A primeira grande tentativa de replicar a evidência impactante da “alvorada cósmica” – o aparecimento das primeiras estrelas do Universo 180 milhões de anos após o Big Bang – deixou o cenário confuso.
© N. R. Fuller (ilustração de algumas das primeiras estrelas do Universo)
Quatro anos depois que radioastrônomos relataram ter encontrado um sinal da alvorada cósmica, o radioastrônomo Ravi Subrahmanyan e seus colaboradores descrevem como fizeram uma antena flutuar em um represa no rio Sharavati, no estado indiano de Karnataka, em busca desse sinal.
Os resultados originais causaram alvoroço nos círculos de cosmologia, pois eram os primeiros a afirmar que descobriram sinais da alvorada cósmica. A luz das estrelas mais antigas no Universo Observável teve que viajar quase 14 bilhões de anos para alcançar a Terra. Assim, até agora, ela é muito fraca para ser vista diretamente com telescópios comuns.
Mas radioastrônomos buscam por um efeito indireto usando o espectro de ondas de rádio. A luz ultravioleta das primeiras estrelas deve ter deixado o hidrogênio interestelar, normalmente transparente na maior parte do espectro eletromagnético, levemente opaco em um comprimento de onda de rádio específico. Em 2018, astrônomos relataram ter visto uma queda no espectro de rádio primordial, centrada numa frequência de cerca de 78 MHz. Em seguida, a equipe acreditou tratar-se de evidência da alvorada cósmica.
Os pesquisadores usaram um instrumento com o formato de uma mesa de centro no outback australiano, chamado Experiment to Detect the Global EoR Signature (EDGES). Mas o sinal do EDGES parecia ser bom demais para ser verdade. A queda no espectro era mais profunda e larga do que as teorias cosmológicas previam. Para explicar o tamanho deste sinal, físicos teóricos propuseram uma gama de mecânicas exóticas, como a presença de partículas elementares anteriormente desconhecidas, com cargas elétricas milhares de vezes menores que a de um elétron. Diversos outros pesquisadores mostraram-se preocupados, enfatizando a dificuldade de encontrar a assinatura de rádio da alvorada cósmica.
As ondas de rádio do Universo jovem são “afogadas” pela cacofonia de ruído produzida por fontes pela galáxia, que são milhares de vezes mais intensas. Para subtrair o espectro galáctico corretamente, pesquisadores têm de calcular com precisão a maneira como seu instrumento e o ambiente ao redor respondem a diversos comprimentos de onda de rádio, também conhecido como “sistemática” do experimento. Por exemplo, a equipe do EDGES modelou os efeitos causados pelo solo do deserto no Observatório de Radioastronomia de Murchison, no oeste da Austrália, e passou dois anos revisando os dados antes de publicá-los. Mas alguns cientistas ainda não estavam convencidos. Desde então, diversos experimentos competidores vêm tentando checar as descobertas do EDGES.
Em uma tentativa de escapar da confusão gerada pela interferência de frequências de rádio de atividades humanas, em particular de estações de rádio FM, as equipes montam antenas em algumas das regiões mais remotas da Terra. Subrahmanyan optou pela abordagem inovadora de ir sobre as águas de lagos na Índia para fazer flutuar seu instrumento, chamado Shaped Antenna Measurement of the Background Radio Spectrum (SARAS). A SARAS 3 tinha um formato cônico com o objetivo de facilitar o cálculo de sua resposta a ondas de rádio, e a água abaixo significa que a equipe não precisou lidar com a estrutura incerta ou com as propriedades de rádio do terreno. Subrahmanyan afirma que os resultados da SARAS 3 eliminam a detecção de sinais da alvorada cósmica do EDGES.
Mas o astrônomo Judd Bowman, da Universidade do Estado do Arizona, não está convencido que a SARAS 3 eliminou os resultados de sua equipe. “Esses são instrumentos desafiadores e muitos dos problemas sistemáticos que podem afetar o EDGES também podem ocorrer para a SARAS 3”, afirma Bowman.
Subrahmanyan está começando um novo experimento no CSIRO, e seu antigo colaborador em Raman, o cosmólogo experimental Saurabh Singh, irá continuar os testes em uma nova antena SARAS. Singh também está participando de uma proposta na Indian Space Research Organisation para uma espaçonave que poderia escapar da interferência na frequência de rádio da Terra ao conduzir medições no lado distante da Lua. Qualquer que seja o destino das observações do EDGES, Singh afirma que a equipe por trás delas merece crédito por reaver o interesse na alvorada cósmica.
Um artigo foi publicado na revista Nature.
Fonte: Scientific American
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