terça-feira, 10 de março de 2020

ALMA avista estrela idosa e metamorfósica

Usando o ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array), uma equipe internacional de astrônomos captou o momento exato em que uma estrela antiga começa a alterar o seu ambiente.


© ESO/ALMA (sistema W43A)

A imagem acima mostra o velho sistema W43A. A alta velocidade dos jatos bipolares ejetados da estrela antiga central podem ser vistos em azul, os fluxos de baixa velocidade têm cor verde e as nuvens poeirentas incorporadas pelos jatos estão a laranja.

A estrela ejetou jatos velozes e bipolares de gás que estão agora colidindo com o material circundante; a idade estimada do jato observado corresponde a menos de 60 anos. Estas são características fundamentais para entender como são produzidas as formas complexas das nebulosas planetárias.

As estrelas parecidas com o Sol evoluem para gigantes vermelhas e inchadas na fase final das suas vidas. Aí, a estrela expele gás para formar um remanescente chamado nebulosa planetária. Existe uma grande variedade nas formas das nebulosas planetárias; algumas são esféricas, mas outras são bipolares ou apresentam estruturas complicadas. Os astrônomos estão interessados nas origens desta variedade, mas a poeira e o gás espesso expelidos por uma estrela velha obscura o sistema e dificultam a análise do funcionamento interno do processo.

Para resolver este problema, uma equipe de astrônomos liderada por Daniel Tafoya da Universidade de Tecnologia de Chalmers, Suécia, apontou o ALMA para W43A, um antigo sistema estelar na direção da constelação de Águia.

Graças à alta resolução do ALMA, foi obtida uma visão muito detalhada do espaço em torno de W43A. A equipe descobriu que a velocidade dos jatos é tão alta quanto 175 km/s, o que é muito maior do que as estimativas anteriores. Com base nesta velocidade e no tamanho dos jatos, foi calculada a idade dos jatos como sendo inferior ao tempo de vida do ser humano.

"Considerando a juventude dos jatos em comparação com a vida útil de uma estrela, é seguro dizer que estamos testemunhando o 'momento exato' em que os jatos começaram a empurrar o gás circundante," explica Tafoya.

Realmente, a imagem do ALMA mapeia claramente a distribuição de nuvens empoeiradas incorporadas pelos jatos, o que é uma evidência reveladora de que está impactando o ambiente.

A equipe assume que esta incorporação é a chave para produzir uma nebulosa planetária de forma bipolar. No seu cenário, a estrela idosa originalmente ejeta gás esfericamente e o núcleo da estrela perde o seu invólucro. Se a estrela tiver uma companheira, o seu gás é "derramado" para o núcleo da estrela moribunda e uma porção deste novo gás forma os jatos. Portanto, ter ou não uma companheira é um fator importante para determinar a estrutura da nebulosa planetária resultante.

Algumas estrelas antigas mostram emissões de rádio características das moléculas de água. Supõe-se que manchas destas emissões de água indicam a região da interface entre os jatos e o material circundante. Isto é denominado "fontes de água" e pode ser um sinal de que a fonte central é um sistema binário que lança um novo jato.

Existem apenas 15 objetos 'fonte de água' identificados até ao momento, apesar de existirem mais de 100 bilhões de estrelas na nossa Via Láctea. Isto porque provavelmente a vida útil dos jatos é bastante curta, de modo que temos muita sorte em observar objetos tão raros.

O estudo foi publicado na revista The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: National Radio Astronomy Observatory

domingo, 8 de março de 2020

Um "Jekyll e Hyde" cósmico

De acordo com observações do Observatório de raios X Chandra da NASA e do VLA (Karl F. Jansky Very Large Array) da NSF (National Science Foundation), um sistema estelar binário tem vindo a alternar entre dois alter-egos.


© Hubble (Terzan 5)

Usando quase uma década e meia de dados do Chandra, os pesquisadores notaram que um par estelar se comporta como um tipo de objeto antes de mudar a sua identidade e depois regressa ao seu estado original ao fim de alguns anos. Este é um exemplo raro de um sistema estelar que altera o seu comportamento desta maneira.

Os astrônomos encontraram esta volátil estrela dupla, ou sistema binário, numa densa coleção de estrelas, o aglomerado globular Terzan 5, localizado a mais ou menos 20.000 anos-luz da Terra, na Via Láctea. Esta dupla estelar, conhecida como Terzan 5 CX1, tem uma estrela de nêutrons (o remanescente extremamente denso deixado para trás por uma explosão de supernova) em órbita íntima com uma estrela semelhante ao Sol, mas com menos massa.

Em sistemas binários como Terzan 5 CX1, a estrela de nêutrons mais pesada puxa o material da companheira de massa inferior para um disco circundante. Os astrônomos podem detetar estes denominados discos de acreção graças à sua brilhante radiação em raios X e referem-se a estes objetos como "binários de raios X de baixa massa."

O material giratório no disco cai sobre a superfície da estrela de nêutrons, acelerando a sua rotação. A estrela de nêutrons pode girar cada vez mais depressa até que a esfera com aproximadamente 16 km de diâmetro, com mais massa do que o Sol, gira centenas de vezes por segundo. Eventualmente, a transferência de matéria diminui e o material restante é varrido pelo campo magnético giratório da estrela de nêutrons, que se torna num pulsar de milissegundo. Os astrônomos detectam pulsos de ondas de rádio destes pulsares de milissegundo enquanto o feixe de ondas de rádio da estrela de nêutrons aponta para a Terra durante cada rotação.



© Chandra (Terzan 5 em raios X)

Embora os cientistas esperem que a evolução completa de um binário de raios X de baixa massa para um pulsar de milissegundo ocorra ao longo de vários bilhões de anos, existe um período de tempo em que o sistema pode alternar rapidamente entre estes dois estados. As observações de Terzan 5 CX1 pelo Chandra mostram que estava agindo como um binário de raios X de baixa massa em 2003, porque era mais brilhante em raios X do que qualquer uma das dezenas de outras fontes no aglomerado globular. Isto era um sinal de que a estrela de nêutrons provavelmente estava acumulando matéria.

Nos dados do Chandra obtidos de 2009 a 2014, Terzan 5 CX1 havia se tornado cerca de dez vezes mais fraco em raios X. Os astrônomos também o detectaram como uma fonte de rádio com o VLA em 2012 e 2014. A quantidade de emissão de rádio e raios X e os espectros correspondentes (a quantidade de emissão em diferentes comprimentos de onda) concordam com as expectativas de um pulsar de milissegundo. Embora os dados rádio usados não permitam uma busca por pulsos de milissegundo, estes resultados implicam que Terzan 5 CX1 passou por uma transformação, passando a comportar-se como um pulsar de milissegundo e que estava ejetando material. Quando o Chandra observou Terzan 5 CX1 novamente em 2016, tornou-se mais brilhante em raios X e voltou a agir novamente como um binário de raios X de baixa massa.

Para confirmar este padrão de comportamento "Jekyll e Hyde", os astrônomos precisam de detectar pulsos de rádio enquanto Terzan 5 CX1 é fraco em termos de raios X. Estão planejadas mais observações no rádio e em raios X para procurar este comportamento, além de pesquisas sensíveis de pulsos nos dados existentes. Apenas se conhecem três exemplos confirmados destes sistemas que mudam de identidade, o primeiro descoberto em 2013 usando o Chandra e vários outros telescópios de raios X e rádio.

O estudo do binário "Jekyll e Hyde" foi liderado por Arash Bahramian do ICRAR (International Center for Radio Astronomy Research), Austrália, e publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Dois outros estudos recentes usaram observações de Terzan 5 pelo Chandra para estudar como as estrelas de nêutrons de dois diferentes binários de raios X de baixa massa se recuperam depois de terem recebido grandes quantidades de material despejado na superfície por uma estrela companheira. Tais estudos são importantes para entender a estrutura da camada externa de uma estrela de nêutrons, conhecida como crosta.

Num destes estudos, o do binário de raios X de baixa massa Swift J174805.3–244637 (T5 X-3 para abreviar), o material despejado na estrela de nêutrons durante uma explosão de raios X detectada em 2012 pelo Chandra aqueceu a crosta da estrela. A crosta da estrela de nêutrons então arrefeceu, levando cerca de cem dias para voltar à temperatura observada antes da explosão. O ritmo de arrefecimento está de acordo com um modelo de computador deste processo.

Num estudo separado de outro binário de raios X de baixa massa em Terzan 5, IGR J17480–2446 (T5 X-2 para abreviar), a estrela de nêutrons ainda estava arrefecendo quando a sua temperatura foi registada cinco anos e meio depois de ter ocorrido um surto. Estes resultados mostram que a capacidade da crosta desta estrela de nêutrons em transferir ou conduzir calor pode ser menor do que a que os astrônomos encontraram em outras estrelas de nêutrons arrefecendo ou em binários de raios X de baixa massa. Esta diferença na capacidade de conduzir calor pode estar relacionada com o fato de T5 X-2 ter um campo magnético maior em comparação com outras estrelas de nêutrons em arrefecimento, ou ser muito mais jovem do que T5 X-3.

O trabalho sobre a estrela de nêutrons de arrefecimento rápido e lento foram publicados na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

O estudo do binário foi publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics

Descoberta explosão recorde por buraco negro

Foi encontrada a maior explosão já vista no Universo. Esta gigantesca erupção recorde veio de um buraco negro num distante aglomerado de galáxias a centenas de milhões de anos-luz de distância.


© Chandra/XMM-Newton/MWA/GMRT (erupção desencadeada por um buraco negro)

"De certa forma, esta explosão é semelhante ao modo como a erupção do Monte Santa Helena em 1980 destruiu o topo da montanha," disse Simona Giacintucci do Naval Research Laboratory em Washington, EUA, autora principal do estudo. "Uma diferença fundamental é que podíamos colocar quinze Vias Lácteas seguidas na cratera criada pela erupção que perfurou o gás quente do aglomerado."

Os astrônomos fizeram esta descoberta usando dados de raios X do Observatório Chandra da NASA, do XMM-Newton da ESA, e dados rádio do MWA (Murchison Widefield Array) na Austrália e do GMRT (Giant Metrewave Radio Telescope) na Índia.

A incomparável explosão foi detectada no aglomerado de galáxias de Ofiúco, que fica a cerca de 390 milhões de anos-luz da Terra. Os aglomerados de galáxias são as maiores estruturas do Universo mantidas juntas pela gravidade, contendo milhares de galáxias individuais, matéria escura e gás quente.

No centro do aglomerado de galáxias de Ofiúco, existe uma grande galáxia que contém um buraco negro supermassivo. Os cientistas pensam que a fonte da erupção gigantesca é este buraco negro.

Embora os buracos negros sejam famosos por puxar material na sua direção, normalmente expelem quantidades prodigiosas de material e energia. Isto ocorre quando a matéria que cai em direção ao buraco negro é redirecionada para jatos, ou feixes, expelidos para o espaço e que chocam com qualquer material circundante.

As observações do Chandra relatadas em 2016 revelaram pela primeira vez pistas da explosão gigante no aglomerado de galáxias de Ofiúco. Norbert Werner e colegas divulgaram a descoberta de uma incomum borda curva na imagem do aglomerado pelo Chandra. Consideraram se isso representava parte da parede de uma cavidade no gás quente criado pelos jatos do buraco negro supermassivo. No entanto, descartaram esta possibilidade, em parte porque seria necessária uma quantidade enorme de energia para o buraco negro criar uma cavidade tão grande.

O estudo mais recente por Giacintucci e colegas mostra que ocorreu uma enorme explosão. Primeiro, mostraram que a aresta curva também é detectada pelo XMM-Newton, confirmando a observação do Chandra. O seu avanço crucial foi a utilização de novos dados de rádio do MWA e do arquivo do GMRT para mostrar que a orla curva faz realmente parte da parede de uma cavidade, porque faz fronteira com uma região cheia de emissão de rádio. Esta emissão é de elétrons acelerados até quase à velocidade da luz. A aceleração provavelmente teve origem no buraco negro supermassivo.

A quantidade de energia necessária para criar a cavidade em Ofiúco é cerca de cinco vezes maior que o recordista anterior, MS 0735+74, e centenas de milhares de vezes maior que os aglomerados típicos.

A erupção do buraco negro deve ter terminado porque os cientistas não vêm nenhuma evidência de jatos atuais nos dados de rádio. Este desligar pode ser explicado pelos dados do Chandra, que mostram que o gás mais denso e mais frio visto em raios X está atualmente localizado numa posição diferente da galáxia central. Se este gás se tiver afastado da galáxia, terá privado o buraco negro de combustível para o seu crescimento, desligando os jatos.

Este deslocamento de gás é provavelmente provocado pela agitação do gás em torno do meio do aglomerado, como vinho num copo. Normalmente, a fusão de dois aglomerado de galáxias desencadeia tal agitação, mas aqui pode ter sido deflagrada pela erupção.

Um enigma é que apenas é vista uma região gigante de emissão de rádio, pois estes sistemas geralmente contêm duas em lados opostos do buraco negro. É possível que o gás do outro lado da cavidade do aglomerado seja menos denso, de modo que as emissões de rádio desvaneceram mais rapidamente.

O artigo que descreve estes resultados foi publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics

quinta-feira, 5 de março de 2020

O impacto das constelações de satélites nas observações astronômicas

Astrônomos recentemente levantaram preocupações sobre o impacto das mega-constelações de satélites na pesquisa científica. 


© ESO (áreas do céu mais afetadas pelas constelações de satélites)

Para entender melhor o efeito que estes satélites podem ter sobre as observações astronômicas, o ESO encomendou um estudo científico sobre o seu impacto, focado nas observações obtidas com os telescópios do ESO que operam no visível e no infravermelho, mas que também leva em conta outros observatórios. O estudo considera um total de 18 constelações representativas de satélites, em desenvolvimento pela SpaceX, Amazon, OneWeb, entre outras, num total de 26 mil de satélites.

O estudo mostra que os grandes telescópios, como o Very Large Telescope (VLT) do ESO e o futuro Extremely Large Telescope (ELT) também do ESO serão “moderadamente afetados” por estas constelações de satélites em desenvolvimento. O efeito é mais pronunciado no caso de longas exposições (de cerca de 1.000 segundos), sendo que podem ser afetadas até 3% destas exposições obtidas durante o crepúsculo (tanto durante a madrugada como ao cair da noite). As exposições mais curtas serão menos afetadas, com menos de 0,5% das observações deste tipo. Observações realizadas em outros horários durante a noite também seriam menos afetadas, pois os satélites ficariam na sombra da Terra e, portanto, não seriam iluminados. Dependendo do caso científico, os impactos podem ser reduzidos com alterações nos horários de operação dos telescópios do ESO, embora estas alterações tenham um custo. Do lado da indústria, um passo importante e eficaz para atenuar estes impactos passaria por escurecer os satélites.

O estudo também mostrou que o maior impacto seria em pesquisas de campo amplo, em particular aquelas realizadas com grandes telescópios. Por exemplo, até 30% a 50% das exposições do Observatório Vera C. Rubin, que não é uma infraestrutura do ESO, mas sim da Fundação Nacional de Ciência do EUA, seria “severamente afetada”, dependendo da época do ano, da noite e das condições simplificados deste estudo. Técnicas de mitigação que poderiam ser aplicadas aos telescópios do ESO não funcionariam para este observatório, embora outras estratégias estejam sendo ativamente exploradas. São necessários estudos adicionais para compreender completamente as implicações científicas desta perda de dados observacionais e de complexidade na sua análise. 

Telescópios de rastreio de campo amplo como o Observatório Rubin podem mapear rapidamente grandes áreas do céu, tornando-os indispensáveis para descobrir fenômenos de curta duração como supernovas e asteroides potencialmente perigosos. Devido à sua capacidade única para gerar enormes quantidades de dados e descobrir alvos de observação para muitos outros observatórios, as comunidades astronômicas e agências de financiamento da Europa e em outros lugares classificaram os telescópios de rastreio de campo amplo como uma prioridade para desenvolvimentos futuros na astronomia.

Astrônomos profissionais e amadores também levantaram preocupações sobre como as mega-constelações de satélites poderiam ter um impacto nas condições límpidas do céu noturno. O estudo mostra que cerca de 1.600 satélites destas constelações se encontrarão acima do horizonte de um observatório situado a meia latitude, a maioria dos quais estará baixo no céu, em um intervalo de 30º acima do horizonte. Acima deste valor, na parte do céu onde é feita a maioria das observações astronômicas, haverá sempre cerca de 250 satélites independentemente da hora. Apesar de estarem todos iluminados ao nascer e ao pôr do Sol, os satélites começam a entrar na sombra da Terra à medida que a noite avança. O estudo do ESO pressupõe um determinado brilho para todos estes satélites. Com esta pressuposição, até cerca de 100 satélites poderão ser suficientemente brilhantes para se verem a olho nu durante as horas do crepúsculo, com cerca de 10 acima dos 30º de elevação. Todos este números diminuem quando a noite avança, tornando-se mais escura, e os satélites passam para a sombra da Terra. No geral, estas novas constelações de satélites irão duplicar o número de satélites visíveis a olho nu no céu noturno acima dos 30º de elevação. 

Estima-se que cerca de 34.000 objetos com dimensões maiores que 10 cm se encontrem atualmente em órbita terrestre. Destes, cerca de 5.500 são satélites, incluindo 2.300 em funcionamento. O restante é lixo espacial, incluindo partes superiores de foguetes e adaptadores de lançadores de satélites. Cerca de 2.000 destes objetos estão sempre acima do horizonte, independentemente de tempo e local. Durante as horas do crepúsculo, cerca de 5 a 10 deles se encontram iluminados pelo Sol e suficientemente brilhantes para serem vistos a olho nu. 

Estes números não incluem os trens de satélites visíveis logo após o seu lançamento. Apesar de brilhantes e bastante espetaculares, estes rastros são de curta duração e visíveis apenas depois do pôr ou antes do nascer do Sol e, em qualquer momento, apenas a partir de uma área muito limitada da superfície terrestre. O estudo do ESO usa simplificações e suposições para obter estimativas conservadoras dos efeitos, os quais podem ser na realidade menores do que o calculado. Modelos mais sofisticados serão necessários para quantificar mais precisamente os impactos atuais. Apesar do estudo focar nos telescópios do ESO, estes resultados se aplicam igualmente a telescópios semelhantes que, não sendo do ESO, operam também no visível e infravermelho, com instrumentos e casos científicos semelhantes. 

As constelações de satélites terão também impacto nos observatórios que operam no rádio, no milimétrico e no submilimétrico, incluindo o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) e o Atacama Pathfinder Experiment (APEX). Este impacto será considerado em estudos futuros. 

O ESO, juntamente com outros observatórios, a União Astronômica Internacional (IAU), a Sociedade Astronômica Americana (ASS), a Sociedade Astronômica Real do Reino Unido (RAS) e outras sociedades, está tomando medidas para sensibilizar o público sobre este assunto em fóruns globais tais como o Comitê das Nações Unidas para o Uso Pacífico do Espaço Sideral (COPUOS) e o Comitê Europeu de Frequências Rádio em Astronomia (CRAF). Ao mesmo tempo, e em conjunto com as companhias ligadas ao espaço, estão sendo exploradas soluções práticas que possam salvaguardar os investimentos em larga escala feitos em infraestruturas de astronomia terrestre de última geração. O ESO apoia o desenvolvimento de estruturas regulatórias que garantirão a coexistência harmoniosa de avanços tecnológicos altamente promissores em baixa órbita terrestre com as condições que permitem à humanidade continuar sua observação e compreensão do Universo. 

O estudo foi aceito para publicação no periódico Astronomy & Astrophysics

Fonte: ESO

domingo, 1 de março de 2020

Revelada proeminência gigante de estrela minúscula

Uma estrela com cerca de oito por cento da massa do Sol foi apanhada emitindo uma enorme "super-proeminência" de raios X, uma dramática erupção altamente energética que representa um problema fundamental para os astrônomos, que não consideravam ser possível em estrelas tão pequenas.


© ESA (ilustração de uma estrela anã L)

A estrela, conhecida como J0331-27, é uma anã L. É uma estrela com tão pouca massa que está apenas acima do limite do que constitui uma estrela. Se tivesse menos massa, não possuiria as condições internas necessárias para gerar a sua própria energia.

Os astrônomos descobriram a enorme proeminência de raios X em dados registados no dia 5 de julho de 2008 pelo instrumento EPIC (European Photon Imaging Camera) a bordo do observatório de raios X XMM-Newton da ESA. Em questão de minutos, a pequena estrela liberou mais de dez vezes mais energia do que as proeminências mais intensas do Sol.

As proeminências estelares são lançadas quando o campo magnético na atmosfera de uma estrela se torna instável e colapsa numa configuração mais simples. No processo, libera uma grande proporção da energia aí armazenada.

Esta liberação explosiva de energia cria um brilho repentino, a proeminência, e é aqui que as novas observações apresentam o seu maior quebra-cabeças.

A energia só pode ser colocada no campo magnético de uma estrela por partículas carregadas, também conhecidas como material ionizado e criadas em ambientes de alta temperatura. No entanto, sendo uma anã L, a J0331-27 tem uma temperatura superficial baixa para uma estrela, apenas 2.100K em comparação com os cerca de 6.000K do Sol. Os astrônomos não pensavam que uma temperatura tão baixa pudesse ser capaz de gerar partículas carregadas suficientes para alimentar tanta energia no campo magnético. Portanto, o enigma é: como é que é possível uma super-proeminência numa estrela tão pequena?

A super-proeminência foi descoberta em dados de arquivo do XMM-Newton como parte de um grande projeto de investigação liderado por Andrea De Luca do INAF - Instituto de Astrofísica Espacial e Física Cósmica em Milão, Itália. O projeto estudou a variabilidade temporal de aproximadamente 400.000 fontes detectadas pelo XMM-Newton ao longo de 13 anos.

Andrea e colaboradores procuravam, em particular, fenômenos peculiares e com J0331-27 certamente conseguiram isso. Várias estrelas semelhantes já tinham sido observadas emitindo super-proeminências na parte visível do espetro, mas esta é a primeira detecção inequívoca de uma erupção deste tipo em raios X.

O comprimento de onda é importante porque assinala de que parte da atmosfera a super-proeminência vem: a luz óptica vem de mais profundamente na atmosfera da estrela, perto da sua superfície visível, ao passo que os raios X vêm de mais alto na atmosfera.

A compreensão das semelhanças e diferenças entre esta nova, e até agora única, super-proeminência na anã L e as proeminências anteriormente observadas, detectadas em todos os comprimentos de onda em estrelas de maior massa, é agora uma prioridade para a equipe. Mas para alcançar isso, precisam de encontrar mais exemplos.

Uma pista que efetivamente possuem é que existe apenas uma proeminência de J0331-27 nos dados, apesar do XMM-Newton ter observado a estrela por um total de cerca de 40 dias. Isto é peculiar porque outras estrelas flamejantes tendem a sofrer de vários surtos menores.

Os dados parecem sugerir que uma anã L leva mais tempo para acumular energia, de modo que há uma grande liberação repentina.

As estrelas com proeminências mais frequentes liberam menos energia de cada vez, enquanto esta anã L parece liberar energia muito raramente, mas num evento realmente grande. Porque é que isto pode ser o caso, ainda é uma questão em aberto que precisa de mais investigação.

Um artigo foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics.

Fonte: ESA

sábado, 29 de fevereiro de 2020

Grande exoplaneta pode ter as condições ideais para a vida

Os astrônomos descobriram que um exoplaneta com mais do dobro do tamanho da Terra é potencialmente habitável, alargando a busca por vida a planetas significativamente maiores que a Terra, mas menores que Netuno.


© Amanda Smith (ilustração do exoplaneta K2-18b)

Uma equipe da Universidade de Cambridge usou a massa, o raio e os dados atmosféricos do exoplaneta K2-18b e determinou que é possível que o planeta hospede água líquida em condições habitáveis sob a sua atmosfera rica em hidrogênio.

O exoplaneta K2-18b, a 124 anos-luz de distância, tem 2,6 vezes o raio e 8,6 vezes a massa da Terra, e orbita a sua estrela dentro da zona habitável, onde as temperaturas podem permitir a existência de água líquida. O planeta foi objeto de uma cobertura significativa por parte da comunicação social no outono de 2019, quando duas equipes diferentes relataram a detecção de vapor de água na sua atmosfera rica em hidrogênio. No entanto, a extensão da atmosfera e as condições por baixo continuavam desconhecidas.

"O vapor de água já foi detectado nas atmosferas de vários exoplanetas, mas mesmo que o planeta esteja na zona habitável, isso não significa necessariamente que existam condições habitáveis à superfície," disse o Dr. Nikku Madhusudhan do Instituto de Astronomia de Cambridge, que liderou a nova pesquisa. "Para estabelecer as perspectivas de habitabilidade, é importante obter uma compreensão unificada das condições interiores e atmosféricas do planeta, em particular, se a água líquida pode existir sob a atmosfera."

Dado o grande tamanho de K2-18b, sugeriu-se que seria mais como uma versão menor de Netuno do que uma versão maior da Terra. Espera-se que um "mini-Netuno" tenha um "invólucro" significativo de hidrogênio ao redor de uma camada de água a alta pressão, com um núcleo interno de rocha e ferro. Se o invólucro de hidrogênio for demasiado espesso, a temperatura e pressão à superfície da camada de água seriam demasiado grandes para suportar vida.

Agora, Madhusudhan e a sua equipe mostraram que, apesar do tamanho de K2-18b, o seu invólucro de hidrogênio não é necessariamente muito espesso e a camada de água pode ter as condições ideais para suportar vida. Usaram as observações existentes da atmosfera, bem como a massa e o raio, para determinar a composição e a estrutura da atmosfera e do interior usando modelos numéricos detalhados e métodos estatísticos para explicar os dados.

Os pesquisadores confirmaram que a atmosfera é rica em hidrogênio com uma quantidade significativa de vapor de água. Também descobriram que os níveis de outras substâncias químicas, como metano e amônia, estavam abaixo do esperado para uma tal atmosfera. Ainda não se sabe se estes níveis podem ser atribuídos a processos biológicos.

A equipe usou então as propriedades atmosféricas como condições limite para modelos do interior planetário. Exploraram uma ampla gama de modelos que podiam explicar as propriedades atmosféricas, bem como a massa e raio do planeta. Isto permitiu-lhes obter a variedade de possíveis condições no interior, incluindo o tamanho do invólucro de hidrogênio e as temperaturas e pressões na camada de água.

Os pesquisadores descobriram que a extensão máxima do invólucro de hidrogênio permitida pelos dados é de cerca de 6% da massa do planeta, embora a maioria das soluções exija muito menos. A quantidade mínima de hidrogênio é cerca de um milionésimo da massa, semelhante à fração de massa da atmosfera da Terra. Em particular, vários cenários permitem um mundo oceânico, com água líquida por baixo da atmosfera a pressões e temperaturas semelhantes às encontradas nos oceanos da Terra.

Este estudo abre a busca por condições habitáveis e por assinaturas biológicas para lá do Sistema Solar a exoplanetas significativamente maiores que a Terra, além dos exoplanetas parecidos com a Terra. Além disso, planetas como K2-18b são mais acessíveis a observações atmosféricas com instalações observacionais atuais e futuras. As restrições atmosféricas obtidas neste estudo podem ser refinadas usando observações futuras com grandes instalações, como o futuro telescópio espacial James Webb.

Os resultados foram divulgados na revista The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: University of Cambridge

Planeta com ano de 18 horas à beira da destruição

Astrônomos da Universidade de Warwick observaram um exoplaneta orbitando uma estrela em pouco mais de 18 horas, o período orbital mais curto já observado para um planeta do seu tipo.


© U.Warwick/Mark Garlick (ilustração de um Júpiter quente em órbita de estrela)

Isto significa que a duração do ano para este Júpiter quente - um gigante gasoso semelhante em tamanho e composição com Júpiter, no nosso próprio Sistema Solar - é inferior a um dia terrestre.

Os cientistas pensam que a descoberta pode ajudar a descobrir se os planetas deste gênero estão, ou não, numa espiral destrutiva em direção aos seus sóis.

O planeta NGTS-10b foi descoberto a cerca de 1.000 anos-luz de distância da Terra, como parte do NGTS (Next-Generation Transit Survey), um levantamento exoplanetário sediado no Chile que visa descobrir planetas do tamanho de Netuno usando o método de trânsito. Isto envolve a observação de estrelas em busca de uma queda no brilho, indicativa da passagem de um planeta à sua frente.

A qualquer momento o levantamento observa 100 graus quadrados do céu, que inclui cerca de 100.000 estrelas. Destas estrelas, a NGTS-10 chamou a atenção dos astrônomos devido aos mergulhos muito frequentes no brilho estelar provocados pela rápida órbita do planeta.

Embora, em teoria, os Júpiteres quentes com períodos orbitais curtos (menos de 24 horas) sejam os mais fáceis de detectar devido ao seu grande tamanho e trânsitos frequentes, provaram ser extremamente raros. Das centenas de Júpiteres quentes atualmente conhecidos, apenas sete têm um período orbital inferior a um dia.

O NGTS-10b orbita tão depressa porque está muito próximo de sua estrela, a apenas o dobro do diâmetro da estrela que, no contexto do nosso Sistema Solar, a posicionaria 27 vezes mais perto do que Mercúrio está do nosso próprio Sol. Os cientistas notaram que está perigosamente perto do ponto em que as forças de maré da estrela acabariam por destruir o planeta.

É provável que o planeta sofra bloqueio de maré, de modo que um lado está constantemente virado para a estrela e constantemente quente, estima-se que a temperatura média seja superior a 1.000º C. A estrela tem aproximadamente 70% do raio do Sol e é 1.000º C mais fria que o Sol, com cerca de 4.000º C. O exoplaneta NGTS-10b também é um excelente candidato para caracterização atmosférica com o telescópio espacial James Webb.

Usando fotometria de trânsito, os cientistas sabem que o planeta é 20% maior do que o nosso Júpiter e tem pouco mais de duas vezes a sua massa, de acordo com medições da velocidade radial, capturadas num ponto conveniente do seu ciclo de vida para ajudar a responder perguntas sobre a evolução deste tipo de planetas.

Os planetas massivos geralmente formam-se muito longe da estrela e depois migram por meio de interações com o disco enquanto o planeta ainda está se formando, ou por meio de interações com planetas adicionais muito mais tarde na sua vida.

Conjectura-se que estes planetas de período extremamente curto migram dos confins dos seus sistemas solares e acabam sendo consumidos ou perturbados pela estrela.

Nos próximos dez anos, pode ser possível ver este planeta a espiralar. Vamos poder usar o NGTS para o monitorizar ao longo de uma década. Se o período orbital do exoplaneta começar a diminuir e a espiralar, isso indicará sobre a estrutura do planeta que ainda não é conhecida.

Um artigo científico foi publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: University of Warwick

Como as estrelas recém-nascidas se preparam para o nascimento dos planetas

Uma equipe internacional de astrônomos usou dois dos radiotelescópios mais poderosos do mundo para criar mais de trezentas imagens de discos de formação planetária em torno de estrelas muito jovens nas Nuvens de Órion.


© ALMA/VLA (protoestrelas e seus jovens discos protoplanetários em Órion)

Estas imagens revelam novos detalhes sobre os locais de nascimento dos planetas e sobre os estágios iniciais da formação estelar.

A maioria das estrelas do Universo é acompanhada por planetas. Estes planetas nascem em anéis de poeira e gás, chamados discos protoplanetários. Mesmo estrelas muito jovens estão cercadas por estes discos. Os astrônomos querem saber exatamente quando estes discos começam a se formar e qual o seu aspeto. Mas as estrelas jovens são muito fracas e existem densas nuvens de poeira e gás ao seu redor, nos berçários estelares. Somente complexos radiotelescópios altamente sensíveis conseguem localizar os pequenos discos em torno destas estrelas infantis por entre o material densamente compacto nestas nuvens.

Nesta nova pesquisa, os astrônomos apontaram o VLA (Karl G. Jansky Very Large Array) e o ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array) para uma região no espaço onde nascem muitas estrelas: as Nuvens Moleculares de Órion. Este levantamento, de nome VANDAM (VLA/ALMA Nascent Disk and Multiplicity), é até à data o maior levantamento de estrelas jovens e dos seus discos.

As estrelas muito jovens, também chamadas protoestrelas, formam-se em nuvens de gás e poeira no espaço. O primeiro passo na formação de uma estrela é o colapso destas nuvens densas devido à gravidade. À medida que a nuvem colapsa, começa a girar, formando um disco achatado em torno da protoestrela. O material do disco continua alimentando a estrela e a fazê-la crescer. Eventualmente, o material restante no disco deverá formar planetas.

Muitos aspetos destes primeiros estágios da formação estelar, e de como o disco se forma, ainda não são claros. Mas o VLA e o ALMA espiaram através das nuvens densas e observaram centenas de protoestrelas e seus discos em vários estágios de formação.

Foi descoberto que os discos muito jovens podem ter tamanho semelhante, mas são, em média, muito mais massivos do que os discos mais antigos. "Quando uma estrela cresce, consome cada vez mais material do disco. Isto significa que os discos mais jovens têm muito mais matéria-prima da qual os planetas podem formar-se. Possivelmente já começaram a ser formados, em torno de estrelas muito jovens, planetas maiores.

Entre as centenas de imagens deste levantamento, quatro protoestrelas parecem diferentes das outras e chamaram a atenção dos cientistas.

Para serem definidas como uma típica protoestrela (classe 0), as estrelas não devem apenas ter um disco giratório achatado em seu redor, mas também um fluxo expelindo material em direções opostas, que limpa a nuvem densa em torno das estrelas e as torna opticamente visíveis. Este fluxo é importante, porque impede que as estrelas descontrolem a sua rotação enquanto crescem. Mas exatamente quando é que estes fluxos começam, é uma questão em aberto na astronomia.

Uma das estrelas infantis neste estudo, chamada HOPS 404, possui um fluxo de apenas dois km/s (um típico fluxo protoestelar tem 10-100 km/s). É uma grande estrela inchada que ainda está acumulando muita massa e que apenas começou o seu fluxo para perder momento angular e assim continuar crescendo.

A excelente resolução e sensibilidade fornecidas pelo ALMA e pelo VLA, foram cruciais para entender as regiões exteriores e interiores das protoestrelas e dos seus discos. Embora o ALMA possa examinar em grande detalhe o material denso e empoeirado em torno de protoestrelas, as imagens do VLA obtidas a maiores comprimentos de onda foram essenciais para entender as estruturas internas das protoestrelas mais jovens em escalas menores do que o nosso Sistema Solar.

Fonte: NRAO

domingo, 16 de fevereiro de 2020

Superfície de Betelgeuse está diminuindo de brilho

Com o auxílio do Very Large Telescope (VLT) do ESO, os astrônomos captaram a diminuição de brilho de Betelgeuse, uma estrela supergigante vermelha localizada na constelação de Órion.



© ESO/VLT (queda de brilho Betelgeuse)


A imagem acima mostra a estrela Betelgeuse antes e depois da diminuição de brilho, respectivamente, em Janeiro de 2019 e Dezembro de 2019.

As novas imagens da superfície da estrela mostram não apenas a supergigante vermelha diminuindo seu brilho mas também a variação da sua forma aparente.

Betelgeuse tem sido um farol no céu noturno para os observadores estelares, no entanto durante o último ano temos assistido a uma diminuição do seu brilho. Neste momento Betelgeuse apresenta cerca de 36% do seu brilho normal, uma variação considerável, visível até a olho nu. Entusiastas da astronomia e cientistas esperavam descobrir o porquê desta diminuição de brilho sem precedentes. 

Uma equipe liderada por Miguel Montargès, astrônomo na KU Leuven, Bélgica, observa a estrela com o VLT desde dezembro, com o objetivo de entender por que é que ela está se tornando mais fraca. Entre as primeiras observações da campanha está uma imagem da superfície de Betelgeuse, obtida no final do ano passado com o instrumento SPHERE. 

A equipe também observou a estrela com o SPHERE em janeiro de 2019, antes da diminuição do seu brilho, nos dando assim uma imagem do antes e do depois de Betelgeuse. Obtidas no óptico, as imagens destacam as mudanças que ocorreram na estrela, tanto em brilho como em forma aparente. 

Muitos entusiastas da astronomia se perguntam se esta diminuição de brilho da Betelgeuse significa que a estrela está prestes a explodir. 

Tal como todas as supergigantes, um dia Betelgeuse se transformará numa supernova, no entanto os astrônomos não pensam que isso esteja acontecendo agora. Existem outras hipóteses para explicar o que exatamente está causando as variações em forma e brilho observadas nas imagens SPHERE. 

“Os dois cenários em que estamos trabalhando são o resfriamento da superfície devido a atividade estelar excepcional ou ejeção de poeira na nossa direção,” explica Montargès. “Claro que o nosso conhecimento de supergigantes vermelhas é ainda incompleto e este é um trabalho em curso, por isso podemos ainda ter algumas surpresas.” 

A superfície irregular de Betelgeuse é composta por células convectivas gigantes que se movem, diminuem e aumentam de tamanho. A estrela apresenta também pulsações, tal como o bater de um coração, variando em brilho periodicamente. Estas alterações de convecção e pulsação em Betelgeuse são chamadas de atividade estelar.

Montargès e a sua equipe usaram o VLT instalado no Cerro Paranal, no Chile, para estudar a estrela, que fica a mais de 700 anos-luz de distância da Terra, e tentar encontrar pistas que apontem para o porquê da diminuição do seu brilho. 

“O Observatório do Paranal do ESO é uma das poucas instalações capazes de obter imagens da superfície de Betelgeuse,” diz Montargès. Os instrumentos montados no VLT permitem efetuar observações  desde o visível ao infravermelho médio, o que significa que os astrônomos podem observar tanto a superfície da estrela como o material que a circunda. “Esta é a única maneira de compreendermos o que está acontecendo nesta estrela.” 

Outra nova imagem, obtida com o instrumento VISIR montado no VLT, mostra a radiação infravermelha emitida pela poeira que circundava a Betelgeuse em dezembro de 2019. Estas observações foram realizadas por uma equipe liderada por Pierre Kervella do Observatório de Paris, França, que explicou que o comprimento de onda captado nesta imagem é semelhante ao detectado por câmaras que detectam calor. As nuvens de poeira, que se assemelham a chamas na imagem VISIR, se formam quando a estrela lança a sua matéria para o espaço. 

A frase “somos todos feitos de poeira estelar” é algo que ouvimos muito na astronomia popular, mas de onde é que exatamente vem esta poeira? Ao longo das suas vidas, as supergigantes vermelhas, como a Betelgeuse, criam e ejetam enormes quantidades de material ainda antes de explodirem sob a forma de supernovas. A tecnologia moderna nos permite estudar estes objetos, situados a centenas de anos-luz de distância de nós, com um detalhe sem precedentes, nos dando a oportunidade de desvendar o mistério que dá origem a esta perda de massa. 

Fonte: ESO

sábado, 15 de fevereiro de 2020

Modelos apontam para uma formação mais longa de Marte

O Sistema Solar primitivo era um lugar caótico, com evidências indicando que Marte provavelmente foi atingido por planetesimais, pequenos protoplanetas com até 1.900 km em diâmetro, no início da sua história.


© SwRI (ilustração do aspeto primitivo de Marte)

Cientistas do SwRI (Southwest Research Institute) modelaram a mistura de materiais associados a estes impactos, revelando que o Planeta Vermelho pode ter sido formado numa escala de tempo mais longa do que se pensava anteriormente.

Uma importante questão em aberto na ciência planetária é a determinação de como Marte se formou e até que ponto a sua evolução inicial foi afetada por colisões. Esta questão é difícil de responder, dado que bilhões de anos apagaram constantemente evidências de eventos iniciais de impacto. Felizmente, parte desta evolução está registada nos meteoritos marcianos. Dos aproximadamente 61.000 meteoritos encontrados na Terra, pensa-se que apenas mais ou menos 200 sejam de origem marciana, ejetados do Planeta Vermelho por colisões mais recentes.

Estes meteoritos exibem grandes variações de elementos que associam ao ferro, como tungstênio e platina, que têm uma afinidade moderada a alta por ferro. Estes elementos tendem a migrar do manto de um planeta para o núcleo central de ferro durante a formação. As evidências destes elementos no manto marciano, amostrados por meteoritos, são importantes porque indicam que Marte foi bombardeado por planetesimais algum tempo após o fim da sua formação primária do núcleo. O estudo de isótopos de elementos específicos produzidos localmente no manto através de processos de decaimento radioativo ajuda os cientistas a entender quando a formação do planeta ficou completa.

"Nós sabíamos que Marte recebeu elementos como platina e ouro de grandes colisões iniciais. Para investigar este processo, realizamos simulações hidrodinâmicas de impacto de partículas suaves," disse a Dra. Simone Marchi, do SwRI. "Com base no nosso modelo, as colisões iniciais produzem um manto marciano heterogêneo, semelhante a um bolo de mármore. Estes resultados sugerem que a visão predominante da formação de Marte pode estar influenciada pelo número limitado de meteoritos disponíveis para estudo."

Com base na proporção de isótopos de tungstênio nos meteoritos marcianos, argumentou-se que Marte cresceu rapidamente cerca de 2 a 4 milhões de anos após o início da formação do Sistema Solar. No entanto, grandes colisões precoces podem ter alterado o balanço isotópico do tungstênio, o que poderá suportar uma escala de tempo para a formação de Marte de até 20 milhões de anos, como mostra o novo modelo.

"As colisões de projéteis grandes o suficiente para terem os seus próprios núcleos e mantos podem resultar numa mistura heterogênea destes materiais no início do manto marciano," disse a Dra. Robin Canup, vice-presidente assistente da Divisão de Ciência e Engenharia do SwRI. "Isto pode levar a interpretações sobre o momento da formação de Marte diferentes daquelas que assumem que todos os projéteis são pequenos e homogêneos."

Os meteoritos marcianos que caíram na Terra provavelmente partiram de apenas alguns locais ao redor do planeta. A nova pesquisa mostra que o manto marciano pode ter recebido adições variadas de materiais projetáveis, levando a concentrações variáveis de elementos siderófilos. A próxima geração de missões em Marte, incluindo planos para enviar amostras à Terra, fornecerá novas informações para melhor entender a variabilidade destes elementos nas rochas marcianas e a evolução inicial do Planeta Vermelho.

"Para entender completamente Marte, precisamos de entender o papel que as colisões mais antigas e energéticas tiveram na sua evolução e composição," conclui Marchi.

Um artigo foi publicado na revista Science Advances.

Fonte: Southwest Research Institute