabalho de análise dos dados do Kepler para obter uma taxa de ocorrência e prepara o terreno para futuras observações de exoplanetas informadas por quão comuns esperamos que estes mundos rochosos e potencialmente habitáveis sejam. As pesquisas futuras vão continuar refinando esta percentagem, informando a probabilidade de encontrar estes tipos de planetas e alimentando os planetas para os próximos estágios de exploração exoplanetária.

Depois de revelar mais de 2.800 exoplanetas confirmados, os dados recolhidos pelo telescópio espacial Kepler continuam produzindo novas descobertas essenciais sobre o nosso lugar no Universo. Embora o campo de visão do Kepler cobrisse apenas 0,25% do céu, a área coberta por uma mão à distância do braço esticado, os seus dados permitiram que os cientistas extrapolassem o que os dados da missão significam para o resto da Galáxia. Este trabalho continua com o TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite), o atual telescópio de caça exoplanetária da NASA. 

O estudo será publicado no periódico The Astronomical Journal.

Fonte: SETI Institute

domingo, 1 de novembro de 2020

Vulcões ajudam a criar atmosfera em lua de Júpiter

Novas imagens obtidas pelo radiotelescópio ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array) mostram, pela primeira vez, os efeitos diretos da atividade vulcânica na superfície sobre a atmosfera da Io, uma das luas de Júpiter.

© NASA/JPL (Io)

Io é a lua que apresenta a atividade vulcânica mais intensa no Sistema Solar. Ela possui mais de 400 vulcões ativos que expelem gases de enxofre. É devido ao congelamento desse material que a superfície de Io possui sua coloração típica em tons de amarelo, branco, laranja e vermelho. 

Embora a atmosfera de Io seja extremamente rarefeita, cerca de um bilhão de vezes mais fina que a atmosfera da Terra, ela pode nos ensinar muitas coisas sobre a atividade vulcânica no astro, fornecendo uma janela para o que acontece por baixo de sua crosta colorida.

Pesquisas anteriores mostram que a atmosfera de Io é dominada pelo gás dióxido de enxofre, que é fornecido pela atividade vulcânica. Entretanto, não é conhecido qual é o processo que fomenta a dinâmica da atmosfera de Io. 

Será a atividade vulcânica? Ou será o gás congelado que passa pela sublimação quando Io recebe a luz do Sol? 

Para identificar qual é o processo responsável por criar a atmosfera de Io, uma equipe de astrônomos utilizou o ALMA para produzir imagens da lua quando ela eclipsou devido à sombra de Júpiter. Quando Io passa por dentro da sombra de Júpiter, e está fora da luz direta do Sol, fica frio demais para que o dióxido de enxofre se mantenha como gás, e ele se condensa sobre a superfície de Io. Durante esse período, observa-se apenas o dióxido que tem origem na atividade vulcânica, e é possível ver exatamente o quanto da atmosfera é impactada por ela. 

Graças a resolução extraordinária do ALMA e a sua elevada sensibilidade, os astrônomos puderam, pela primeira vez, ver claramente as plumas do dióxido de enxofre (SO2) e monóxido de enxofre (SO) surgindo dos vulcões. Baseando-se nas imagens, eles calcularam que as atividades vulcânicas produzem diretamente entre 30% a 50% da atmosfera de Io. As imagens do ALMA também revelaram um terceiro gás proveniente dos vulcões: o cloreto de potássio (KCl). 

Essa é uma evidência poderosa de que as reservas de magma são diferentes sob diferentes vulcões. Io possui atividades vulcânicas devido a um processo chamado aquecimento de maré. A orbita de Io ao redor de Júpiter não é muito circular, e também possui um lado que está permanente voltado para o planeta, tal como acontece com a nossa Lua. 

A força gravitacional de outras luas de Júpiter, Europa e Ganimedes, causa uma quantidade tremenda de atrito interno e aquecimento, dando origem aos vulcões como o Loki Patera, que possui mais de 200 quilômetros. 

O estudo a atmosfera de Io e sua atividade vulcânica, aprendemos mais não apenas sobre os vulcões em si, mas também sobre o processo de aquecimento por maré e o interior de Io.

Fonte: The Planetary Sciences Journal

O mistério de galáxia composta quase inteiramente por matéria escura

Até o momento, é difícil explicar o processo que leva à formação das galáxias sem evocar a presença de um componente onipresente mas misterioso: a chamada matéria escura.

© Gemini (Dragonfly 44 no centro)

Graças a muitas medições já feitas nas regiões ao redor de galáxias, os astrônomos estimam que a quantidade de matéria escura que uma certa galáxia possui seja de 10 até 30 vezes superior à quantidade de matéria visível. 

Porém, a descoberta de um objeto muito difuso, chamado Dragonfly 44, ocorrida alguns anos atrás, desafiou essa ideia. Constatou-se que, nessa galáxia, a quantidade estimada de matéria escura superava a massa formada por suas estrelas visíveis em 10 mil vezes.

Animados por esta descoberta, os astrônomos procuraram determinar se se tratava de um objeto realmente anômalo, ou se teria acontecido algo de errado durante a análise das observações. Agora temos a resposta. Uma equipe internacional liderada pelo Instituto Kapteyn, da Universidade de Groningen, na Holanda, e com participação do Instituto de Astrofísica de Canarias (IAC) e da Universidade de La Laguna, descobriu que o número total de aglomerados globulares ao redor da Dragonfly 44, e, portanto, o conteúdo de matéria escura, é muito menor do que sugeriram as descobertas iniciais. Isso mostra que a galáxia não é uma anomalia. 

A galáxia Dragonfly 44 foi descoberta durante uma grande pesquisa sobre o aglomerado Coma, que é composto por milhares de galáxias. Desde o início, a galáxia causou espanto junto aos pesquisadores. As estimativas atribuíam a ela uma quantidade de matéria escura quase equivalente à que existe na Via Láctea, na ordem dos bilhões de massas solares.

Porém, diferentemente da Via Láctea, que possui centenas de bilhões de estrelas ao seu redor, a DF44 é circundada por apenas centenas de milhares de estrelas, um número milhares de vezes menor. Isso implicava uma quantidade de matéria escura dez vezes maior do que a massa de suas estrelas. 

Se os cálculos estivessem corretos, isso tornaria a galáxia um objeto singular, com quase 100 vezes mais matéria escura do que o que seria de se esperar a partir do número de suas estrelas. Porém, uma análise exaustiva revelou que o total de aglomerados globulares que existem ao redor da Dragonfly 44 é de somente 20. 

Além disso, o total de matéria escura estimado nesse estudo equivale a apenas cerca de 300 vezes o total de matéria luminosa. “O fato de termos encontrado apenas 20 aglomerados globulares, em contraste com os 80 relatados anteriormente, reduz drasticamente as estimativas para a quantidade de matéria escura na galáxia,” diz Ignacio Trujillo, pesquisador do IAC.

Com esse número de aglomerados globulares, a quantidade de matéria escura que é estimada para a Dragonfly 44 está de acordo com o que é esperado para esse tipo de galáxia. A taxa entre matéria visível e matéria escura não é mais de 1 para 10 mil, mas 1 para 300. “Agora, sabemos que os resultados anteriores estavam errado e que a DF44 não é nada de extraordinário, pontua Teymoor Saifollahi, pesquisador no Instituto Kapteyn. 

“Entretanto, nós não temos uma explicação física para essa relação entre o número total de aglomerados globulares e a quantidade total de galáxias. Isso é um conhecimento puramente observacional. Pode haver alguma relação com a quantidade original do gás a partir do qual se formaram as estrelas, e os aglomerados globulares. Quanto mais matéria escura existe em uma galáxia, mais gás ela contém,” sugere Johan H. Knapen, pesquisador da IAC. 

Os resultados foram publicados recentemente no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Scientific American