sábado, 27 de maio de 2023

A primeira observação de um ciclone polar em Urano

Pela primeira vez, os cientistas da NASA têm fortes indícios da existência de um ciclone polar em Urano.


© JPL-Caltech / VLA (ciclone polar em Urano)

A imagem mostra o ciclone polar em Urano através de observações de micro-ondas, visto aqui como um ponto de cor clara à direita do centro em cada imagem do planeta. As imagens utilizam as bandas de comprimento de onda K, Ka e Q, a partir da esquerda.

Ao examinarem as ondas de rádio emitidas pelo gigante gelado, detectaram o fenômeno no polo norte do planeta. As descobertas confirmam uma verdade geral sobre todos os planetas com atmosferas substanciais no nosso Sistema Solar: quer os planetas sejam compostos principalmente por rocha ou gás, as suas atmosferas mostram sinais de um vórtice rodopiante nos polos. 

Há muito que os cientistas sabem que o polo sul de Urano tem uma característica rodopiante. As imagens da Voyager 2 da NASA, do topo das nuvens de metano, mostraram que os ventos no centro polar giravam mais depressa do que no resto do polo. As medições infravermelhas da Voyager não observaram alterações de temperatura, mas as novas descobertas confirmaram. 

Utilizando as enormes antenas do VLA (Very Large Array), os pesquisadores espreitaram por baixo das nuvens do gigante gelado, determinando que o ar que circula no polo norte parece ser mais quente e mais seco, as características de um ciclone forte. Recolhidas em 2015, 2021 e 2022, as observações são as mais profundas da atmosfera de Urano.

O planeta Urano está se mostrando mais hoje em dia, graças à posição do planeta na sua órbita. É uma longa viagem em volta do Sol para este planeta exterior, que demora 84 anos para efetuar uma volta completa, e nas últimas décadas os polos não estavam apontados para a Terra. Desde 2015, os cientistas têm tido uma melhor visão e têm sido capazes de olhar mais profundamente para a atmosfera polar. 

O ciclone de Urano, de forma compacta e com ar quente e seco no seu núcleo, é muito semelhante aos observados pela Cassini da NASA em Saturno. Com as novas descobertas, foram agora identificados ciclones (que giram na mesma direção da rotação do planeta) ou anticiclones (que giram na direção oposta) nos polos de todos os planetas do nosso Sistema Solar, à exceção de Mercúrio, que não tem uma atmosfera substancial. Mas, ao contrário dos furacões na Terra, os ciclones em Urano e em Saturno não se formam sobre a água (nenhum dos dois parece ter água líquida) e não andam à deriva; ficam bloqueados nos polos. 

Os cientistas vão estar atentos para ver como este recém-descoberto ciclone em Urano evolui nos próximos anos. Será que o núcleo quente que foi observado representa a mesma circulação de alta velocidade vista pela Voyager? Ou existem ciclones empilhados na atmosfera de Urano? 

O Levantamento Decenal de Ciência Planetária e Astrobiologia das Academias Nacionais de Ciência dos EUA deu prioridade à exploração de Urano. Em preparação para essa missão, os cientistas planetários estão concentrados em reforçar os seus conhecimentos sobre o sistema do misterioso gigante gelado. 

Um artigo foi publicado no periódico Geophysical Research Letters

Fonte: Jet Propulsion Laboratory

domingo, 21 de maio de 2023

Nebulosa do Anel WR 134

Feito com filtros de banda estreita, este instantâneo cósmico cobre um campo de visão do tamanho da Lua cheia dentro dos limites da constelação de Cygnus.

© Craig Stocks (WR 134)

A fotografia destaca a borda brilhante de uma nebulosa em forma de anel traçada pelo brilho de enxofre ionizado, hidrogênio e gás oxigênio. Embutidos nas nuvens interestelares de gás e poeira da região, os arcos complexos e brilhantes são seções de bolhas ou conchas de material arrastadas pelo vento da estrela Wolf-Rayet WR 134, a estrela mais brilhante perto do centro da imagem. 

As estimativas de distância colocam WR 134 a cerca de 6.000 anos-luz de distância, tornando a imagem com mais de 50 anos-luz de diâmetro. Derramando seus invólucros externos em poderosos ventos estelares, as massivas estrelas Wolf-Rayet queimaram seu combustível nuclear a uma taxa prodigiosa e encerram esta fase final de evolução estelar massiva em uma espetacular explosão de supernova. Os ventos estelares e as supernovas finais enriquecem o material interestelar com elementos pesados a serem incorporados nas futuras gerações de estrelas. 

Fonte: NASA

Encontrado exoplaneta do tamanho da Terra coberto por vulcões

Os astrônomos descobriram um exoplaneta com a dimensão da Terra, que poderá estar coberto de vulcões.

© NASA / C. Smith (ilustração do exoplaneta LP 791-18 d)

Chamado LP 791-18 d, o planeta poderá sofrer surtos vulcânicos tão frequentes como a lua de Júpiter, Io, o corpo mais vulcanicamente ativo do nosso Sistema Solar. 

Os pesquisadores descobriram e estudaram o planeta utilizando dados do TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA e do telescópio espacial Spitzer, desativado em janeiro de 2020, bem como de um conjunto de observatórios terrestres. 

O exoplaneta LP 791-18 d sofre bloqueio de maré, o que significa que o mesmo lado está constantemente virado para a sua estrela. O lado diurno será provavelmente demasiado quente para a existência de água líquida à superfície. Mas a quantidade de atividade vulcânica que suspeita-se ocorrer por todo o planeta poderia sustentar uma atmosfera, o que permitiria a condensação de água no lado noturno. 

O LP 791-18 d orbita uma pequena estrela anã vermelha a cerca de 90 anos-luz de distância na direção da constelação de Taça. A equipe estima que seja apenas ligeiramente maior e mais massivo do que a Terra. Os astrônomos já sabiam da existência de dois outros mundos no sistema antes desta descoberta, chamados LP 791-18 b e c. O planeta interior é cerca de 20% maior do que a Terra. O planeta exterior c tem cerca de 2,5 vezes o tamanho da Terra e mais de sete vezes a sua massa. 

Durante cada órbita, os planetas d e c passam muito perto um do outro. Cada passagem próxima do planeta mais massivo c produz uma atração gravitacional no planeta d, tornando a sua órbita algo elíptica. Nesta trajetória elíptica, o planeta d é ligeiramente deformado de cada vez que gira em torno da estrela. Estas deformações podem criar atrito interno suficiente para aquecer substancialmente o interior do planeta e produzir atividade vulcânica à sua superfície. 

O planeta Júpiter e algumas das suas luas afetam Io de forma semelhante. O planeta d situa-se no limite interior da zona habitável, a gama tradicional de distâncias, à estrela, em que os cientistas supõem que pode existir água líquida à superfície de um planeta. Se o planeta for tão geologicamente ativo, poderá manter uma atmosfera. As temperaturas podem descer o suficiente no lado noturno do planeta para que a água se condense à superfície. 

O planeta c já foi aprovado para tempo de observação com o telescópio espacial James Webb e a equiea pensa que o planeta d é também um candidato excepcional para estudos atmosféricos pela missão. Uma grande questão na astrobiologia, o campo que estuda amplamente as origens da vida na Terra e fora dela, é se a atividade tectônica ou vulcânica é necessária para a vida. Para além de potencialmente fornecerem uma atmosfera, estes processos podem agitar materiais que de outra forma se afundariam e ficariam presos na crosta, incluindo o elemento carbono. 

Um artigo foi publicado na revista Nature

Fonte: Harvard–Smithsonian Center for Astrophysics

quinta-feira, 18 de maio de 2023

A inflação de raio estelar em Anãs M do Aglomerado das Híades

Com o objetivo de compreender melhor o fenômeno conhecido como "inflação de raio", pesquisadores liderados pelo doutorando do Observatório Nacional (ON/MCTI), Fábio Wanderley, analisaram um grupo de estrelas anãs M no aglomerado aberto das Híades.

© J. Mtanous (aglomerado aberto das Híades)

Inflação de raio é quando o raio de uma estrela é maior do que o previsto pelos modelos estelares que não consideram campos magnéticos. Os raios são inflados por efeito do campo magnético, por isso, modelos que não o consideram tendem a subestimá-los. 

O aglomerado das Híades é um aglomerado estelar aberto relativamente próximo, localizado a cerca de 43 parsecs de distância do Sol (1,33 quatrilhões de quilômetros ou cerca de 140 anos-luz), com aproximadamente 625 milhões de anos de idade. Por ser relativamente jovem, espera-se que as estrelas anãs M do aglomerado ainda mantenham seus campos magnéticos. 

De acordo com Wanderley, isso as torna uma escolha ideal para investigar o fenômeno de inflação do raio estelar, pois elas possuem uma maior probabilidade de apresentar as chamadas assinaturas de inflação. 

Ao analisar um conjunto de 48 estrelas anãs M do aglomerado, os pesquisadores descobriram que a inflação dos raios das estrelas anãs M tem relação com as manchas estelares, ou seja, com as áreas mais escuras e relativamente frias da superfície de estrelas que são geradas pelo campo magnético estelar. Alguns modelos indicam que estrelas como as anãs M, com uma maior cobertura de manchas, apresentam níveis mais altos de inflação de raio. 

Segundo Wanderley, este trabalho e seus resultados são úteis para aprimorar o conhecimento acerca da física de estrelas anãs M. Além disso, podem ajudar a estudar planetas que orbitam essas estrelas. Em conjunto com trabalhos que estudam campos magnéticos dessas estrelas anãs M, é possível também estudar a habitabilidade de sistemas planetários que orbitam estas estrelas. 

As chamadas estrelas anãs M são estrelas frias que pertencem à classe espectral M na sequência principal (faixa de estrelas no diagrama de Hertzsprung-Russell, que relaciona luminosidade e temperatura superficial das estrelas). Essas estrelas são consideravelmente menores e menos massivas que o Sol e são as mais comuns na nossa Galáxia.


© Como Novas (diagrama de Hertzsprung-Russell)

O diagrama de Hertzsprung-Russell (HR) é essencial para estudar a evolução estelar. Estrelas iniciam sua evolução na sequência principal, tornam-se gigantes ou supergigantes e se extinguem como anãs brancas ou, em casos mais raros, como estrelas de nêutrons e buracos negros. # 

Apesar de cerca de 75% das estrelas da nossa galáxia serem anãs M, a modelagem destas estrelas apresenta desafios dada a complexidade de seus espectros observados e o fato de elas serem pouco brilhantes, o que demanda um maior tempo para obtenção de espectros com maior sinal-ruído. Os espectros são uma espécie de “impressão digital" das estrelas e quanto maior o seu sinal-ruído, melhor a qualidade das observações e mais fácil é obter informações de qualidade sobre as características físicas das estrelas.

Segundo os pesquisadores, espera-se que estrelas do mesmo aglomerado aberto, como é o caso das estrelas anãs M deste estudo, tenham aproximadamente a mesma idade, tornando-as ideais para comparação com modelos físicos. Além disso, é esperado que essas estrelas tenham composições químicas semelhantes. Afinal, elas se originaram da mesma nuvem molecular, o que permite aos pesquisadores comparar parâmetros como a metalicidade com estrelas mais massivas já estudadas no aglomerado.

O estudo em questão fez a modelização das atmosferas das estrelas usando o método chamado “síntese espectral”, usando espectros no infravermelho do levantamento astronômico APOGEE (Apache Point Observatory Galactic Evolution Experiment), parte do SDSS IV (Sloan Digital Sky Survey IV), um projeto de grande escala que mapeou o céu e coletou dados de milhões de objetos astronômicos, incluindo estrelas, galáxias e quasares.

Foram determinados os parâmetros atmosféricos de 48 estrelas anãs M do aglomerado, como temperaturas efetivas, gravidades superficiais e metalicidades, além de outros parâmetros como luminosidades e raios estelares. Os raios obtidos foram comparados a diferentes modelos físicos de isócronas para analisar a inflação de raio. Isócronas são modelos que estimam características físicas estelares para uma determinada idade. 

O resultado encontrado foi que a inflação de raio de estrelas anãs M não é muito significativa e representa na média cerca de 2% de aumento do raio. Entretanto, a definição de inflação de raio é muito dependente do modelo estelar utilizado, já que os modelos diferem consideravelmente, sobretudo para estrelas anãs M menos massivas, que possuem interior totalmente convectivo, ou seja, aquelas em que a transferência de energia ocorre por convecção, inclusive no núcleo. 

Um dos resultados importantes foi que os raios obtidos para as anãs M das Híades podem ser explicados por modelos que consideram a presença de manchas estelares, indicando que estrelas com maior cobertura de manchas apresentam níveis mais altos de inflação de raio. Usando esses modelos, descobriu-se que a inflação observada em 76% da amostra pode ser explicada por uma cobertura de manchas de até 20%, enquanto as estrelas mais infladas podem ser explicadas por uma cobertura de manchas de até cerca de 40% da fotosfera estelar, a região visível da atmosfera de uma estrela. Também foi observado que estrelas com maior cobertura de manchas são, em média, mais ativas, exibindo maiores proporções entre a luminosidade de altas energias e a luminosidade bolométrica, ou seja, a medida da quantidade total de energia emitida por uma estrela. 

O estudo em questão resultou no artigo “Stellar characterization and radius inflation of Hyades M Dwarf Stars from the APOGEE Survey” aceito para publicação no periódico The Astrophysical Journal

Fonte: Observatório Nacional

Revelada a maior explosão cósmica jamais vista

Uma equipe de astrônomos liderada por pesquisadores da Universidade de Southampton descobriu a maior explosão cósmica jamais testemunhada.

© John Paice (ilustração da acreção de um buraco negro)

A explosão é mais de 10 vezes mais brilhante do que qualquer supernova conhecida. A explosão, conhecida como AT2021lwx, durou até agora mais de três anos, em comparação com a maioria das supernovas que só permanecem visivelmente brilhantes durante alguns meses. Ocorreu há quase 8 bilhões de anos, quando o Universo tinha cerca de 6 bilhões de anos, e está localizada na direção da constelação de Raposa. 

A AT2021lwx foi detectada pela primeira vez em 2020 pelo ZTF (Zwicky Transient Facility) na Califórnia e foi subsequentemente detectado pelo ATLAS (Asteroid Terrestrial-impact Last Alert System), sediado no Havaí. Estas instalações observam o céu noturno para detectar objetos transientes que mudam rapidamente de brilho, indicando eventos cósmicos como supernovas, bem como encontrando asteroides e cometas. 

Até agora, a escala da explosão era desconhecida. A equipe investigou o objeto com vários telescópios diferentes: o Observatório Neil Gehrels Swift, o NTT (New Technology Telescope) no Chile e o GTC (Gran Telescopio Canarias) em La Palma, Espanha. Os pesquisadores pensam que a explosão é o resultado de uma vasta nuvem de gás, possivelmente milhares de vezes maior do que o nosso Sol, que foi violentamente perturbada por um buraco negro supermassivo. Fragmentos da nuvem teriam sido engolidos, enviando ondas de choque através dos seus remanescentes, bem como para uma grande fração poeirenta em forma de rosquinha que rodeia o buraco negro. 

Estes eventos são muito raros e nunca antes se tinha visto nada a esta escala. No ano passado, os astrônomos testemunharam a explosão mais brilhante de que há registo, uma explosão de raios gama denominada GRB 221009A. Embora esta tenha sido mais brilhante do que AT2021lwx, durou apenas uma fração do tempo, o que significa que a energia total liberada pela explosão de AT2021lwx é muito maior. A dimensão física da explosão é cerca de 100 vezes maior do que todo o Sistema Solar e, no seu máximo brilho, foi cerca de 2 trilhões de vezes mais brilhante do que o Sol. 

As únicas coisas no Universo que são tão brilhantes como AT2021lwx são os quasares, ou seja, buracos negros supermassivos com um fluxo constante de gás caindo sobre eles a alta velocidade. Existem diferentes teorias sobre o que poderia ter causado tal explosão, mas considera-se que a explicação mais viável é uma nuvem extremamente grande de hidrogênio gasoso ou poeira que se desviou da sua órbita em torno do buraco negro supermassivo e que foi puxada para o centro do sistema.

A equipe está agora tentando recolher mais dados sobre a explosão, observando o objeto em diferentes comprimentos de onda, incluindo raios X, que poderão revelar a temperatura do objeto e os processos que poderão estar ocorrendo à superfície. Também vão efetuar simulações computacionais atualizadas para testar se estas correspondem à sua teoria sobre o que provocou a explosão.

Com novas instalações, como o LSST (Legacy Survey of Space and Time) do Observatório Vera Rubin entrando em funcionamento nos próximos anos, espera-se descobrir mais eventos como este e aprender mais sobre eles. É possível que estes acontecimentos, embora extremamente raros, sejam tão energéticos que são fundamentais da forma como os centros galácticos mudam ao longo do tempo. Uma vez conhecida a distância ao objeto e quão brilhante parece ser, é possível calcular o brilho do objeto na sua origem. Depois de efetuar estes cálculos, percebeu-se que este objeto é extremamente brilhante. 

Com um quasar, nota-se o brilho oscilando para cima e para baixo ao longo do tempo. Mas olhando para trás, ao longo de uma década, não foi detectado AT2021lwx e, de repente, apareceu como uma das coisas mais luminosas do Universo!

Um artigo foi publicado no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Institute of Space Sciences

Uma vida solitária para as jovens estrelas no centro da Via Láctea

Segundo um novo estudo, as estrelas que vivem o mais perto do buraco negro no centro da Via Láctea não têm companheiras.

© GCOI (órbitas de estrelas S em torno do buraco negro supermassivo da Via Láctea)

Usando o Observatório W. M. Keck em Maunakea, Havaí, Devin Chu, astrônomo da GCOI (Galactic Center Orbits Initiative) da UCLA (Universidade da Califórnia em Los Angeles), liderou um levantamento de 10 anos que descobriu que estas "estrelas S", onde "S" significa Sagitário A*, o nome do buraco negro supermassivo no centro da nossa Galáxia, são todas individuais.

O resultado é surpreendente, uma vez que as estrelas S que a equipe observou incluem estrelas jovens e massivas de sequência principal, com apenas cerca de seis milhões de anos. Normalmente, as estrelas desta idade, que são 10 vezes mais massivas do que o nosso Sol, passam a sua infância emparelhadas com uma gêmea num sistema binário ou, por vezes, mesmo como trigêmeas. 

É provável que a poderosa influência do buraco negro supermassivo faça com que os sistemas estelares binários se fundam ou se tornem perturbados, onde uma estrela companheira é expulsa da região. Isto pode explicar porque é que não vemos nenhuma estrela com parceiras tão perto de Sagitário A*. 

Este estudo de uma década marca a primeira pesquisa sistemática de sistemas binários no aglomerado de estrelas S. Utilizando o sistema de ópticas adaptativas do observatório Keck, emparelhado com o seu instrumento OSIRIS (OH-Suppressing Infrared Imaging Spectrograph), os astrônomos seguiram os movimentos de 28 estrelas S; 16 das quais são estrelas jovens do tipo B da sequência principal e as restantes são estrelas velhas e de baixa massa do tipo M ou gigantes do tipo K. As ópticas adaptativas do Keck e o OSIRIS foram cruciais para nos darem a visão infravermelha de que precisávamos para espreitar através da poeira do Centro Galáctico e para distinguir as estrelas S individuais nesta região tão povoada. 

Os pesquisadores não só encontraram as estrelas S viajando sozinhas, como também conseguiram calcular o limite de quantas destas estrelas S poderiam existir como binários, uma métrica conhecida como fração binária. Descobriram que o limite da fração binária das estrelas S jovens é de 47%, o que significa que por cada 100 estrelas S, um máximo de 47 podem estar em sistemas binários. Este limite é dramaticamente mais baixo do que o esperado para tipos semelhantes de estrelas jovens na vizinhança solar, que têm uma fração binária de 70%. 

Esta descoberta sugere que as estrelas com companheiras têm dificuldade em manter-se juntas no ambiente extremo do buraco negro supermassivo da Via Láctea. A descoberta acrescenta ao caráter já exótico das estrelas S, cujo nascimento permanece um mistério. As forças de maré de um buraco negro perturbam normalmente a formação estelar tradicional, o que levanta questões sobre a forma como as estrelas S se conseguiram desenvolver no perigoso turbilhão cósmico que Sagitário A* cria. 

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal

Fonte: W. M. Keck Observatory

sábado, 13 de maio de 2023

Um bando de novas luas de Saturno

Foram descobertas novas luas de Saturno que elevará seu total para 145, e quebrará o recorde de Júpiter.


© K Ly (diagrama de 41 novas luas descobertas em Saturno)

Este diagrama mostra as órbitas atuais das 41 novas luas publicadas até agora, codificadas por cores pela direção de suas órbitas (azul para prógrada, na direção da rotação de Saturno e vermelha para retrógrada). O diagrama é mostrado em escala; o tamanho da órbita da lua da Terra é mostrado para comparação no canto inferior esquerdo. 

O planeta Saturno recuperou o recorde de mais luas no Sistema Solar com a descoberta de 62 novas luas. Todas têm apenas alguns quilômetros de tamanho e têm órbitas distantes do planeta que indicam sua origem: Saturno capturou estas rochas em algum momento do passado. 

Até o momento, o Minor Planet Center (MPC) publicou as órbitas das 41 novas luas em uma série de anúncios, chamados Minor Planet Electronic Circulars, emitidos entre 3 e 10 de maio. Brett Gladman (Universidade de British Columbia, Canadá) disse em 11 de maio que o centro liberaria órbitas para mais 21 luas em breve. Isso elevará a contagem total de luas de Saturno para 145, incluindo 24 luas “regulares”, que se formaram ao redor do planeta, e 121 luas menores e “irregulares” em órbitas largas, alongadas e inclinadas. 

Os novos relatórios mais do que dobram o número de luas irregulares de Saturno, deixando Saturno muito à frente das 95 luas de Júpiter, que colocaram Júpiter em primeiro lugar no início deste ano. A torrente de descobertas saturnianas vem de uma série de observações que Edward Ashton (agora na Academia Sinica Institute of Astronomy and Astrophysics, Taiwan) e colegas, incluindo Gladman, fizeram com o Canada France Hawaii Telescope de 2019 a 2021. Seu objetivo inicial era estudar os tamanhos das luas que orbitam Saturno e, em 2021, relataram a distribuição de tamanho das pequenas luas irregulares.

A maior quantidade de luas menores indica uma colisão recente (há 100 milhões de anos) entre dois objetos ao redor de Saturno. Para registrar luas fracas de até alguns quilômetros de tamanho, o grupo empilhou séries de imagens, um método usado anteriormente para procurar luas ao redor de Urano e Netuno, mas não anteriormente para Saturno. O próximo projeto do grupo foi calcular as órbitas dos objetos durante o período em que os pesquisadores obtiveram observações. O processo é trabalhoso, mas essencial e envolve rastrear o movimento de pequenos objetos no céu ao longo do tempo. 

O rastreamento da órbita é difícil. Estas luas estão longe do planeta, suas órbitas não são triviais e fechadas. Os arquivos do MPC remontam a muitos anos. Comparar novas descobertas com objetos arquivados é difícil porque requer órbitas retroativas ao longo de muitos anos. Ao mesmo tempo, combinar com sucesso a órbita de um novo objeto com observações mais antigas melhora a precisão de seus parâmetros orbitais. 

Quantas luas saturnianas ainda não foram descobertas? A pesquisa de 2021 cobriu apenas 2,2 graus quadrados dos 26 graus quadrados do céu em que a gravidade de Saturno domina, uma região chamada esfera de Hill. No entanto, as luas irregulares raramente ultrapassam a metade do raio da esfera de Hill de um planeta. 

Em seu artigo de 2021, Ashton e Gladman estimaram que Saturno tem cerca de 150 luas irregulares com pelo menos 3 quilômetros de diâmetro. Com cerca de 120 destas luas agora conhecidas. Existem cerca de 30 luas não descobertas nesta faixa de tamanho e provavelmente muitas centenas, senão milhares, de luas saturnianas com tamanhos menores. Descobertas fortuitas de luas remanescentes são improváveis. Um observador procurando por outra coisa provavelmente não reconheceria uma lua nova e, em vez disso, presumiria que era um asteroide comum. 

Fonte: Sky & Telescope

sexta-feira, 12 de maio de 2023

Nova descoberta: Nebulosa de Angelo

A aventura começou em outubro de 2022 a partir do desejo do astrônomo Nicolas Martino de fotografar uma nebulosa escura.

© N. Martino (Nebulosa de Angelo, Relâmpago de Thor, SRN G150.3+4.5 e LDN 1400)

A imagem mostra uma animação dos dados obtidos com filtros RGB. Nesta época do ano, a região de Cassiopeia, Cepheus e Girafa são áreas privilegiadas. Martino avistou uma nebulosa escura chamada LDN 1400 na constelação da Girafa. Seu formato atípico atraiu sua atenção à primeira vista e sua distância focal oferecia um enquadramento interessante. 

De acordo com os dados do IPHAS (INT Photometric H-Alpha Survey), existe até um sinal de Hidrogênio-Alfa (H-Alpha) por trás de LDN 1400. Ao explorar um pouco mais, ele percebeu que, de fato, o sinal H-Alpha vem do remanescente de supernova SNR G150.3+4.5. Este objeto raramente é fotografado e apenas uma foto pode ser vista em Oxygen III (OIII); tornando o projeto ainda mais interessante. 

Martino teve a colaboração do amigo Yann Sainty.  No total, foram necessárias 7 noites para coletar o máximo de dados. A lua deveria estar o menos presente possível para ter sinais OIII e H-Alpha mais "puros". Atendendo aos seus requisitos, as sessões de filmagem começaram em 27 de outubro de 2022 (em Puzieux, Mosela, França) e terminaram em 20 de janeiro de 2023 (em Moydans, Hautes-Alpes, França). O tempo total de integração foi de 46h15. 

O projeto foi apresentado aos astrônomos amadores Marcel Drechsler e Xavier Strottner, que efetuaram o processamento da imagem. Eles concordaram em processar os dados de banda estreita H-Alpha e OIII e os retoques finais, se necessário. Drechsler informou que havia notado um sinal OIII semelhante a uma bolha em torno de CI Camelopardalis. 

Um envelope de nova previamente desconhecido está em torno da estrela CI Camelopardalis, um sistema binário de raios X de massa muito alta. O objeto está muito próximo dos filamentos OIII do brilho residual da supernova G150.3+4.5, mas o envelope bipolar de CI Camelopardalis é um objeto independente e isolado que se encontra bem no fundo de G150.3+4.5.

A última erupção conhecida deste sistema ocorreu em 1998 e foi objeto de inúmeros estudos e publicações nos anos seguintes. Descobrimos um envelope muito mais antigo em torno da estrela, que, de acordo com os cálculos atuais, tem entre 1.500 e 2.200 anos. Este cálculo é baseado em dados de movimento obtidos em 1998 e 1999. Esses dados revelaram velocidades iniciais de 14.000 km/s, mas que diminuíram um terço após alguns dias. Essas velocidades foram inesperadas e até excederam as de uma supernova tipo 1A, o que explica o poder do flare em combinação com os raios X medidos pelo CI Camelopardalis. 

Como as distâncias para sistemas binários como CI Camelopardalis são muito imprecisas para calcular, os valores variam de 4,7 a 7,6 10³ Pc (parsec). Se tomarmos como base o valor médio, obtemos um diâmetro de 50 a 60 anos-luz para o envelope de nova descoberto recentemente em torno do CI Camelopardalis. O que é notável é a trajetória e orientação quase idênticas do surto de CI Camelopardalis de 1998 e de 1500 a 2200 anos atrás. 

O eixo da nebulosa é quase exatamente norte-sul, com uma ligeira inclinação para leste. A periferia norte dominante também corresponde a ambas as erupções. Durante este trabalho, foi possível identificar um OIII muito forte. O H-Alpha, no entanto, era tão fraco que era impossível separá-lo do fundo por meio de nossos filtros H-Alpha. O levantamento do IPHAS foi, no entanto, capaz de identificar um arco noroeste fraco, usamos esses dados para integrá-lo à imagem da descoberta. O envelope em torno do CI Camelopardalis que foi descoberto e que não foi mencionado em nenhuma publicação até agora é muito mais poderoso que uma nova comum e está, em termos de intensidade, entre uma nova e uma supernova. 

A descoberta foi registrada no novo catálogo MarSai Objet, sendo está a primeira descoberta: MarSai O 1, denominada Nebulosa de Angelo, em homenagem ao pai falecido de Martino. 

A foto final de LDN 1400, o Relâmpago de Thor, SNR G150.3+4.5 e MarSai O 1 é uma mistura de gelo, relâmpago e apocalipse. 

Fonte: AstroBin

quinta-feira, 11 de maio de 2023

O jogo de sombras em torno do disco de formação de planetas

A jovem estrela TW Hydrae está fazendo um jogo de sombras em torno do disco de formação de planetas que foi observado pelo telescópio espacial Hubble.

© STScI (ilustração de discos de gás e poeira ao redor da estrela TW Hydrae)

Em 2017, os astrônomos descobriram uma sombra que varre a face de um vasto disco de gás e poeira em forma de panqueca que rodeia a estrela anã vermelha. A sombra não é de um planeta, mas de um disco interior ligeiramente inclinado em relação ao disco exterior, muito maior, o que faz com que este projete uma sombra. Uma explicação é que a gravidade de um planeta invisível está puxando poeira e gás para a órbita inclinada do planeta. Agora, uma segunda sombra surgiu em apenas alguns anos nas observações armazenadas no arquivo MAST do Hubble. Poderá ser de outro disco aninhado no interior do sistema. Os dois discos são provavelmente evidências de um par de planetas em construção. 

A TW Hydrae tem menos de 10 milhões de anos e situa-se a cerca de 200 anos-luz de distância. Na sua infância, o nosso Sistema Solar pode ter-se assemelhado ao sistema de TW Hydrae, há cerca de 4,6 bilhões de anos. Como o sistema TW Hydrae está inclinado quase de face para o ponto de vista da Terra, é um alvo ótimo para obter uma visão panorâmica de um "estaleiro" de construção planetária. 

A segunda sombra foi descoberta em observações obtidas a 6 de junho de 2021, como parte de um programa plurianual concebido para seguir as sombras em discos circunstelares. A melhor solução que a equipe encontrou é que há dois discos desalinhados projetando sombras. Estavam tão próximos um do outro na observação anterior que não os conseguiam separar. Com o tempo, separaram-se e dividiram-se em duas sombras. A explicação mais simples é que os discos desalinhados são provavelmente causados pela atração gravitacional de dois planetas em planos orbitais ligeiramente diferentes. 

O Hubble está a reunir uma visão holística da arquitetura do sistema. Os discos podem ser representativos de planetas com velocidades orbitais diferentes em torno de uma estrela. É como se estivéssemos girando dois discos de vinil a velocidades ligeiramente diferentes. Por vezes os rótulos no centro coincidem, mas depois um passa à frente do outro. Isto sugere que os dois planetas têm de estar bastante próximos um do outro. Se um estivesse se movendo muito mais depressa do que o outro, teria sido captado em observações anteriores. 

Os planetas suspeitos estão localizados numa região a uma distância parecida à de Júpiter em torno do Sol. E as sombras completam uma rotação em volta da estrela a cada 15 anos; o período orbital que seria de esperar a esta distância da estrela. Além disso, estes dois discos interiores estão inclinados cerca de cinco a sete graus relativamente ao plano do disco exterior. Isto é comparável à gama de inclinações orbitais dentro do nosso Sistema Solar.

O disco exterior sobre o qual as sombras estão sendo projetadas pode estender-se até várias vezes o raio do cinturão de Kuiper do nosso Sistema Solar. Este disco maior tem uma curiosa divisão com duas vezes a distância média de Plutão ao Sol. Isto pode ser uma evidência da existência de um terceiro planeta no sistema. Quaisquer planetas interiores seriam difíceis de detectar porque a sua luz perder-se-ia no brilho da estrela. Além disso, a poeira no sistema iria escurecer a sua luz refletida. 

Os dados de TW Hydrae foram obtidos pelo instrumento STIS (Space Telescope Imaging Spectrograph) do Hubble. A visão infravermelha do Telescópio Espacial James Webb poderá também mostrar as sombras com mais pormenor.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: ESA

Imagens ocultas de vastas maternidades estelares

Com o auxílio do VISTA (Visible and Infrared Survey Telescope for Astronomy) do ESO, os astrônomos criaram um vasto atlas infravermelho de cinco maternidades estelares próximas, juntando mais de um milhão de imagens.

© ESO (imagem infravermelha do objeto HH 909 A na constelação do Camaleão)

Estes grandes mosaicos revelam estrelas jovens em formação, envoltas em espessas nuvens de poeira. Graças a estas observações, os astrônomos dispõem agora de uma ferramenta única para decifrar o complexo enigma que é a formação estelar.

Nestas imagens podemos detectar até as fontes de luz mais tênues, tais como estrelas com muito menos massa que o nosso Sol, revelando assim objetos que nunca tinham sido observados anteriormente. Isto permitirá compreender melhor os processos que levam o gás e a poeira a transformarem-se em estrelas. 

As estrelas formam-se quando nuvens de gás e poeira colapsam sob a sua própria gravidade, mas o modo como isso acontece não é totalmente compreendido. Quantas estrelas nascem a partir de uma nuvem? Qual a sua massa? Quantas estrelas verão planetas formarem-se em sua órbita? 

Para responder a estas questões, os pesquisadores analisaram cinco regiões de formação estelar próximas com o telescópio VISTA montado no Observatório do Parana, no Chile. Utilizando a câmara de infravermelhos VIRCAM do VISTA, a equipe captou a luz proveniente das profundezas das nuvens de poeira. A poeira obscurece estas estrelas jovens, tornando-as virtualmente invisíveis aos nossos olhos. Só nos comprimentos de onda do infravermelho é que conseguimos observar o interior destas nuvens e estudar as estrelas em formação. 

O rastreio, denominado VISIONS, observou regiões de formação estelar nas constelações de Órion, Ofiúco, Camaleão, Coroa Austral e Lobo. Estas regiões encontram-se a menos de 1.500 anos-luz de distância da Terra e cobrem uma enorme área no céu. 

O diâmetro do campo de visão do VIRCAM é tão grande como o de três luas cheias, o que o torna único para mapear estas regiões tão vastas. A equipa obteve mais de um milhão de imagens durante um período de cinco anos. As imagens individuais foram usadas para construir os grandes mosaicos que revelam vastas paisagens cósmicas. Estes panoramas pormenorizados apresentam manchas escuras de poeira, nuvens brilhantes, estrelas recém nascidas e as distantes estrelas de fundo da Via Láctea. Uma vez que as mesmas áreas foram observadas repetidamente, os dados do VISIONS permitirão igualmente aos astrônomos estudar o modo como as estrelas jovens se movem. 

Esta não é uma tarefa fácil, uma vez que o deslocamento aparente destas estrelas observado a partir da Terra é tão pequeno como a espessura de um cabelo humano visto a 10 quilômetros de distância. Estas medições dos movimentos estelares complementam as medições obtidas pela missão Gaia da ESA (Agência Espacial Europeia) nos comprimentos de onda do visível, onde as estrelas jovens se encontram escondidas por espessos véus de poeira. 

Adicionalmente, o VISIONS estabelecerá as bases para futuras observações com outros telescópios, tais como o Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, atualmente em construção no Chile e que deverá começar a funcionar no final desta década. O ELT permitirá que observamos mais de perto regiões específicas com um detalhe sem precedentes, fornecendo-nos uma visão nunca antes vista das estrelas individuais que estão atualmente se formando nessas regiões. 

Este trabalho foi descrito num artigo científico intitulado “VISIONS: The VISTA Star Formation Atlas”, publicado na revista da especialidade Astronomy & Astrophysics

Fonte: ESO

Um novo estudo das grandes luas de Urano mostra que podem conter água

Uma reanálise de dados da nave espacial Voyager da NASA, juntamente com novos modelos computacionais, levou os cientistas a concluir que quatro das maiores luas de Urano contêm provavelmente uma camada oceânica entre os seus núcleos e as crostas geladas.

© Hubble (Urano com seus 4 anéis principais e 10 das suas luas)

O seu estudo é o primeiro a detalhar a evolução da composição e estrutura do interior das cinco grandes luas: Ariel, Umbriel, Titânia, Oberon e Miranda. O trabalho sugere que quatro das luas têm oceanos que podem ter dezenas de quilômetros de profundidade. 

No total, pelo menos 27 luas orbitam Urano, sendo que as quatro maiores vão de Ariel, com 1.160 km de diâmetro, até Titânia, com 1.580 quilômetros de diâmetro. Os cientistas há muito que pensam que Titânia, dada a sua dimensão, teria maior probabilidade de reter calor interno provocado pelo decaimento radioativo. As outras luas eram anteriormente consideradas demasiado pequenas para reter o calor necessário para evitar que um oceano interno congelasse, especialmente porque o aquecimento criado pela atração gravitacional de Urano é apenas uma pequena fonte de calor. 

O Levantamento Decenal de Ciência Planetária e Astrobiologia das Academias Nacionais de Ciência dos EUA deu prioridade à exploração de Urano. Em preparação para essa missão, os cientistas planetários estão se concentrando no gigante gelado para reforçar os seus conhecimentos sobre o misterioso sistema de Urano. O novo trabalho tem o potencial de informar como uma futura missão poderá explorar as luas. Quando se trata de corpos pequenos os cientistas planetários já encontraram evidências da existência de oceanos em vários locais improváveis, incluindo os planetas anões Ceres e Plutão, e a lua de Saturno, Mimas. 

O estudo revisitou as descobertas da Voyager 2 da NASA, que passou por Urano na década de 1980, e de observações terrestres. Os autores construíram modelos de computador com descobertas adicionais das sondas Galileo, Cassini, Dawn e New Horizons da NASA (cada uma das quais descobriu mundos oceânicos), incluindo conhecimentos sobre a química e a geologia da lua de Saturno, Encélado, de Ceres, de Plutão e da sua lua Caronte, todos corpos gelados com aproximadamente o mesmo tamanho das luas uranianas.

Os pesquisadores usaram esses modelos para avaliar o grau de porosidade das superfícies das luas uranianas, descobrindo que são provavelmente suficientemente isoladas para reter o calor interno que seria necessário para abrigar um oceano subterrâneo. Além disso, encontraram o que poderia ser uma potencial fonte de calor nos mantos rochosos das luas, que liberam líquido quente e ajudariam um oceano a manter um ambiente quente, um cenário que é especialmente provável para Titânia e Oberon, onde os oceanos podem até ser suficientemente quentes para potencialmente suportar a habitabilidade.

Ao investigar a composição dos oceanos, os cientistas podem aprender mais sobre os materiais que também podem ser encontrados nas superfícies geladas das luas, dependendo se as substâncias que se encontram por baixo foram empurradas para cima pela atividade geológica. Os telescópios mostram que pelo menos uma das luas, Ariel, tem material que fluiu para a sua superfície, talvez a partir de vulcões gelados, há relativamente pouco tempo. De fato, Miranda, a quinta maior e a mais interior das grandes luas de Urano, tem características na sua superfície que parecem ser de origem recente, sugerindo que pode ter mantido calor suficiente para sustentar um oceano em algum momento da sua história. Os recentes modelos térmicos concluíram que é pouco provável que Miranda tenha retido água durante muito tempo; perde calor demasiado depressa e provavelmente está agora gelada. 

Mas o calor interno não seria o único fator que contribuiria para o oceano subsuperficial de uma lua. Uma descoberta importante do estudo sugere que os cloretos, bem como o amoníaco, são provavelmente abundantes nos oceanos das maiores luas de Urano. Há muito que se sabe que o amoníaco atua como anticongelante. Além disso, a modelagem sugere que os sais provavelmente presentes na água seriam outra fonte de anticongelante, mantendo os oceanos internos dos corpos. 

A pesquisa sobre o que se encontra por baixo e à superfície dessas luas ajudará os cientistas a escolherem os melhores instrumentos científicos para as examinar. Por exemplo, determinar que o amoníaco e os cloretos podem estar presentes significa que os espectrômetros, que detectam os compostos através da sua luz refletida, terão de utilizar uma gama de comprimentos de onda que abranja ambos os tipos de compostos. Da mesma forma, podem usar esse conhecimento para conceber instrumentos que possam sondar o interior profundo em busca de líquido.

A procura de correntes elétricas que contribuam para o campo magnético de uma lua é geralmente a melhor forma de encontrar um oceano profundo, como fizeram os cientistas da missão Galileo na lua de Júpiter, Europa. No entanto, a água fria nos oceanos interiores de luas como Ariel e Umbriel poderia tornar esses oceanos menos capazes de transportar essas correntes elétricas e representaria um novo tipo de desafio para os cientistas que trabalham para descobrir o que está por baixo.

Um artigo foi publicado no periódico Journal of Geophysical Research

Fonte: Jet Propulsion Laboratory