De acordo com novos resultados da sonda MAVEN (Mars Atmosphere and Volatile Evolution Mission) da NASA, o vento e a radiação solares são os responsáveis pela remoção da atmosfera marciana, transformando Marte de um planeta que poderia ter suportado vida há bilhões de anos atrás, num mundo frio e desértico.
© Goddard Space Flight Center (atmosfera atual e do passado de Marte)
"Nós determinamos que a maioria do gás presente na atmosfera de Marte foi perdido para o espaço," realça Bruce Jakosky, pesquisador principal da MAVEN, da Universidade do Colorado em Boulder, EUA. A equipe fez esta determinação a partir dos últimos resultados, que revelam que aproximadamente 65% do argônio que já esteve presente na atmosfera foi perdido para o espaço.
Em 2015, os membros da equipe da MAVEN anunciaram resultados que mostravam uma perda atmosférica atual e descreveram como é que esta atmosfera é removida. A análise presente usa medições da atmosfera de hoje para a primeira estimativa de quanto gás foi perdido ao longo do tempo.
A água líquida, essencial para a vida, não é hoje estável à superfície de Marte porque a sua atmosfera é demasiado fria e fina para a suportar. No entanto, evidências como características que se assemelham com leitos de rio e minerais que só se formam na presença de água líquida, indicam que o antigo clima marciano era muito diferente, quente o suficiente para a água correr à superfície durante longos períodos de tempo.
"Esta descoberta é um importante passo em frente para desvendar o mistério dos ambientes passados de Marte," salienta Elsayed Talaat, cientista do Programa MAVEN, na sede da NASA em Washington. "Num contexto mais amplo, esta informação ensina-nos mais sobre os processos que podem, ao longo do tempo, mudar a habitabilidade de um planeta."
Existem muitas maneiras de um planeta perder parte da sua atmosfera. Por exemplo, reações químicas podem prender o gás nas rochas à superfície, ou uma atmosfera pode ser corroída por radiação e vento da estrela que hospeda o planeta. Os novos resultados revelam que a radiação solar e o vento solar são os responsáveis pela maior parte da perda atmosférica de Marte e que o esgotamento foi suficiente para transformar o clima marciano. O vento solar é um fluxo fino de gás, eletricamente condutor, soprado constantemente a partir da superfície do Sol.
O Sol primitivo tinha uma radiação ultravioleta e um vento solar muito mais intensos, de modo que a perda atmosférica devido a estes processos foi provavelmente muito maior no passado de Marte. Segundo a equipe, estes processos podem ter sido os que controlaram o clima e habitabilidade do planeta. É possível que a vida microbiana possa ter existido à superfície no início da história de Marte. À medida que o planeta arrefecia e secava, qualquer forma de vida pode ter sido empurrada para locais subterrâneos ou para raros oásis à superfície.
Jakosky e a sua equipe obtiveram os novos resultados através da medição da abundância atmosférica de dois isótopos diferentes do gás argônio. Os isótopos são átomos do mesmo elemento, mas com massas diferentes. Uma vez que o mais leve dos dois isótopos escapa para o espaço com mais facilidade, deixa o gás remanescente enriquecido com o isótopo mais pesado. A abundância relativa dos dois isótopos, medida na atmosfera superior e à superfície, possibilitou estimar a fração do gás atmosférico perdido para o espaço.
Dado que um "gás nobre" não pode reagir quimicamente, não pode ser arrastado para as rochas; o único processo que pode remover gases nobres para o espaço é um processo físico chamado pulverização catódica pelo vento solar. Neste processo, os íons capturados pelo vento solar podem impactar Marte a altas velocidades e empurrar, fisicamente, o gás atmosférico para o espaço. A equipe rastreou o argônio porque só pode ser removido por pulverização catódica. Assim que os cientistas determinaram a quantidade de argônio perdida por pulverização, puderam usar esta informação para determinar a perda por pulverização catódica de outros átomos e moléculas, incluindo o dióxido de carbono (CO2).
O CO2 é de interesse porque é o principal constituinte da atmosfera de Marte e porque é um eficiente gás de efeito estufa que pode reter calor e aquecer o planeta. "Nós determinamos que a maioria do CO2 do planeta foi também perdido para o espaço por pulverização catódica," comenta Jakosky. "Existem outros processos que podem remover o CO2, de modo que este processo nos dá o valor mínimo de CO2 que foi perdido para o espaço."
A equipe fez a sua estimativa usando dados da atmosfera superior de Marte, recolhidos pelo instrumento NGIMS (Neutral Gas and Ion Mass Spectrometer) da MAVEN. Esta análise incluiu medições da superfície marciana obtidas pelo instrumento SAM (Sample Analysis at Mars) a bordo do rover Curiosity.
"As medições combinadas permitem uma melhor determinação de quanto argônio marciano foi perdido para o espaço ao longo de bilhões de anos," comenta Paul Mahaffy do Goddard Space Flight Center da NASA. "A utilização de medições de ambas as plataformas aponta para o valor que múltiplas missões têm em fazer medições complementares". Mahaffy, pesquisador principal do SAM e líder do instrumento NGIMS, ambos desenvolvidos no Goddard Space Flight Center.
Um artigo descrevendo os resultados foi publicado na revista Science.
Fonte: University of Arizona