sábado, 6 de março de 2021

Estrelas velhas podem servir como nova "régua" cósmica

Apesar de um século de medições, os astrônomos não conseguem concordar no valor da expansão do Universo.

© Martin Pugh (R Leropis)

Uma técnica que se baseia na medição de distâncias a um tipo específico de estrela velha em outras galáxias, chamado método JAGB (J-region Asymptotic Giant Branch), pode ajudar.

A estrela brilhante e alaranjada, R Leropis, visível no centro, é um exemplo de um tipo de estrelas localizada na região-J do ramo assintótico das gigantes. A cor impressionante vem das grandes quantidades de carbono na atmosfera.

A astrofísica e estudante da Universidade de Chicago, Abigail Lee, analisou observações da luz de uma galáxia próxima para validar o método JAGB para medir distâncias cósmicas. Esta nova técnica permitirá futuras medições independentes de distância que podem ajudar a responder a uma das maiores questões pendentes da cosmologia: quão depressa está o Universo se expandindo? 

"Uma das questões mais interessantes da cosmologia hoje é se há uma nova física em falta no nosso entendimento atual de como o Universo está evoluindo. Uma discrepância atual na medição da constante de Hubble pode estar sinalizando uma nova propriedade física do Universo ou incertezas não reconhecidas de medição," disse Wendy L. Freedman, professora de astronomia e astrofísica na mesma universidade. Existem poucos métodos para medir distâncias que podem fornecer a precisão necessária.

Em 1920, Edwin Hubble notou pela primeira vez a relação entre a distância de uma galáxia e quão depressa estava se afastando de nós. Este valor, agora conhecido como constante de Hubble, é um parâmetro chave dos modelos cosmológicos. Hubble primeiro mediu esta constante comparando medições de distâncias galácticas e velocidades derivadas de um tipo específico de estrela que pulsa regularmente. 

As medições, usando métodos diretos como o de Hubble, melhoraram muito ao longo das décadas, mas não concordam com os métodos que extrapolam a partir da radiação cósmica de fundo em micro-ondas, a radiação remanescente do Universo muito primitivo. Esta discordância é chamada de tensão de Hubble e é uma das questões mais proeminentes da cosmologia moderna. 

Um método de medição independente pode ajudar a preencher a lacuna entre os métodos e levar a um valor mais decisivo da constante de Hubble medida diretamente das distâncias. É aqui que entra o método JAGB. As estrelas na região-J do ramo assintótico das gigantes são um tipo específico de gigantes velhas que contêm uma quantidade substancial de carbono nas suas atmosferas e que é trazido para a superfície por correntes de convecção, dando-lhes uma cor e brilho muito distintos que permite que sejam identificadas num determinado conjunto de estrelas numa galáxia.

Foi observado empiricamente que estas estrelas têm um brilho intrínseco conhecido de galáxia para galáxia. Isto torna-as grandes candidatas de velas padrão. Sabendo que o brilho aparente de uma estrela depende tanto da distância ao observador como do seu brilho intrínseco, se for conhecido este brilho intrínseco de uma estrela, é possível inferir a sua distância. 

A equipe selecionou uma galáxia na periferia do grupo galáctico mais próximo, chamada WLM (Wolf–Lundmark–Melotte), e usou dados obtidos de observações com os telescópios Magellan no Observatório Las Campanas no Chile. 

Usando um único objeto como alvo e aplicando quatro métodos diferentes e independentes de medição, a equipe pôde comparar a exatidão e a precisão do método JAGB com os métodos estabelecidos anteriormente. Depois de analisarem dados de quatro maneiras diferentes, as pesquisadoras determinaram que o método JAGB não é apenas uma verificação independente de outros métodos de medição de distâncias, mas que requer menos tempo de observação. 

Considerando que as estrelas JAGB são mais brilhantes do que as estrelas usadas em outras medições de distância, também podem ser observadas mais longe, o que permitirá calibrações mais distantes do que é possível com os outros métodos. Além disso, as estrelas JAGB podem ser encontradas em todos os tipos de galáxias, ao contrário das estrelas pulsantes usadas por Edwin Hubble, que se encontram apenas no subconjunto mais limitado de galáxias espirais e sofrem frequentemente de aglomeração e interferência significativa da poeira.

"Idealmente, vamos obter tempo de observação com o telescópio espacial James Webb e com o telescópio espacial Hubble para usar este método e medir distâncias a galáxias que hospedam supernovas do Tipo Ia," disse Lee. 

As supernovas do Tipo Ia são usadas para medir galáxias mais distantes, mas precisam de ser calibradas por medições de distâncias inferiores usando técnicas como o método JAGB. "Assim que fizermos isto, podemos não apenas medir a constante de Hubble, mas também comparar estes vários métodos de distância para ver se há problemas com algum deles." 

Se este novo valor independente para a constante de Hubble concordar com outros métodos de medição direta ou com medições do Universo inicial, irá lançar luz sobre esta questão que há muito intriga os astrônomos e cosmólogos.

"Não temos uma compreensão firme do valor da constante de Hubble, de modo que este trabalho é realmente importante para ajudar a resolver, de momento, aquilo que é um dos maiores problemas da cosmologia," conclui Lee.

Fonte: University of Chicago

quarta-feira, 3 de março de 2021

Os buracos negros supermassivos são formados de matéria escura?

Um novo estudo teórico propôs um curioso mecanismo para a criação de buracos negros supermassivos a partir de matéria escura.

© ESO/L. Calçada (galáxia espiral num halo de matéria escura)

A equipe internacional descobriu que, em vez dos cenários de formação convencionais envolvendo matéria "normal", os buracos negros supermassivos poderiam ao invés formar-se diretamente a partir de matéria escura em regiões de alta densidade no centro das galáxias.

O resultado tem implicações importantes para a cosmologia no início do Universo. Exatamente como os buracos negros supermassivos se formaram inicialmente é um dos maiores problemas de hoje no estudo da evolução galáctica. Os buracos negros supermassivos foram observados 800 milhões de anos após o Big Bang, e permanece inexplicável como podem ter crescido tão depressa.

Os modelos de formação padrão envolvem matéria bariônica normal, ou seja, os átomos e os elementos que compõem as estrelas, planetas e todos os objetos visíveis, colapsando sob a gravidade para formar buracos negros, que então crescem com o tempo.

No entanto, o novo trabalho investiga a existência potencial de núcleos galácticos estáveis feitos de matéria escura e rodeados por um halo de matéria escura diluída, descobrindo que os centros destas estruturas podem tornar-se tão concentrados que também podem colapsar em buracos negros supermassivos, assim que é atingido um limite crítico. 

De acordo com o modelo, isto poderia ter acontecido muito mais depressa do que outros mecanismos de formação propostos e teria permitido que os buracos negros supermassivos no início do Universo se formassem antes das galáxias que habitam, ao contrário da compreensão atual. 

Carlos R. Argüelles, o pesquiador da Universidade Nacional de La Plata e do ICRANet (International Center for Relativistic Astrophysics Network) que liderou a pesquisa, comenta: "Este novo cenário de formação pode fornecer uma explicação natural para como os buracos negros supermassivos se formaram no início do Universo, sem exigir a formação prévia de estrelas ou a necessidade de invocar 'sementes' de buracos negros com ritmos de acreção irrealistas." 

Outra consequência intrigante do novo modelo é que a massa crítica para o colapso num buraco negro pode não ser alcançada para halos menores de matéria escura, por exemplo aqueles que rodeiam algumas galáxias anãs. Os autores sugerem que isso pode deixar as galáxias anãs menores com um núcleo central de matéria escura em vez do esperado buraco negro. Este núcleo de matéria escura ainda poderia imitar as assinaturas gravitacionais de um buraco negro central convencional, enquanto o halo externo de matéria escura também poderia explicar as curvas de rotação observadas da galáxia.

"Este modelo mostra como os halos de matéria escura podem abrigar densas concentrações nos seus centros, o que pode desempenhar um papel crucial para ajudar a entender a formação de buracos negros supermassivos," acrescentou Carlos. 

Isto prova pela primeira vez que estas distribuições de matéria escura de núcleo-halo podem, realmente, se formar numa estrutura cosmológica e permanecer estáveis por toda a vida do Universo.

Os autores esperam que mais estudos esclareçam a formação de buracos negros supermassivos nos primeiros dias do nosso Universo, bem como investiguem se os centros de galáxias não ativas, incluindo a Via Láctea, podem hospedar estes densos núcleos de matéria escura.

O resultado foi publicado na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Royal Astronomical Society

terça-feira, 2 de março de 2021

Descoberto o maior aglomerado de galáxias do Universo primitivo

Um estudo, liderado por pesquisadores do IAC (Instituto de Astrofísica de Canarias) e realizado com o OSIRIS, um instrumento acoplado ao GTC (Gran Telescopio Canarias), descobriu o aglomerado de galáxias em formação mais densamente povoado do Universo primitivo.

© NASA/ESA/IAC (aglomerado de galáxias em formação)

Os círculos indicam os novos membros descobertos com o GTC; 4 deles são mostrados em detalhe.

Os pesquisadores preveem que esta estrutura, que fica a 12,5 bilhões de anos-luz, terá evoluído para se tornar um aglomerado semelhante ao de Virgem, vizinho do Grupo Local de galáxias ao qual pertence a Via Láctea. 

Os aglomerados de galáxias são grupos de galáxias que permanecem juntas devido à ação da gravidade. Para entender a evolução destes agrupamentos de galáxias, os cientistas procuram estruturas em formação, os chamados protoaglomerados galácticos, no início do Universo. 

Em 2012, astrônomos fizeram uma determinação precisa da distância da galáxia HDF850.1, conhecida como uma das galáxias com o maior ritmo de formação estelar no Universo observável. Para sua surpresa, os cientistas também descobriram que esta galáxia, que fica numa das regiões mais estudadas do céu conhecida como HDF/GOODS-North, faz parte de um grupo de mais ou menos uma dúzia de protogaláxias que se formaram durante os primeiros bilhões de anos da história cósmica. 

Antes da sua descoberta, apenas era conhecido um outro grupo primordial semelhante. Agora, graças a uma nova pesquisa com o instrumento OSIRIS do GTC, a equipe mostrou que é uma das regiões mais densamente povoadas de galáxias no Universo primitivo e, pela primeira vez, realizaram um estudo detalhado das propriedades físicas deste sistema.

Surpreendentemente, descobrimos que todos os membros do aglomerado estudado até agora, cerca de duas dúzias, são galáxias com formação estelar normal, e que a galáxia central parece dominar a produção de estrelas nesta estrutura. 

Este estudo recente mostra que este aglomerado de galáxias em formação é formado por vários componentes, ou "zonas" com diferenças em termos de evolução. Os astrônomos preveem que esta estrutura mudará gradualmente até se tornar um aglomerado de galáxias semelhante ao de Virgem, a região central do superaglomerado com o mesmo nome onde está situado o Grupo Local de galáxias ao qual a Via Láctea pertence.

A distância medida a estas fontes estudadas concorda perfeitamente com as previsões baseadas em observações fotométricas feitas anteriormente no GTC por Pablo Arrabal Haro, ex-aluno de doutoramento no IAC, orientado por José Miguel Rodríguez Espinosa, pesquisador do IAC e secretário-geral adjunto da União Astronômica Internacional. Arrabal desenvolveu um método para selecionar galáxias com ritmos normais de formação estelar, baseado no levantamento fotométrico SHARDS (Survey for High-z Absorption Red and Dead Sources), um Grande Programa do ESO realizado no GTC.

O estudo foi publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Instituto de Astrofísica de Canarias

sábado, 27 de fevereiro de 2021

A Via Láctea pode estar repleta de planetas parecidos com a Terra

De acordo com um novo estudo da Universidade de Copenhague, a Terra, Vênus e Marte foram formados a partir de pequenas partículas de poeira contendo gelo e carbono.

© STScI/G. Bacon (ilustração de inúmeros planetas parecidos com a Terra na Via Láctea)

A descoberta abre a possibilidade de que a Via Láctea está repleta de planetas aquáticos. Os astrônomos há muito tempo que olham para o vasto Universo na esperança de descobrir civilizações alienígenas. Mas para um planeta ter vida como a conhecemos, a água líquida tem que estar presente. 

As chances de se descobrir um tal cenário pareciam impossíveis de calcular porque a suposição tem sido a de que os planetas como a Terra obtêm a sua água por acaso, quando asteroides grandes e gelados atingem o planeta. 

Agora, pesquisadores do Instituto GLOBE da Universidade de Copenhague divulgaram um estudo revelador, indicando que a água pode estar presente durante a própria formação de um planeta. Segundo os cálculos do estudo, isto é verdade para a Terra, Vênus e Marte.

"Todos os nossos dados sugerem que a água fez parte dos blocos de construção da Terra desde o início. E como a molécula de água ocorre com frequência, há uma probabilidade razoável de que se aplique a todos os planetas na Via Láctea. O ponto decisivo para saber se a água líquida está presente é a distância do planeta à sua estrela," diz o professor Anders Johansen, do Centro para Formação Estelar e Planetária. 

Será que todos os planetas são formados por gelo? Usando um modelo de computador, Anders Johansen e a sua equipe calcularam a rapidez com que os planetas são formados, e a partir de quais blocos de construção. O estudo indica que foram as partículas milimétricas de poeira de gelo e carbono, que orbitam em torno de todas as estrelas jovens da Via Láctea, que há 4,5 bilhões de anos atrás se acumularam na formação do que mais tarde se tornaria a Terra.

 Até ao ponto em que a proto-Terra tinha 1% da sua massa atual, o nosso planeta cresceu capturando massas de seixos repletos de gelo e carbono. A Terra então cresceu cada vez mais depressa até que, após cinco milhões de anos, se tornou tão grande quanto a conhecemos hoje. Ao longo do caminho, a temperatura à superfície subiu drasticamente, fazendo com que o gelo nos seixos evaporasse no caminho para a superfície, de modo que hoje apenas 0,1% do planeta é constituído por água, embora 70% da superfície da Terra esteja coberta por água. 

A teoria, chamada "acreção de seixos", diz que os planetas são formados por seixos que se aglomeram e que os planetas ficam cada vez maiores. A molécula de água pode ser encontrada em toda a nossa Galáxia e que a teoria, portanto, abre a possibilidade de que outros planetas possam ter sido formados da mesma forma que a Terra, Marte e Vênus.

Todos os planetas na Via Láctea podem ter sido formados pelos mesmos blocos de construção, o que significa que planetas com a mesma quantidade de água e carbono que a Terra ocorrem frequentemente em torno de outras estrelas da nossa Galáxia, desde que a temperatura seja a ideal. 

Caso planetas na Via Láctea tenham os mesmos blocos de construção e as mesmas condições de temperatura que a Terra, também podem haver boas probabilidades de que tenham a mesma quantidade de água e continentes que o nosso planeta. 

Com este modelo, todos os planetas recebem a mesma quantidade de água, e isso sugere que outros planetas podem ter não apenas a mesma quantidade de água e oceanos, mas também a mesma quantidade de continentes como aqui na Terra. Se, por outro lado, a quantidade de água nos planetas fosse aleatória, os planetas poderiam ser muito diferentes. Alguns planetas seriam demasiado secos para desenvolver vida, enquanto outros estariam completamente cobertos por água.

Os novos telescópios são poderosos para buscar exoplanetas, pois usam espectroscopia, o que significa que ao observar o tipo de luz que está sendo absorvida durante a passagem do planeta em frente da sua estrela, é possível ver quanto vapor de água existe. Pode informar mais sobre o número de oceanos neste planeta.

O estudo publicado na revista Science Advances.

Fonte: University of Copenhagen

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021

Estrela de nêutrons reclusa pode ter sido encontrada em supernova

Desde que os astrônomos captaram a explosão brilhante de uma estrela no dia 24 de fevereiro de 1987, que os pesquisadores têm procurado o núcleo estelar esmagado que deveria ter sido deixado para trás.

© Chandra/NuSTAR (estrutura no centro da SN 1987A)

Um grupo de astrônomos, usando dados de missões espaciais da NASA e telescópios terrestres, pode finalmente tê-lo encontrado. Como a primeira supernova visível a olho nu em aproximadamente 400 anos, a supernova 1987A (SN 1987A) gerou grande entusiasmo entre os cientistas e rapidamente se tornou um dos objetos mais estudados do céu.

A supernova está localizada na Grande Nuvem de Magalhães, uma pequena galáxia companheira da Via Láctea, a apenas 170.000 anos-luz da Terra. Enquanto os astrônomos assistiam à explosão de detritos para fora do local de detonação, também procuravam o que deveria ter permanecido do núcleo da estrela: uma estrela de nêutrons.

Dados do observatório de raios X Chandra da NASA e dados anteriormente não publicados do NuSTAR (Nuclear Spectroscopic Telescope Array) da NASA, em combinação com dados do ALMA (Atacama Large Millimeter Array) relatados no ano passado, agora apresentam uma coleção intrigante de evidências para a presença da estrela de nêutrons no centro da SN 1987A.

Quando uma estrela explode, colapsa sobre si própria antes que as camadas externas sejam lançadas para o espaço. A compressão do núcleo torna-o um objeto extraordinariamente denso, com a massa do Sol comprimida num objeto com aproximadamente 16 km de diâmetro. 

Estes objetos foram apelidados de estrelas de nêutrons, porque são compostos quase exclusivamente por nêutrons densamente compactados. São laboratórios de física extrema que não podem ser replicados aqui na Terra. As estrelas de nêutrons com rápida rotação e altamente magnetizadas, chamadas pulsares, produzem um feixe de radiação semelhante a um farol que são detectados como pulsos quando a sua rotação varre o feixe pelo céu. 

Existe um subconjunto de pulsares que produzem ventos das suas superfícies, às vezes quase à velocidade da luz, e que criam estruturas intricadas de partículas carregadas e campos magnéticos conhecidos como "nebulosas de vento pulsar".

Com o Chandra e o NuSTAR, a equipe encontrou raios X de energia relativamente baixa dos detritos de SN 1987A colidindo com o material circundante. Foi também encontrado evidências de partículas altamente energéticas usando a capacidade do NuSTAR em detectar raios X mais energéticos. Existem duas explicações prováveis para esta emissão energética de raios X: ou uma nebulosa de vento de pulsar ou partículas sendo aceleradas a altas energias pela onda de choque da explosão. O último efeito não requer a presença de um pulsar e ocorre a distâncias muito maiores do centro da explosão. 

O estudo mais recente de raios X apoia o caso da nebulosa de vento de pulsar, o que significa que a estrela de nêutrons deve estar lá. Primeiro, o brilho dos raios X mais energéticos permaneceu quase o mesmo entre 2012 e 2014, enquanto a emissão de rádio detectada com o ATCA (Australia Telescope Compact Array) aumentou. Isto vai contra as expetativas para o cenário de onda de choque.

Em seguida, estima-se que levaria quase 400 anos para acelerar os elétrons até às energias mais altas vistas nos dados do NuSTAR, período de tempo mais de 10 vezes superior à idade do remanescente.

Será que ainda não passou tempo suficiente para a formação de um pulsar, ou mesmo se a SN 1987A criou um buraco negro? 

Os dados do Chandra e do NuSTAR também apoiam um resultado de 2020 do ALMA que forneceu possíveis evidências para a estrutura de uma nebulosa de vento de pulsar na faixa de comprimentos de onda milimétricos. Embora esta "bolha" tenha outras potenciais explicações, a sua identificação como uma nebulosa de vento de pulsar poderia ser comprovada com os novos dados de raios X. Esta é mais uma evidência que apoia a ideia de que existe uma estrela de nêutrons deixada para trás. Se isto for realmente um pulsar no centro de SN 1987A, será o mais jovem já encontrado. 

O centro da SN 1987A está rodeado por gás e poeira. Os pesquisadores usaram simulações de última geração para entender como este material absorveria os raios X em diferentes energias, permitindo uma interpretação mais precisa do espectro de raios X, ou seja, a quantidade de raios X em diferentes energias. Isto permite-lhes estimar o aspeto do espectro das regiões centrais de SN 1987A sem o material obscurante. 

Como geralmente acontece, são necessários mais dados para fortalecer o caso da nebulosa de vento de pulsar. Um aumento nas ondas de rádio, acompanhado por um aumento nos raios X altamente energéticos em observações futuras seria um argumento contra esta ideia.

Por outro lado, se os astrônomos observarem uma diminuição nos raios X altamente energéticos, então a presença de uma nebulosa de vento de pulsar será corroborada. Os fragmentos estelares ao redor do pulsar desempenham uma função importante, absorvendo fortemente a sua emissão de raios X de baixa energia, tornando-os atualmente indetectáveis.

O modelo prevê que este material se disperse nos próximos anos, o que reduzirá o seu poder de absorção. Assim, a emissão do pulsar deverá surgir daqui a mais ou menos 10 anos, revelando a existência da estrela de nêutrons. 

Um artigo que descreve estes resultados foi publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics

terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

Cygnus X-1 é mais massivo do que se pensava

Novas observações do primeiro buraco negro já detectado levaram os astrônomos a questionar o que sabem sobre os objetos mais misteriosos do Universo.

© ICRAR (ilustração do sistema Cygnus X-1)

A pesquisa mostra que o sistema conhecido como Cygnus X-1 contém o buraco negro de massa estelar mais massivo já detectado sem a utilização de ondas gravitacionais. 

Cygnus X-1 é um dos buracos negros mais próximos da Terra. Foi descoberto em 1964, quando um par de contadores Geiger foram transportados a bordo de um foguete suborbital lançado a partir do estado norte-americano do Novo México.

O objeto foi o foco de uma famosa aposta científica entre os físicos Stephen Hawking e Kip Thorne, com Hawking apostando em 1974 que não era um buraco negro. Hawking concedeu a aposta em 1990. 

Neste trabalho mais recente, uma equipe internacional de astrônomos usou o VLBA (Very Long Baseline Array), um radiotelescópio do tamanho de um continente composto por 10 antenas espalhadas pelos EUA, juntamente com uma técnica inteligente para medir distâncias no espaço.

"Se pudermos ver o mesmo objeto de locais diferentes, podemos calcular a sua distância medindo como o objeto parece mover-se em relação ao plano de fundo," disse o professor James Miller-Jones da Universidade Curtin e do ICRAR (International Centre for Radio Astronomy Research). Se colocarmos o dedo à frente dos nossos olhos e o observarmos com um olho de cada vez, vamos notar que o dedo parece saltar de posição em relação ao plano de fundo. É exatamente o mesmo princípio.

Ao longo de seis dias foi observada uma órbita completa do buraco negro e usando observações obtidas do mesmo sistema com a mesma rede de telescópios em 2011. Este método e as novas medições mostram que o sistema está mais longe do que se pensava, com um buraco negro que é significativamente mais massivo. 

As estrelas perdem massa para o ambiente circundante por meio de ventos estelares que sopram da sua superfície. Mas para formar um buraco negro assim tão massivo, é preciso diminuir a quantidade de massa que as estrelas brilhantes perdem durante as suas vidas. 

O buraco negro no sistema Cygnus X-1 começou a sua vida como uma estrela com aproximadamente 60 vezes a massa do Sol e colapsou há dezenas de milhares de anos. Incrivelmente, está orbitando a sua estrela companheira, uma supergigante, a cada cinco dias e meio a apenas um-quinto da distância entre a Terra e o Sol.

Estas novas observações dizem-nos que o buraco negro tem mais de 20 vezes a massa do nosso Sol, um aumento de 50% em relação às estimativas anteriores. Usando as medições atualizadas para a massa do buraco negro e a sua distância da Terra, foi possível confirmar que Cygnus X-1 gira incrivelmente depressa, muito perto da velocidade da luz e mais depressa do que qualquer outro buraco negro encontrado até à data.

A pesquisa foi publicada na revista Science.

Fonte: International Centre for Radio Astronomy Research

Um mapa sem precedentes do campo magnético do Sol

Durante décadas após a sua descoberta, os observadores só podiam ver a cromosfera solar por alguns momentos fugazes: durante um eclipse solar total, quando um brilho vermelho rodeava a silhueta da Lua.


© Luc Viatour (cromosfera durante um eclipse solar)

Mais de cem anos depois, a cromosfera continua a ser a mais misteriosa das camadas atmosféricas do Sol. Situada entre a brilhante superfície e a etérea coroa solar, a atmosfera externa do Sol, a cromosfera é um lugar de mudanças rápidas, onde a temperatura aumenta e os campos magnéticos começam a dominar o comportamento do Sol.

Agora, pela primeira vez, três missões da NASA perscrutaram a atmosfera para enviar medições a várias altitudes do seu campo magnético. As observações, captadas por dois satélites e pela missão CLASP2 (Chromospheric Layer Spectropolarimeter 2), a bordo de um pequeno foguete suborbital, ajudam a revelar como os campos magnéticos à superfície do Sol dão origem às erupções brilhantes na sua atmosfera externa.

Um objetivo principal da heliofísica, a ciência da influência do Sol no espaço, incluindo as atmosferas planetárias, é prever o clima espacial, que geralmente começa no Sol, mas pode espalhar-se rapidamente pelo espaço e causar distúrbios perto da Terra.

O que impulsiona estas erupções solares é o campo magnético do Sol, as linhas invisíveis de força que se estendem da superfície solar ao espaço bem para lá da Terra. Este campo magnético é difícil de ver, só pode ser observado indiretamente, pela luz do plasma, ou gás superaquecido, que traça as suas linhas como faróis de carros que viajam numa estrada distante. No entanto, a forma como estas linhas magnéticas se organizam, sejam frouxas e retas ou firmes e emaranhadas, faz toda a diferença entre um Sol silencioso e uma erupção solar. 

Idealmente, os pesquisadores poderiam ler as linhas do campo magnético na coroa, onde ocorrem as erupções solares, mas o plasma é muito esparso para leituras precisas (a coroa é mais de um bilhão de vezes menos densa do que o ar ao nível do mar). Ao invés, os cientistas medem a fotosfera mais densamente compactada, a superfície visível do Sol, duas camadas abaixo. Usam então modelos matemáticos para propagar este campo para cima até à coroa. 

Esta abordagem ignora a medição da cromosfera, que fica entre as duas, na esperança de simular o seu comportamento. Infelizmente, na cromosfera as linhas do campo magnético reorganizam-se de maneiras difíceis de prever. 

Instituições nos EUA, Japão, Espanha e França trabalharam juntas para desenvolver uma nova abordagem para medir o campo magnético da cromosfera, apesar da sua natureza desorganizada. Modificando um instrumento que voou em 2015, acoplaram o seu observatório solar num foguete de sondagem. Este tipo de foguetes é lançado para o espaço para breves pesquisas de alguns minutos antes de cair de volta à Terra. Mais acessíveis e rápidos de construir e voar do que missões com satélites maiores, são também um palco ideal para testar novas ideias e técnicas inovadoras.

Lançado a partir do Campo de Teste de Mísseis de White Sands, no estado norte-americano do Novo México, o foguete atingiu uma altitude de 274 km para uma visão do Sol acima da atmosfera da Terra, que de outra forma bloqueia certos comprimentos de onda da luz.

Enquanto o CLASP2 observava o Sol, o IRIS (Interface Region Imaging Spectrograph) da NASA e o satélite Hinode da JAXA/NASA, ambos observando o Sol a partir de órbita terrestre, ajustaram os seus telescópios para olhar para o mesmo local. Em coordenação, as três missões concentraram-se na mesma parte do Sol, mas perscrutaram profundidades diferentes. O Hinode focou-se na fotosfera, procurando linhas espectrais do ferro neutro aí formado. O CLASP2 visou três alturas diferentes dentro da cromosfera, examinando linhas espectrais do magnésio ionizado e do manganês. Entretanto, o IRIS media as linhas de magnésio em mais alta resolução, para calibrar os dados do CLASP2. Juntas, as missões monitoraram quatro camadas diferentes dentro e ao redor da atmosfera.

O aspeto mais impressionante dos dados foi o quão variada a cromosfera acabou por ser. Tanto ao longo da porção do Sol que foi estudada, quanto a diferentes alturas no seu interior, o campo magnético variou significativamente.

Na superfície do Sol, vemos campos magnéticos que mudam a distâncias curtas: mais acima, essas variações são muito mais difusas. Em alguns lugares, o campo magnético não alcançou todo o caminho até ao ponto mais alto medido, enquanto em outros lugares, ainda estava com força total.

A equipe espera usar esta técnica para medições magnéticas com várias alturas para mapear todo o campo magnético da cromosfera. Isto não apenas ajudaria na capacidade de prever o clima espacial, mas também forneceria informações importantes sobre a atmosfera em torno da nossa estrela. Em vez de apenas medir os campos magnéticos ao longo de uma faixa muito estreita, a equipe quer examiná-los ao longo do alvo e fazer um mapa bidimensional.

Um artigo científico foi publicado na revista Science Advances.

Fonte: National Astronomical Observatory of Japan

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

Voando em asas de formação planetária

Tal como um pássaro em voo, com as asas esticadas no vazio no espaço, a estrela SU Aur, muito mais jovem e mais massiva que o Sol, encontra-se rodeada por um disco gigante de formação planetária.

© ESO/Ginski (estrela SU Aur)

Esta imagem, captada pelo instrumento SPHERE montado no Very Large Telescope (VLT) do ESO, mostra o disco em torno da SU Aur com um detalhe sem precedentes, incluindo as longas correntes de poeira que se encontram ligadas ao disco.

A estrela propriamente dita aparece-nos tapada pelo coronógrafo do instrumento, um dispositivo que bloqueia a luz emitida pela estrela central com o objetivo de podermos observar as estruturas menos brilhantes que a rodeiam.

As correntes de poeira são compostas por material vindo de uma nebulosa que está fluindo para o disco. Esta nebulosa teve muito provavelmente origem numa colisão entre a estrela e uma enorme nuvem de gás e poeira, o que resultou na forma bastante única do disco de formação planetária e na estrutura da poeira circundante.

Um novo estudo da SU Aur, que fez uso do VLT e de dados de outros telescópios, incluindo o Atacama Large Millimeter/Submillimeter Array (ALMA), mostrou que a nebulosa ainda está fornecendo material ao disco de formação planetária. Estas novas observações mostram bem como os discos de formação planetária podem ser complexos.

Fonte: ESO

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

Dois exoplanetas em órbita reversa em um sistema estelar triplo

Um grupo de pesquisadores liderados por Maria Hjorth e Simon Albrecht do Centro de Astrofísica Estelar da Universidade de Aarhus descobriu um sistema exoplanetário muito especial.

© Christoffer Grønne (ilustração do sistema exoplanetário K2-290)

Dois exoplanetas estão em órbita contrária em torno da sua estrela. Esta surpreendente arquitetura orbital foi provocada pelo disco protoplanetário, no qual os dois planetas se formaram, sendo inclinado pela segunda estrela neste sistema.

Este sistema planetário é muito intrigante. Existem dois planetas que orbitam em torno da estrela quase na direção oposta à rotação da estrela em torno de si própria. Isto é diferente do nosso próprio Sistema Solar, onde todos os planetas giram na mesma direção da rotação do Sol. 

Este não é o primeiro caso conhecido de um sistema planetário "retrógrado", os primeiros foram avistados há mais de 10 anos. Mas este é um caso raro em que é preciso saber o que provocou o desalinhamento drástico, e a explicação é diferente do que os pesquisadores assumiram que poderia ter acontecido nos outros sistemas.

Em qualquer sistema planetário, pensa-se que os planetas se formam num disco circular e giratório de material que orbita em torno da jovem estrela durante alguns milhões de anos após o nascimento da própria estrela, o chamado disco protoplanetário. Normalmente, o disco e a estrela giram da mesma maneira. No entanto, se houver uma estrela vizinha, a força gravitacional desta estrela companheira pode inclinar o disco.

A física subjacente está ligada ao comportamento que um pião exibe, quando a sua rotação diminui e o próprio eixo começa a girar em forma de cone. O cenário foi teorizado em 2012 e agora foi encontrado o primeiro sistema onde este processo ocorreu. 

Depois que foi descoberto o sistema K2-290, notou-se que este sistema é ideal para testar esta teoria, pois não é orbitado apenas por dois planetas, mas também contém duas estrelas. 

Uma implicação da descoberta é que não se pode mais assumir que as condições iniciais da formação planetária exigem alinhamentos entre a rotação estelar e as órbitas planetárias. É importante ressaltar que enquanto outras teorias que visam explicar os desalinhamentos em sistemas exoplanetários tendem a funcionar melhor em grandes planetas como Júpiter em órbitas de período curto, o mecanismo de inclinação do disco aplica-se a planetas de qualquer tamanho. Poderá haver outro mundo parecido com a Terra, por exemplo, que viaja pelos polos norte e sul da sua estrela progenitora. 

Um artigo foi publicado recentemente no conceituado periódico Proceedings of the National Academy of Sciences.

Fonte: National Astronomical Observatory of Japan

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

Novos exoplanetas numa coleção de estrelas jovens

Usando observações do TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA, astrônomos descobriram um trio de exoplanetas quentes maiores do que a Terra em órbita de uma estrela muito mais jovem que nosso Sol, de nome TOI 451.

© NASA (TOI 451 e outros objetos)

Os pontos amarelos na imagem mostram as posições de membros conhecidos ou suspeitos, com TOI 451 assinalado no círculo verde. Nota-se também o famoso aglomerado das Plêiades em Touro (em cima, à esquerda).

O sistema reside na recém-descoberta corrente Peixes-Erídano, uma coleção de estrelas com menos de 3% da idade do nosso Sistema Solar que se estende por um-terço do céu. 

Os planetas foram descobertos em imagens obtidas pelo TESS entre outubro e dezembro de 2018. Estudos de acompanhamento de TOI 451 e dos seus planetas incluíram observações feitas em 2019 e 2020 usando o telescópio espacial Spitzer da NASA, desde então reformado, bem como com muitas outras instalações terrestres. 

Dados infravermelhos de arquivo do satélite NEOWISE (Near-Earth Object Wide-Field Infrared Survey Explorer) da NASA, recolhidos entre 2009 e 2011 sob o seu nome anterior, WISE, sugerem que o sistema retém um disco frio de poeira e detritos rochosos.

Outras observações mostram que TOI 451 provavelmente tem duas companheiras estelares distantes que se orbitam uma à outra muito além dos planetas. Tem apenas 120 milhões de anos e fica a apenas 400 anos-luz, permitindo observações detalhadas deste jovem sistema planetário. E dado que existem três planetas com tamanhos entre duas e quatro vezes o da Terra, são alvos especialmente promissores para testar teorias sobre como as atmosferas planetárias evoluem.

As correntes estelares formam-se quando a gravidade da Via Láctea "rasga" os aglomerados de estrelas ou galáxias anãs. As estrelas individuais movem-se ao longo da órbita original do aglomerado, formando um grupo alongado que se dispersa gradualmente.

Em 2019, uma equipe liderada por Stefan Meingast da Universidade de Viena usou dados da missão Gaia da ESA para descobrir a corrente Peixes-Erídano, com o nome das constelações que contêm as maiores concentrações de estrelas. Estendendo-se por 14 constelações, a corrente tem cerca de 1.300 anos-luz de comprimento. No entanto, a idade inicialmente determinada para a corrente era muito maior do que a determinada atualmente.

Mais tarde, ainda em 2019,pesquisadores liderados por Jason Curtis da Universidade de Columbia em Nova York analisaram os dados do TESS para dúzias de membros deste fluxo. As estrelas mais jovens giram mais depressa do que as suas homólogas mais velhas e também tendem a ter manchas estelares mais proeminentes, regiões mais escuras e frias como as manchas solares.

À medida que estas manchas giram para dentro e para fora do nosso ponto de vista, podem produzir pequenas variações no brilho de uma estrela que o TESS pode medir. As medições do TESS revelaram evidências esmagadoras de manchas estelares e de rotação rápida entre as estrelas da corrente. 

Com base neste resultado, Curtis e seus colegas descobriram que o fluxo estelar tinha apenas 120 milhões de anos, semelhante ao famoso aglomerado das Plêiades e oito vezes mais jovem do que as estimativas anteriores. 

A massa, juventude e proximidade da corrente Peixes-Erídano fazem dela um laboratório fundamental para estudar a formação e a evolução estelar e planetária. 

A jovem estrela TOI 451, mais conhecida como CD-38 1467, fica a cerca de 400 anos-luz de distância, na direção da constelação de Erídano. Tem 95% da massa do nosso Sol, mas é 12% menor, ligeiramente mais fria e emite 35% menos energia. TOI 451 completa uma rotação em torno de si própria a cada 5,1 dias, mais de cinco vezes mais depressa do que o Sol. 

O TESS identifica novos mundos procurando trânsitos, quedas ligeiras e regulares no brilho estelar que ocorrem quando um planeta passa em frente da sua estrela a partir da nossa perspetiva. São evidentes, nos dados do TESS, trânsitos de todos os três planetas. 

Observações adicionais de acompanhamento vieram do Observatório Las Cumbres, uma rede global de telescópios com sede em Goleta, Califórnia, e do PEST (Perth Exoplanet Survey Telescope), na Austrália. 

Mesmo o planeta mais distante de TOI 451 orbita três vezes mais perto do que Mercúrio orbita o Sol, de modo que todos estes mundos são bastante quentes e inóspitos à vida como a conhecemos. As estimativas de temperatura variam de cerca de 1.200º C para o planeta mais interior a cerca de 450º C para o mais exterior. 

TOI 451 b completa uma órbita a cada 1,9 dias, tem aproximadamente 1,9 vezes o tamanho da Terra e tem uma massa estimada entre duas e 12 vezes a da Terra. O planeta seguinte, TOI 451 c, completa uma órbita a cada 9,2 dias, é cerca de três vezes maior do que a Terra e possui entre três e 16 vezes a massa da Terra. O maior e mais distante mundo, TOI 451 d, orbita a estrela a cada 16 dias, tem quatro vezes o tamanho do nosso planeta e tem entre quatro e 19 massas terrestres. 

Os astrônomos esperam que planetas tão grandes quanto estes retenham grande parte da sua atmosfera, apesar do intenso calor da sua estrela. Diferentes teorias de como as atmosferas evoluem até que um sistema planetário atinge a idade de TOI 451 preveem uma ampla gama de propriedades. A observação da luz estelar passando pelas atmosferas destes planetas fornece uma oportunidade de estudar esta fase de desenvolvimento e pode ajudar a restringir os modelos atuais. Ao medir a luz estelar que penetra através da atmosfera de um planeta em diferentes comprimentos de onda, podemos inferir a sua composição química e a presença de nuvens ou neblina em alta altitude.

As observações do WISE mostram que o sistema é excepcionalmente brilhante no infravermelho, que é invisível aos olhos humanos, em comprimentos de onda de 12 e 24 micrômetros. Isto sugere a presença de um disco de detritos, onde corpos rochosos semelhantes a asteroides colidem e se transformam em poeira. 

Os astrônomos não conseguiram determinar a extensão do disco, imaginam-no como um anel difuso de rocha e poeira posicionado tão longe da sua estrela quanto Júpiter está do nosso Sol. Os pesquisadores também analisam uma estrela vizinha fraca que aparece a cerca de dois pixéis de distância de TOI 451 nas imagens obtidas pelo TESS. Com base nos dados do Gaia, a equipe determinou que esta estrela é uma companheira gravitacional localizada tão longe de TOI 451 que a sua luz leva 27 dias para chegar até ela. De fato, os cientistas pensam que a companheira é provavelmente um sistema binário composto por duas anãs do tipo-M, cada uma com cerca de 45% da massa do Sol e emitindo apenas 2% da sua energia.

Um artigo que relata as descobertas foi publicado no periódico The Astronomical Journal.

Fonte: NASA

terça-feira, 16 de fevereiro de 2021

Sinais preliminares de um planeta na zona habitável de Alpha Centauri A

Uma equipe internacional de astrônomos encontrou sinais de que poderá existir um planeta na zona habitável de Alpha Centauri AB, um sistema binário a uns meros 4,37 anos-luz de distância.

© Hubble (Alpha Centauri AB)

Poderá ser um dos planetas na zona habitável mais próximos até à data, embora a ser confirmado não seja muito parecido com a Terra. Alpha Centauri é o sistema estelar mais próximo do nosso Sistema Solar, contendo três estrelas diferentes. Estas são Alpha Centauri A e B, estrelas parecidas com o Sol que formam um binário íntimo uma em torno da outra a cerca de 4,37 anos-luz de distância. O par estelar orbita o centro de gravidade comum a cada 80 anos, com uma distância média de aproximadamente 11 vezes a distância Terra-Sol.

O sistema estelar também hospeda Proxima Centauri, uma pequena anã vermelha que até está mais próxima do Sol (a 4,24 anos-luz de distância) e tem uma relação gravitacional muito mais liberal com as outras duas estrelas. 

Sabemos que Proxima Centauri abriga dois planetas, um dos quais (Proxima b) parece ser um exoplaneta do tamanho da Terra na zona habitável (região onde a água líquida pode existir à superfície de um planeta rochoso). Mas pensa-se que Proxima b sofre bloqueio de marés e é inundado por ventos estelares, o que significa que é improvável que seja habitável.

O potencial do sistema Alpha Centauri AB para hospedar mundos propícios à vida sempre intrigou os cientistas, mas nenhum exoplaneta conhecido foi aí encontrado, em parte porque a proximidade significava que era demasiado brilhante para serem examinados eficazmente quaisquer objetos planetários na área. Mas, astrônomos usando o VLT (Very Large Telescope) do ESO no Chile encontrou um sinal de imagem térmica brilhante oriundo da zona habitável de Alpha Centauri A. 

O sinal foi derivado através do NEAR (Near Earths in the Alpha Center Region), um projeto de 3 milhões de dólares financiado pelo ESO e pela iniciativa Breakthrough Watch, que visa procurar planetas rochosos do tamanho da Terra em torno de Alpha Centauri e de outros sistemas estelares até 20 anos-luz do Sol.

O NEAR promoveu atualizações do VLT que incluíram um coronógrafo térmico, que pode bloquear a luz estelar e procurar assinaturas de calor provenientes de objetos planetários à medida que estes refletem a luz das suas estrelas. Este encontrou o sinal em torno de Alpha Centauri A após analisar 100 horas de dados.

No entanto, a existência do planeta ainda não foi verificada, pelo que ainda nem tem nome. O novo sinal sugere que é do tamanho de Netuno. Isto significa que não é um mundo parecido com a Terra, mas um gigante gasoso quente cinco a sete vezes maior que a Terra. 

Se abrigasse vida, provavelmente seria vida microbiana que vagueava pelas nuvens. E o sinal pode muito bem ser provocado por uma série de outras explicações, como poeira cósmica quente, um objeto mais distante no plano de fundo, ou fótons perdidos.

A confirmação ou refutação da existência do planeta não deverá ser muito difícil, os astrônomos simplesmente têm que observar o objeto novamente e verificar se a sua nova posição corresponde à de uma órbita.

Um artigo foi publicado na revista Nature Communications.

Fonte: Massachusetts Institute of Technology

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021

Hubble descobre concentração de pequenos buracos negros

Uma equipe de astrônomos esperave encontrar um buraco negro de massa intermediária no núcleo do aglomerado globular NGC 6397, mas, em vez disso, encontraram evidências de uma concentração de buracos negros menores escondidos ali.

© Hubble (aglomerado globular NGC 6397)

Novos dados do telescópio espacial Hubble levaram à primeira medição da extensão de uma coleção de buracos negros em um aglomerado globular colapsado. 

Os aglomerados globulares são sistemas estelares extremamente densos, nos quais as estrelas são compactadas juntas. Eles também são tipicamente muito antigos, o aglomerado globular que é o foco deste estudo, o NGC 6397, é quase tão antigo quanto o próprio Universo. 

Ele reside a 7.800 anos-luz de distância, tornando-o um dos aglomerados globulares mais próximos da Terra. Por causa de seu núcleo muito denso, é conhecido como um aglomerado com núcleo colapsado. 

Quando Eduardo Vitral e Gary A. Mamon do Institut d'Astrophysique de Paris (IAP) decidiram estudar o núcleo do NGC 6397, eles esperavam encontrar evidências de um buraco negro de massa intermediária (IMBH). Eles são menores do que os buracos negros supermassivos que ficam nos núcleos de grandes galáxias, mas maiores do que os buracos negros de massa estelar formados pelo colapso de estrelas massivas. 

Os IMBHs são o tão procurado “elo perdido” na evolução do buraco negro e sua mera existência é calorosamente debatida, embora alguns candidatos tenham sido encontrados, por exemplo, veja: Encontrado um elusivo buraco negro de massa intermediária.

Para procurar o IMBH, Vitral e Mamon analisaram as posições e velocidades das estrelas do aglomerado. Eles fizeram isso usando estimativas anteriores dos movimentos próprios das estrelas a partir de imagens do Hubble do aglomerado ao longo de vários anos, além dos movimentos adequados fornecidos pelo observatório espacial Gaia da ESA, que mede com precisão as posições, distâncias e movimentos de estrelas.

Saber a distância até o aglomerado permitiu que os astrônomos traduzissem os movimentos adequados destas estrelas em velocidades. “Nossa análise indicou que as órbitas das estrelas são quase aleatórias em todo o aglomerado globular, em vez de sistematicamente circular ou muito alongado,” explicou Mamon. “Encontramos evidências muito fortes de massa invisível nas densas regiões centrais do aglomerado, mas ficamos surpresos ao descobrir que esta massa extra não é pontual, mas estendida a alguns por cento do tamanho do aglomerado,” acrescentou Vitral. 

Este componente invisível só poderia ser feito de remanescentes (anãs brancas, estrelas de nêutrons e buracos negros) de estrelas massivas cujas regiões internas entraram em colapso sob sua própria gravidade quando seu combustível nuclear acabou. As estrelas colapsaram progressivamente para o centro do aglomerado após interações gravitacionais com estrelas menos massivas próximas, levando à pequena extensão da concentração de massa invisível. Após interagirem com estrelas próximas de menor massa, a troca de momentum entre elas faz com que as estrelas de menor porte sejam impulsionadas em direção à periferia do aglomerado, e as de maior massa vão para o centro.

Usando a teoria da evolução estelar, os cientistas concluíram que a maior parte da concentração invisível é composta de buracos negros de massa estelar, em vez de anãs brancas ou estrelas de nêutrons que são muito fracas para serem observadas. Dois estudos recentes também propuseram que remanescentes estelares e, em particular, buracos negros de massa estelar, poderiam povoar as regiões internas dos aglomerados globulares. 

“Nosso estudo é a primeira descoberta a fornecer tanto a massa quanto a extensão do que parece ser uma coleção de buracos negros em um aglomerado globular colapsado,” disse Vitral. “Nossa análise não teria sido possível sem ter os dados do Hubble para restringir as regiões internas do aglomerado e os dados de Gaia para restringir as formas orbitais das estrelas externas, que por sua vez restringem indiretamente as velocidades das estrelas de primeiro e segundo planos no regiões internas,” acrescentou Mamon. 

Os astrônomos também observam que esta descoberta levanta a questão de saber se as fusões destes buracos negros compactados em aglomerados globulares colapsados ​​podem ser uma fonte importante de ondas gravitacionais recentemente detectadas pelo experimento do Observatório de Ondas Gravitacionais com Interferômetro a Laser (LIGO).

Fonte: ESA

sábado, 13 de fevereiro de 2021

A órbita do objeto mais distante no Sistema Solar

Uma equipe de astrônomos, incluindo o professor associado Chad Trujillo do Departamento de Astronomia e Ciência Planetária da Universidade do Norte do Arizona, confirmou um planetoide que está quase quatro vezes mais distante do Sol do que Plutão, tornando-o o objeto mais distante já observado no nosso Sistema Solar.

© NOIRLab (ilustração de Farfarout)

O planetoide, apelidado "Farfarout," foi detectado pela primeira vez em 2018, e já foi possível recolher observações suficientes para definir a sua órbita. O Minor Planet Center já lhe deu a designação oficial de 2018 AG37. A alcunha Farfarout distinguia-o do detentor do recorde anterior "Farout", descoberto pela mesma equipe em 2018. 

Além de Trujillo, a equipe inclui Scott S. Sheppard da Instituição Carnegie para Ciência e David Tholen do Instituto para Astronomia da Universidade do Havaí, que está realizando um levantamento para mapear o Sistema Solar exterior para além de Plutão. 

O Farfarout receberá um nome oficial (como Sedna e outros objetos semelhantes) depois da sua órbita ser melhor determinada ao longo dos próximos anos. Foi descoberto com o telescópio Subaru de 8 metros localizado no topo do Maunakea, no Havaí, e recuperado usando os telescópios Gemini Norte e Magellan nos últimos anos para determinar a sua órbita com base no seu lento movimento pelo céu. 

A distância média de Farfarout ao Sol é de 132 UA (unidades astronômicas, a distância Terra-Sol, 150 milhões de quilômetros). Para comparação, Plutão fica a 39 UA do Sol. O objeto recém-descoberto tem uma órbita alongada que o leva a 175 UA no afélio (ponto orbital mais distante do Sol), e para dentro da órbita de Netuno, a cerca de 27 UA, quando está no periélio (ponto orbital mais próximo do Sol). 

A jornada de Farfarout em torno do Sol leva cerca de mil anos, cruzando a órbita do planeta gigante Netuno. Isto significa que Farfarout provavelmente sofreu fortes interações gravitacionais com Netuno ao longo da idade do Sistema Solar, e é a razão pela qual tem uma órbita tão grande e alongada. 

Farfarout é muito tênue, e com base no seu brilho e distância do Sol, estima-se que tenha aproximadamente 400 km em diâmetro, colocando-o na extremidade inferior da classificação de planeta anão, assumindo que é um objeto rico em gelo. 

"A descoberta de Farfarout mostra a nossa crescente capacidade de mapear o Sistema Solar exterior e de observar cada vez mais longe em direção à fronteira do nosso Sistema Solar," disse Sheppard. "Somente com os avanços nos últimos anos de grandes câmaras digitais em telescópios muito grandes foi possível descobrir com eficácia objetos muitos distantes como Farfarout. Embora alguns destes objetos distantes sejam bastante grandes, sendo planetas anões em tamanho, são muito tênues por causa das suas distâncias extremas ao Sol. Farfarout é apenas a ponta do iceberg dos objetos do Sistema Solar muito distante." 

Dado que Netuno interage fortemente com Farfarout, a órbita e o movimento de Farfarout não podem ser usados para determinar a existência de outro planeta massivo no Sistema Solar muito distante, uma vez que estas interações dominam a dinâmica orbital de Farfarout.

Apenas aqueles objetos cujas órbitas ficam no Sistema Solar muito distante, bem para lá da influência de Netuno, podem ser usados para sondar por sinais de um planeta massivo desconhecido. 

Estes incluem Sedna e 2012 VP113 que, embora estejam atualmente mais perto do Sol do que Farfarout (cerca de 80 UA), nunca se aproximam de Netuno e, portanto, seriam fortemente influenciados ao invés pelo possível Planeta X. 

"A dinâmica orbital de Farfarout pode ajudar-nos a entender como Netuno se formou e evoluiu, já que Farfarout foi provavelmente lançado para o Sistema Solar exterior por ter passado demasiado perto de Netuno no passado distante," disse Trujillo. "Farfarout provavelmente vai interagir fortemente com Netuno de novo, uma vez que as suas órbitas continuam a intersectar-se."

Fonte: Northern Arizona University

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

A primeira medição da densidade de um exoplaneta muito jovem

Uma equipe liderada por cientistas do IRAP (CNRS/CNES/Université Toulouse III - Paul Sabatier) e do IPAG (CNRS/UGA) mediu pela primeira vez a densidade interna de um exoplaneta muito jovem que orbita uma estrela extremamente ativa e recém-formada.

© NASA/JPL-Caltech (ilustração de anã vermelha e seu planeta)

Apesar do "ruído" gerado pela atividade da estrela, conseguiram fazê-lo usando o instrumento de caça exoplanetária SPIRou acoplado ao CFHT (Canada-France-Hawaii Telescope). 

A estrela AU Microscopii (AU Mic) não tem mais do que 22 milhões de anos. Portanto, é muito jovem, assim como o sistema planetário em seu redor, que abriga um gigante gasoso chamado AU Mic b. 

A massa e a densidade de AU Mic b, que foi detectado pela primeira vez pelo satélite TESS da NASA, foram agora determinadas usando o espectropolarímetro SPIRou. Os valores revelaram-se muito semelhantes aos de Netuno, que é mais de 4 bilhões de anos mais velho. No entanto, a órbita do exoplaneta está 450 vezes mais próxima da sua estrela do que Netuno está do Sol. A sua atmosfera tem uma temperatura de cerca de 300º C, pelo que pertence à família dos "Netunos quentes".

A sua estrela, que é altamente ativa por ser tão jovem, gera campos magnéticos muito fortes, tornando extremamente difícil a análise do sinal de AU Mic b. No entanto, as capacidades de alto desempenho do SPIRou, juntamente com o trabalho realizado pelos cientistas do IRAP e do IPAG, finalmente tornaram possível a determinação da sua massa e, portanto, da sua densidade, apesar do "ruído" gerado pela atividade da estrela AU Mic. 

Esta é a primeira vez que os astrônomos medem com sucesso a massa (usando o SPIRou) e o raio (graças ao TESS) de um exoplaneta com menos de 200 milhões de anos. É também o primeiro exoplaneta cuja massa foi medida pelo SPIRou, um instrumento de próxima geração projetado e construído sob a supervisão de equipes francesas e recentemente acoplado ao CFHT. 

As equipes envolvidas com o SPIRou também confirmaram o desempenho incomparável do novo instrumento e estudaram outra característica de AU Mic b, a inclinação da sua órbita. Esta acabou por estar bem alinhada com o planeta equatorial da sua estrela, sugerindo que a sua formação não foi afetada por outros objetos massivos. 

Todas estas descobertas fornecem informações adicionais que vão ajudar os cientistas a refinar os modelos de formação e migração planetária.

Os resultados foram publicados no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: National Centre for Scientific Research

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

Uma ampulheta cósmica

A Imagem do telescópio espacial Hubble desta semana apresenta um retrato impressionante de M1-63, um exemplo lindamente captado de uma nebulosa planetária bipolar localizada na constelação de Scutum (o Escudo).

© Hubble (M1-63)

Uma nebulosa como esta é formada quando a estrela em seu centro derrama enormes quantidades de material de suas camadas externas, deixando para trás uma nuvem espetacular de gás e poeira.

Acredita-se que um sistema binário de estrelas no centro da nebulosa bipolar seja capaz de criar formas de ampulheta ou borboletas como a desta imagem. Isso ocorre porque o material da estrela que se desprende é afunilado em direção aos seus polos, com a ajuda da companheira, criando a distinta estrutura de lóbulo duplo vista em nebulosas como M1-63.

Fonte: ESA