Os restos de uma interação fatal entre uma estrela morta e um asteroide foram estudados pela primeira vez em detalhes por astrônomos que utilizou o Very Large Telescope (VLT) situado no Observatório do Paranal do ESO, no Chile.
© U. Warwick/Mark Garlick (ilustração do disco de material resplandescente em torno de anã branca)
Este estudo ajuda-nos a prever como será o futuro distante do Sistema Solar.
Uma equipe de pesquisadores liderada por Christopher Manser, um estudante de doutorado da Universidade de Warwick no Reino Unido, utilizou dados do VLT e outros observatórios para estudar os restos destruídos de um asteroide em torno de uma estrela morta, uma anã branca chamada SDSS J122859.93+104032.9, ou simplesmente SDSS J1228+1040.
Usando vários instrumentos, incluindo o Ultraviolet and Visual Echelle Spectrograph (UVES) e o X-shooter, ambos montados no VLT, a equipe obteve observações detalhadas da radiação emitida pela anã branca e pelo material que a rodeia durante um período de 12 anos, entre 2003 e 2015. Foram necessárias observações de longa duração para estudar o sistema sob vários aspectos. Foi identificada a assinatura espectral inconfundível em forma de tridente do cálcio ionizado, o chamado tripleto de cálcio (Ca II). A diferença entre os comprimentos de onda observados e os conhecidos destas três linhas permite determinar a velocidade do gás com elevada precisão.
“A imagem que criamos a partir dos dados processados mostra-nos que estes sistemas são claramente do tipo de discos e revela muitas estruturas que não poderiam ter sido detectadas com uma única observação,” explica o autor principal do trabalho Christopher Manser.
A equipe utilizou uma técnica chamada tomografia Doppler, semelhante à tomografia médica que é utilizada para observar o corpo humano, a qual permitiu mapear em detalhe, e pela primeira vez, a estrutura gasosa resplandescente que resta da "refeição" da anã branca e que a orbita.
Enquanto as estrelas grandes, mais massivas do que dez vezes a massa do Sol, sofrem no final das suas vidas um clímax espetacularmente violento sob a forma de explosão de supernova, as estrelas menores não têm um fim tão dramático. Quando as estrelas como o Sol chegam ao final das suas vidas, consomem todo o seu combustível, expandem-se nas chamadas gigantes vermelhas e mais tarde expelem as suas camadas exteriores para o espaço. Os seus núcleos quentes e muito densos, uma anã branca, é tudo o que resta do objeto.
Mas poderão os planetas, asteroides e outros corpos do sistema sobreviver a tal provação? O que restará? As novas observações ajudam a responder a estas questões.
É raro as anãs brancas terem em órbita discos de material gasoso, até hoje foram encontradas apenas sete nestas condições. A equipe concluiu que um asteroide se aproximou perigosamente da estrela morta, tendo sido desfeito pelas enormes forças de maré a que foi sujeito, formando por isso o disco de matéria que vemos agora.
© U. Warwick/C. Manser (movimento do material em torno da anã branca SDSS J1228+1040)
Este gráfico obtido através da tomografia Doppler é um tipo incomum de imagem que mostra as velocidades do gás no disco que orbita a anã branca SDSS J1228+1040. Os círculos tracejados correspondem a material em órbitas circulares a duas distâncias diferentes da estrela. O gráfico parece “virado ao contrário” porque a matéria desloca-se mais rapidamente em órbitas mais interiores.
O disco que orbita a estrela formou-se de maneira semelhante aos fotogênicos anéis que vemos em torno de planetas próximo de nós, como Saturno. No entanto, apesar da SDSS J1228+1040 ter um diâmetro sete vezes menor que o de Saturno, tem uma massa 2.500 vezes superior. A equipe descobriu que a distância entre a anã branca e o seu disco é também muito diferente; Saturno e os seus anéis caberiam confortavelmente no espaço entre eles. Embora o disco em torno desta anã branca seja muito maior que o sistema de anéis de Saturno, é ainda assim minúsculo quando comparado com os discos de detritos situados em torno de estrelas jovens onde se formam planetas. O novo estudo de longa duração efetuado com o VLT permitiu à equipe observar a precessão do disco sob a influência do forte campo gravitacional da anã branca. A equipe descobriu ainda que o disco está ligeiramente torto e não se tornou ainda circular.
“Quando descobrimos este disco de detritos em órbita da anã branca em 2006, não podíamos imaginar os detalhes extraordinários que vemos agora nesta imagem, criada a partir de 12 anos de dados, valeu definitivamente a pena esperar,” acrescentou Boris Gänsicke, co-autor do estudo.
Restos como a SDSS J1228+1040 dão-nos pistas importantes para compreender o meio que se forma quando as estrelas chegam ao fim das suas vidas. Este fato ajuda os astrônomos a perceber melhor os processos que ocorrem em sistemas exoplanetários e até a prever o destino do Sistema Solar quando o Sol chegar ao fim dos seus dias daqui a cerca de sete bilhões de anos.
Este trabalho foi descrito no artigo científico intitulado “Doppler-imaging of the planetary debris disc at the white dwarf SDSS J122859.93+104032.9”, de C. Manser et al., que será publicado na revista especializada Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.
Fonte: ESO
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