Os maiores buracos negros do Universo são muitas vezes rodeados por discos espessos de gás e poeira com a forma de um toróide.
© NASA/JPL-Caltech (M77)
A galáxia M77 (ou NGC 1068) pode ser vista nesta ampliação obtida pelo telescópio espacial Hubble. Os olhos em raios X do NuSTAR foram capazes de obter a melhor visão, até agora, do covil escondido do buraco negro supermassivo e central da galáxia. Este buraco negro ativo, visto na ilustração em destaque, é um dos mais obscurecidos que se conhecem, o que significa que é rodeado por nuvens extremamente espessas de gás e poeira.
Este material com formato de rosquinha, em última análise, alimenta e nutre os buracos negros no interior.
Até recentemente, os telescópios não eram capazes de penetrar nestas zonas em forma de rosca.
"Originalmente, pensávamos que alguns buracos negros estavam escondidos por paredes de material que não deixavam ver o que estava por trás," afirma Andrea Marinucci da Universidade Roma Tre na Itália, autora principal de um novo estudo que descreve resultados do NuSTAR (Nuclear Spectroscopic Telescope Array) e do observatório espacial XMM-Newton, ambos da NASA.
Com a sua visão de raios X, o NuSTAR espiou recentemente um dos toróides mais densos que se sabe rodear um buraco negro supermassivo. Este buraco negro está no centro da galáxia bem estudada M77, localizada a 47 milhões de anos-luz de distância na direção da constelação da Baleia.
"O material em rotação não é um toróide simples e arredondado como originalmente se pensava, mas tem aglomerados," explica Marinucci.
Os discos de gás e poeira, em forma toroidal e em torno de buracos negros supermassivos, foram propostos pela primeira vez em meados da década de 1980 para explicar porque é que alguns buracos negros estão escondidos atrás de gás e poeira, enquanto outros não estão. A ideia é que a orientação do toróide, relativamente à Terra, afeta o modo como observamos o buraco negro e a sua intensa radiação. Se o toróide é visto de lado, o buraco negro é ocultado. Se é visto de face, conseguimos detectar o buraco negro e os seus materiais quentes nos arredores. Esta ideia é referida como o modelo unificado porque junta os vários diferentes tipos de buraco negro com base apenas na orientação.
Ao longo da última década, os astrônomos têm encontrado indícios de que estes discos de material possuem grânulos e não têm uma forma tão harmoniosa como se pensava.
© NASA/JPL-Caltech/Universidade Roma Tre (M77 no visível e em raios X)
A galáxia M77 é vista na imagem composta acima no visível e em raios X. Os raios X altamente energéticos (magenta) capturados pelo NuSTAR, estão sobrepostos em imagens ópticas captadas pelo telescópio espacial Hubble e pelo SDSS (Sloan Digital Sky Survey). Os raios X vêm de um buraco negro supermassivo e ativo, também conhecido como quasar, no centro da galáxia. Este buraco negro supermassivo tem sido estudado extensamente devido à sua relativa proximidade com a Via Láctea.
A nova descoberta é a primeira vez que foram observadas irregularidades num disco ultra espesso e suporta a ideia que este fenômeno pode ser comum. A pesquisa é importante para a compreensão do crescimento e evolução dos buracos negros supermassivos e das suas galáxias hospedeiras.
"Nós não entendemos totalmente o porquê de alguns buracos negros supermassivos serem tão fortemente obscurecidos, ou porque é que o material em volta tem tantas irregularidades," afirma Poshak Gandhi da Universidade de Southampton no Reino Unido.
Tanto o NuSTAR como o XMM-Newton observaram o buraco negro de M77 simultaneamente em duas ocasiões entre 2014 e 2015. Numa dessas ocasiões, em agosto de 2014, o NuSTAR observou um aumento de brilho. O NuSTAR observa raios X numa gama mais energética do que o XMM-Newton, e esses raios X altamente energéticos podem penetrar as espessas nuvens ao redor do buraco negro. O aumento de raios X de alta energia foi devido a uma espécie de abertura que diminuiu a espessura do material que sepulta o buraco negro supermassivo.
"É como um dia nublado, quando as nuvens parcialmente saem da frente do Sol para deixar entrar mais luz," comenta Marinucci.
A galáxia M77 é bem conhecida pelos astrônomos pois o seu buraco negro foi o primeiro a sugerir a ideia da unificação. "Mas é somente com o NuSTAR que agora temos um vislumbre direto do buraco negro supermassivo através dessas nuvens, ainda que fugaz, permitindo um melhor teste do conceito de unificação," afirma Marinucci.
A equipe diz que a pesquisa futura irá abordar a questão do que produz a desigualdade nos discos em forma de rosquinha. A resposta pode vir em muitos sabores. É possível que um buraco negro gere turbulência à medida que "mastiga" material das redondezas. Ou, a energia emitida por estrelas jovens pode ser a responsável pela turbulência que, em seguida, pode "infiltrar-se" através do bolo cósmico. Outra possibilidade é que os aglomerados podem vir de material em queda para o toróide. À medida que as galáxias se formam, o material migra para o centro, onde a densidade e a gravidade são maiores. O material tende a cair em aglomerados, quase como uma corrente de água que se forma a partir de várias gotas quando atingem o solo.
"Estas observações coordenadas com o NuSTAR e com o XMM-Newton mostram mais uma vez a emocionante ciência possível quando estes satélites trabalham em conjunto," comenta Daniel Stern, cientista do projeto NuSTAR no JPL (Jet Propulsion Laboratory) da NASA em Pasadena, no estado americano da Califórnia.
O novo estudo foi publicado na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.
Fonte: NASA