sexta-feira, 1 de setembro de 2023

Discos de acreção: quão grandes são, realmente?

Recorrendo ao telescópio Gemini North, os astrônomos detectaram pela primeira vez evidências da presença de um disco de acreção no núcleo galáctico ativo da galáxia III Zw 002.


© NOIRLab / P. Marenfeld (buraco negro e seu disco de acreção)

Utilizando duas linhas de emissão raras e peculiares no infravermelho próximo, estas observações colocam limites firmes na dimensão do disco de acreção da galáxia e evidencia sua geometria e comportamento. 

As linhas de emissão resultam quando um átomo num estado excitado cai para um nível de energia mais baixo, liberando luz no processo. Uma vez que cada átomo tem um conjunto único de níveis de energia, a luz emitida tem um comprimento de onda discreto que atua como uma impressão digital que identifica a sua origem. As linhas de emissão aparecem normalmente nos espetros como picos finos e nítidos. Mas no vórtice rodopiante de um disco de acreção, onde o gás excitado está sob a influência gravitacional do buraco negro supermassivo e se move a velocidades de milhares de quilômetros por segundo, as linhas de emissão alargam-se em picos mais rasos. A região do disco de acreção onde estas linhas têm origem é designada por região de linhas largas.

À primeira vista, estas estruturas sublimes podem parecer bastante serenas. Mas, na verdade, o centro de muitas galáxias é um ambiente turbulento que contém um buraco negro supermassivo que se alimenta ativamente. Orbitando estes objetos incompreensivelmente densos estão discos de acreção rodopiantes de gás e poeira, que alimentam o buraco negro e emitem quantidades imensas de energia ao longo de todo o espetro eletromagnético, desde raios gama e raios X altamente energéticos, passando pela luz visível, até às ondas infravermelhas e de rádio. 

O estudo dos discos de acreção pode melhorar a compreensão sobre os buracos negros e a evolução das galáxias que os hospedam. A maior parte dos discos de acreção, no entanto, são impossíveis de observar diretamente devido às suas distâncias extremas e tamanhos relativamente pequenos. É extremamente difícil obter imagens diretas dos discos de acreção, tendo apenas sido obtidas imagens de duas fontes graças à capacidade de alta resolução angular do EHT (Event Horizon Telescope). 

Assim, se não houver acesso a uma rede global de radiotelescópios, como é que os astrônomos sabem quando um buraco negro supermassivo tem um disco à sua volta? Acontece que a evidência de um disco de acreção pode ser encontrada num padrão específico de linhas de emissão largas chamado perfil de pico duplo. Dado que o disco está girando, o gás de um lado está se afastando do observador, enquanto o gás do outro lado está se movendo na direção do observador. Estes movimentos relativos esticam e comprimem as linhas de emissão para comprimentos de onda mais longos e mais curtos, respectivamente. O resultado é uma linha alargada com dois picos distintos, cada um originário de cada lado do disco em rápida rotação. Estes perfis de pico duplo são um fenômeno raro, uma vez que a sua ocorrência está limitada a fontes que podem ser observadas quase de face. Nas poucas fontes em que foi observado, o pico duplo foi encontrado nas linhas H-alfa e H-beta, duas linhas de emissão de átomos de hidrogênio que aparecem em comprimentos de onda do visível. Com origem na zona interior da região de linhas largas perto do buraco negro supermassivo, estas linhas não fornecem qualquer evidência sobre a dimensão do disco de acreção na sua totalidade. Mas observações recentes no infravermelho próximo revelaram uma zona da região exterior de linhas largas que nunca tinha sido vista antes. 

A linha Paschen-alfa (hidrogênio) tem origem na zona interior da região de linhas largas e a linha O I (oxigénio neutro) tem origem na periferia da região de linhas largas, uma região que nunca tinha sido observada antes. Estes são os primeiros perfis de duplo pico a serem encontrados no infravermelho próximo e surgiram inesperadamente durante as observações com o GNIRS (Gemini Near-Infrared Spectrograph), que é capaz de observar todo o espetro do infravermelho próximo (800-2500 nanómetros) de uma só vez.

Comparando estas observações com os modelos existentes de disco, a equipe conseguiu extrair parâmetros que fornecem uma imagem mais clara do buraco negro supermassivo de III Zw 002 e da região de linhas largas. O modelo indica que a linha Paschen-alfa tem origem num raio de 16,77 dias-luz, e a linha O I tem origem num raio de 18,86 dias-luz. Também prevê que o raio exterior da região de linhas largas é de 52,43 dias-luz. O modelo também indica que a região de linhas largas de III Zw 002 tem um ângulo de inclinação de 18 graus em relação aos observadores na Terra e que o buraco negro supermassivo no seu centro tem 400 a 900 milhões de vezes a massa do nosso Sol.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters

Fonte: National Optical-Infrared Astronomy Research Laboratory

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