quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Exoplanetas em colisão

Existem atualmente cerca de 2.000 exoplanetas confirmados com raios inferiores a cerca de três raios terrestres, e as medidas de suas densidades revelam uma diversidade surpreendente.


© Z. Leinhardt/T. Denman (exoplanetas em colisão)

Alguns têm densidades mais baixas que Netuno, que são feitos principalmente de materiais voláteis que são menos densos que metais e rochas, mas Netuno tem quase quatro vezes o raio da Terra, enquanto outros parecem ter densidades semelhantes a rochas, tão altas quanto as da Terra. Uma gama tão ampla de composições pode ser o produto das diferentes condições iniciais no processo de formação do planeta, ou pode ser porque algo dramático acontece ao planeta para alterar suas propriedades iniciais à medida que ele evolui.

Os astrônomos do Istituto Nazionale Di Astrofisica (INAF) Aldo S. Bonomo e Mario Damasso e o astrofísico Li Zeng do Harvard–Smithsonian Center for Astrophysics (CfA), juntamente com uma grande equipe de colegas, relatou que uma colisão gigante deve ter ocorrido no sistema exoplanetário Kepler-107. Embora haja alguma evidência observacional para o processo de colisão em nosso próprio Sistema Solar, até agora não houve nenhuma descoberta inequívoca em apoio ao cenário de impacto entre os exoplanetas.

Os astrônomos costumavam pensar que os planetas de baixa densidade, como os gigantes Júpiter, Saturno, Urano e Netuno, são formados por gelos frios e gás nas regiões mais externas do disco protoplanetário de uma jovem estrela; a zona interna constrói planetas a partir de elementos rochosos, como silicatos e ferro, cujas partículas podem sobreviver no ambiente mais quente. Hoje, a imagem se tornou mais complicada com centenas de exoplanetas gigantes de baixa densidade descobertos orbitando perto de suas estrelas. No caso dos efeitos evolutivos, acredita-se que dois processos afetam a densidade de um planeta: perda de massa da atmosfera e/ou superfície do planeta devido à evaporação pela radiação da estrela hospedeira, ou uma colisão gigante entre planetas.

Dos quatro planetas conhecidos em Kepler-107, os dois mais internos têm raios quase idênticos de 1,536 e 1,597 raios terrestres, respectivamente (a incerteza de cada um é apenas cerca de 0,2%). Seus períodos também são semelhantes em 3,18 e 4,90 dias, o que significa que eles orbitam relativamente próximos uns dos outros. Usando o espectrógrafo HARPS-N no Telescopio Nazionale Galileo em La Palma, a equipe determinou as massas do planeta e, portanto, suas densidades.

As observações são surpreendentes, suas densidades são muito diferentes: 5,3 e 12,65 gramas por centímetro cúbico, respectivamente. Para comparação, a densidade da água é de 1 grama por centímetro cúbico e a da Terra é de 5,5 gramas por centímetro cúbico. O fato de um dos planetas ter uma densidade duas vezes maior do que o outro não pode ser facilmente explicado pelos efeitos da radiação estelar, que deveriam ter afetado os dois da mesma maneira. Além disso, é o exterior que é mais denso que o interior. Os astrônomos argumentam que um impacto gigantesco em um planeta, o Kepler-107c (o planeta mais denso), arrancou parte do seu manto inicial de silicato, deixando-o dominado por seu denso núcleo de ferro. Os astrônomos suportam esta hipótese com cálculos teóricos.

"Este é um dos muitos sistemas de exoplanetas interessantes que o telescópio espacial Kepler descobriu e caracterizou. Esta descoberta confirmou trabalhos teóricos anteriores sugerindo que o impacto gigante entre os planetas desempenhou um papel durante a formação do planeta. Espera-se encontrar mais destes exemplos com a missão TESS," observa Li Zeng.

Se rupturas catastróficas ocorrem frequentemente em sistemas planetários, então os astrônomos preveem encontrar muitos outros exemplos como o Kepler-107, já que um número crescente de densidades de exoplanetas é determinado com precisão.

O novo artigo foi publicado na Nature Astronomy.

Fonte: Harvard–Smithsonian Center for Astrophysics

terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Bombardeio de cometas em estrela

Uma chuva de cometas está caindo sobre uma jovem estrela distante, dando aos astrônomos uma nova visão de um processo que moldou nosso Sistema Solar bilhões de anos atrás.


© NASA/JPL-Caltech (ilustração de uma tempestade de cometas em torno de Eta Corvi)

Quando a Terra era um planeta jovem, detritos de cometas atingiam sua superfície, transportando material orgânico que pode ter ajudado o surgimento da vida em nosso mundo rochoso. Nos últimos anos, cientistas identificaram evidências indiretas de um processo semelhante em torno de Eta Corvi, uma estrela do tipo solar a cerca de 59 anos-luz de distância, que é um pouco maior e três vezes mais jovem do que o nosso próprio Sol. Agora, os lampejos de gás recentemente observados, os quais cientistas acreditam que emanam de cometas evaporando no calor da estrela, estão fornecendo evidências mais fortes tanto da existência de planetas ocultos quanto da ocorrência de impactos cataclísmicos.

Detectadas pelo astrônomo Barry Welsh, da Universidade da Califórnia em Berkeley, e por sua colega Sharon Montgomery, da Clarion University, na Pensilvânia, estas lufadas de gás podem ter uma conexão profunda, embora indireta, com nosso próprio lar cósmico. Quando nosso Sol tinha a mesma idade de Eta Corvi, as interações gravitacionais entre os planetas externos do nosso Sistema Solar varreram para a parte interna os remanescentes gelados de sua formação, ocasionando um bombardeio que devassou a Terra e outros planetas rochosos. Este "bombardeio cósmico tardio" (LHB, na sigla em inglês) pode ter sido crucial para a habitabilidade da Terra e para nossa própria existência, ao trazer, do armazenamento profundo nas regiões frias do Sistema Solar externo, os compostos orgânicos e água, elementos essenciais para a vida. E algo parecido com isso parece estar ocorrendo agora em torno de Eta Corvi.

Quando visto em conjunto com observações anteriores que também sugerem influxos de fragmentos de gelo e colisões que abalam o planeta em torno de Eta Corvi, o trabalho de Welsh e de Montgomery constitui o melhor caso para um bombardeio de cometas em curso em torno de outra estrela. O influxo em si fornece dicas sobre planetas envoltos em dois anéis massivos. Acredita-se que uma cadeia de planetas gigantes esteja jogando os cometas para dentro, enquanto pelo menos um corpo rochoso parece ter sido atingido pelos destroços gelados. "Temos uma boa imagem dos diferentes fenômenos que estão ocorrendo no sistema e agora temos uma maneira de conectá-los", diz Sebastian Marino, astrônomo da Universidade de Cambridge que utilizou o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) no Chile para estudar Eta Corvi.

Com 1,5 bilhão de anos de idade, Eta Corvi e seu disco já passaram bastante da infância do planeta. Como o nosso próprio Sistema Solar, a estrela possui um par de discos de detritos, embora Eta Corvi esteja um pouco mais distante. Os discos interno e externo estão a 6 e 165 UA (unidades astronômicas, igual à distância entre a Terra e o Sol) da estrela, respectivamente. Em comparação, nosso Cinturão de Asteroides fica a 5 UA do Sol, enquanto o Cinturão de Kuiper, os restos de gelo que sobraram da formação do Sistema Solar, começa apenas com 40 UA. O fato de Eta Corvi brilhar mais e ser mais quente do que o nosso próprio Sol faz com que os cinturões sejam parecidos com os nossos.

A existência de cometas em torno de Eta Corvi não é inesperada. Em 2012, uma equipe de astrônomos liderada por Carey Lisse, no Laboratório de Física Aplicada da Universidade Johns Hopkins, descobriu material incomum no cinturão interno. Usando o telescópio espacial Spitzer da NASA, eles descobriram que nanolosangos microscópicos, juntamente com poeira rica em água e carbono, foram misturados ao cinturão interno. Os pesquisadores concluíram que algum material vindo de fora do cinturão mais externo havia entrado no sistema, provavelmente através de pelo menos um grande cometa, e que a pura força de sua colisão com um planeta rochoso invisível esmagou a rocha rica em carbono e transformou-a em pó de diamante, que então salpicava o cinturão interno.

Trabalhos posteriores de Marino sugeriram que uma cadeia de planetas de tamanho médio, maiores do que a Terra, mas menores do que Júpiter, poderiam arremessar material cometário para dentro da região do cinturão externo, numa espécie de  jogo celestial de batata quente. Neste cenário, a atração gravitacional do planeta mais externo retira o material do cinturão externo e o transporta até que a gravidade do próximo planeta o afaste. Os cometas congelados continuam se movendo, de um planeta para outro, até chegarem ao cinturão interno, onde a luz da estrela derrete suas camadas externas e cria suas “caudas” distintivas de poeira e gás.

Welsh e Montgomery usaram um telescópio de 2,1 metros na Universidade do Texas, no Observatório McDonald de Austin, para estudar Eta Corvi em quatro noites. Durante uma das sessões de uma hora da equipe, eles viram gás quente, que saía de um objeto grande, ou de um aglomerado de objetos menores, bloqueando a luz da estrela. Métodos semelhantes foram usados para identificar cometas em torno de outras estrelas.

As novas observações poderiam ajudar a melhorar nossa compreensão do que aconteceu em nosso próprio Sistema Solar quando o Sol tinha a mesma idade que Eta Corvi tem hoje. Há um grande debate sobre se este evento memorável na história do Sistema Solar ocorreu como um único grande pico ou, em vez disso, a Terra e os outros planetas terrestres experimentaram um ataque mais lento e gradual. Se Eta Corvi é verdadeiramente um análogo confiável para o Sistema Solar pode dirimir as incertezas sobre o tempo e a magnitude da LHB; o que, por sua vez, poderia melhorar a compreensão deste processo à medida que ele se desdobra em outras estrelas.

Até agora, nenhum planeta foi confirmado orbitando Eta Corvi, mas a evidência indireta de sua existência é forte. Enquanto os limites exatos do Cinturão de Kuiper do nosso Sistema Solar são um tanto nebulosos e difusos, o cinturão externo de Eta Corvi é estreito e melhor definido. De acordo com David Nesvorny, um teórico do Southwest Research Institute que modela o desenvolvimento inicial do nosso Sistema Solar, um estreito cinturão sugere fortemente a presença de pelo menos um gigante gasoso nos arredores da faixa.

Tampouco as cadeias de planetas são incomuns. A multiplicidade é a norma para os sistemas exoplanetários, e quase todo tipo de sistema multiplanetário deve prontamente lançar material para a região interna. Atualmente, a maioria das técnicas de detecção de exoplanetas funciona melhor para encontrar mundos próximos de suas estrelas, mas há possibilidade de cadeias de planetas se estenderem para os limites externos de sistemas planetários alienígenas. Os planetas exteriores do Sistema Solar criam esta corrente, embora a gravidade de Júpiter, na maioria das vezes, ejete material para o espaço interestelar, em vez de transportá-lo para mais perto do Sol.

Welsh e Montgomery planejam continuar observando Eta Corvi para fornecer mais uma confirmação do tentador sinal do cometa. Uma nova geração de grandes telescópios terrestres e espaciais programados para começar as operações na próxima década podem ser capazes de fazer imagens do anel interno para ver mais claramente o que está acontecendo lá, talvez até revelando os planetas ocultos da estrela. Enquanto isso, os pesquisadores usaram os telescópios espaciais da NASA Chandra e Spitzer para monitorar a estrela, descartando mundos supermassivos cinco a dez vezes maiores que Júpiter; outras observações estabeleceram um limite superior de seis massas de Júpiter em quaisquer planetas ao redor de Eta Corvi. Pode ser apenas uma questão de tempo até que os astrônomos realmente enxerguem a multiplicidade de mundos de tamanho médio que deve se esconder por ali, e obtenham deles um vislumbre mais profundo de um dos capítulos mais violentos da história do nosso Sistema Solar.

Fonte: Scientific American

sábado, 2 de fevereiro de 2019

Diga adeus a uma das jóias do céu noturno

Durante mais de século e meio, Eta Carinae tem sido uma das estrelas mais luminosas e mais enigmáticas do sul da Via Láctea.


© NASA/N. Smith/J. A. Morse (Eta Carinae)

A imagem acima mostra à esquerda Eta Carinae vista em 2000 pelo telescópio espacial Hubble e à direita o aspecto da estrela em 2032, quando ficar mais brilhante do que a nebulosa.

Parte da sua natureza foi revelada em 1847, quando numa erupção gigante expeliu uma nebulosa chamada Homúnculo. O evento tornou Eta Carinae a segunda estrela mais brilhante do céu depois de Sirius, visível até durante o dia e (mais tarde) facilmente distinguível de outras estrelas similarmente instáveis chamadas Variáveis Azuis Luminosas, cujas nebulosas não são tão claramente visíveis.

Além de tornar Eta Carinae um dos mais belos e frequentemente fotografados objetos do céu noturno, a gigante Nebulosa de Homúnculo contém informações sobre a sua estrela progenitora, que vão desde a energia da sua expansão até ao fluxo bipolar e composição química.

No entanto, daqui a provavelmente uma década, podemos já não ver a nebulosa claramente.

Um estudo recente indica que Homúnculo será ofuscada pelo brilho crescente da própria Eta Carinae. Está crescendo tão depressa que em 2036 a estrela será 10 vezes mais brilhante do que a nebulosa, o que no final a tornará indistinguível de outras Variáveis Azuis Luminosas.

Mas há um lado positivo.

Uma equipe de 17 pesquisadores liderada pelo astrônomo brasileiro Augusto Damineli, com contribuições de Anthony Moffatt da Universidade de Montreal, pensa que o brilho crescente de Eta Carinae não é intrínseco à própria estrela, como é frequentemente aceito. De fato, é provavelmente provocado pela dissipação de uma nuvem de poeira posicionada exatamente à sua frente, a partir da perspetiva da Terra.

Os cientistas postulam em um novo estudo que esta nuvem encobre completamente a estrela e os seus ventos, apagando parte da sua luz que emana para a Terra. A Nebulosa de Homúnculo circundante, em contraste, pode ser vista diretamente porque é 200 vezes maior do que a nuvem obscurecida e o seu brilho fica, portanto, quase inalterado.

Em 2032 (com uma incerteza de mais ou menos quatro anos), a nuvem empoeirada terá se dissipado, de modo que o brilho da estrela central não aumentará mais e Homúnculo se perderá no seu brilho.
E isso vai proporcionar uma oportunidade para um estudo mais aprofundado de Eta Carinae, mostrando até que na realidade não é uma, mas duas estrelas.

"Tem havido uma série de recentes revelações sobre este objeto único no céu, mas esta é uma das mais importantes," realça Moffat. "Pode finalmente permitir-nos sondar a verdadeira natureza do motor central e mostrar que é um sistema binário íntimo constituído por duas estrelas massivas em interação."

O novo estudo foi publicado na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Université de Montréal

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

Telescópio Hubble descobre galáxia inesperadamente

Astrônomos usando o telescópio espacial Hubble para estudar algumas das mais antigas e mais fracas estrelas no aglomerado globular NGC 6752 fizeram uma descoberta inesperada.


© Hubble (Bedin 1)

Eles descobriram uma galáxia anã em nossa vizinhança cósmica, a apenas 30 milhões de anos-luz de distância.

O objetivo das observações foi usar as estrelas anãs brancas para medir a idade do aglomerado globular NGC 6752, mas no processo foi descoberta a galáxia Bedin 1.

Nas franjas externas da área observada com a Advanced Camera for Surveys do Hubble, uma coleção compacta de estrelas era visível. Após uma análise cuidadosa de seus brilhos e temperaturas, os astrônomos concluíram que estas estrelas não pertenciam ao aglomerado, que é parte da Via Láctea, mas estão a milhões de anos-luz mais distantes.

O vizinho cósmico Bedin 1 é uma galáxia alongada de tamanho modesto. Ela mede apenas cerca de 3.000 anos-luz em sua maior extensão, uma fração do tamanho da Via Láctea. Não só é pequena, mas também é incrivelmente fraca. Estas propriedades levaram os astrônomos a classificá-la como uma galáxia anã esferoidal.

As galáxias anãs esferoidais são definidas pelo seu pequeno tamanho, baixa luminosidade, falta de poeira e antigas populações estelares. As galáxias elípticas anãs são semelhantes na aparência e nas propriedades às galáxias anãs esferoidais, porém estas têm em geral uma forma aproximadamente esférica e uma luminosidade mais baixa. Sabe-se que existem 36 galáxias deste tipo no Grupo Local de Galáxias, 22 das quais são galáxias satélites da Via Láctea.

Embora as galáxias anãs esferoidais não sejam incomuns, Bedin 1 tem algumas características notáveis. Não só é uma das poucas anãs esferoidais que têm uma distância bem estabelecida, mas também é extremamente isolada. Fica a cerca de 30 milhões de anos-luz da Via Láctea e a 2 milhões de anos-luz da mais próxima grande hospedeira de galáxias plausíveis, a NGC 6744. Isto torna-a possivelmente a menor galáxia anã descoberta até à data.

Das propriedades de suas estrelas, os astrônomos foram capazes de inferir que a galáxia tem 13 bilhões de anos, quase tão antiga quanto o próprio Universo. Por causa de seu isolamento, que resultou em quase nenhuma interação com outras galáxias, e sua idade, Bedin 1 é o equivalente astronômico de um fóssil vivo do Universo primordial.

A descoberta de Bedin 1 foi um achado verdadeiramente casual. Poucas imagens do Hubble permitem que estes objetos sejam vistos e cobrem apenas uma pequena área do céu. Os telescópios futuros com um grande campo de visão, como o telescópio WFIRST, terão câmeras cobrindo uma área muito maior do céu e poderão encontrar muitos destes vizinhos galácticos.

A descoberta é relatada na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Osservatorio Astronomico di Padova

Mapeamento de "ecos de luz" de buraco negro recém-descoberto

Cientistas mapearam o ambiente em torno de um buraco negro de massa estelar com 10 vezes a massa do Sol usando o NICER (Neutron star Interior Composition Explorer) da NASA a bordo da Estação Espacial Internacional (ISS).


© Goddard Space Flight Center (buraco negro atraindo matéria de uma estrela companheira)

O NICER detectou raios X do recém-descoberto buraco negro MAXI J1820+070 (ou J1820), à medida que consumia material de uma estrela companheira. Ondas de raios X formaram "ecos de luz" refletidos do turbilhão de gás perto do buraco negro e revelaram mudanças no tamanho e na forma do ambiente.

Anteriormente, estes ecos de luz do disco interior de acreção tinham sido vistos apenas em buracos negros supermassivos, que têm milhões a bilhões de vezes a massa do Sol e que mudam muito lentamente. Os buracos negros de massa estelar como J1820 têm massas muito menores e evoluem muito mais depressa, de modo que possibilita observar mudanças ocorrendo em escalas de tempo humanas.

O J1820 está localizado a aproximadamente 10.000 anos-luz na direção da constelação de Leão. A estrela companheira no sistema foi identificada num levantamento realizado pela missão Gaia da ESA, que permitiu a estimativa de sua distância. Os astrônomos só souberam da presença do buraco negro no dia 11 de março de 2018, quando foi detectada uma explosão pelo MAXI (Monitor of All-sky X-ray Image) da JAXA, também a bordo da ISS. O J1820 passou de um buraco negro totalmente desconhecido para uma das fontes mais brilhantes do céu de raios X ao longo de alguns dias. O NICER foi rapidamente apontado para esta transição dramática e continua seguindo o rescaldo da erupção.

Um buraco negro pode sugar gás de uma estrela companheira próxima para um anel de material chamado disco de acreção. As forças gravitacionais e magnéticas aquecem o disco a milhões de graus, tornando-o quente o suficiente para produzir raios X nas regiões mais internas do disco, perto do buraco negro. As explosões ocorrem quando uma instabilidade no disco provoca uma inundação de gás para o interior, na direção do buraco negro, como uma avalanche. Os motivos das instabilidades de disco não são bem compreendidos.

Acima do disco está a coroa, uma região de partículas subatômicas com mais ou menos um bilhão de graus Celsius que brilha em raios X altamente energéticos. Ainda permanecem muitos mistérios sobre a origem e evolução da coroa. Algumas teorias sugerem que a estrutura poderá representar uma forma inicial dos jatos de partículas velozes que estes tipos de sistemas geralmente emitem.

Os astrofísicos querem entender melhor como a orla interna do disco de acreção e a coroa, por cima, mudam de tamanho e forma à medida que um buraco negro acreta material da sua estrela companheira. Se se conseguir entender como e porque é que estas mudanças ocorrem nos buracos negros de massa estelar ao longo de um período de semanas, os cientistas podem elucidar detalhes sobre a evolução dos buracos negros supermassivos ao longo de milhões de anos e como afetam as galáxias em que residem.

Um dos métodos usados para estudar estas mudanças tem o nome mapeamento de reverberação de raios X, que usa reflexos de raios X da mesma maneira que um sonar usa ondas sonoras para mapear terreno submarino. Alguns raios X da coroa viajam diretamente até nós, enquanto outros iluminam o disco e são refletidos de volta em energias e ângulos diferentes.

O mapeamento de reverberação de raios X dos buracos negros supermassivos mostrou que a orla interna do disco de acreção está muito próxima do horizonte de eventos, o ponto de não retorno. A coroa também é compacta, ficando mais próxima do buraco negro do que grande parte do disco de acreção. Observações anteriores de ecos de raios X de buracos negros estelares, no entanto, sugeriram que a seção interior do disco de acreção podia estar bem distante, até centenas de vezes o tamanho do horizonte de eventos. No entanto, o buraco negro de massa estelar J1820 tem um comportamento mais parecido com o dos seus primos supermassivos.

Durante as observações do J1820 pelo NICER, foi vista uma diminuição no atraso de tempo entre o clarão inicial de raios X oriundos diretamente da coroa e o seu eco do disco, indicando que os raios X viajaram cada vez menos antes de serem refletidos. A 10.000 anos-luz de distância, foi estimado que a coroa se contraiu verticalmente de aproximadamente 161 km para 16,1 km.

Para confirmar que a diminuição no tempo de atraso era provocada por uma mudança na coroa e não no disco, os cientistas usaram um sinal chamado linha K de ferro, produzido quando os raios X da coroa colidem com átomos de ferro no disco, dotando-os de fluorescência. O tempo corre mais devagar em campos gravitacionais mais fortes e a velocidades mais altas, como indicado pela teoria da relatividade de Einstein. Quando os átomos de ferro mais próximos do buraco negro são bombardeados pela luz do núcleo da coroa, os comprimentos de onda de raios X que emitem são esticados porque o tempo move-se mais lentamente para eles do que para o observador (neste caso, o NICER).

A equipe descobriu que a linha K de ferro esticada do J1820 permaneceu constante, o que significa que a orla interna do disco permaneceu perto do buraco negro, semelhante a um buraco negro supermassivo. Se o menor tempo de atraso fosse provocado por uma região interna do disco movendo-se ainda mais para dentro, então a linha K de ferro teria sido esticada ainda mais.

Estas observações fornecem aos cientistas novas informações sobre como o material é afunilado para o buraco negro e como a energia é liberada neste processo.

O artigo que descreve as descobertas foi publicado na revista Nature.

Fonte: Massachusetts Institute of Technology

quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

Galáxias ativas apontam para nova física na expansão do cosmos

Ao explorar a história do nosso cosmos com uma grande amostra de galáxias "ativas" distantes observadas pelo XMM-Newton da ESA, uma equipe de astrônomos descobriu que pode haver algo mais na expansão inicial do Universo do que o previsto pelo modelo cosmológico padrão.


© ESA/C. Carreau (ilustração de um quasar)

De acordo com o cenário mais aceito, o nosso Universo contém apenas uma pequena porcentagem de matéria comum. Um-quarto do cosmos é composto por matéria escura, que podemos sentir gravitacionalmente, mas não observar, e o resto consiste na ainda mais misteriosa energia escura que está impulsionando a atual aceleração da expansão do Universo.

Este modelo é baseado numa infinidade de dados recolhidos ao longo das últimas décadas, desde o fundo cósmico de micro-ondas, a primeira luz na história do cosmos, liberada apenas 380.000 anos após o Big Bang e observada em detalhes sem precedentes pela missão Planck da ESA. Estas últimas incluem explosões de supernova, aglomerados galácticos e distorções gravitacionais impressas pela matéria escura em galáxias distantes, e podem ser usadas para traçar a expansão cósmica em épocas recentes da história cósmica, ao longo dos últimos nove bilhões de anos.

Um novo estudo, por Guido Risaliti da Universidade de Florença, Itália, e Elisabeta Lusso da Universidade de Durham, Reino Unido, aponta para outro tipo de rastreador cósmico, os quasares, que preencheriam parte da lacuna entre estas observações, medindo a expansão do Universo até há 12 bilhões de anos.

Os quasares são os núcleos de galáxias onde um buraco negro supermassivo está puxando matéria dos seus arredores a velocidades muito elevadas, brilhando através do espectro eletromagnético. À medida que o material cai para o buraco negro, forma um disco giratório que irradia no visível e no ultravioleta; esta radiação, por sua vez, aquece os elétrons próximos, produzindo raios X.

Há três anos, Guido e Elisabeta perceberam que uma relação bem conhecida entre o brilho ultravioleta e raios X dos quasares podia ser usada para estimar a distância até estas fontes, algo que é notoriamente complicado em astronomia, e, em última análise, estudar a história da expansão do Universo.

As fontes astronômicas cujas propriedades permitem-nos avaliar as suas distâncias são chamadas "velas padrão".

A classe mais notável, as supernovas do tipo Ia, consiste no espetacular desaparecimento das anãs brancas depois de terem engolido demasiado material de uma estrela companheira, gerando explosões de brilho previsível que permitem com que os astrônomos determinem a distância. As observações destas supernovas, no final da década de 1990, revelou a expansão acelerada do Universo nos últimos bilhões de anos.

"A utilização de quasares como velas padrão tem grande potencial, já que podemos observá-los a distâncias muito maiores do que as supernovas do tipo Ia, e assim usá-los para investigar épocas muito mais para trás no Universo," explica Elisabeta.

Com uma amostra considerável de quasares em mão, os astrônomos colocaram agora o seu método em prática, e os resultados são interessantes.

Vasculhando o arquivo do XMM-Newton, recolheram dados de raios X para mais de 7.000 quasares, combinando-os com observações ultravioletas do SDSS (Sloan Digital Sky Survey). Também usaram um novo conjunto de dados, obtidos especialmente com o XMM-Newton em 2017 para observar quasares muito distantes, observando-os como eram quando o Universo tinha apenas dois bilhões de anos. Finalmente, complementaram os dados com um pequeno número de quasares ainda mais longínquos e com alguns relativamente próximos, estudados com os observatórios de raios X Chandra e Swift da NASA, respectivamente.

"Uma amostra tão grande permitiu-nos escrutinar a relação entre a emissão de raios X e ultravioleta por parte dos quasares em grande detalhe, o que refinou em muito a nossa técnica para estimar a distância," explica Guido.

As novas observações do XMM-Newton de quasares distantes são tão boas que a equipe até identificou dois grupos diferentes: 70% das fontes brilham intensamente com raios X de baixa energia, enquanto os restantes 30% emitem quantidades mais baixas de raios X caracterizados por energias mais altas. Para a análise, apenas mantiveram o primeiro grupo de fontes, no qual a relação entre as emissões de raios X e ultravioleta parece mais clara.

Depois de examinarem os dados e de restringir a amostra até mais ou menos 1.600 quasares, os astrônomos ficaram com as melhores observações, levando a estimativas robustas da distância até estas fontes que podiam usar para pesquisar a expansão do Universo.

"Quando combinamos a amostra, que abrange quase 12 bilhões de anos de história cósmica, com a amostra mais local de supernovas do tipo Ia, que cobre apenas aproximadamente os últimos 8 bilhões de anos, encontramos resultados semelhantes nas épocas que se sobrepõem. No entanto, nas fases anteriores que só podemos estudar com os quasares, encontramos uma discrepância entre a evolução observada do Universo e o que poderíamos prever com base no modelo cosmológico padrão," explica Elisabeta.

Ao examinarem este período anteriormente pouco explorado da história cósmica com a ajuda dos quasares, os astrônomos revelaram uma possível tensão no modelo cosmológico padrão, o que poderá exigir a adição de novos parâmetros para reconciliar os dados com a teoria.

"Uma das possíveis soluções seria invocar uma energia escura em evolução, com uma densidade que aumenta com o passar do tempo," diz Guido.

Incidentalmente, este modelo em particular também aliviaria outra tensão que tem mantido os cosmólogos ocupados ultimamente, no que concerne à constante de Hubble, a atual velocidade de expansão do Universo. Esta discrepância foi encontrada em estimativas da constante de Hubble no Universo local, com base em dados de supernovas, independentemente em aglomerados de galáxias e em observações pelo Planck do fundo cósmico de micro-ondas no Universo primordial.

A equipe está ansiosa por observar ainda mais quasares no futuro a fim de refinar os seus resultados. Pistas adicionais poderão vir da missão Euclides da ESA, com lançamento previsto para 2022 e que vai explorar os últimos dez bilhões de anos da expansão cósmica e explorar a natureza da energia escura.

Fonte: ESA

segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

Vagando através da água

Esta imagem impressionante combina dados recolhidos com a Advanced Camera for Surveys, instalada no telescópio espacial Hubble e dados do telescópio Subaru no Havaí.


© Hubble/Subaru (galáxia D100)

Ela mostra apenas uma parte da cauda espetacular emergindo de uma galáxia espiral apelidada de D100.

Caudas como essas são criadas por um processo conhecido como decapagem por pressão. Apesar das aparências, o espaço entre as galáxias em um aglomerado está longe de ser vazio; na verdade, ela é preenchida com gás e plasma superaquecidos, que arrasta e puxa as galáxias enquanto elas se movem através dela, um pouco como a resistência que se experimenta quando se atravessa águas profundas.

Isso pode ser forte o suficiente para separar as galáxias, e muitas vezes resulta em objetos com formas e feições peculiares e bizarras, como visto aqui.

A cauda de gás da galáxia D100, que se estende muito além desta imagem para a esquerda, é um exemplo particularmente notável desse fenômeno. A galáxia é um membro do enorme aglomerado Coma. A pressão do plasma quente constituinte do aglomerado removeu o gás da D100 e o arrancou do corpo principal da galáxia e o arrastou para a pluma retratada aqui.

Aglomerados densamente povoados, como o Coma, abrigam milhares de galáxias. Eles são, portanto, os laboratórios perfeitos para estudar o intrigante fenômeno da decapagem por pressão, que, além de produzir belas imagens como essa, pode ter um profundo efeito sobre como as galáxias evoluem e formam novas gerações de estrelas.

Fonte: ESA

A perfeição de DSHARP no ALMA

A imagem abaixo mostra 20 discos protoplanetários captados pelo primeiro Grande Programa do ALMA (Atacama Large Millimeter Array), chamado DSHARP (Disk Substructures at High Angular Resolution Project).


© ESO/ALMA/DSHARP (20 discos protoplanetários)

Nestas observações, que incluiram horas de dados coletados durante vários meses, os pesquisadores obtiveram imagens de quase 20 discos protoplanetários próximos do Sol, no intuito de aprenderem mais sobre as fases iniciais da formação planetária. A enorme quantidade de dados do projeto acaba de ser divulgada.

Pensa-se desde há muito tempo que os sistemas planetários têm a sua origem nos chamados discos protoplanetários; círculos, espirais ou elipses de gás e poeira, que se formam em torno de protoestrelas nas fases iniciais do seu desenvolvimento. No entanto, o processo pelo qual os planetas emergem destes discos difusos não é bem compreendido, tornando-se particularmente desafiante perceber as fases mais iniciais da sua evolução, quando a poeira no seio de um disco coalesce em planetesimais, dando origem a "sementes" de planetas.

Sabe-se que o primeiro estágio de crescimento de um planeta, de grãos individuais a um corpo com a dimensão de alguns quilômetros, deve acontecer rapidamente em termos astronômicos, no entanto a falta de dados observacionais não tem permitido compreender a física por detrás deste crescimento. Felizmente, este aspecto está mudando com a existência de novos telescópios, tais como o ALMA.

Eventualmente, os astrônomos esperam poder prever com precisão que tipo de sistema planetário evoluirá a partir de qualquer disco protoplanetário particular. O programa DSHARP faz-nos avançar em direção a este objetivo ao fornecer-nos uma vista detalhada das subestruturas (os vários padrões de círculos e espirais escuras e claras que podemos ver em cada disco) e ajudando-nos assim a compreender o seu significado.

Fonte: ESO

sábado, 26 de janeiro de 2019

Debate sobre rapidez da expansão do Universo

A questão de quão rapidamente o Universo está se expandindo tem intrigado os astrônomos há quase um século.


© UCLA/Hubble (quasar com imagem dupla)

Estudos diferentes continuam obtendo novas respostas, o que faz com que alguns pesquisadores se perguntem se estão negligenciando um mecanismo fundamental na "maquinaria" que impulsiona o cosmos. Agora, ao descobrirem uma nova maneira de medir quão rapidamente o cosmos está se expandindo, uma equipe liderada por astrônomos da UCLA (University of California, Los Angeles) deu um passo em direção à resolução do debate.

No coração da disputa está a constante de Hubble, um número que relaciona as distâncias com os desvios para o vermelho das galáxias, quanto a luz é esticada enquanto viaja até à Terra através do Universo em expansão. As estimativas da constante de Hubble variam de 67 a 73 quilômetros por segundo por megaparsec, o que significa que dois pontos no espaço separados por 1 megaparsec (o equivalente a 3,26 milhões de anos-luz) estão se afastando um do outro a uma velocidade entre 67 e 73 quilômetros por segundo.

"A constante de Hubble ancora a escala física do Universo," disse Simon Birrer, acadêmico pós-doutorado da UCLA e autor principal do estudo. Sem um valor preciso para a constante de Hubble, os astrônomos não podem determinar com precisão os tamanhos de galáxias remotas, a idade do Universo ou a história de expansão do cosmos.

A maioria dos métodos para derivar a constante de Hubble tem dois ingredientes: uma distância até uma determinada fonte de luz e o desvio para o vermelho desta fonte de luz. Procurando uma fonte de luz que não tinha sido usada nos cálculos de outros cientistas, Birrer e colegas voltaram-se para os quasares, fontes de radiação alimentadas por enormes buracos negros. Os cientistas escolheram um subconjunto específico de quasares, aqueles cuja luz foi curvada pela gravidade de uma galáxia interveniente e pelo seu efeito de lente gravitacional, que produz duas imagens do quasar lado a lado no céu.

A luz das duas imagens toma percursos diferentes até à Terra. Quando o brilho do quasar flutua, as duas imagens piscam uma após a outra, e não ao mesmo tempo. O atraso no tempo entre estas duas cintilações, juntamente com informações sobre o campo gravitacional da galáxia "intrometida", pode ser usado para traçar a viagem da luz e deduzir as distâncias à Terra, tanto do quasar como da galáxia no plano da frente. O conhecimento dos desvios para o vermelho do quasar e da galáxia permitiu que os cientistas estimassem a rapidez com que o Universo está se expandindo.

A equipe da UCLA, como parte da colaboração internacional H0liCOW, tinha aplicado anteriormente a técnica no estudo de quasares com imagem quadruplicada, imagens de um quasar que aparece quatro vezes ao redor de uma galáxia no plano da frente. Mas as imagens quádruplas não são tão comuns; pensa-se que os quasares com imagem dupla sejam aproximadamente cinco vezes mais abundantes do que os de imagem quádrupla.

Para demonstrar a técnica, a equipe estudou um quasar conhecido como SDSS J1206+4332; contaram com dados do telescópio espacial Hubble, dos observatórios Gemini e W. M. Keck e da rede COSMOGRAIL (Cosmological Monitoring of Gravitational Lenses), um programa gerido pela Escola Politécnica Federal de Lausanne, Suíça, cujo objetivo é determinar a constante de Hubble.

Os pesquisadores obtiveram fotos do quasar, todos os dias, durante vários anos, para medir com precisão o desfasamento de tempo entre as imagens duplas. Então, para obter a melhor estimativa possível da constante de Hubble, combinaram os dados reunidos deste quasar com dados previamente recolhidos pela sua colaboração H0liCOW de três quasares de imagem quadruplicada.

A equipe apresentou uma estimativa da constante de Hubble de aproximadamente 72,5 quilômetros por segundo por megaparsec, um número em linha com o que outros cientistas haviam determinado em pesquisas anteriores que usaram distâncias de supernovas, ou seja, explosões estelares em galáxias remotas, como medições fundamentais. No entanto, ambas as estimativas são cerca de 8% mais altas do que uma que se baseia num brilho fraco de todo o céu chamado fundo cósmico de micro-ondas, uma relíquia que remonta a 380.000 anos após o Big Bang, quando a luz viajou pela primeira vez livremente pelo espaço.

Por outro lado, também pode ser que uma medição, ou todas as três, estejam erradas.

Os pesquisadores estão agora à procura de mais quasares a fim de melhorar a precisão da sua medição da constante de Hubble. Os quasares com imagens duplas dão aos cientistas muitas mais fontes de luz úteis para os seus cálculos da constante de Hubble. No entanto, por agora, a equipe focaliza a sua pesquisa em 40 quasares de imagens quadruplicadas, devido ao seu potencial para fornecer informações ainda mais úteis do que os quasares com imagens duplas.

A pesquisa foi publicada na revista científica Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: University of California

Órbitas misteriosas nos confins do Sistema Solar

As estranhas órbitas de alguns objetos nas áreas mais distantes do nosso Sistema Solar, que alguns astrônomos teorizam serem moldadas por um nono planeta ainda por descobrir, podem ao invés ser explicadas pela força gravitacional combinada de pequenos objetos que orbitam o Sol localizados além de Netuno.


© ESO/M. Kornmesser (ilustração da região do Cinturão de Kuiper)

A explicação alternativa à hipótese denominada de "Planeta Nove", apresentada por pesquisadores da Universidade de Cambridge e da Universidade Americana de Beirute, propõe um disco composto por pequenos corpos gelados com uma massa combinada equivalente a dez massas terrestres. Quando combinada com um modelo simplificado do Sistema Solar, as forças gravitacionais do disco teorizado podem explicar a arquitetura orbital incomum exibida por alguns objetos nos limites exteriores do Sistema Solar.

Embora a nova teoria não seja a primeira a propor que as forças gravitacionais de um disco massivo constituído por objetos pequenos podem evitar a necessidade de um nono planeta, é a primeira teoria capaz de explicar as características significativas das órbitas observadas tendo em conta a massa e a gravidade dos outros oito planetas do nosso Sistema Solar.

Para além da órbita de Netuno, encontramos o Cinturão de Kuiper, composta por corpos pequenos remanescentes da formação do Sistema Solar. Netuno e os outros planetas gigantes influenciam gravitacionalmente os objetos no Cinturão de Kuiper e além, conhecidos coletivamente como Objetos Transnetunianos (TNOs), que rodeiam o Sol em órbitas quase circulares e em quase todas as direções.

No entanto, os astrônomos descobriram alguns aspectos misteriosos. Desde 2003 que foram localizados cerca de 30 TNOs em órbitas altamente elípticas: destacam-se do resto dos TNOs partilhando, em média, a mesma orientação espacial. Este tipo de agrupamento não pode ser explicado pela arquitetura existente do Sistema Solar com oito planetas e levou alguns astrônomos a supor que as órbitas incomuns podem ser influenciadas pela existência de um nono planeta ainda desconhecido.

A hipótese do "Planeta Nove" sugere que, para explicar as órbitas incomuns destes TNOs, teria que haver outro planeta, que se acredita ser dez vezes mais massivo do que a Terra, escondido nos confins distantes do Sistema Solar e acompanhando os TNOs na mesma direção através do efeito combinado da sua gravidade e da do resto do Sistema Solar.

O professor Jihad Touma, da Universidade Americana de Beirute, e o seu ex-aluno Sefilian modelaram a dinâmica espacial completa dos TNOs com a ação combinada dos planetas exteriores gigantes e um grande disco massivo localizados além de Netuno. Os cálculos desta dupla de cientistas, que surgiram de um seminário na Universidade Americana de Beirute, revelaram que tal modelo pode explicar as órbitas perplexas espacialmente agrupadas de alguns TNOs. No processo, foram capazes de identificar variedades na massa do disco, a sua excentricidade e mudanças graduais forçadas nas suas orientações (precessão), que reproduziram com precisão as órbitas dos TNOs.

As tentativas anteriores de estimar a massa total dos objetos localizados além de Netuno apenas contribuíram para cerca de um-décimo da massa da Terra. No entanto, para que os TNOs tenham as órbitas observadas e para que não exista um Planeta Nove, o modelo apresentado por Sefilian e Touma requer que a massa combinada do Cinturão de Kuiper esteja entre algumas a dez vezes a massa da Terra.

"Ao observar outros sistemas, muitas vezes estudamos o disco em torno da estrela hospedeira para inferir as propriedades de quaisquer planetas em órbita. O problema é que quando observamos o disco a partir do interior do sistema, é quase impossível ver o seu todo de uma só vez. Embora não tenhamos evidências observacionais diretas do disco, também não as temos para o Planeta Nove, razão pela qual estamos investigando outras possibilidades. No entanto, é interessante notar que as observações de análogos do Cinturão de Kuiper em torno de outras estrelas, bem como de modelos de formação planetária, revelam populações remanescentes massivas de detritos," disse Sefilian.

"Também é possível que ambos os cenários possam ser verdadeiros, pode haver um disco massivo e um nono planeta. Com a descoberta de cada novo TNO, reunimos mais evidências que podem ajudar a explicar o seu comportamento."

Os resultados foram divulgados na revista científica The Astronomical Journal.

Fonte: University of Cambridge

quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

Alimentando um buraco negro

Os buracos negros são criaturas das trevas. Eles rastejam através do Universo sem emitir luz própria, fora de um leve halo de radiação de Hawking que é quase invisível para buracos negros conhecidos.


© LBNL/Alexander Tchekhovskoy (ilustração de um burco negro emitindo dois jatos opostos)

Portanto, é uma das grandes ironias da astronomia que, muitas vezes, buracos negros foram encontrados nos lugares mais brilhantes do cosmos. Essa associação entre buracos negros e luz surge porque as incríveis forças gravitacionais exercidas por um buraco podem transmitir energia ao material próximo, fazendo com que ele irradie. Um exemplo desse processo ocorre em jatos de buraco negro, onde sua rotação e campos magnéticos se combinam para criar um fluxo de partículas de plasma que emitem luz em uma ampla faixa de comprimentos de onda.

Um novo conjunto de simulações realizado por Kyle Parfrey, do Lawrence Berkeley National Laboratory (LBNL), e seus colegas, oferece uma visão detalhada dos jatos de buraco negro, rastreando, pela primeira vez, o movimento das partículas de plasma que são produzidas através da criação de pares na vizinhança do buraco negro. Os resultados mostram que um grande número dessas partículas roubam energia da rotação do buraco negro. Esses tipos de simulações podem desempenhar um papel fundamental na decodificação dos sinais dos buracos negros no Universo distante e em nossa própria Via Láctea.

Para construir um jato de buraco negro, a natureza tem uma fórmula testada e comprovada. Comece com um buraco negro que está girando tão rápido que seu horizonte de eventos - a superfície que separa o interior do buraco negro do lado de fora - está correndo por uma fração apreciável da velocidade da luz. Agora sincronize o buraco negro em rotação com um campo magnético.

Cálculos mostram que a rotação do buraco negro, juntamente com o efeito de inflar o gás, fará com que as linhas do campo magnético se enrolem em hélices gigantes que espiralam ao longo do eixo rotacional do buraco negro. Nesse processo, a energia rotacional do buraco negro é lentamente transferida para o campo magnético. A energia no campo magnético é eventualmente dissipada e convertida em radiação comum através de um processo em cascata envolvendo a criação de pares e efeitos síncrotron. Acredita-se que os jactos de buraco negro como este alimentam algumas das mais brilhantes fontes de raios X e emissões de rádio no céu.

Durante a última década, houve muitos esforços para entender os jatos de buracos negros usando simulações numéricas. As atuais simulações de última geração usam a teoria da magnetohidrodinâmica relativista geral (GRMHD), que descreve o movimento de um fluido magnetizado no espaço-tempo curvo. Essas simulações são muito boas em descrever a transferência de energia do buraco negro em rotação para o campo magnético. No entanto, elas tratam o plasma como um fluido contínuo.

Em verdadeiros jatos astrofísicos, o plasma é tão rarefeito que a aproximação do fluido não é realmente válida, e sua densidade está constantemente se ajustando às interações locais entre as partículas de plasma e o campo magnético. Por causa de suas limitações, as simulações de GRMHD são incapazes de modelar a conversão de energia de campo magnético em radiação comum, e ainda precisam resolver questões remanescentes sobre a força geral dos jatos.

Para resolver esses problemas, os pesquisadores introduziram um novo tipo de simulação de jato de buraco negro. Em seu trabalho, o plasma é descrito corretamente como uma coleção de partículas individuais, e não como um fluido contínuo e suave. A densidade do plasma ainda não é baseada em um modelo de primeiro princípio das interações entre as partículas e o campo magnético, mas com base na criação de pares de elétrons e pósitrons no campo elétrico que é induzida pela dinâmica do campo magnético ao redor do buraco negro.

Como as simulações do GRMHD, as novas simulações exigem muito poder computacional para observar variações espaciais em pequena escala no jato. Esse trabalho apresenta apenas duas execuções de alta resolução, ambas descrevendo buracos negros girando a cerca de 96% da velocidade da luz. Em uma simulação, o limite para a criação de pares é baixo, levando a um plasma de alta densidade. Na outra simulação, o limiar é maior e o plasma resultante é menos denso.

Os resultados finais em ambos os casos são curtos, cada um durando apenas o suficiente para o buraco negro girar em torno de uma dúzia de vezes. Apesar da brevidade das simulações, os jatos parecem relaxar a um estado quase estático durante as simulações.

Os resultados das novas simulações não são radicalmente diferentes dos resultados das antigas simulações do GRMHD, o que é, em certo sentido, tranquilizador. No entanto, os pesquisadores descobriram algum comportamento interessante e novo. Por exemplo, eles encontram uma grande população de partículas cujas energias relativísticas são negativas, medidas por um observador longe do buraco negro. Quando essas partículas caem no buraco negro, a energia total do buraco negro diminui.

A possibilidade de criar partículas de energia negativa perto de um buraco negro em rotação foi prevista há muito tempo por Roger Penrose. O que é surpreendente é que as novas simulações mostram um fluxo substancial dessas partículas no buraco negro, tanto que a energia que elas extraem ao cair no buraco é comparável à energia extraída pelo enrolamento do campo magnético. É necessário um trabalho de acompanhamento para confirmar essa previsão, mas se o efeito das partículas de energia negativa for tão forte quanto o alegado, isso poderia alterar as expectativas para os espectros de radiação dos jatos de buraco negro.

Os próximos anos estão cheios de promessas. Os detectores de ondas gravitacionais começaram a captar as ondulações no espaço-tempo deixado pelas fusões de buracos negros distantes. Embora ainda não tenha sido visto, os buracos negros também devem emitir ondas gravitacionais quando engolem uma estrela. Essas ondas gravitacionais devem chegar acompanhadas de luz comum.

Modelos de jato como os desenvolvidos pela equipe de pesquisadores desempenhará um papel fundamental na interpretação dessas observações. Mais perto de casa, o Event Horizon Telescope (EHT) está pronto para fornecer a mais alta resolução ainda do buraco negro escondido no centro de nossa galáxia. Esse buraco negro tem um jato modesto, portanto, os dados do EHT precisarão ser processados ​​com a ajuda de modelos de jato realistas. O futuro é brilhante para a pesquisa dos buracos negros.

Fonte: Physical Review Letters

quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

Um momento fugaz

Uma bolha evanescente de gás brilhante se espalhando pelo espaço, a nebulosa planetária ESO 577-24 domina esta imagem captada pelo Very Large Telescope (VLT) do ESO.


© ESO/VLT (nebulosa planetária ESO 577-24)

As nebulosas planetárias foram inicialmente observadas por astrônomos no século XVIII, para os quais o brilho tênue e os contornos bem definidos destes objetos pareciam planetas do nosso Sistema Solar.
O débil e efêmero brilho que emana da nebulosa planetária ESO 577-24 é de curta duração, cerca de 10.000 anos, ou seja, um piscar de olhos em termos astronômicos.

Esta nebulosa planetária teve origem nos restos de uma estrela gigante vermelha morta que lançou as suas camadas exteriores para o espaço, tendo no mesmo momento dado origem a uma anã branca muito quente e pequena. Estes restos irão gradualmente arrefecer e desvanecer, estando atualmente vivendo os seus últimos dias, meros fantasmas da antes vasta gigante vermelha.

As gigantes vermelhas são estrelas no final das suas vidas que já gastaram o hidrogênio dos seus núcleos e começaram a contrair-se sob a enorme força da sua própria gravidade. À medida que a gigante vermelha se contrai, a enorme pressão torna a reacender o núcleo da estrela, fazendo com que esta lance as suas camadas mais exteriores para o espaço sob a forma de um poderoso vento estelar. O núcleo incandescente da estrela moribunda emite radiação ultravioleta suficientemente intensa para ionizar o material ejetado e fazê-lo brilhar. O resultado deste processo é o que chamamos uma nebulosa planetária, um último testamento fugaz a uma estrela anciã no final da sua vida. No momento em que evoluir para uma gigante vermelha, o nosso Sol terá atingido a idade venerável de 10 bilhões de anos. Não há, no entanto, motivo para pânico imediato, já que a atual idade do Sol é de apenas 5 bilhões de anos.

Esta bela nebulosa planetária foi descoberta durante o rastreio da National Geographic Society  — Palomar Observatory Sky Survey na década de 1950, tendo sido registada no Catálogo de Nebulosas Planetárias de Abell em 1966. Os objetos astronômicos têm frequentemente uma variedade de nomes oficiais, com diferentes catálogos a dar-lhes diferentes designações. O nome formal deste objeto no Catálogo de Nebulosas Planetárias de Abell é PN A66 36.

Situado a cerca de 1.400 anos-luz de distância da Terra, o brilho fantasmagórico da ESO 577-24 só é visível através de um telescópio poderoso. À medida que a anã branca vai arrefecendo, a nebulosa continua a expandir-se no espaço, desaparecendo lentamente de vista.

Esta imagem foi obtida no âmbito do Programa Joias Cósmicas do ESO, uma iniciativa que visa obter imagens de objetos interessantes, intrigantes ou visualmente atrativos, utilizando os telescópios do ESO, para efeitos de educação e divulgação científica. O programa utiliza tempo de telescópio que não pode ser usado em observações científicas. Todos os dados obtidos podem ter igualmente interesse científico e são por isso postos à disposição dos astrônomos através do arquivo científico do ESO.

Fonte: ESO

terça-feira, 22 de janeiro de 2019

Dados lunares sobre a história do impacto de asteroides na Terra

A Lua é a crônica mais completa e acessível das colisões de asteroides que esculpiram o nosso jovem Sistema Solar, e um grupo de cientistas está desafiando a nossa compreensão de uma parte da história da Terra.


© NASA/Ernie Wright (mapa de abundâncias rochosas na Lua)

A imagem mostra o lado noturno da Lua, sendo representado pelo mapa de abundâncias rochosas da sonda LRO (Lunar Reconnaissance Orbiter) da NASA. As crateras mais proeminentes visíveis no mapa são Tycho (85 milhões de anos), Copérnico (797 milhões de anos) e Aristarco (164 milhões de anos).
O número de impactos de asteroides na Lua e na Terra aumentou duas a três vezes desde há cerca de 290 milhões de anos.

O estudo tem por base a primeira linha temporal compreensiva de grandes crateras na Lua formadas nos últimos bilhões de anos, usando imagens e dados térmicos recolhidos pela sonda LRO. Quando os cientistas compararam a linha temporal da Lua com a linha temporal das crateras aqui na Terra, descobriram que os dois corpos registaram a mesma história de bombardeamento de asteroides, uma que contradiz as teorias sobre a taxa de impacto da Terra.

Durante décadas os cientistas tentaram entender o ritmo a que os asteroides atingem a Terra estudando cuidadosamente as crateras de impacto nos continentes e usando datação radiométrica das rochas em seu redor para determinar as idades das maiores e, portanto, das mais intactas. O problema é que muitos especialistas assumiram que as primeiras crateras da Terra foram desgastadas pelo vento, pelas tempestades e por outros processos geológicos. Esta ideia explicava por que a Terra tem menos crateras mais antigas do que o esperado em comparação com outros corpos no Sistema Solar, mas tornou difícil a determinação de uma taxa de impacto precisa e determinar se havia mudado com o tempo.

Uma maneira de contornar este problema é através do estudo da Lua. A Terra e a Lua são atingidas nas mesmas proporções ao longo do tempo. Em geral, devido ao seu tamanho maior e gravidade mais alta, cerca de vinte asteroides atingem a Terra por cada um que atinge a Lua, embora os grandes impactos em ambos os corpos sejam raros. Mas apesar das grandes crateras lunares terem sofrido pouca erosão ao longo de blhões de anos, e assim fornecerem aos cientistas um registo valioso, não havia como determinar as suas idades até que a LRO começou a orbitar a Lua há uma década.

O radiômetro térmico da LRO, chamado Diviner, disse aos cientistas quanto calor é irradiado da superfície da Lua, um fator crítico na determinação das idades das crateras. Ao observar este calor irradiado durante a noite lunar, os cientistas podem calcular quanta superfície é coberta por rochas grandes e quentes, em comparação com o regolito mais frio e mais fino, também conhecido como solo lunar.

As grandes crateras formadas por impactos de asteroides nos últimos bilhões de anos são cobertas por pedras e rochas, enquanto crateras mais antigas têm poucas rochas, mostram os dados do Diviner. Isto acontece porque os impactos escavam pedregulhos lunares que são "moídos" ao longo de dezenas de milhões de anos por uma chuva constante de meteoritos minúsculos.

Rebecca Ghent, cientista planetária na Universidade de Toronto e do Instituto de Ciência Planetária (EUA), calculou em 2014 a velocidade a que as rochas da Lua se decompõem em solo. O seu trabalho revelou uma relação entre a abundância de rochas grandes perto de uma cratera e a sua idade. Usando esta foi reunido uma lista de idades de todas as crateras lunares com menos de um bilhão de anos.

O trabalho compensou, retornando várias descobertas inesperadas. Primeiro, a equipe descobriu que o ritmo de formação de crateras grandes na Lua foi duas a três vezes maior ao longo dos últimos 290 milhões de anos do que nos últimos 700 milhões de anos. A razão para este salto na taxa de impacto é desconhecida. Pode estar relacionado com grandes colisões que ocorreram há mais de 300 milhões de anos no cinturão principal de asteroides entre Marte e Júpiter. Tais eventos podem criar detritos que podem atingir o Sistema Solar interior.

A segunda surpresa veio da comparação das idades das crateras grandes na Lua com as da Terra. O seu número e idades similares desafiam a teoria de que a Terra perdeu tantas crateras através da erosão que uma taxa de impacto não pode ser calculada.

Provar que menos crateras significa menos impactos e não perda por erosão, representou um desafio formidável.

Os tubos de kimberlito subterrâneos são vulcões há muito extintos que se estendem, em forma de cenoura, até alguns quilômetros abaixo da superfície. Os cientistas sabem muito sobre a idade e sobre a taxa de erosão dos tubos de kimberlito porque são amplamente minados à procura de diamantes. Estão também localizados em algumas das regiões com menos erosão da Terra, os mesmos locais onde encontramos crateras de impacto preservadas.

Os tubos de kimberlito formados desde há aproximadamente 650 milhões de anos não sofreram muita erosão, indicando que as grandes crateras de impacto mais jovens do que 650 milhões de anos, em terrenos estáveis, também devem estar intactas.

Os achados da equipe relacionados com a Terra podem ter implicações para a história da vida, que é pontuada por eventos de extinção e por uma rápida evolução de novas espécies. Embora as forças que impulsionaram estes eventos sejam complicadas e possam incluir outras causas geológicas, como grandes erupções vulcânicas, combinadas com outros fatores biológicos, a equipe realça que os impactos de asteroides certamente desempenharam um papel nesta saga. A questão é saber se a mudança prevista nos impactos de asteroides está diretamente ligada a eventos que ocorreram há muito tempo na Terra.

Um artigo científico relata a pesquisa na revista Science.

Fonte: Southwest Research Institute

A duração do dia em Saturno foi finalmente determinada

Usando novos dados da sonda Cassini da NASA, os pesquisadores pensam ter resolvido um antigo mistério da ciência do Sistema Solar: a duração do dia em Saturno. É 10 horas, 33 minutos e 38 segundos.


© NASA/Cassini (hemisfério norte de Saturno perto do solstício de verão)

O valor iludiu os cientistas planetários durante décadas, porque o gigante gasoso não tem superfície sólida com marcos para rastrear enquanto gira, e tem um campo magnético incomum que esconde o período de rotação do planeta.

A resposta, descobriu-se, estava escondida nos anéis.

Durante as órbitas da Cassini ao redor de Saturno, os instrumentos examinaram os anéis gelados e rochosos em detalhes sem precedentes. Christopher Mankovich, estudante de astronomia e astrofísica da Universidade da Califórnia em Santa Cruz, EUA, usou os dados para estudar padrões de ondas dentro dos anéis.

O seu trabalho determinou que os anéis respondem a vibrações dentro do próprio planeta, agindo de forma semelhante aos sismógrafos usados para medir o movimento provocado por sismos. O interior de Saturno vibra a frequências que causam variações no seu campo gravitacional. Os anéis, por sua vez, detectam estes movimentos no campo.

Em locais específicos nos anéis, estas oscilações capturam partículas no momento certo nas suas órbitas para gradualmente acumular energia que é convertida como uma onda observável.

A pesquisa descreve o desenvolvimento de modelos da estrutura interna de Saturno que combinam com as ondas dos anéis. Isso permitiu o rastreamneto dos movimentos no interior do planeta e sua rotação.

A rotação que a análise rendeu é vários minutos mais rápida do que as estimativas anteriores de 1981, baseadas em sinais de rádio da sonda Voyager da NASA.

A análise dos dados da Voyager, que estimou o dia como tendo a duração de 10h:39m:33s, baseou-se na informação do campo magnético. A Cassini também usou dados do campo magnético, mas as estimativas anteriores variavam entre 10h:36m até 10h:48m, agora é 10 horas, 33 minutos e 38 segundos. Um ano em Saturno são 29 anos terrestres.

Os cientistas geralmente dependem dos campos magnéticos para medir as rotações dos planetas. O eixo magnético de Júpiter, como o da Terra, não está alinhado com o seu eixo de rotação. Por isso, gira enquanto o planeta roda, permitindo aos cientistas medir um sinal periódico nas ondas de rádio para obter o período de rotação. No entanto, Saturno é diferente. O seu campo magnético único está quase perfeitamente alinhado com o seu eixo de rotação.

É por isso que a descoberta nos anéis foi a chave para determinar a duração do dia. Os cientistas estão entusiasmados com a melhor resposta até agora para uma questão tão central sobre o planeta.
A ideia de que os anéis de Saturno podiam ser usados para estudar a sismologia do planeta foi sugerida pela primeira em 1982, muito antes das observações necessárias serem possíveis.

O pesquisadorr Mark Marley, agora do Centro de Pesquisa Ames da NASA, subsequentemente aprofundou a ideia para a sua tese de doutoramento em 1990. Além de mostrar como os cálculos podiam ser feitos, previu onde poderiam estar as assinaturas dos anéis de Saturno. Ele também observou que a missão Cassini seria capaz de fazer as observações necessárias para testar a ideia.

Duas décadas depois, nos anos finais da missão Cassini, os cientistas analisaram os dados e encontraram características dos anéis nas posições previstas por Mark.

A missão da Cassini terminou em setembro de 2017 quando, com pouco combustível, mergulhou deliberadamente na atmosfera de Saturno, para evitar a queda nas luas do planeta.

A pesquisa foi publicada na revista The Astrophysical Journal.

Fonte: Jet Propulsion Laboratory

domingo, 20 de janeiro de 2019

Proeminências solares: desde o aparecimento até à erupção

Pela primeira vez, uma equipe de cientistas usou um modelo computacional único e coeso para simular todo o ciclo de vida de uma erupção solar: desde a acumulação de energia milhares de quilômetros abaixo da superfície solar, passando pela emergência de linhas emaranhadas de campo magnético, até à liberação explosiva de energia num flash brilhante.


© Mark Cheung/Matthias Rempel (animação da proeminência solar)

Esta visualização é uma animação da proeminência solar modelada no novo estudo. A cor violeta representa plasma, com uma temperatura inferior a 1 milhão Kelvin. O vermelho representa temperaturas entre 1 milhão e 10 milhões Kelvin, e o verde representa temperaturas acima dos 10 milhões Kelvin.

O feito define o cenário para os futuros modelos solares simularem realisticamente o próprio clima do Sol à medida que se desenrola em tempo real, incluindo o aparecimento de manchas solares, que por vezes produzem proeminências e ejeções de massa coronal. Estas erupções podem ter impactos generalizados na Terra, desde interromper redes de energia e redes de comunicações, até prejudicar satélites e pondo os astronautas em perigo.

A pesquisa foi liderada por cientistas do NCAR (National Center for Atmospheric Research) e do Laboratório de Física Solar e Astrofísica da Lockheed Martin. A nova simulação abrangente captura a formação de uma erupção solar de forma mais realista do que os esforços anteriores, e inclui o espectro de emissões de luz conhecidas por estarem associadas a explosões no Sol.

Para o novo estudo, os cientistas tiveram que construir um modelo solar que pudesse estender-se por várias regiões do Sol, capturando o comportamento físico complexo e único de cada uma.

O modelo resultante começa na parte superior da zona de convecção, cerca de 10.000 quilômetros abaixo da superfície do Sol, sobe através da superfície solar e vai até 40.000 km para a atmosfera solar, conhecida como coroa. As diferenças na densidade do gás, na pressão e em outras características do Sol, representadas em todo o modelo, são vastas.

Para simular com sucesso uma erupção solar desde o aparecimento até à liberação de energia, os cientistas precisaram acrescentar equações detalhadas ao modelo que permitissem com que cada região contribuísse para a evolução da erupção solar de maneira realista. Mas também tiveram que ter cuidado para não tornar o modelo tão complicado que deixasse de ser prático a sua execução nos recursos disponíveis de supercomputação.

Para resolver os desafios, foi utilizada uma técnica matemática historicamente usada por pesquisadores que estudam as magnetosferas da Terra e dos outros planetas. A técnica, que permitiu que os cientistas comprimissem a diferença nas escalas de tempo entre as camadas sem perder a precisão, fez com que fosse criado um modelo que realista e computacionalmente eficiente.

O próximo passo foi configurar um cenário do Sol simulado. Em pesquisas anteriores, usando modelos menos complexos, os cientistas precisaram iniciar os modelos quase no momento em que a erupção ia acontecer para conseguirem formar uma explosão.

No novo estudo, a equipe queria ver se o seu modelo podia gerar uma erupção autonomamente. Começaram por criar um cenário com condições inspiradas por uma mancha solar particularmente ativa observada em março de 2014. A mancha solar propiciou dúzias de erupções durante o tempo em que foi visível, incluindo uma pertencente à poderosa classe-X e três moderadamente poderosas de classe-M. Os cientistas não tentaram imitar a mancha solar de 2014 com precisão; ao invés, tentaram aproximar os mesmos ingredientes solares que estavam presentes à época, e que foram tão eficazes na produção de proeminências.

Em seguida, deixaram o modelo correr, vendo se este conseguia produzir uma erupção por conta própria.

O modelo foi capaz de capturar todo o processo, desde a acumulação de energia, passando pela subida até à superfície, até à coroa, energizando a coroa, e depois chegando ao ponto em que a energia é liberada numa erupção solar.

Agora que o modelo mostrou ser capaz de simular realisticamente todo o ciclo de vida de uma erupção solar, os cientistas vão testá-lo com observações reais do Sol e ver se consegue simular com sucesso o que realmente ocorre na superfície solar.

Um artigo foi publicado na revista Nature Astronomy.

Fonte: National Center for Atmospheric Research