sábado, 6 de setembro de 2025

O complexo coração de uma borboleta cósmica

O telescópio espacial James Webb revelou novos pormenores do núcleo da Nebulosa Borboleta, catalogada como NGC 6302.

© Hubble / Webb (três imagens da Nebulosa Borboleta)

Este conjunto mostra três imagens da Nebulosa Borboleta. A primeira e a segunda das três imagens aqui apresentadas realçam a natureza bipolar da Nebulosa Borboleta no visível e no infravermelho próximo pelo telescópio espacial Hubble. A nova imagem do Webb, à direita, amplia o centro da Nebulosa Borboleta, proporcionando uma visão sem precedentes da sua complexa estrutura. Os dados do Webb são complementados com dados do ALMA.

Desde o toro denso e poeirento que rodeia a estrela escondida no centro da nebulosa até aos seus jatos, as observações do Webb revelam muitas novas descobertas que pintam um retrato nunca antes visto de uma nebulosa planetária dinâmica e estruturada.

A Nebulosa Borboleta, localizada a cerca de 3.400 anos-luz de distância na direção da constelação de Escorpião, é uma das nebulosas planetárias mais bem estudadas da nossa Galáxia. Esta espantosa nebulosa foi anteriormente fotografada pelo telescópio espacial Hubble. Agora, o Webb captou uma nova imagem desta nebulosa.

As nebulosas planetárias estão entre os objetos mais belos e mais elusivos do zoo cósmico. Estas nebulosas formam-se quando estrelas com massas entre 0,8 e 8 vezes a massa do Sol perdem a maior parte da sua massa no final das suas vidas. A fase de nebulosa planetária é efêmera, durando apenas cerca de 20.000 anos.

Ao contrário do que o nome indica, as nebulosas planetárias não têm nada a ver com planetas: a confusão de nomes começou há várias centenas de anos, quando os astrônomos referiram que estas nebulosas pareciam redondas, como os planetas. O nome pegou, apesar de muitas nebulosas planetárias não serem redondas de todo, e a Nebulosa Borboleta é um excelente exemplo das formas fantásticas que estas nebulosas podem assumir.

A NGC 6302 é uma nebulosa bipolar, o que significa que tem dois lóbulos que se estendem em direções opostas, formando as "asas" da borboleta. Uma banda escura de gás poeirento constitui o "corpo" da borboleta. Esta banda é na realidade um toro em forma de rosquinha que está sendo visto de lado, escondendo a estrela central da nebulosa, o núcleo antigo de uma estrela semelhante ao Sol que dá energia à nebulosa e a faz brilhar.

Esta nova imagem do Webb faz zoom até ao centro da Nebulosa Borboleta e até ao seu toro poeirento, proporcionando uma visão sem precedentes da sua complexa estrutura. A imagem utiliza dados do MIRI (Mid-InfraRed Instrument) do Webb, funcionando em modo de unidade de campo integral. Este modo combina uma câmara e um espectrógrafo para obter imagens em muitos comprimentos de onda diferentes simultaneamente, revelando como a aparência de um objeto muda com o comprimento de onda. As observações do Webb foram complementadas com dados do ALMA (Atacama Large Millimetre/submillimetre Array), uma poderosa rede de antenas de rádio. 

Os pesquisadores que analisaram estes dados do Webb identificaram cerca de 200 linhas espectrais, cada uma das quais contém informação sobre os átomos e as moléculas da nebulosa. Estas linhas revelam estruturas aninhadas e interligadas definidas por diferentes substâncias químicas. Foi identificada a posição da estrela central da Nebulosa Borboleta, que aquece uma nuvem de poeira anteriormente não detectada ao seu redor, fazendo com que esta brilhe intensamente nos comprimentos de onda do infravermelho médio a que o MIRI é sensível.

A localização da estrela central da nebulosa tem permanecido incerta até agora, porque a poeira que a envolve torna-a invisível em comprimentos de onda ópticos. As pesquisas anteriores para encontrar a estrela não tinham a combinação de sensibilidade infravermelha e resolução necessárias para detectar a nuvem de poeira quente que a obscurece. Com uma temperatura de 220.000 K, esta é uma das estrelas centrais mais quentes conhecidas numa nebulosa planetária da nossa Galáxia. Este motor estelar em chamas é responsável pelo brilho deslumbrante da nebulosa, mas o seu poder total pode ser canalizado pela densa banda de gás poeirento que a rodeia: o toro.

Os novos dados do Webb mostram que o toro é composto por silicatos cristalinos como o quartzo, bem como por grãos de poeira de forma irregular. Os grãos de poeira têm tamanhos da ordem de um milionésimo de metro. Fora do toro, a emissão de diferentes átomos e moléculas assume uma estrutura em várias camadas. Os íons que requerem a maior quantidade de energia para se formarem estão concentrados perto do centro, enquanto os que requerem menos energia encontram-se mais longe da estrela central.

O ferro e o níquel são particularmente interessantes, traçando um par de jatos que se projetam para fora da estrela em direções opostas. Curiosamente, a equipe também detectou luz emitida por moléculas à base de carbono conhecidas como hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, ou HAPs. Estas moléculas formam estruturas planas em forma de anel, muito parecidas com as formas de favo de mel encontradas nas colmeias. Na Terra, é frequente encontrarmos HAPs na fumaça de fogueiras, no escape dos automóveis ou em pão torrado queimado. Dada a localização dos HAPs, suspeita-se que estas moléculas se formam quando uma "bolha" de vento da estrela central irrompe no gás que a rodeia. Esta pode ser a primeira evidência da formação de HAPs numa nebulosa planetária rica em oxigênio, fornecendo um importante vislumbre dos detalhes da formação destas moléculas.

Os resultados foram publicados no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: ESA