quarta-feira, 30 de março de 2022

Mapeado o movimento das anãs brancas na Via Láctea

As anãs brancas foram outrora estrelas normais semelhantes ao Sol, mas que colapsaram depois de esgotarem todo o seu combustível.

© STScI (ilustração de uma anã branca)

Estes remanescentes interestelares têm sido historicamente difíceis de estudar. No entanto, um estudo recente da Universidade de Lund, na Suécia, revela novas informações sobre os padrões de movimento destas estrelas intrigantes.

As anãs brancas têm um raio de cerca de 1% do raio do Sol. Têm aproximadamente a mesma massa, o que significa que têm uma densidade surpreendente de cerca de 1 tonelada por centímetro cúbico. Após milhares de milhões de anos, as anãs brancas arrefecem até um ponto em que deixam de emitir luz visível e transformam-se nas chamadas anãs negras. 

A primeira anã branca descoberta foi 40 Eridani A. É um corpo celeste brilhante a 16,2 anos-luz da Terra, rodeado por um sistema binário composto pela anã branca 40 Eridani B e pela anã vermelha 40 Eridani C. Desde que foi descoberta em 1783 que os astrônomos têm tentado aprender mais sobre as anãs brancas a fim de adquirirem uma compreensão mais profunda da história evolutiva da nossa Galáxia. 

Num estudo, pesquisadores apresentaram novas descobertas sobre a forma como as estrelas colapsadas se movem. "Graças às observações do telescópio espacial Gaia, conseguimos pela primeira vez revelar a distribuição tridimensional da velocidade para o maior catálogo de anãs brancas até à data. Isto dá-nos uma imagem detalhada da sua estrutura de velocidade com detalhes inigualáveis," diz Daniel Mikkola, estudante de doutoramento em astronomia na Universidade de Lund.

O Gaia propiciou aos astrônomos medirem posições e velocidades para cerca de 1,5 bilhões de estrelas. Mas só recentemente foram capazes de se concentrar completamente nas anãs brancas na vizinhança solar.

"Conseguimos mapear as velocidades das anãs brancas e os padrões de movimento. O Gaia revelou que existem duas sequências paralelas de anãs brancas ao olhar para a sua temperatura e brilho. Se as estudarmos separadamente, podemos ver que elas provavelmente se movem de modo diferente, provavelmente como consequência de terem massas e vidas diferentes," diz Mikkola. 

Os resultados podem ser utilizados para desenvolver novas simulações e modelos para continuar mapeando a história e desenvolvimento da Via Láctea. Através de um maior conhecimento das anãs brancas, os pesquisadores esperam ser capazes de esclarecer uma série de dúvidas em torno do nascimento da Via Láctea. 

"Este estudo é importante porque aprendemos mais sobre as regiões mais próximas na nossa Galáxia. Os resultados também são interessantes porque a nossa própria estrela, o Sol, irá um dia transformar-se numa anã branca como 97% de todas as estrelas na Via Láctea," conclui Mikkola.

O estudo publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Lund University

segunda-feira, 28 de março de 2022

Atingido o marco de 5.000 exoplanetas descobertos

Não há muito tempo, vivíamos num Universo com apenas um pequeno número de planetas conhecidos, todos eles em órbita do nosso Sol.

© NASA/JPL-Caltech (variedade de exoplanetas)

Mas uma nova fornada de descobertas assinala um marco científico: foram agora confirmados, no total, mais de 5.000 planetas localizados para lá do nosso Sistema Solar. O odômetro planetário rodou a 21 de março, com o lote mais recente de 65 exoplanetas adicionado ao Arquivo de Exoplanetas da NASA.

O arquivo registra as descobertas de exoplanetas que aparecem em artigos científicos revistos por pares e que foram confirmados utilizando múltiplos métodos de detecção ou por técnicas analíticas. Os mais de 5.000 planetas encontrados até agora incluem mundos pequenos e rochosos como a Terra, gigantes de gás muitas vezes maiores que Júpiter e "Júpiteres quentes" em órbitas abrasadoramente íntimas em torno das suas estrelas. Existem "super-Terras", que são mundos rochosos maiores do que o nosso, e "mini-Netunos", versões menores do que Netuno do nosso Sistema Solar.

Acrescente-se à mistura planetas que orbitam duas estrelas ao mesmo tempo e planetas que teimam em orbitar os remanescentes estelares de estrelas moribundas. A Via Láctea contém provavelmente centenas de bilhões de exoplanetas. 

A batida constante da descoberta começou em 1992 com estranhos novos mundos em órbita de uma estrela ainda mais estranha. Era um tipo de estrela de nêutrons conhecida como pulsar, um cadáver estelar com rotação rápida que pulsa com rajadas de radiação de milissegundos. A medição de ligeiras alterações no tempo dos pulsos permitiu aos cientistas revelar planetas em órbita em torno do pulsar. A descoberta de apenas três planetas em torno desta estrela giratória abriu essencialmente as comportas.

O TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite), lançado em 2018, continua fazendo novas descobertas exoplanetárias. Mas em breve os poderosos telescópios de próxima geração e os seus instrumentos altamente sensíveis, começando pelo recentemente lançado telescópio espacial James Webb, irão captar luz das atmosferas dos exoplanetas, identificando quais os gases presentes para potencialmente identificar sinais indicadores de condições habitáveis.

O telescópio espacial Nancy Grace Roman, cujo lançamento está previsto para 2027, fará novas descobertas de exoplanetas utilizando uma variedade de métodos. A missão ARIEL (Atmospheric Remote-sensing Infrared Exoplanet Large-survey) da ESA, com lançamento previsto para 2029, irá observar as atmosferas de exoplanetas.

A estreita ligação entre a química da vida na Terra e a química encontrada por todo o Universo, bem como a detecção de moléculas orgânicas disseminadas, sugere que a detecção da própria vida é apenas uma questão de tempo. 

Este quadro nem sempre pareceu tão promissor. O primeiro planeta detectado em torno de uma estrela parecida com o Sol, em 1995, revelou-se um Júpiter quente: um gigante gasoso com cerca de metade da massa do planeta Júpiter numa órbita extremamente íntima, de quatro dias, em torno da sua estrela. 

Alguns exoplanetas foram encontrados utilizando o método de "oscilação": o rastreamento de movimentos ligeiros de uma estrela, provocados pela atração gravitacional de planetas em órbita. Mas mesmo assim, nada parecia ser habitável. A descoberta de mundos pequenos e rochosos como o nosso exigiu o próximo grande salto na tecnologia de caça exoplanetária: o método de "trânsito".

O astrônomo William Borucki, pesquisador principal da missão Kepler, missão lançada em 2009 e está agora aposentada, teve a ideia de fixar detectores de luz extremamente sensíveis a um telescópio, lançando-o depois para o espaço. O telescópio olharia durante anos para um campo com mais de 170.000 estrelas, à procura de pequenas quedas no brilho das estrelas quando um planeta passava em frente, do ponto de vista do Sistema Solar.

Fonte: Jet Propulsion Laboratory

quarta-feira, 23 de março de 2022

Nuvem gigante de detritos criada por choque entre corpos celestes

A maioria dos planetas rochosos e satélites do nosso Sistema Solar, incluindo a Terra e a Lua, foram formados ou moldados por colisões massivas no início da história do Sistema Solar.

© NASA/JPL-Caltech (ilustração de nuvem de detritos bloqueando uma estrela)

Ao chocarem uns com os outros, os corpos rochosos podem acumular mais material, aumentando de tamanho, ou podem desfazer-se em múltiplos corpos menores.

Os astrônomos, usando o agora aposentado telescópio espacial Spitzer da NASA, encontraram no passado evidências destes tipos de colisões em torno de estrelas jovens, onde planetas rochosos estão sendo formados. Mas estas observações não forneceram muitos detalhes sobre as colisões, tais como o tamanho dos objetos envolvidos.

Num novo estudo, um grupo de astrônomos da Universidade do Arizona relatou as primeiras observações de uma nuvem de detritos de uma destas colisões ao passar em frente da sua estrela e ao bloquear brevemente a luz. Juntamente com o conhecimento sobre o tamanho e brilho da estrela, as observações permitiram a determinação do tamanho da nuvem pouco depois do impacto, a estimativa do tamanho dos objetos que colidiram e a velocidade com que a nuvem se dispersou.

A partir de 2015, a equipa começou a fazer observações de rotina de uma estrela com 10 milhões de anos chamada HD 166191. Por volta desta fase inicial da vida de uma estrela, a poeira que sobra da sua formação junta-se para formar corpos rochosos chamados planetesimais. Assim que o gás que anteriormente preenchia o espaço entre estes objetos se dispersa, colisões catastróficas entre eles tornam-se comuns. 

Antevendo que poderiam ver evidências de uma destas colisões em torno de HD 166191, a equipe utilizou o Spitzer para realizar mais de 100 observações do sistema entre 2015 e 2019. Embora os planetesimais sejam demasiado pequenos e distantes para serem resolvidos por telescópio, as suas colisões produzem grandes quantidades de poeira.

O Spitzer detectou luz infravermelha, ou seja, comprimentos de onda ligeiramente superiores ao que os olhos humanos podem ver. O infravermelho é ideal para detectar poeira, incluindo os detritos criados por colisões entre protoplanetas. Em meados de 2018, o telescópio espacial viu o sistema HD 166191 tornar-se significativamente mais brilhante, sugerindo um aumento na produção de detritos. Durante este tempo, o Spitzer também detectou uma nuvem de detritos bloqueando a estrela. Combinando a observação do trânsito pelo Spitzer com as observações por telescópios no solo, a equipe pôde deduzir o tamanho e a forma da nuvem de detritos. 

O seu trabalho sugere que a nuvem era altamente alongada, com uma área mínima estimada três vezes maior do que a estrela. No entanto, a quantidade de aumento de brilho infravermelho que o Spitzer viu sugere que apenas uma pequena parte da nuvem passou em frente da estrela e que os detritos deste evento cobriram uma área centenas de vezes maior do que a da estrela.

Para produzir uma nuvem tão grande, os objetos na colisão principal devem ter sido do tamanho de planetas anões, como Vesta no nosso Sistema Solar, um objeto com 530 km de diâmetro localizado no cinturão principal de asteroides entre Marte e Júpiter.

O choque inicial gerou energia e calor suficientes para vaporizar parte do material. Também desencadeou uma reação em cadeia de impactos entre fragmentos da primeira colisão e outros pequenos corpos no sistema, o que provavelmente criou uma quantidade significativa de poeira que o Spitzer observou. Nos meses seguintes, a grande nuvem de poeira cresceu em tamanho e tornou-se mais translúcida, indicando que a poeira e outros detritos estavam rapidamente se dispersando pelo jovem sistema estelar.

Em 2019, a nuvem que passava em frente da estrela já não era visível, mas o sistema continha o dobro da poeira que tinha antes do Spitzer ter avistado a nuvem. Esta informação pode ajudar os cientistas a testar teorias sobre como os planetas terrestres se formam e crescem.

Olhando para discos poeirentos de detritos em torno de estrelas jovens, é possível essencialmente olhar para trás no tempo e ver os processos que podem ter moldado o nosso próprio Sistema Solar. Aprendendo sobre o resultado das colisões nestes sistemas, podemos também ter uma melhor ideia da frequência com que os planetas rochosos se formam em torno de outras estrelas.

O novo estudo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: Jet Propulsion Laboratory

sábado, 19 de março de 2022

Estrela minúscula libera feixe gigantesco de matéria e antimatéria

Os astrônomos fotografaram um feixe de matéria e antimatéria com mais de 60 trilhões de quilômetros com o observatório de raios X Chandra.

© Chandra/Gemini (pulsar PSR J2030+4415)

O campo de visão de médio alcance mostra cerca de um-terço do comprimento de um filamento extremamente longo do pulsar. A imagem de grande plano mostra onde os raios X são criados pelas partículas que trafegam em torno do próprio pulsar, que tem apenas 16 km de diâmetro.

O feixe de raios X é alimentado por um pulsar, uma estrela colapsada com rotação rápida e um forte campo magnético. Com a sua tremenda escala, este feixe pode ajudar a explicar o número surpreendentemente grande de pósitrons, os homólogos de antimatéria dos elétrons, por toda a Via Láctea. 

Os astrônomos descobriram pela primeira vez o feixe, ou filamento, em 2020, mas não sabiam o seu comprimento total porque se estendia para lá do limite do detector do Chandra. Novas observações do Chandra feitas pelo mesmo par de pesquisadores em fevereiro e novembro de 2021 mostram que o filamento é cerca de três vezes mais longo do que o originalmente visto. O filamento abrange cerca de metade do diâmetro da Lua Cheia no céu, tornando-o o feixe mais longo de um pulsar, a partir do ponto de vista da Terra.

O pulsar denominado PSR J2030+4415 está localizado a cerca de 1.600 anos-luz da Terra. Este objeto do tamanho de uma cidade gira cerca de três vezes por segundo. Este resultado pode fornecer uma nova visão sobre a fonte de antimatéria da Via Láctea, que é semelhante à matéria comum, mas com as suas cargas elétricas invertidas.

A grande maioria do Universo consiste de matéria comum e não antimatéria. Contudo, os cientistas continuam encontrando evidências de um número relativamente grande de pósitrons em detectores na Terra, o que leva à questão: quais são as possíveis fontes desta antimatéria? 

Os pesquisadores do novo estudo do Chandra pensam que pulsares como PSR J2030+4415 podem ser uma resposta. A combinação de dois extremos - a rotação veloz e os fortes campos magnéticos dos pulsares - leva à aceleração de partículas e radiação altamente energética que cria pares de elétrons e pósitrons (o processo habitual de conversão de massa em energia, famoso pela equação E=m.c² de Albert Einstein, é invertido, e a energia é convertida em massa). O pulsar pode estar expelindo estes pósitrons para a Galáxia. 

Os pulsares geram ventos de partículas carregadas que estão normalmente confinados dentro dos seus poderosos campos magnéticos. O pulsar viaja através do espaço interestelar a cerca de 1,6 milhões de quilômetros por hora. Um choque de gás na proa move-se em frente do pulsar, semelhante ao acumular de água na frente de um barco em movimento. No entanto, há cerca de 20 a 30 anos, o movimento de choque da proa parece ter estagnado, e o pulsar apanhou-o, resultando numa interação com o campo magnético interestelar que corre quase em linha reta da esquerda para a direita.

O campo magnético do vento pulsar ligou-se ao campo magnético interestelar e os elétrons e pósitrons altamente energéticos foram "esguichados" através de um bocal formado pela ligação. À medida que as partículas se moviam ao longo desta linha do campo magnético interestelar a cerca de um-terço da velocidade da luz, tornaram-se brilhantes em raios X. Isto produziu o feixe longo visto pelo Chandra.

Anteriormente, os astrônomos observaram grandes halos em torno de pulsares próximos em raios gama que implicam que os pósitrons energéticos geralmente têm dificuldade em "vazar" para a Galáxia. Isto anula a ideia de que os pulsares explicam o excesso de pósitrons que os cientistas detectam. No entanto, filamentos de pulsares recentemente descobertos, como PSR J2030+4415, mostram que as partículas podem realmente escapar para o espaço interestelar e eventualmente chegar à Terra.

O artigo que descreve estes resultados aparecerá no periódico The Astrophysical Journal

Fonte: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics

quarta-feira, 16 de março de 2022

Observado o início do nascimento de planetas num sistema estelar binário

Astrônomos observaram, com um detalhe sem precedentes, material primordial que pode estar originando três sistemas planetários em torno de uma estrela binária.

© ESO/ALMA (poeira nos discos em torno de SVS 13)

Reunindo três décadas de estudo, um grupo internacional de cientistas observou um par de estrelas em órbita para revelar que estas estrelas estão rodeadas por discos de gás e poeira.

A pesquisa mostra que o material dentro dos discos recentemente descobertos pode ser o início de novos sistemas planetários que, no futuro, vão orbitar as estrelas binárias. Usando o VLA (Very Large Array) e o ALMA (Atacama Large Millimeter/Submillimeter Array), o grupo científico estudou a estrela binária SVS 13, ainda na sua fase embrionária.

Este trabalho forneceu a melhor descrição disponível até à data de um sistema binário em formação. Os modelos de formação planetária sugerem que os planetas se formam pela lenta agregação de gelo e partículas de poeira, em discos protoplanetários e em torno de estrelas em formação. Normalmente estes modelos consideram apenas estrelas únicas, tais como o Sol. No entanto, a maioria das estrelas formam sistemas binários, nos quais duas estrelas giram em torno de um centro comum. 

Ainda se sabe muito pouco sobre como nascem os planetas em torno destes importantes sistemas com estrelas gêmeas, nos quais a interação gravitacional entre as duas estrelas desempenha um papel essencial.

Os resultados revelaram que cada estrela tem um disco de gás e poeira ao seu redor e que, além disso, está se formando um disco maior em torno de ambas as estrelas. Este disco exterior mostra uma estrutura em espiral que alimenta os discos individuais e em todos eles os sistemas planetários poderiam formar-se no futuro. Isto é uma clara evidência da presença de discos em torno de ambas as estrelas e da existência de um disco comum num sistema binário.

O sistema binário SVS 13, constituído por dois embriões estelares com uma massa total semelhante à do Sol, está relativamente perto de nós, a cerca de 980 anos-luz de distância na nuvem molecular de Perseu, permitindo o seu estudo detalhado. As duas estrelas do sistema estão muito próximas uma da outra, com uma distância de apenas cerca de noventa vezes a distância entre a Terra e o Sol. 

O trabalho permitiu estudar a composição de gás, poeira e matéria ionizada no sistema. Além disso, foram identificadas quase trinta moléculas diferentes em torno de ambas as protoestrelas, incluindo treze moléculas orgânicas complexas precursoras da vida (sete delas detectadas pela primeira vez neste sistema).

A equipe utilizou as observações de SVS 13 obtidas pelo VLA ao longo de trinta anos, juntamente com os novos dados do ALMA, e acompanhou o movimento de ambas as estrelas ao longo deste período, o que permitiu rastrear a sua órbita, bem como a geometria e orientação do sistema, juntamente com muitos parâmetros fundamentais, tais como a massa das protoestrelas, a massa dos discos e a sua temperatura.

Um detalhe surpreendente foi a descoberta de que SVS 13 era um binário de rádio, porque apenas uma estrela é vista no óptico. Normalmente, são detectados embriões estelares no rádio, mas só se tornam visíveis no final do processo de gestação. Foi muito estranho a descoberta de um par de estrelas gêmeas onde uma delas parecia ter evoluído muito mais rapidamente do que a outra. Foi concebida várias experiências para obter mais detalhes e verificar se qualquer uma das estrelas poderia formar planetas. Agora nota-se que ambas as estrelas são muito jovens e que ambas podem formar planetas.

O sistema binário SVS 13 tem gerado muito debate na literatura científica, uma vez que alguns estudos o consideram extremamente jovem e outros o consideram estar numa fase posterior. Este novo estudo, provavelmente o mais completo de um sistema estelar binário em formação, não só evidencia detalhes sobre a natureza das duas protoestrelas e do seu ambiente, como também fornece parâmetros cruciais para testar simulações numéricas das fases iniciais da formação de um sistema binário e de um sistema múltiplo.

A pesquisa foi publicada no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: University of Manchester

segunda-feira, 14 de março de 2022

Olho da Galáxia

Esta imagem finamente detalhada mostra o coração de NGC 1097, uma galáxia espiral barrada que fica a cerca de 48 milhões de anos-luz da Terra na constelação de Fornax.

© Hubble (NGC 1097)

Esta imagem revela a complexidade da teia de estrelas e poeira no centro de NGC 1097, com os longos tentáculos de poeira destacados em um tom vermelho escuro. 

A extensão em que a estrutura da galáxia é revelada é graças a dois instrumentos no telescópio espacial Hubble: a Wide Field Camera 3 (WFC3) e a Advanced Camera for Surveys (ACS). 

A ideia de que uma única imagem pode ser tirada usando duas câmeras diferentes não é muito intuitiva. No entanto, faz muito mais sentido depois de analisar como belas imagens astronômicas como esta são compostas. 

Um ponto de partida útil é considerar exatamente o que é a cor. Nossos olhos podem detectar ondas de luz em comprimentos de onda ópticos entre aproximadamente 380 e 750 nanômetros, usando três tipos de receptores, cada um dos quais é sensível a apenas uma fatia deste intervalo. Nosso cérebro interpreta estes comprimentos de onda específicos como cores. 

Por outro lado, uma câmera de telescópio como a WFC3 ou ACS é sensível a uma única e ampla faixa de comprimentos de onda para maximizar a quantidade de luz coletada. As imagens brutas dos telescópios estão sempre em escala de cinza, mostrando apenas a quantidade de luz captada em todos estes comprimentos de onda. 

Imagens coloridas de telescópios são indiretamente possíveis, no entanto, com a ajuda de filtros. Ao introduzir um filtro sobre a abertura de um instrumento como o WFC3 ou ACS, apenas a luz de uma faixa de comprimento de onda muito específica é deixada passar; um destes filtros usados ​​nesta imagem é para luz verde em torno de 555 nanômetros. Isso produz uma imagem em escala de cinza mostrando apenas a quantidade de luz com este comprimento de onda. Esta imagem multicolorida do NGC 1097 é composta por imagens usando sete filtros diferentes no total.

Fonte: ESA

Uma hipnotizante espiral dourada

Esta imagem mostra a galáxia NGC 4254, também conhecida como Messier 99 (M99).

© ESO/PHANGS (NGC 4254)

Trata-se de um exemplo de uma galáxia, com braços em espiral bem definidos e proeminentes que se entrelaçam claramente em torno do seu centro. A M99 situa-se a 49 milhões de anos-luz de distância da Terra, na constelação da Cabeleira de Berenice. 

Podemos vê-la nesta imagem com um detalhe extraordinário obtido com o instrumento MUSE (Multi-Unit Spectroscopic Explorer) montado no Very Large Telescope (VLT) do ESO. A imagem mostra uma combinação de observações realizadas em diferentes cores, ou comprimentos de onda da luz, onde se veem nuvens e gás ionizado por estrelas recém-nascidas. Os gases de hidrogênio, oxigênio e enxofre estão em vermelho, azul e laranja, respectivamente. 

Esta imagem foi obtida como parte do projeto PHANGS (Physics at High Angular resolution in Nearby GalaxieS), que observa galáxias próximas em alta resolução ao longo de todo o espectro electromagnético com o objetivo de compreender o ciclo de vida da formação estelar nas galáxias.

Fonte: ESO

quinta-feira, 10 de março de 2022

Tentativa de replicar a “alvorada cósmica”

A primeira grande tentativa de replicar a evidência impactante da “alvorada cósmica” – o aparecimento das primeiras estrelas do Universo 180 milhões de anos após o Big Bang – deixou o cenário confuso.

© N. R. Fuller (ilustração de algumas das primeiras estrelas do Universo)

Quatro anos depois que radioastrônomos relataram ter encontrado um sinal da alvorada cósmica, o radioastrônomo Ravi Subrahmanyan e seus colaboradores descrevem como fizeram uma antena flutuar em um represa no rio Sharavati, no estado indiano de Karnataka, em busca desse sinal.

Os resultados originais causaram alvoroço nos círculos de cosmologia, pois eram os primeiros a afirmar que descobriram sinais da alvorada cósmica. A luz das estrelas mais antigas no Universo Observável teve que viajar quase 14 bilhões de anos para alcançar a Terra. Assim, até agora, ela é muito fraca para ser vista diretamente com telescópios comuns.

Mas radioastrônomos buscam por um efeito indireto usando o espectro de ondas de rádio. A luz ultravioleta das primeiras estrelas deve ter deixado o hidrogênio interestelar, normalmente transparente na maior parte do espectro eletromagnético, levemente opaco em um comprimento de onda de rádio específico. Em 2018, astrônomos relataram ter visto uma queda no espectro de rádio primordial, centrada numa frequência de cerca de 78 MHz. Em seguida, a equipe acreditou tratar-se de evidência da alvorada cósmica. 

Os pesquisadores usaram um instrumento com o formato de uma mesa de centro no outback australiano, chamado Experiment to Detect the Global EoR Signature (EDGES). Mas o sinal do EDGES parecia ser bom demais para ser verdade. A queda no espectro era mais profunda e larga do que as teorias cosmológicas previam. Para explicar o tamanho deste sinal, físicos teóricos propuseram uma gama de mecânicas exóticas, como a presença de partículas elementares anteriormente desconhecidas, com cargas elétricas milhares de vezes menores que a de um elétron. Diversos outros pesquisadores mostraram-se preocupados, enfatizando a dificuldade de encontrar a assinatura de rádio da alvorada cósmica. 

As ondas de rádio do Universo jovem são “afogadas” pela cacofonia de ruído produzida por fontes pela galáxia, que são milhares de vezes mais intensas. Para subtrair o espectro galáctico corretamente, pesquisadores têm de calcular com precisão a maneira como seu instrumento e o ambiente ao redor respondem a diversos comprimentos de onda de rádio, também conhecido como “sistemática” do experimento. Por exemplo, a equipe do EDGES modelou os efeitos causados pelo solo do deserto no Observatório de Radioastronomia de Murchison, no oeste da Austrália, e passou dois anos revisando os dados antes de publicá-los. Mas alguns cientistas ainda não estavam convencidos. Desde então, diversos experimentos competidores vêm tentando checar as descobertas do EDGES. 

Em uma tentativa de escapar da confusão gerada pela interferência de frequências de rádio de atividades humanas, em particular de estações de rádio FM, as equipes montam antenas em algumas das regiões mais remotas da Terra. Subrahmanyan optou pela abordagem inovadora de ir sobre as águas de lagos na Índia para fazer flutuar seu instrumento, chamado Shaped Antenna Measurement of the Background Radio Spectrum (SARAS). A SARAS 3 tinha um formato cônico com o objetivo de facilitar o cálculo de sua resposta a ondas de rádio, e a água abaixo significa que a equipe não precisou lidar com a estrutura incerta ou com as propriedades de rádio do terreno. Subrahmanyan afirma que os resultados da SARAS 3 eliminam a detecção de sinais da alvorada cósmica do EDGES.

Mas o astrônomo Judd Bowman, da Universidade do Estado do Arizona, não está convencido que a SARAS 3 eliminou os resultados de sua equipe. “Esses são instrumentos desafiadores e muitos dos problemas sistemáticos que podem afetar o EDGES também podem ocorrer para a SARAS 3”, afirma Bowman. 

Subrahmanyan está começando um novo experimento no CSIRO, e seu antigo colaborador em Raman, o cosmólogo experimental Saurabh Singh, irá continuar os testes em uma nova antena SARAS. Singh também está participando de uma proposta na Indian Space Research Organisation para uma espaçonave que poderia escapar da interferência na frequência de rádio da Terra ao conduzir medições no lado distante da Lua. Qualquer que seja o destino das observações do EDGES, Singh afirma que a equipe por trás delas merece crédito por reaver o interesse na alvorada cósmica.

Um artigo foi publicado na revista Nature.

Fonte: Scientific American

terça-feira, 8 de março de 2022

A maior molécula encontrada até hoje num disco de formação planetária

Pesquisadoras do Observatório de Leiden, na Holanda, detectaram pela primeira vez éter dimetílico num disco de formação planetária.

© ESO/L. Calçada (grãos de poeira formando corpos celestes)

Com nove átomos, esta é a maior molécula identificada até hoje num disco deste tipo. Esta é também a precursora de moléculas orgânicas maiores que podem levar ao surgimento da vida. O éter dimetílico é uma molécula orgânica observada frequentemente em nuvens de formação estelar, mas nunca tinha sido antes encontrada num disco de formação planetária. As pesquisadoras obtiveram igualmente uma possível detecção de metanoato de metila, uma molécula complexa semelhante ao éter dimetílico que também é um bloco constituinte de moléculas orgânicas maiores. 

As moléculas foram encontradas no disco de formação planetária que circunda a estrela jovem IRS 48 (também conhecida por Oph-IRS 48) com o auxílio do Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), no Chile. A IRS 48, localizada a 444 anos-luz de distância na constelação de Ofiúco, tem sido objeto de vários estudos porque seu disco contém uma “armadilha de poeira” assimétrica em forma de castanha de caju. 

Esta região, que se formou muito provavelmente como resultado de um planeta recém nascido ou de uma pequena estrela companheira localizada entre a estrela e a armadilha de poeira, retém um grande número de grãos de poeira do tamanho de milímetros que se podem se juntar para formar objetos do tamanho de quilômetros, tais como cometas, asteroides e, potencialmente, até planetas. 

Acredita-se que muitas moléculas orgânicas complexas, tais como o éter dimetílico, surjam em nuvens de formação estelar, antes ainda das próprias estrelas se formarem. Nesses ambientes frios, átomos e moléculas simples como o monóxido de carbono aderem aos grãos de poeira, formando uma camada de gelo e sofrendo reações químicas, que resultam em moléculas mais complexas.

As pesquisadoras descobriram recentemente que a armadilha de poeira no disco da IRS 48 é também um reservatório gelado que contém grãos de poeira cobertos por esse gelo rico em moléculas complexas. Foi nesta região do disco que o ALMA encontrou agora sinais da molécula de éter dimetílico: quando o calor da IRS 48 sublima o gelo em gás, as moléculas prisioneiras que vieram das nuvens frias, libertam-se e podem assim ser detectadas.

© ALMA (moléculas no disco que rodeia a estrela IRS 48)

A descoberta de éter dimetílico sugere que muitas outras moléculas complexas, que são normalmente detectadas em regiões de formação estelar, poderão estar também presentes em estruturas geladas em discos de formação planetária. Estas moléculas são precursoras de moléculas prebióticas tais como aminoácidos e açucares, que são alguns dos blocos constituintes básicos da vida. 

Ao estudar a sua formação e evolução é possível obter uma melhor compreensão de como as moléculas prebióticas acabam nos planetas, incluindo o nosso. Estudos futuros da IRS 48 com o Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, atualmente em construção no Chile e previsto para começar as suas operações no final desta década, permitirão à equipe estudar a química das regiões mais internas do disco, onde planetas como a Terra podem estar se formando.

Esta pesquisa foi apresentada no artigo intitulado "A major asymmetric ice trap in a planet-forming disk: III. First detection of dimethyl ether" publicado no periódico Astronomy and Astrophysics. Esta publicação apresenta pesquisas realizadas por seis pesquisadoras e foi lançada no Dia Internacional da Mulher 2022.

Fonte: ESO

Algo novo no céu

A cerca de 500 milhões de anos-luz de distância, na constelação do Escultor, encontra-se uma galáxia de aparência bastante peculiar, conhecida como a galáxia Cartwheel (Roda de Carro).

© VLT/NTT (surgimento da supernova na galáxia Cartwheel)

Esta galáxia era uma galáxia normal até ter sofrido uma interação frontal com uma galáxia companheira menor há vários milhões de anos, o que lhe deu esta aparência tão característica de roda de carro. 

No entanto, há ainda outras coisas curiosas relativas a este objeto. Algo interessante está acontecendo no canto inferior esquerdo da imagem direita, captada em dezembro de 2021 com o New Technology Telescope (NTT) do ESO: uma supernova. A imagem da esquerda, obtida em agosto de 2014 com o instrumento MUSE (Multi Unit Spectroscopic Explorer) montado no Very Large Telescope (VLT) do ESO, mostra a galáxia antes da ocorrência desta supernova. 

Este evento, chamado SN2021afdx, é uma supernova do tipo II, que ocorre quando uma estrela massiva chega ao final da sua evolução. As supernovas podem fazer com que uma estrela brilhe mais intensamente do que a sua galáxia hospedeira inteira e pode ser vista pelos observadores durante meses, ou até anos, um piscar de olhos em escalas de tempo astronômicas. 

As supernovas são uma das razões pelas quais os astrônomos dizem que somos todos feitos de poeira de estrelas: este fenômeno libera para o espaço circundante elementos pesados forjados pela estrela progenitora, que podem mais tarde fazer parte de outras gerações de estrelas, dos planetas que as orbitam e da vida que possa existir nestes planetas.

Para detectar e estudar estes eventos imprevisíveis é necessária colaboração internacional. A SN2021afdx foi observada pela primeira vez em novembro de 2021 durante o rastreio ATLAS, tendo sido posteriormente seguida pelo ePESSTO+ (Public ESO Spectroscopic Survey for Transient Objects), o rastreio espectroscópico público avançado do ESO para objetos transientes. O ePESSTO+ foi concebido para estudar objetos que apareçam no céu noturno por períodos de tempo muito curtos, tais como esta supernova. Este rastreio faz uso dos instrumentos EFOSC2 e SOFI montados no NTT, no Observatório de La Silla do ESO, no Chile. O EFOSC2 obteve não apenas esta bela imagem, como também espectros que permitiram à equipe PESSTO identificar este evento como uma supernova do tipo II.

Fonte: ESO

segunda-feira, 7 de março de 2022

Um jato captado pelo Hubble

Uma explosão energética de uma estrela infantil atravessa esta imagem do telescópio espacial Hubble.

© Hubble (HH34)

Esta exalação estelar, que foi produzida por uma estrela extremamente jovem na fase inicial de formação, consiste em um jato incandescente de gás viajando em velocidades supersônicas. À medida que o jato colide com o material ao redor da estrela ainda em formação, o choque aquece este material e faz com que ele brilhe. O resultado são as estruturas coloridas e finas, denominadas objetos Herbig-Haro, ondulando no canto inferior esquerdo desta imagem. 

Os objetos Herbig-Haro parecem evoluir e mudar significativamente em apenas alguns anos. Este objeto em particular, chamado HH34, foi anteriormente captado pelo Hubble entre 1994 e 2007, e novamente em detalhes gloriosos em 2015, veja o blog Explosão artística de uma jovem estrela

O HH34 reside a aproximadamente 1.250 anos-luz da Terra na Nebulosa de Órion, uma grande região de formação estelar visível a olho nu. A Nebulosa de Órion é um dos locais mais próximos de formação estelar generalizada da Terra e, como tal, tem sido examinada por astrônomos em busca de informações sobre como as estrelas e os sistemas planetários nascem. 

Os dados nesta imagem são de um conjunto de observações do Hubble de quatro jatos brilhantes próximos com a Wide Field Camera 3 tirada para ajudar a pavimentar o caminho para a ciência futura com o telescópio espacial James Webb, que observará em comprimentos de onda predominantemente infravermelhos, e será capaz de perscrutar os envelopes empoeirados que cercam protoestrelas ainda em formação, revolucionando o estudo de jatos destas estrelas jovens. 

Fonte: ESA

domingo, 6 de março de 2022

Sistema não contém nenhum buraco negro

Em 2020 uma equipe liderada por astrônomos do Observatório Europeu do Sul (ESO) anunciou a descoberta do buraco negro mais próximo da Terra, situado a apenas 1.000 anos-luz de distância no sistema HR 6819.

© ESO/L. Calçada (ilustração do sistema HR 6819)

No entanto, estes resultados foram contestados por outros grupos de pesquisadores, entre eles uma equipe internacional sediada na KU Leuven, Bélgica. As duas equipes uniram-se para anunciar que, de fato, não existe nenhum buraco negro em HR 6819, que é, em vez disso, um sistema “vampiro” de duas estrelas num estágio raro e de curta duração da sua evolução.

O estudo original de HR 6819 recebeu especial atenção por parte tanto da imprensa como dos cientistas. Thomas Rivinius, astrônomo do ESO no Chile e autor principal do artigo na época, não ficou surpreendido com a reação da comunidade astronômica à sua descoberta do buraco negro. Rivinius e colegas estavam convencidos que a melhor explicação para os dados que tinham obtido, com o telescópio MPG/ESO de 2,2 metros, era que HR 6819 fosse um sistema triplo, com uma estrela orbitando um buraco negro a cada 40 dias e uma segunda estrela numa órbita muito mais afastada. 

No entanto, um estudo liderado por Julia Bodensteiner, enquanto estudante de doutoramento na KU Leuven, Bélgica, propôs uma explicação diferente para os mesmos dados: HR 6819 podia ser também um sistema com apenas duas estrelas numa órbita de 40 dias e sem nenhum buraco negro. Este cenário alternativo necessitaria que uma das estrelas estivesse “despida”, ou seja, que numa fase anterior, tivesse perdido uma enorme fração da sua massa para a outra estrela.

Para resolver este mistério, as duas equipes trabalharam em conjunto no sentido de obterem dados mais nítidos de HR 6819, usando para isso o Very Large Telescope (VLT) do ESO e o Interferômetro do VLT (VLTI). Para distinguir entre as duas hipóteses, os astrônomos usaram os instrumentos GRAVITY, montado no VLTI, e MUSE (Multi Unit Spectroscopic Explorer), do VLT do ESO. O MUSE confirmou que não existe nenhuma companheira brilhante numa órbita mais afastada, enquanto a resolução espacial do GRAVITY foi capaz de distinguir duas fontes brilhantes separadas por apenas um terço da distância entre a Terra e o Sol. Assim, estes dados permitiram concluir que HR 6819 é um sistema sem buraco negro. E ao mesmo tempo que a estrela dadora se viu “despida” de algum do seu material, a estrela receptora começou a girar mais rapidamente. 

A nova equipe conjunta recém-formada, Leuven-ESO, planeja agora monitorar mais de perto o sistema HR 6819 com o auxílio do instrumento GRAVITY do VLTI. Os pesquisadores irão explorar um estudo conjunto do sistema ao longo do tempo para compreender melhor a sua evolução, analisar suas propriedades e usar este conhecimento para aprender mais sobre outros sistemas binários.

Este trabalho foi descrito num artigo científico intitulado “HR 6819 is a binary system with no black hole: Revisiting the source with infrared interferometry and optical integral field spectroscopy” publicado na revista da especialidade Astronomy & Astrophysics.

Fonte: ESO

quarta-feira, 2 de março de 2022

Rajadas Rápida de Rádio num local incomum

Estão entre os grandes mistérios do Universo: explosões de radiação que duram cerca de um milésimo de segundo e que só aparecem em radiotelescópios.

© ASTRON (ilustração de um magnetar e a galáxia M81)

Desde a sua descoberta em 2007, os astrónomos têm analisado a causa destes flashes cósmicos. Agora, uma equipe que envolve o Instituto Max Planck para Radioastronomia e a sua antena de 100 metros em Effelsberg encontrou uma destas Rajadas Rápida de Rádio (FRBs, sigla em inglês) à distância mais próxima da Terra até agora, na galáxia espiral Messier 81, a cerca de 12 milhões de anos-luz de distância.

Além disso, a fonte está aparentemente localizada num aglomerado globular desta galáxia, onde menos se esperaria encontrar uma FRB. A maioria dos flashes de rádio aparecem como se vindos do nada, alguns repetem-se periodicamente. Cada um destes surtos emite tanta energia quanto o Sol irradia num dia inteiro. Várias centenas destes flashes cósmicos são disparados todos os dias e têm sido observados por todo o céu. A maioria está localizada a grandes distâncias da Terra, em galáxias a bilhões de anos-luz de distância. 

Pesquisadores liderados por Franz Kirsten (Universidade de Chalmers, Suécia) e Kenzie Nimmo (Universidade de Amesterdã) analisaram agora de perto uma fonte de surtos repetidos detectada em janeiro de 2020 na direção da constelação de Ursa Maior.

Para este fim, os cientistas utilizaram a rede europeia de observação EVN (European VLBI Network). Combinaram os dados de 12 antenas parabólicas, incluindo o telescópio de 100 metros do Instituto Max Planck para Radioastronomia, o instrumento mais sensível do grupo, e foram assim capazes de identificar exatamente onde no céu teve origem a explosão de radiação. A posição coincide exatamente com um aglomerado globular que se encontra na galáxia M81 e que consiste numa densa coleção de estrelas muito antigas. É precisamente este fato que surpreende os pesquisadores, porque até agora as FRBs tinham sido encontradas mais longe no Universo, em lugares onde as estrelas são muito mais jovens.

Para compreender a surpresa, é preciso conhecer a teoria por detrás da causa das explosões rádio. Muitos especialistas pensam que os chamados magnetares estão associadas a elas. Estes são remanescentes muito densos de sóis massivos que explodiram, isto é, estrelas de nêutrons com cerca de 20 quilômetros de diâmetro que giram rapidamente e que têm campos magnéticos extremamente fortes.

Os cientistas pensam, portanto, que a fonte dos surtos rádio da galáxia M81 é um objeto que foi previsto teoricamente, mas nunca visto ao vivo antes: um magnetar que se formou quando uma anã branca tinha acumulado massa suficiente para se desmoronar sob o seu próprio peso. As anãs brancas são consideradas as fases finais de estrelas normais como o nosso Sol, que vivem durante vários bilhões de anos e acabam por transformar-se em objetos densos do tamanho da Terra sem explodir. Muitas destas anãs brancas existem em antigos aglomerados estelares, algumas delas em sistemas binários. Alguns destes pares devem ser tão íntimos que uma parceira "rouba" material da outra. Se uma das anãs brancas acumular massa extra suficiente da sua companheira, pode transformar-se numa estrela ainda mais densa, um magnetar.

Durante as suas medições, os pesquisadores fizeram outra descoberta: alguns dos surtos eram mais curtos do que o esperado e mudaram de brilho em apenas algumas dezenas de nanossegundos. Isto significa que devem vir de um volume minúsculo no espaço, menor do que um campo de futebol e talvez com apenas algumas dezenas de metros em diâmetro.

Sinais ultracurtos semelhantes também são recebidos de um dos objetos mais famosos do céu, o pulsar da Nebulosa do Caranguejo. Esta também é uma estrela de nêutrons, ou seja, o denso remanescente de uma explosão de supernova que foi avistada da Terra na direção da constelação de Touro no ano 1054. À medida que a estrela gira rapidamente sob si própria, emite dois feixes de radiação. Quando passam na direção da Terra, o objeto parece ser um pulsar, piscando como um farol.

Observações futuras deste e de outros sistemas devem ajudar a determinar se a fonte é, realmente, um magnetar ou outra coisa qualquer, como um pulsar com propriedades incomuns, ou mesmo um buraco negro em órbita íntima de uma estrela compacta. 

Fonte: Max Planck Institute for Radio Astronomy

A emissão de raios X de uma Kilonova

Uma kilonova é um evento poderoso que acontece quando duas estrelas de nêutrons se fundem.

© NASA/M. Weiss (ilustração de uma kilonova)

O Observatório de raios X Chandra da NASA vem coletando dados sobre a kilonova associada a GW170817 desde que foi detectada pela primeira vez em ondas gravitacionais pelo Observatório de Ondas Gravitacionais por Interferometria a Laser (LIGO) e Virgo em 17 de agosto, 2017. 

GW170817 foi o primeiro, e até agora o único, evento cósmico onde tanto as ondas gravitacionais quanto a radiação eletromagnética, ou luz, foram detectadas. Essa combinação fornece aos cientistas informações críticas sobre a física das fusões de estrelas de nêutrons e fenômenos relacionados, usando observações em muitas regiões diferentes do espectro eletromagnético.

O Chandra é o único observatório ainda capaz de detectar a luz desta extraordinária colisão cósmica mais de quatro anos após o evento original. Os astrônomos pensam que depois que as estrelas de nêutrons se fundem, os detritos geram luz visível e infravermelha a partir do decaimento de elementos radioativos como platina e ouro formados nos detritos da fusão. Essa explosão de luz é chamada de kilonova. De fato, a luz visível e a emissão infravermelha foram detectadas de GW170817 várias horas após as ondas gravitacionais.

Inicialmente, a fusão de estrelas de nêutrons provavelmente produziu um jato de partículas de alta energia que não foi apontada diretamente para a Terra, explicando uma falta inicial de raios X vista pelo Chandra. O jato então desacelerou e se alargou com o impacto com gás e poeira ao redor. Essas mudanças causaram um aumento nos raios X observados pelo Chandra seguido por um declínio no início de 2018. No entanto, desde o final de 2020, os raios X detectados pelo Chandra permaneceram em um nível quase constante.

Através de dados obtidos em dezembro de 2020 e janeiro de 2021 o Chandra observou a emissão de raios X de GW170817 e do centro de sua galáxia hospedeira, a NGC 4993. Uma equipe de pesquisadores que estuda os dados do Chandra acha que essa estabilização da emissão de raios X vem de um choque, como um estrondo sônico de um avião, quando os detritos da fusão responsáveis ​​​​pela kilonova atingem o gás em torno de GW170817. O material aquecido por tal choque brilharia constantemente em raios X, dando um "resplandecente de kilonova", como o Chandra observou. 

A ilustração acima mostra os detritos da fusão responsáveis ​​pela kilonova em azul cercado por um choque retratado em laranja e vermelho. Há também uma explicação alternativa sugerindo que os raios X vêm de material caindo em direção a um buraco negro que se formou após a fusão das estrelas de nêutrons. 

Para evitar uma coincidência, é provável que apenas uma das duas opções, o brilho residual da kilonova ou a matéria caindo em um buraco negro, seja uma fonte significativa dos raios X detectados. Os dois arcos azuis brilhantes de material acima e abaixo da kilonova mostram onde o material do jato agora desbotado atingiu o material circundante.

Para distinguir entre as duas explicações, os astrônomos continuarão monitorando GW170817 em raios X e ondas de rádio. Se for um brilho residual de kilonova, espera-se que a emissão de rádio fique mais brilhante ao longo do tempo e seja detectada novamente nos próximos meses ou anos. Se a explicação envolver matéria caindo em um buraco negro recém-formado, a saída de raios X deve permanecer estável ou diminuir rapidamente e nenhuma emissão de rádio será detectada ao longo do tempo.

Pesquisadores anunciaram recentemente que uma fonte foi detectada em novas observações do Chandra realizadas em dezembro de 2021. A análise desses dados está em andamento. Nenhuma detecção de rádio ainda foi relatada. 

Um artigo descrevendo esses resultados foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics

terça-feira, 1 de março de 2022

Um "triângulo espacial" gerado por uma colisão de galáxias

Uma colisão frontal espetacular entre duas galáxias, conhecida como Arp 143, alimentou a exaltação incomum de formação de estrelas em forma triangular, conforme captado pelo telescópio espacial Hubble.

© Hubble (Arp 143)

A dupla de galáxias interativas Arp 143 contém a galáxia espiral distorcida e formadora de estrelas NGC 2445, à direita, junto com sua companheira menos chamativa, NGC 2444, à esquerda. Sua colisão frenética ocorre contra a tapeçaria de galáxias distantes, das quais algumas podem ser vistas através do par em interação. 

Os astrônomos sugerem que as duas galáxias passaram uma pela outra, iniciando a tempestade de forma única de formação de estrelas em NGC 2445, onde milhares de estrelas estão ganhando vida. Esta galáxia está repleta de novas estrelas porque é rica em gás, a matéria-prima da qual as estrelas são feitas. 

No entanto, ainda não escapou das garras gravitacionais de sua parceira à esquerda. A dupla está travando um cabo de guerra cósmico, que NGC 2444 parece estar vencendo. Essa galáxia extraiu gás da NGC 2445, formando o triângulo excêntrico de estrelas recém-criadas.

A NGC 2444 também é responsável por arrancar filamentos de gás de sua parceira, alimentando as correntes de estrelas jovens e azuis que parecem formar uma ponte entre as duas galáxias. Esses fluxos estão entre os primeiros no que parece ser uma onda de formação estelar que começou nos arredores da galáxia e continuou para dentro. Os pesquisadores estimam que as estrelas nasceram entre 50 milhões e 100 milhões de anos atrás. Mas essas estrelas infantis estão sendo deixadas para trás enquanto a NGC 2445 continua se afastando lentamente da NGC 2444. Estrelas com não mais de um milhão a dois milhões de anos estão se formando mais perto do centro da NGC 2445.

A visão aguçada do Hubble revela algumas estrelas individuais, as mais brilhantes e massivas da galáxia. A maioria dos aglomerados azuis brilhantes são agrupamentos de estrelas e as bolhas rosa são nuvens de gás brilhantes que envolvem aglomerados de estrelas jovens e massivos. Embora a maior parte da ação esteja acontecendo na NGC 2445, isso não significa que o outro membro do par de interação escapou ileso.

A disputa gravitacional esticou a NGC 2444 em uma forma estranha, puxando o gás para longe da galáxia. A NGC 2444 contém estrelas antigas e nenhum novo nascimento estelar ocorre porque perdeu seu gás há muito tempo, bem antes desse encontro galáctico. 

Além da formação estelar em NGC 2445, outra característica interessante que o Hubble descobriu são os filamentos escuros de gás no núcleo brilhante da galáxia com formação estelar. Essas feições podem ter sido formadas por explosões de material. Observações de rádio revelam uma fonte poderosa no núcleo que pode estar liderando as explosões. A fonte de rádio pode ter sido produzida por intensa formação de estrelas ou por um buraco negro engolindo material que flui para o centro. 

Não é incomum que a formação de estrelas ocorra nos núcleos das galáxias, impulsionada por interações. Muito gás dos encontros galácticos flui para o centro, o que pode desencadear o nascimento de novas estrelas. Os fluxos dessas estrelas podem expulsar material, mas a poeira criada por essas explosões cobre o núcleo e outras regiões ao longo da NGC 2445, dificultando o estudo do Hubble em luz visível. 

No entanto, o telescópio espacial James Webb terá a visão infravermelha para espiar através da poeira que cobre essas regiões para revelar os jovens aglomerados de estrelas que estão escondidos da vista em imagens de luz visível. Desta forma, Hubble e Webb fornecerão o censo completo de estrelas na NGC 2445. O censo ajudará os astrônomos a responder a perguntas como qual é a taxa de formação de estrelas, quanto tempo leva para as estrelas se formarem e se a explosão de estrelas em NGC 2445 está desaparecendo ou apenas esquentando. 

Estudar aglomerados de estrelas jovens e massivos ainda embutidos em seus casulos de poeira e gás é importante para entender como a formação de estrelas afeta a evolução das galáxias. Estrelas massivas que explodem como supernovas enriquecem seu ambiente com elementos químicos mais pesados ​​que hidrogênio e hélio. 

O sistema Arp 143 está listado em um compêndio de 338 galáxias interativas de aparência incomum chamado “Atlas de Galáxias Peculiares” publicado em 1966 pelo astrônomo Halton Arp. 

Fonte: ESA