quinta-feira, 26 de março de 2020

Galáxia com único braço

A NGC 4618 foi descoberta em 9 de abril de 1787 pelo astrônomo alemão-britânico Wilhelm Herschel, que também descobriu Urano em 1781.


© Hubble/I. Karachentsev (NGC 4618)

Apenas um ano antes de descobrir a NGC 4618, Herschel teorizou que os objetos "nebulosos" que os astrônomos estavam vendo no céu noturno provavelmente seriam grandes aglomerados de estrelas localizados muito mais longe do que as estrelas individuais que ele poderia discernir facilmente.

Desde que Herschel propôs sua teoria, os astrônomos passaram a entender que o que ele estava vendo era uma galáxia. A NGC 4618, classificada como uma galáxia espiral barrada, possui uma distinção especial entre outras galáxias espirais de ter apenas um braço girando em torno do centro da galáxia.

A NGC 4618 está localizada a cerca de 21 milhões de anos-luz de nossa galáxia na constelação Canes Venatici, ela possui um diâmetro de cerca de um terço da Via Láctea. Juntamente com sua vizinha, a NGC 4625, ela forma um par de galáxias que interage, o que significa que as duas galáxias estão próximas o suficiente para se influenciar gravitacionalmente. Estas interações podem resultar na fusão de duas (ou mais) galáxias para formar uma nova estrutura, como uma galáxia em anel.

Fonte: ESA

Sobre a origem das estrelas massivas

Esta cena de criação estelar fica perto dos arredores da famosa Nebulosa de Tarântula.


© Hubble/I. Stephens (LHA 120-N 150)

Esta nuvem de gás e poeira, assim como as muitas estrelas jovens e massivas que a cercam, é o laboratório perfeito para estudar a origem de estrelas massivas.

A nuvem rosa brilhante e as jovens estrelas que a rodeiam nesta imagem captada pelo telescópio espacial Hubble têm o nome pouco inspirador LHA 120-N 150. Esta região do espaço é o maior viveiro estelar conhecido no Universo local. A nebulosa está situada a mais de 160.000 anos-luz de distância na Grande Nuvem de Magalhães, uma galáxia anã irregular vizinha que orbita a Via Láctea.

A Grande Nuvem de Magalhães teve um ou mais encontros próximos no passado, possivelmente com a Pequena Nuvem de Magalhães. Estas interações causaram um episódio de formação energética de estrelas em nossa pequena vizinha, parte do qual é visível como a Nebulosa da Tarântula.

Também conhecida como 30 Doradus ou NGC 2070, a Nebulosa da Tarântula deve seu nome ao arranjo de manchas brilhantes que se assemelham às pernas de uma tarântula. Ela mede quase 1.000 anos-luz de diâmetro. Sua proximidade, a inclinação favorável da Grande Nuvem de Magalhães e a ausência de poeira intermediária fazem da Nebulosa da Tarântula um dos melhores laboratórios para estudar a formação de estrelas, em particular estrelas massivas. Esta nebulosa tem uma concentração excepcionalmente alta de estrelas massivas, geralmente chamadas de aglomerados de super estrelas.

Os astrônomos estudaram a LHA ​​120-N 150 para aprender mais sobre o ambiente em que estrelas massivas se formam. Modelos teóricos da formação de estrelas massivas sugerem que elas se formem em aglomerados de estrelas; mas as observações indicam que até dez por cento delas também se formaram isoladamente. A gigantesca nebulosa de Tarântula, com suas numerosas subestruturas, é o laboratório perfeito para resolver esse quebra-cabeça, pois nele estrelas maciças podem ser encontradas como membros de aglomerados e isoladamente.

Com a ajuda do telescópio espacial Hubble, os astrônomos tentam descobrir se as estrelas isoladas visíveis na nebulosa realmente se formaram sozinhas ou simplesmente se afastaram de suas irmãs estelares. No entanto, este estudo não é uma tarefa fácil; estrelas jovens, antes de serem totalmente formadas, especialmente as massivas, parecem muito semelhantes a densos pedaços de poeira.

A LHA 120-N 150 contém várias dezenas destes objetos. Eles são uma mistura de fontes não classificadas, alguns provavelmente objetos estelares jovens e outros provavelmente amontoados de poeira. Somente análises e observações detalhadas revelarão sua verdadeira natureza e isso ajudará a finalmente resolver a questão sem resposta da origem de estrelas massivas.

telescópio espacial Hubble observou a Nebulosa da Tarântula e suas subestruturas no passado, sempre se interessando pela formação e evolução das estrelas.

Os resultados científicos desta observação foram publicados no periódico Astrophyiscal Journal.

Fonte: ESA

sábado, 21 de março de 2020

Descoberto remanescente pulsante de estrela em sistema binário

Cientistas da Universidade de Sheffield descobriram uma antiga estrela pulsante num sistema binário, o que lhes permite aceder a informações importantes sobre a história de como estrelas como o nosso Sol evoluem e eventualmente morrem.


© ESO/M. Kornmesser (ilustração de um sistema binário com uma anã branca)

A descoberta da primeira estrela anã branca pulsante num binário eclipsante, por físicos da Universidade de Sheffield, significa que a equipa pode ver, pela primeira vez e em detalhe, como a evolução binária afetou a estrutura interna de uma anã branca.
Um binário eclipsante, ou sistema estelar duplo, é constituído por duas estrelas que se orbitam uma à outra e que passam periodicamente uma à frente da outra, a partir da perspetiva da Terra.

As anãs brancas são os núcleos queimados deixados para trás quando uma estrela como o Sol morre. Esta anã branca em particular pode fornecer, pela primeira vez, informações importantes sobre a estrutura, evolução e morte destas estrelas.

Pensa-se que a maioria das anãs brancas sejam compostas principalmente de carbono e oxigênio, mas esta anã em particular é composta principalmente de hélio. A equipa pensa que isso é resultado da companheira binária ter interrompido a sua evolução cedo, antes de ter hipótese de fundir o hélio em carbono e oxigênio.

Os pulsos desta estrela foram descobertos usando a HiPERCAM, uma revolucionária câmara de alta velocidade desenvolvida por uma equipa liderada pelo professor Vik Dhillon do Departamento de Física e Astronomia da Universidade de Sheffield.

A HiPERCAM pode captar uma imagem a cada milissegundo em cinco cores diferentes simultaneamente e está acoplada ao GTC (Gran Telescopio Canarias) de 10,4 metros, o maior telescópio ótico do mundo em La Palma. Isto permitiu que os cientistas detetassem os pulsos rápidos e subtis desta anã branca em particular.

Os pulsos da anã branca e do sistema binário eclipsante permitiram à equipa investigar a sua estrutura usando duas técnicas, asterossismologia e estudos de eclipses. A asterossismologia envolve a medição da rapidez com que as ondas sonoras viajam através da anã branca.

O Dr. Steven Parsons, que liderou o estudo e do mesmo departamento, disse: "A determinação da composição de uma anã branca não é simples porque estes objetos têm aproximadamente metade da massa do Sol e aproximadamente o tamanho da Terra. Isto significa que a gravidade é extremamente forte numa anã branca, cerca de um milhão de vezes maior do que aqui na Terra, de modo que à superfície de uma anã branca uma pessoa média pesaria 60 milhões de quilogramas. A gravidade faz com que todos os elementos pesados da anã branca afundem para o centro, deixando apenas os elementos mais leves na superfície e, portanto, a verdadeira composição permanece oculta por baixo.

"Esta anã branca pulsante que descobrimos é extremamente importante, pois podemos usar o movimento binário e o eclipse para medir independentemente a massa e o raio desta anã branca, o que nos ajuda a determinar a sua composição. Ainda mais interessante, as duas estrelas neste sistema binário interagiram uma com a outra no passado, transferindo material para a frente e para trás. Podemos ver como esta evolução binária afetou a estrutura interna da anã branca, algo que não conseguimos fazer antes para este tipo de sistemas binários."

O próximo passo da investigação é continuar a observar a anã branca para registar o maior número possível de pulsos usando a HiPERCAM e o telescópio espacial Hubble.

Fonte: University of Sheffield

terça-feira, 17 de março de 2020

Descobertos novos planetas menores localizados além de Netuno

Usando dados do DES (Dark Energy Survey) instalado no telescópio Blanco, pesquisadores descobriram mais de 300 objetos transnetunianos (OTNs), planetas menores localizados nos confins do Sistema Solar, incluindo mais de 100 novas descobertas.


© Fermilab/Reidar Hahn (cúpula do telescópio Blanco)

O estudo também descreve uma nova abordagem para encontrar tipos semelhantes de objetos e pode ajudar pesquisas futuras do hipotético Planeta Nove e de outros planetas não descobertos. O trabalho foi executado por pesquisadores da Universidade da Pensilvânia, EUA.

O objetivo do DES, que completou em janeiro seis anos de recolhimento de dados, é entender a natureza da energia escura, obtendo imagens de alta resolução do céu do hemisfério sul. Embora o DES não tenha sido desenhado especificamente para os OTNs, a sua abrangência e profundidade de cobertura tornaram-no particularmente hábil em encontrar novos objetos localizados além de Netuno.

Dado que o DES foi projetado para estudar galáxias e supernovas, os pesquisadores tiveram que desenvolver uma nova maneira de rastrear movimento. Dois levantamentos dedicados a OTNs recolhem medições com a frequência de uma ou duas horas, o que permite que os cientistas sigam mais facilmente os seus movimentos.

Usando os primeiros quatros anos de dados do DES, foi obtido inicialmente um conjunto de dados de 7 bilhões de 'pontos', todos os possíveis objetos detectados pelo software que estavam acima dos níveis de fundo da imagem. Seguidamente, removeu quaisquer objetos presentes em noites múltiplas - objetos como estrelas, galáxias e supernovas - para criar uma lista "transiente" de 22 milhões de objetos antes de iniciar um jogo massivo de "liga os pontos", procurando pares ou trios de objetos detectados a fim de ajudar a determinar onde o objeto apareceria nas noites subsequentes.

Para filtrar a lista de candidatos até OTNs reais, os pesquisadores voltaram ao conjunto de dados originais para ver se conseguiam encontrar mais imagens do objeto em questão.

Os pesquisadores desenvolveram uma maneira de "empilhar" várias imagens para criar uma visão mais nítida, o que ajudou a confirmar se um objeto detectado era um OTN real. Também verificaram que o seu método era capaz de observar OTNs conhecidos nas áreas do céu em estudo e foram capazes de detectar objetos falsos injetados na análise.

Após muitos meses de desenvolvimento de método e de análise, os cientistas encontraram 316 OTNs, incluindo 245 descobertas feitas pelo DES e 139 novos objetos que não tinham sido publicados anteriormente. Com apenas 3.000 objetos atualmente conhecidos, este catálogo DES representa 10% de todos os objetos transnetunianos conhecidos. Plutão, o OTN mais famoso, está 40 vezes mais distante do Sol do que a Terra, e os OTNs encontrados usando os dados do DES estão entre 30 e 90 vezes a distância Terra-Sol. Alguns destes objetos estão em órbitas extremamente longas que os levam muito além de Plutão.

Agora que o DES está completo, os pesquisadores estão executando novamente a sua análise de todo o conjunto de dados do DES, desta vez com um limite mais baixo para a detecção de objetos no primeiro estágio de filtragem. Isto significa que há um potencial ainda maior para, no futuro próximo, encontrar novos OTNs, possivelmente até 500, com base nestas estimativas.

O método desenvolvido também pode ser usado para procurar OTNs nos próximos levantamentos astronômicos, incluindo o do novo Observatório Vera C. Rubin. Este observatório vai examinar todo o céu do hemisfério sul e será capaz de detectar objetos ainda mais fracos e mais distantes do que o DES.

Este catálogo de OTNs também será uma ferramenta científica útil para pesquisas futuras do Sistema Solar. Dado que o DES recolhe um amplo espectro de dados sobre cada objeto detectado, os pesquisadores podem tentar descobrir a origem do objeto transnetuniano, tendo em conta que se espera que objetos que se formam mais perto do Sol tenham cores diferentes daqueles formados em regiões mais distantes e mais frias. E, ao estudar as órbitas destes objetos, os cientistas podem estar um passo mais perto de encontrar o Planeta Nove, um planeta hipotético do tamanho de Netuno que se pensa existir para além de Plutão.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: University of Pennsylvania

sábado, 14 de março de 2020

Estrela de nêutrons com 11 km de raio

Uma equipe internacional liderada por membros do Instituto Max Planck para Física Gravitacional (Instituto Albert Einstein) obteve novas medições do tamanho das estrelas de nêutrons.


© NASA (estrela de nêutrons com o tamanho aproximado de uma cidade)

Para tal, combinaram uma descrição geral dos primeiros princípios do comportamento desconhecido da matéria das estrelas de nêutrons com observações da fusão do binário de estrelas de nêutrons GW170817. Os seus resultados são mais rigorosos por um fator de dois do que os limites anteriores e mostram que uma estrela de nêutrons típica tem um raio próximo dos 11 quilômetros. Também descobriram que as estrelas de nêutrons que se fundem com buracos negros são, na maioria dos casos, provavelmente engolidas inteiras, a menos que o buraco negro seja pequeno e/ou gire rapidamente. Isto significa que, embora tais fusões possam ser observadas como fontes de ondas gravitacionais, seriam invisíveis no espectro eletromagnético.

"As fusões de estrelas de nêutrons binárias são uma mina de ouro de informações!" diz Collin Capano, pesquisador do Instituto Albert Einstein, em Hannover. "As estrelas de nêutrons contêm a matéria mais densa do Universo observável. Na verdade, são tão densas e compactas que podemos pensar de toda a estrela como um único núcleo atômico, ampliado para o tamanho de uma cidade. Ao medir as propriedades destes objetos, aprendemos mais sobre a física fundamental que governa a matéria no nível subatômico."

"Descobrimos que uma típica estrela de nêutrons, que é cerca de 1,4 vezes mais massiva do que o nosso Sol, tem um raio de aproximadamente 11 quilômetros," diz Badri Krishnan, que liderou a equipe no Instituto Albert Einstein. "Os nossos resultados limitam o raio até provavelmente entre 10,4 e 11,9 quilômetros. É um intervalo duas vezes mais rigoroso do que os resultados anteriores."

As estrelas de nêutrons são remanescentes compactos e extremamente densos de explosões de supernova. Não é conhecido como esta matéria extremamente densa e rica em nêutrons se comporta e é impossível criar estas condições em qualquer laboratório da Terra. Os físicos propuseram vários modelos (equações de estado), mas não se sabe qual (se é que existe) destes modelos descreve corretamente a matéria das estrelas de nêutrons na natureza.

As fusões de estrelas de nêutrons binárias, como GW170817, que foi observada em ondas gravitacionais e em todo o espetro eletromagnético em agosto de 2017, são os eventos astrofísicos mais excitantes quando se trata de aprender mais sobre a matéria em condições extremas e a física nuclear subjacente. A partir daqui os cientistas podem, por sua vez, determinar as propriedades físicas das estrelas de nêutrons, como o raio e a massa.

A equipe usou um modelo baseado numa descrição dos primeiros princípios de como as partículas subatômicas interagem nas altas densidades encontradas nas estrelas de nêutrons. Notavelmente, os cálculos teóricos em escalas inferiores a um bilionésimo de milímetro podem ser comparados com observações de um objeto astrofísico a mais de cem milhões de anos-luz de distância.

GW170817 foi provocado pela colisão de dois objetos com o tamanho de uma cidade há 120 milhões de anos, quando os dinossauros ainda vagueavam pela Terra. Isto ocorreu numa galáxia a mais de sextilhões de quilômetros de distância. A partir deste evento, foi possível obter informações sobre a física subatômica.

A descrição dos primeiros princípios, usada pelos pesquisadores, prevê uma família inteira de possíveis equações de estado para as estrelas de nêutrons, que são diretamente derivadas da física nuclear. Desta família, os autores selecionaram os membros com a maior probabilidade de explicar diferentes observações astrofísicas; escolheram modelos que:
  • concordam com as observações de ondas gravitacionais de GW170817 a partir de dados públicos do LIGO e do Virgo;
  • produzem uma estrela de nêutrons hipermassiva e de vida curta como resultado da fusão;
  • concordam com as restrições conhecidas na massa máxima da estrela de nêutrons a partir das observações eletromagnéticas de GW170817.
Isto não só permitiu que os cientistas obtivessem informações robustas sobre a física da matéria densa, mas também que obtivessem os limites mais rigorosos, até ao momento, do tamanho das estrelas de nêutrons.

Os novos resultados sugerem que, com um evento como GW170817, os detectores LIGO e Virgo, com a sensibilidade projetada, poderão distinguir facilmente, apenas com ondas gravitacionais, a fusão de duas estrelas de nêutrons ou de dois buracos negros. Para GW170817, as observações no espetro eletromagnético foram cruciais para fazer esta distinção.

A equipe também descobriu que, para binários mistos (uma estrela de neutrões que se funde com um buraco negro), se existirem apenas ondas gravitacionais da fusão, haverá dificuldade em distinguir estes eventos dos eventos de buracos negros binários. As observações no espetro eletromagnético ou de ondas gravitacionais, no rescaldo da fusão, serão cruciais para as diferenciar.

No entanto, os novos resultados também implicam que é improvável que se obtenham observações de fusões de binários mistos. "Nós mostramos que em quase todos os casos a estrela de nêutrons não será dilacerada pelo buraco negro, mas engolida por inteiro," explica Capano. "Somente quando o buraco negro é muito pequeno ou gira rapidamente, é que pode perturbar a estrela de nêutrons antes de a engolir; e só então é que podemos esperar ver algo mais além de ondas gravitacionais."

Na próxima década, os detectores existentes de ondas gravitacionais se tornarão ainda mais sensíveis, e detectores adicionais começarão as suas observações. Os astrônomos esperam detecções de ondas gravitacionais mais "audíveis" e possíveis observações da fusão de estrelas de neutrões binárias. Cada uma destas fusões proporcionará oportunidades maravilhosas para aprender mais sobre as estrela de nêutrons e sobre a física nuclear.

Os seus resultados foram publicados na revista Nature Astronomy.

Fonte: Max Planck Institute for Gravitational Physics

quinta-feira, 12 de março de 2020

Telescópio observa exoplaneta exótico onde chove ferro

Com o auxílio do Very Large Telescope (VLT) do ESO, pesquisadores observaram um planeta extremo onde suspeitam que chova ferro.


© ESO/M. Kornmesser (ilustração do lado noturno do exoplaneta WASP-76b)

O exoplaneta gigante ultra-quente tem um lado diurno onde as temperaturas sobem acima de 2.400º Celsius, ou seja, suficientemente altas para vaporizar metais. Ventos fortes transportam vapor de ferro para o lado noturno mais frio, onde este vapor condensa em gotas de ferro. Conhecido por WASP-76b, o exoplaneta está localizado a cerca de 640 anos-luz de distância da Terra, na constelação de Peixes.

Este estranho fenômeno ocorre porque o exoplaneta apenas mostra uma face, o lado diurno, à sua estrela progenitora, estando o lado noturno sempre na escuridão. Tal como a Lua que orbita em torno da Terra, WASP-76b encontra-se em rotação sincronizada, o que significa que demora tanto tempo a completar uma rotação em torno do seu eixo como a dar uma volta em torno da sua estrela.

O lado diurno recebe milhares de vezes mais radiação da sua estrela do que a Terra recebe do Sol, e por isso se encontra tão quente que as moléculas se separam em átomos e os metais, tais como o ferro, evaporam para a atmosfera. A extrema diferença de temperatura entre os lados diurno e noturno resulta em ventos vigorosos que levam o vapor de ferro do lado diurno ultra quente até ao lado noturno mais frio, onde as temperaturas diminuem para cerca de 1.500º Celsius.

De acordo com o novo estudo, WASP-76b não tem apenas diferentes temperaturas entre os lados diurno e noturno, mas apresenta também uma química diferente entre os dois lados. Com o auxílio do instrumento ESPRESSO montado no VLT, situado no deserto chileno do Atacama, os astrônomos identificaram pela primeira vez variações químicas num planeta gigante gasoso ultra quente. Os cientistas detectaram uma forte assinatura de vapor de ferro na fronteira do final da tarde, a qual separa o lado diurno do planeta do seu lado noturno.

Este resultado foi obtido em setembro de 2018, a partir das primeiras observações científicas do ESPRESSO, pelo consórcio científico que construiu o instrumento: uma equipe de Portugal, Itália, Suíça, Espanha e ESO.

O ESPRESSO (Echelle SPectrograph for Rocky Exoplanets and Stable Spectroscopic Observations) foi originalmente concebido para procurar planetas do tipo terrestre em torno de estrelas do tipo solar. No entanto, rapidamente provou ser muito mais versátil.

Um artigo foi publicado na revista Nature.

Fonte: ESO

terça-feira, 10 de março de 2020

ALMA avista estrela idosa e metamorfósica

Usando o ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array), uma equipe internacional de astrônomos captou o momento exato em que uma estrela antiga começa a alterar o seu ambiente.


© ESO/ALMA (sistema W43A)

A imagem acima mostra o velho sistema W43A. A alta velocidade dos jatos bipolares ejetados da estrela antiga central podem ser vistos em azul, os fluxos de baixa velocidade têm cor verde e as nuvens poeirentas incorporadas pelos jatos estão a laranja.

A estrela ejetou jatos velozes e bipolares de gás que estão agora colidindo com o material circundante; a idade estimada do jato observado corresponde a menos de 60 anos. Estas são características fundamentais para entender como são produzidas as formas complexas das nebulosas planetárias.

As estrelas parecidas com o Sol evoluem para gigantes vermelhas e inchadas na fase final das suas vidas. Aí, a estrela expele gás para formar um remanescente chamado nebulosa planetária. Existe uma grande variedade nas formas das nebulosas planetárias; algumas são esféricas, mas outras são bipolares ou apresentam estruturas complicadas. Os astrônomos estão interessados nas origens desta variedade, mas a poeira e o gás espesso expelidos por uma estrela velha obscura o sistema e dificultam a análise do funcionamento interno do processo.

Para resolver este problema, uma equipe de astrônomos liderada por Daniel Tafoya da Universidade de Tecnologia de Chalmers, Suécia, apontou o ALMA para W43A, um antigo sistema estelar na direção da constelação de Águia.

Graças à alta resolução do ALMA, foi obtida uma visão muito detalhada do espaço em torno de W43A. A equipe descobriu que a velocidade dos jatos é tão alta quanto 175 km/s, o que é muito maior do que as estimativas anteriores. Com base nesta velocidade e no tamanho dos jatos, foi calculada a idade dos jatos como sendo inferior ao tempo de vida do ser humano.

"Considerando a juventude dos jatos em comparação com a vida útil de uma estrela, é seguro dizer que estamos testemunhando o 'momento exato' em que os jatos começaram a empurrar o gás circundante," explica Tafoya.

Realmente, a imagem do ALMA mapeia claramente a distribuição de nuvens empoeiradas incorporadas pelos jatos, o que é uma evidência reveladora de que está impactando o ambiente.

A equipe assume que esta incorporação é a chave para produzir uma nebulosa planetária de forma bipolar. No seu cenário, a estrela idosa originalmente ejeta gás esfericamente e o núcleo da estrela perde o seu invólucro. Se a estrela tiver uma companheira, o seu gás é "derramado" para o núcleo da estrela moribunda e uma porção deste novo gás forma os jatos. Portanto, ter ou não uma companheira é um fator importante para determinar a estrutura da nebulosa planetária resultante.

Algumas estrelas antigas mostram emissões de rádio características das moléculas de água. Supõe-se que manchas destas emissões de água indicam a região da interface entre os jatos e o material circundante. Isto é denominado "fontes de água" e pode ser um sinal de que a fonte central é um sistema binário que lança um novo jato.

Existem apenas 15 objetos 'fonte de água' identificados até ao momento, apesar de existirem mais de 100 bilhões de estrelas na nossa Via Láctea. Isto porque provavelmente a vida útil dos jatos é bastante curta, de modo que temos muita sorte em observar objetos tão raros.

O estudo foi publicado na revista The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: National Radio Astronomy Observatory

domingo, 8 de março de 2020

Um "Jekyll e Hyde" cósmico

De acordo com observações do Observatório de raios X Chandra da NASA e do VLA (Karl F. Jansky Very Large Array) da NSF (National Science Foundation), um sistema estelar binário tem vindo a alternar entre dois alter-egos.


© Hubble (Terzan 5)

Usando quase uma década e meia de dados do Chandra, os pesquisadores notaram que um par estelar se comporta como um tipo de objeto antes de mudar a sua identidade e depois regressa ao seu estado original ao fim de alguns anos. Este é um exemplo raro de um sistema estelar que altera o seu comportamento desta maneira.

Os astrônomos encontraram esta volátil estrela dupla, ou sistema binário, numa densa coleção de estrelas, o aglomerado globular Terzan 5, localizado a mais ou menos 20.000 anos-luz da Terra, na Via Láctea. Esta dupla estelar, conhecida como Terzan 5 CX1, tem uma estrela de nêutrons (o remanescente extremamente denso deixado para trás por uma explosão de supernova) em órbita íntima com uma estrela semelhante ao Sol, mas com menos massa.

Em sistemas binários como Terzan 5 CX1, a estrela de nêutrons mais pesada puxa o material da companheira de massa inferior para um disco circundante. Os astrônomos podem detetar estes denominados discos de acreção graças à sua brilhante radiação em raios X e referem-se a estes objetos como "binários de raios X de baixa massa."

O material giratório no disco cai sobre a superfície da estrela de nêutrons, acelerando a sua rotação. A estrela de nêutrons pode girar cada vez mais depressa até que a esfera com aproximadamente 16 km de diâmetro, com mais massa do que o Sol, gira centenas de vezes por segundo. Eventualmente, a transferência de matéria diminui e o material restante é varrido pelo campo magnético giratório da estrela de nêutrons, que se torna num pulsar de milissegundo. Os astrônomos detectam pulsos de ondas de rádio destes pulsares de milissegundo enquanto o feixe de ondas de rádio da estrela de nêutrons aponta para a Terra durante cada rotação.



© Chandra (Terzan 5 em raios X)

Embora os cientistas esperem que a evolução completa de um binário de raios X de baixa massa para um pulsar de milissegundo ocorra ao longo de vários bilhões de anos, existe um período de tempo em que o sistema pode alternar rapidamente entre estes dois estados. As observações de Terzan 5 CX1 pelo Chandra mostram que estava agindo como um binário de raios X de baixa massa em 2003, porque era mais brilhante em raios X do que qualquer uma das dezenas de outras fontes no aglomerado globular. Isto era um sinal de que a estrela de nêutrons provavelmente estava acumulando matéria.

Nos dados do Chandra obtidos de 2009 a 2014, Terzan 5 CX1 havia se tornado cerca de dez vezes mais fraco em raios X. Os astrônomos também o detectaram como uma fonte de rádio com o VLA em 2012 e 2014. A quantidade de emissão de rádio e raios X e os espectros correspondentes (a quantidade de emissão em diferentes comprimentos de onda) concordam com as expectativas de um pulsar de milissegundo. Embora os dados rádio usados não permitam uma busca por pulsos de milissegundo, estes resultados implicam que Terzan 5 CX1 passou por uma transformação, passando a comportar-se como um pulsar de milissegundo e que estava ejetando material. Quando o Chandra observou Terzan 5 CX1 novamente em 2016, tornou-se mais brilhante em raios X e voltou a agir novamente como um binário de raios X de baixa massa.

Para confirmar este padrão de comportamento "Jekyll e Hyde", os astrônomos precisam de detectar pulsos de rádio enquanto Terzan 5 CX1 é fraco em termos de raios X. Estão planejadas mais observações no rádio e em raios X para procurar este comportamento, além de pesquisas sensíveis de pulsos nos dados existentes. Apenas se conhecem três exemplos confirmados destes sistemas que mudam de identidade, o primeiro descoberto em 2013 usando o Chandra e vários outros telescópios de raios X e rádio.

O estudo do binário "Jekyll e Hyde" foi liderado por Arash Bahramian do ICRAR (International Center for Radio Astronomy Research), Austrália, e publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Dois outros estudos recentes usaram observações de Terzan 5 pelo Chandra para estudar como as estrelas de nêutrons de dois diferentes binários de raios X de baixa massa se recuperam depois de terem recebido grandes quantidades de material despejado na superfície por uma estrela companheira. Tais estudos são importantes para entender a estrutura da camada externa de uma estrela de nêutrons, conhecida como crosta.

Num destes estudos, o do binário de raios X de baixa massa Swift J174805.3–244637 (T5 X-3 para abreviar), o material despejado na estrela de nêutrons durante uma explosão de raios X detectada em 2012 pelo Chandra aqueceu a crosta da estrela. A crosta da estrela de nêutrons então arrefeceu, levando cerca de cem dias para voltar à temperatura observada antes da explosão. O ritmo de arrefecimento está de acordo com um modelo de computador deste processo.

Num estudo separado de outro binário de raios X de baixa massa em Terzan 5, IGR J17480–2446 (T5 X-2 para abreviar), a estrela de nêutrons ainda estava arrefecendo quando a sua temperatura foi registada cinco anos e meio depois de ter ocorrido um surto. Estes resultados mostram que a capacidade da crosta desta estrela de nêutrons em transferir ou conduzir calor pode ser menor do que a que os astrônomos encontraram em outras estrelas de nêutrons arrefecendo ou em binários de raios X de baixa massa. Esta diferença na capacidade de conduzir calor pode estar relacionada com o fato de T5 X-2 ter um campo magnético maior em comparação com outras estrelas de nêutrons em arrefecimento, ou ser muito mais jovem do que T5 X-3.

O trabalho sobre a estrela de nêutrons de arrefecimento rápido e lento foram publicados na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

O estudo do binário foi publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics

Descoberta explosão recorde por buraco negro

Foi encontrada a maior explosão já vista no Universo. Esta gigantesca erupção recorde veio de um buraco negro num distante aglomerado de galáxias a centenas de milhões de anos-luz de distância.


© Chandra/XMM-Newton/MWA/GMRT (erupção desencadeada por um buraco negro)

"De certa forma, esta explosão é semelhante ao modo como a erupção do Monte Santa Helena em 1980 destruiu o topo da montanha," disse Simona Giacintucci do Naval Research Laboratory em Washington, EUA, autora principal do estudo. "Uma diferença fundamental é que podíamos colocar quinze Vias Lácteas seguidas na cratera criada pela erupção que perfurou o gás quente do aglomerado."

Os astrônomos fizeram esta descoberta usando dados de raios X do Observatório Chandra da NASA, do XMM-Newton da ESA, e dados rádio do MWA (Murchison Widefield Array) na Austrália e do GMRT (Giant Metrewave Radio Telescope) na Índia.

A incomparável explosão foi detectada no aglomerado de galáxias de Ofiúco, que fica a cerca de 390 milhões de anos-luz da Terra. Os aglomerados de galáxias são as maiores estruturas do Universo mantidas juntas pela gravidade, contendo milhares de galáxias individuais, matéria escura e gás quente.

No centro do aglomerado de galáxias de Ofiúco, existe uma grande galáxia que contém um buraco negro supermassivo. Os cientistas pensam que a fonte da erupção gigantesca é este buraco negro.

Embora os buracos negros sejam famosos por puxar material na sua direção, normalmente expelem quantidades prodigiosas de material e energia. Isto ocorre quando a matéria que cai em direção ao buraco negro é redirecionada para jatos, ou feixes, expelidos para o espaço e que chocam com qualquer material circundante.

As observações do Chandra relatadas em 2016 revelaram pela primeira vez pistas da explosão gigante no aglomerado de galáxias de Ofiúco. Norbert Werner e colegas divulgaram a descoberta de uma incomum borda curva na imagem do aglomerado pelo Chandra. Consideraram se isso representava parte da parede de uma cavidade no gás quente criado pelos jatos do buraco negro supermassivo. No entanto, descartaram esta possibilidade, em parte porque seria necessária uma quantidade enorme de energia para o buraco negro criar uma cavidade tão grande.

O estudo mais recente por Giacintucci e colegas mostra que ocorreu uma enorme explosão. Primeiro, mostraram que a aresta curva também é detectada pelo XMM-Newton, confirmando a observação do Chandra. O seu avanço crucial foi a utilização de novos dados de rádio do MWA e do arquivo do GMRT para mostrar que a orla curva faz realmente parte da parede de uma cavidade, porque faz fronteira com uma região cheia de emissão de rádio. Esta emissão é de elétrons acelerados até quase à velocidade da luz. A aceleração provavelmente teve origem no buraco negro supermassivo.

A quantidade de energia necessária para criar a cavidade em Ofiúco é cerca de cinco vezes maior que o recordista anterior, MS 0735+74, e centenas de milhares de vezes maior que os aglomerados típicos.

A erupção do buraco negro deve ter terminado porque os cientistas não vêm nenhuma evidência de jatos atuais nos dados de rádio. Este desligar pode ser explicado pelos dados do Chandra, que mostram que o gás mais denso e mais frio visto em raios X está atualmente localizado numa posição diferente da galáxia central. Se este gás se tiver afastado da galáxia, terá privado o buraco negro de combustível para o seu crescimento, desligando os jatos.

Este deslocamento de gás é provavelmente provocado pela agitação do gás em torno do meio do aglomerado, como vinho num copo. Normalmente, a fusão de dois aglomerado de galáxias desencadeia tal agitação, mas aqui pode ter sido deflagrada pela erupção.

Um enigma é que apenas é vista uma região gigante de emissão de rádio, pois estes sistemas geralmente contêm duas em lados opostos do buraco negro. É possível que o gás do outro lado da cavidade do aglomerado seja menos denso, de modo que as emissões de rádio desvaneceram mais rapidamente.

O artigo que descreve estes resultados foi publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics

quinta-feira, 5 de março de 2020

O impacto das constelações de satélites nas observações astronômicas

Astrônomos recentemente levantaram preocupações sobre o impacto das mega-constelações de satélites na pesquisa científica. 


© ESO (áreas do céu mais afetadas pelas constelações de satélites)

Para entender melhor o efeito que estes satélites podem ter sobre as observações astronômicas, o ESO encomendou um estudo científico sobre o seu impacto, focado nas observações obtidas com os telescópios do ESO que operam no visível e no infravermelho, mas que também leva em conta outros observatórios. O estudo considera um total de 18 constelações representativas de satélites, em desenvolvimento pela SpaceX, Amazon, OneWeb, entre outras, num total de 26 mil de satélites.

O estudo mostra que os grandes telescópios, como o Very Large Telescope (VLT) do ESO e o futuro Extremely Large Telescope (ELT) também do ESO serão “moderadamente afetados” por estas constelações de satélites em desenvolvimento. O efeito é mais pronunciado no caso de longas exposições (de cerca de 1.000 segundos), sendo que podem ser afetadas até 3% destas exposições obtidas durante o crepúsculo (tanto durante a madrugada como ao cair da noite). As exposições mais curtas serão menos afetadas, com menos de 0,5% das observações deste tipo. Observações realizadas em outros horários durante a noite também seriam menos afetadas, pois os satélites ficariam na sombra da Terra e, portanto, não seriam iluminados. Dependendo do caso científico, os impactos podem ser reduzidos com alterações nos horários de operação dos telescópios do ESO, embora estas alterações tenham um custo. Do lado da indústria, um passo importante e eficaz para atenuar estes impactos passaria por escurecer os satélites.

O estudo também mostrou que o maior impacto seria em pesquisas de campo amplo, em particular aquelas realizadas com grandes telescópios. Por exemplo, até 30% a 50% das exposições do Observatório Vera C. Rubin, que não é uma infraestrutura do ESO, mas sim da Fundação Nacional de Ciência do EUA, seria “severamente afetada”, dependendo da época do ano, da noite e das condições simplificados deste estudo. Técnicas de mitigação que poderiam ser aplicadas aos telescópios do ESO não funcionariam para este observatório, embora outras estratégias estejam sendo ativamente exploradas. São necessários estudos adicionais para compreender completamente as implicações científicas desta perda de dados observacionais e de complexidade na sua análise. 

Telescópios de rastreio de campo amplo como o Observatório Rubin podem mapear rapidamente grandes áreas do céu, tornando-os indispensáveis para descobrir fenômenos de curta duração como supernovas e asteroides potencialmente perigosos. Devido à sua capacidade única para gerar enormes quantidades de dados e descobrir alvos de observação para muitos outros observatórios, as comunidades astronômicas e agências de financiamento da Europa e em outros lugares classificaram os telescópios de rastreio de campo amplo como uma prioridade para desenvolvimentos futuros na astronomia.

Astrônomos profissionais e amadores também levantaram preocupações sobre como as mega-constelações de satélites poderiam ter um impacto nas condições límpidas do céu noturno. O estudo mostra que cerca de 1.600 satélites destas constelações se encontrarão acima do horizonte de um observatório situado a meia latitude, a maioria dos quais estará baixo no céu, em um intervalo de 30º acima do horizonte. Acima deste valor, na parte do céu onde é feita a maioria das observações astronômicas, haverá sempre cerca de 250 satélites independentemente da hora. Apesar de estarem todos iluminados ao nascer e ao pôr do Sol, os satélites começam a entrar na sombra da Terra à medida que a noite avança. O estudo do ESO pressupõe um determinado brilho para todos estes satélites. Com esta pressuposição, até cerca de 100 satélites poderão ser suficientemente brilhantes para se verem a olho nu durante as horas do crepúsculo, com cerca de 10 acima dos 30º de elevação. Todos este números diminuem quando a noite avança, tornando-se mais escura, e os satélites passam para a sombra da Terra. No geral, estas novas constelações de satélites irão duplicar o número de satélites visíveis a olho nu no céu noturno acima dos 30º de elevação. 

Estima-se que cerca de 34.000 objetos com dimensões maiores que 10 cm se encontrem atualmente em órbita terrestre. Destes, cerca de 5.500 são satélites, incluindo 2.300 em funcionamento. O restante é lixo espacial, incluindo partes superiores de foguetes e adaptadores de lançadores de satélites. Cerca de 2.000 destes objetos estão sempre acima do horizonte, independentemente de tempo e local. Durante as horas do crepúsculo, cerca de 5 a 10 deles se encontram iluminados pelo Sol e suficientemente brilhantes para serem vistos a olho nu. 

Estes números não incluem os trens de satélites visíveis logo após o seu lançamento. Apesar de brilhantes e bastante espetaculares, estes rastros são de curta duração e visíveis apenas depois do pôr ou antes do nascer do Sol e, em qualquer momento, apenas a partir de uma área muito limitada da superfície terrestre. O estudo do ESO usa simplificações e suposições para obter estimativas conservadoras dos efeitos, os quais podem ser na realidade menores do que o calculado. Modelos mais sofisticados serão necessários para quantificar mais precisamente os impactos atuais. Apesar do estudo focar nos telescópios do ESO, estes resultados se aplicam igualmente a telescópios semelhantes que, não sendo do ESO, operam também no visível e infravermelho, com instrumentos e casos científicos semelhantes. 

As constelações de satélites terão também impacto nos observatórios que operam no rádio, no milimétrico e no submilimétrico, incluindo o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) e o Atacama Pathfinder Experiment (APEX). Este impacto será considerado em estudos futuros. 

O ESO, juntamente com outros observatórios, a União Astronômica Internacional (IAU), a Sociedade Astronômica Americana (ASS), a Sociedade Astronômica Real do Reino Unido (RAS) e outras sociedades, está tomando medidas para sensibilizar o público sobre este assunto em fóruns globais tais como o Comitê das Nações Unidas para o Uso Pacífico do Espaço Sideral (COPUOS) e o Comitê Europeu de Frequências Rádio em Astronomia (CRAF). Ao mesmo tempo, e em conjunto com as companhias ligadas ao espaço, estão sendo exploradas soluções práticas que possam salvaguardar os investimentos em larga escala feitos em infraestruturas de astronomia terrestre de última geração. O ESO apoia o desenvolvimento de estruturas regulatórias que garantirão a coexistência harmoniosa de avanços tecnológicos altamente promissores em baixa órbita terrestre com as condições que permitem à humanidade continuar sua observação e compreensão do Universo. 

O estudo foi aceito para publicação no periódico Astronomy & Astrophysics

Fonte: ESO

domingo, 1 de março de 2020

Revelada proeminência gigante de estrela minúscula

Uma estrela com cerca de oito por cento da massa do Sol foi apanhada emitindo uma enorme "super-proeminência" de raios X, uma dramática erupção altamente energética que representa um problema fundamental para os astrônomos, que não consideravam ser possível em estrelas tão pequenas.


© ESA (ilustração de uma estrela anã L)

A estrela, conhecida como J0331-27, é uma anã L. É uma estrela com tão pouca massa que está apenas acima do limite do que constitui uma estrela. Se tivesse menos massa, não possuiria as condições internas necessárias para gerar a sua própria energia.

Os astrônomos descobriram a enorme proeminência de raios X em dados registados no dia 5 de julho de 2008 pelo instrumento EPIC (European Photon Imaging Camera) a bordo do observatório de raios X XMM-Newton da ESA. Em questão de minutos, a pequena estrela liberou mais de dez vezes mais energia do que as proeminências mais intensas do Sol.

As proeminências estelares são lançadas quando o campo magnético na atmosfera de uma estrela se torna instável e colapsa numa configuração mais simples. No processo, libera uma grande proporção da energia aí armazenada.

Esta liberação explosiva de energia cria um brilho repentino, a proeminência, e é aqui que as novas observações apresentam o seu maior quebra-cabeças.

A energia só pode ser colocada no campo magnético de uma estrela por partículas carregadas, também conhecidas como material ionizado e criadas em ambientes de alta temperatura. No entanto, sendo uma anã L, a J0331-27 tem uma temperatura superficial baixa para uma estrela, apenas 2.100K em comparação com os cerca de 6.000K do Sol. Os astrônomos não pensavam que uma temperatura tão baixa pudesse ser capaz de gerar partículas carregadas suficientes para alimentar tanta energia no campo magnético. Portanto, o enigma é: como é que é possível uma super-proeminência numa estrela tão pequena?

A super-proeminência foi descoberta em dados de arquivo do XMM-Newton como parte de um grande projeto de investigação liderado por Andrea De Luca do INAF - Instituto de Astrofísica Espacial e Física Cósmica em Milão, Itália. O projeto estudou a variabilidade temporal de aproximadamente 400.000 fontes detectadas pelo XMM-Newton ao longo de 13 anos.

Andrea e colaboradores procuravam, em particular, fenômenos peculiares e com J0331-27 certamente conseguiram isso. Várias estrelas semelhantes já tinham sido observadas emitindo super-proeminências na parte visível do espetro, mas esta é a primeira detecção inequívoca de uma erupção deste tipo em raios X.

O comprimento de onda é importante porque assinala de que parte da atmosfera a super-proeminência vem: a luz óptica vem de mais profundamente na atmosfera da estrela, perto da sua superfície visível, ao passo que os raios X vêm de mais alto na atmosfera.

A compreensão das semelhanças e diferenças entre esta nova, e até agora única, super-proeminência na anã L e as proeminências anteriormente observadas, detectadas em todos os comprimentos de onda em estrelas de maior massa, é agora uma prioridade para a equipe. Mas para alcançar isso, precisam de encontrar mais exemplos.

Uma pista que efetivamente possuem é que existe apenas uma proeminência de J0331-27 nos dados, apesar do XMM-Newton ter observado a estrela por um total de cerca de 40 dias. Isto é peculiar porque outras estrelas flamejantes tendem a sofrer de vários surtos menores.

Os dados parecem sugerir que uma anã L leva mais tempo para acumular energia, de modo que há uma grande liberação repentina.

As estrelas com proeminências mais frequentes liberam menos energia de cada vez, enquanto esta anã L parece liberar energia muito raramente, mas num evento realmente grande. Porque é que isto pode ser o caso, ainda é uma questão em aberto que precisa de mais investigação.

Um artigo foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics.

Fonte: ESA