terça-feira, 8 de outubro de 2024

Encontrada a galáxia de disco rotativo mais distante

Foi descoberta a galáxia mais distante parecida à Via Láctea alguma vez observada.

© ALMA (galáxia REBELS-25)

Denominada REBELS-25, esta galáxia de disco parece tão ordenada como as galáxias atuais, no entanto, estamos a observá-la quando o Universo tinha apenas 700 milhões de anos. Este fato é tão mais surpreendente quanto, de acordo com a nossa compreensão atual da formação galáctica, se esperava que estas primeiras galáxias do Universo primordial se apresentassem bastante caóticas.

A estrutura e rotação de REBELS-25 foram observadas com o auxílio do Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), do qual o Observatório Europeu do Sul (ESO) é um parceiro. As galáxias que observamos no Universo atual percorreram um longo caminho desde os objetos aglomerados e caóticos que os astrônomos observam tipicamente no Universo primordial.

As galáxias primitivas fundem-se umas com as outras, evoluindo posteriormente para formas mais suaves a um ritmo muito lento. As teorias atuais sugerem que, para que uma galáxia se apresente tão ordenada como a nossa Via Láctea, ou seja, um disco em rotação com estruturas organizadas como braços em espiral, deverá ter evoluído durante bilhões de anos. Contudo, a detecção de REBELS-25 desafia esta escala de tempo.

Neste estudo, os astrônomos descobriram que REBELS-25 é a mais distante galáxia de disco com forte rotação jamais descoberta. A luz que nos chega desta galáxia foi emitida quando o Universo tinha apenas 700 milhões de anos, uns meros 5% da sua idade atual (13,8 bilhões), o que faz com que a rotação ordenada de REBELS-25 seja deveras inesperada.

REBELS-25 foi inicialmente detectada pela mesma equipe em observações anteriores também realizadas com o ALMA, que está localizado no deserto chileno do Atacama. No momento foi uma descoberta excitante, que mostrava indícios de rotação, no entanto a resolução dos dados não era suficientemente alta para ser confirmada. Para discernir corretamente a estrutura e o movimento da galáxia, foram realizadas observações de seguimento, também com o ALMA, com uma resolução mais elevada, conseguindo assim confirmar a sua natureza recorde.

Surpreendentemente, os dados também sugerem características mais desenvolvidas, semelhantes às da Via Láctea, como uma barra central alongada e até braços em espiral, embora sejam necessárias mais observações para confirmar este fato. Observações futuras de REBELS-25, juntamente com mais descobertas de outras galáxias primordiais com rotação, poderão transformar a nossa compreensão da formação das primeiras galáxias e da evolução do Universo.

Este trabalho foi aceito para publicação no periódico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: ESO

quarta-feira, 2 de outubro de 2024

Descoberto planeta em órbita da estrela individual mais próxima do Sol

Com o auxílio do Very Large Telescope (VLT) do Observatório Europeu do Sul (ESO), os astrônomos descobriram um exoplaneta em órbita da estrela de Barnard, a estrela individual mais próxima do nosso Sol.

© ESO (ilustração de exoplaneta ao redor da estrela Barnard)

Neste exoplaneta recém-descoberto, que tem pelo menos metade da massa de Vênus, um ano dura pouco mais de três dias terrestres. 

As observações também sugerem a existência de mais três candidatos a exoplanetas, em outras órbitas em torno desta estrela. Localizada a apenas seis anos-luz de distância da Terra, a estrela de Barnard é o segundo sistema estelar mais próximo, depois do grupo de três estrelas de Alfa Centauri, e a estrela individual mais próxima de nós.

Devido à sua proximidade, é um alvo primário na procura de exoplanetas semelhantes à Terra, mas, e apesar de uma detecção promissora em 2018, não tinha ainda sido confirmado nenhum planeta em órbita da estrela de Barnard. 

A equipe procurava sinais de possíveis exoplanetas existentes no interior da zona habitável ou temperada da estrela de Barnard, uma zona definida como podendo existir água líquida à superfície dos planetas que aí se encontram. As anãs vermelhas como a estrela de Barnard são muitas vezes observadas pelos astrônomos, uma vez que é mais fácil detectar planetas rochosos de baixa massa em sua órbita do que em torno de estrelas maiores do tipo do Sol.

O exoplaneta recém descoberto, Barnard b, está vinte vezes mais próximo da estrela de Barnard do que Mercúrio está do nosso Sol. Orbita a sua estrela em 3,15 dias terrestres e tem uma temperatura à superfície de cerca de 125 °C. Barnard b é um dos exoplanetas de menor massa conhecidos e um dos poucos que com uma massa inferior à da Terra. No entanto, este planeta encontra-se demasiado perto da sua estrela, mais perto do que a zona habitável. Apesar desta estrela ser cerca de 2.500º mais fria do que o nosso Sol, ainda assim a zona onde se encontra o planeta apresenta-se demasiado quente para a água se manter líquida à sua superfície.

A equipe utilizou o ESPRESSO, um instrumento de alta precisão concebido para medir a oscilação de uma estrela causada pela atração gravitacional de um ou mais planetas em sua órbita. Os resultados obtidos com estas observações foram confirmados com dados de outros instrumentos também especializados na procura de exoplanetas: o HARPS no Observatório de La Silla do ESO, o HARPS-N e o CARMENES.

No entanto, os novos dados não confirmam a existência do candidato a exoplaneta registrado em 2018. Para além do planeta confirmado, os cientistas encontraram ainda indícios de mais três candidatos a exoplanetas em órbita da mesma estrela. Estes candidatos, no entanto, requerem observações adicionais com o ESPRESSO para serem confirmados.

Mas a descoberta deste planeta, juntamente com outras descobertas anteriores, como Proxima b e d, mostra que a nossa vizinhança cósmica se encontra repleta de planetas de pequena massa. O Extremely Large Telescope (ELT) do ESO, atualmente em construção, irá transformar a área de investigação dos exoplanetas. O instrumento ANDES do ELT permitirá detectar mais destes pequenos planetas rochosos na zona temperada em torno de estrelas próximas, fora do alcance dos atuais telescópios, e estudar a composição das suas atmosferas.

Um artigo foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics

Fonte: ESO

Jato de um buraco negro promove erupções estelares

Numa descoberta surpreendente, os astrônomos utilizando o telescópio espacial Hubble descobriram que o jato tipo maçarico de um buraco negro supermassivo, no núcleo de uma enorme galáxia, parece causar a erupção de estrelas ao longo da sua trajetória.

© STScI (ilustração de jato e galáxia M87)

As estrelas, chamadas novas, não são apanhadas no interior do jato, mas aparentemente estão situadas numa perigosa vizinhança. Esta descoberta está confundindo os pesquisadores à procura de uma explicação.

Uma nova surge num sistema estelar duplo em que uma estrela normal, envelhecida e inchada, derrama hidrogênio sobre uma estrela companheira anã branca. Quando a anã branca tiver acumulado uma camada superficial de hidrogênio com quilômetros de espessura, essa camada explode como uma bomba nuclear gigante. A anã branca não é destruída pela erupção da nova, que ejeta a sua camada superficial e volta a sugar combustível da companheira, e o ciclo da nova recomeça.

O Hubble encontrou duas vezes mais novas explodindo perto do jato do que em outras partes da galáxia gigante M87 durante o período de estudo. O jato é lançado por um buraco negro central com 6,5 bilhões de massas solares, rodeado por um disco de matéria rodopiante. O buraco negro, alimentado pela matéria em queda, lança um jato de plasma com 3.000 anos-luz de comprimento, que atravessa o espaço quase à velocidade da luz. Qualquer coisa apanhada no feixe energético seria queimada.

© Hubble (M87)

Mas, de acordo com as novas descobertas obtida com o Hubble, aparentemente até estar perto do seu jato de energia também é arriscado. A descoberta do dobro de novas perto do jato implica que ou há o dobro de sistemas binários formadores de novas perto do jato ou que estes sistemas entram em erupção duas vezes mais do que sistemas semelhantes  em outros pontos da galáxia.

Outra ideia que pode ser considerada é que o jato está aquecendo a estrela companheira da anã, fazendo com que esta "transborde" e despeje ainda mais hidrogênio sobre a anã branca. No entanto, os pesquisadores calcularam que este aquecimento não é suficientemente grande para ter este efeito.

Pouco depois do lançamento do Hubble, em 1990, os astrônomos utilizaram o seu instrumento FOC (Faint Object Camera) de primeira geração para espreitar para o centro de M87, onde se esconde o buraco negro monstruoso. Foram notados "eventos transientes" azulados que podiam ser indícios de novas. Mas a visão do FOC era tão estreita que os astrônomos do Hubble não conseguiam olhar para longe do jato para comparar com a região próxima do jato. 

Durante mais de duas décadas, os resultados permaneceram misteriosamente provocantes. Evidências convincentes da influência do jato nas estrelas da galáxia hospedeira foram recolhidas durante um período de nove meses de observação do Hubble com câmaras mais recentes e de visão mais ampla para contar as novas em erupção. Isto constituiu um desafio para o calendário de observação do telescópio, porque exigia que se revisitasse M87 precisamente de cinco em cinco dias para tirar outra fotografia. A soma de todas as exposições de M87 levou à imagem mais profunda de M87 alguma vez obtida. O Hubble encontrou 94 novas no terço de M87 que a sua câmara consegue abranger. 

Este feito deve-se inteiramente às capacidades únicas do Hubble. As imagens dos telescópios terrestres não têm a nitidez necessária para ver as novas nas profundezas de M87. Não conseguem resolver estrelas ou erupções estelares perto do núcleo da galáxia porque a região que rodeia o buraco negro é demasiado brilhante. Só o Hubble consegue detectar as novas contra o brilhante fundo de M87. As novas são extremamente comuns no Universo. Na galáxia M87, há uma nova todos os dias. Mas como existem pelo menos 100 bilhões de galáxias em todo o Universo visível, entram em erupção, a cada segundo, cerca de 1 milhão de novas.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: Space Telescope Science Institute

Eclipse Anular do Sol

Hoje, dia 2 de outubro, ocorrerá um fenômeno astronômico que promete encantar os observadores: um Eclipse Anular do Sol.

© NASA (Eclipse Solar Anular)

Este fenômeno astronômico ocorre quando a Lua se alinha entre a Terra e o Sol, e o seu diâmetro aparente está menor do que o Sol. Assim, a sombra da Lua não cobre totalmente o Sol, criando um "anel de fogo" no céu. 

Este eclipse será visto como anular em uma estreita faixa que passa pelo oceano Pacífico, oceano Atlântico e no extremo sul da América do Sul, incluindo Chile e Argentina. No Brasil será visível na parte sul das regiões sudeste e centro-oeste e toda a região sul. Quanto mais ao sul, maior será a área eclipsada. 

Tanto no eclipse total quanto no anular a lua se alinha entre a Terra e o Sol, bloqueando toda ou a maior parte da luz solar em uma parte da superfície da Terra. A sombra mais escura, onde toda a luz solar é bloqueada, é chamada umbra. Em torno da umbra se define a sombra mais clara, a penumbra, onde a luz solar é parcialmente bloqueada e o eclipse é visto como parcial. 

Esse tipo de eclipse ocorre quando a lua está em seu apogeu, o ponto mais distante de sua órbita da Terra, ou próxima deste ponto, fazendo com que pareça menor do que o Sol no céu. A frequência com que os eclipses do Sol ocorrem é em média 2 vezes por ano, podendo ser somente parciais, anulares ou totais. 

O último eclipse anular do Sol ocorreu em 14 de Outubro de 2023 e foi visto em uma parte do Brasil. Eclipses da Lua e do Sol costumam ocorrer em sequência. Isso se deve à inclinação da órbita da Lua em relação à Terra. No caso desse eclipse anular, ele faz par com o eclipse parcial da Lua ocorrido na noite de 17 para 18 de setembro. 

Para aqueles que pretendem observar o eclipse, é importante estar em um local com vista sem obstáculos para o oeste, uma vez que o evento ocorrerá próximo ao pôr do Sol. Em São José do Rio Preto (SP), por exemplo, o eclipse parcial começará às 17h04, atingirá seu máximo às 17h42, com 0,12 de magnitude, mas a anularidade não será observada, e o término ocorrerá às 18h16, horário que o Sol estará se pondo.

Em hipótese alguma olhe diretamente para o Sol sem proteção adequada. Óculos escuros, chapas de raio X ou outros filtros caseiros não protegem contra os danos. É essencial utilizar filtros certificados, como os óculos especiais para observação solar ou vidros de soldador 14.

O Observatório Nacional fará uma transmissão ao vivo do eclipse anular para que todos possam acompanhar o fenômeno com segurança em seu canal no YouTube. A transmissão será feita em parceria com astrônomos do Projeto "Céu em sua Casa: observação remota" e com o Time And Date, organização internacional que fornece serviços relacionados ao tempo, clima, fenômenos astronômicos e fusos horários.

Assista a live em: Observatório Nacional. Confira mais detalhes sobre esse eclipse em: Time and Date.

Fonte: Observatório Nacional

sexta-feira, 27 de setembro de 2024

O mapa infravermelho mais detalhado da Via Láctea

Os astrônomos publicaram um gigantesco mapa infravermelho da Via Láctea com mais de 1,5 bilhões de objetos, trata-se do mapa mais detalhado criado até à data.

© VISTA (mapa infravermelho da Via Láctea)

Esta colagem destaca uma pequena seleção de regiões da Via Láctea fotografadas para obtenção do mapa infravermelho. Nota-se, da esquerda para a direita e de cima para baixo: NGC 3576, NGC 6357, Messier 17, NGC 6188, Messier 22 e NGC 3603. Todos estes objetos são nuvens de gás e poeira onde estão se formando estrelas, exceto a Messier 22, que é um grupo muito denso de estrelas antigas.

Utilizando o telescópio VISTA do ESO (Observatório Europeu do Sul), a equipe monitorou as regiões centrais da nossa Galáxia durante mais de 13 anos. Com 500 terabytes de dados, este é o maior projeto de observação alguma vez realizado com um telescópio do ESO.

Este mapa recorde inclui 200.000 imagens obtidas pelo telescópio VISTA (Visible and Infrared Survey Telescope for Astronomy) do ESO (Observatório Europeu do Sul). Localizado no Observatório do Paranal, no Chile, o foco principal deste telescópio é cartografar grandes áreas do céu. A equipe monitorou as regiões centrais da nossa Galáxia durante mais de 13 anos. Com 500 terabytes de dados, este é o maior projeto de observação alguma vez realizado com um telescópio do ESO.

Foi utilizada a câmara de infravermelhos do VISTA, a VIRCAM, que consegue observar para além da poeira e do gás que permeiam a Via Láctea. Por conseguinte, é capaz de captar a radiação emitida nas regiões mais ocultas da Via Láctea, abrindo assim uma janela única para a nossa vizinhança galáctica. 

Este gigantesco conjunto de dados cobre uma área do céu equivalente a 8.600 Luas Cheias e contém cerca de 10 vezes mais objetos do que o mapa publicado em 2012 pela mesma equipe. Os dados incluem estrelas recém-nascidas, que se encontram frequentemente envolvidas por casulos de poeira, e aglomerados globulares, que são grupos densos de milhões das estrelas mais antigas da Via Láctea. 

Observar no infravermelho permite também ao VISTA detectar objetos muito frios, que brilham nestes comprimentos de onda, tais como anãs marrons (estrelas “falhadas” que não têm fusão nuclear sustentada) ou planetas flutuantes que não orbitam nenhuma estrela. 

As observações começaram em 2010 e terminaram na primeira metade de 2023, abrangendo um total de 420 noites. Ao observar cada área do céu muitas vezes, a equipe conseguiu não só determinar a localização destes objetos, mas também seguir o seu movimento e determinar se existem variações de brilho. Foram registradas ainda estrelas cuja luminosidade muda periodicamente e que podem ser usadas como réguas cósmicas para medir distâncias, dando-nos assim uma visão tridimensional exata das regiões mais interiores da Via Láctea, as quais se encontravam anteriormente escondidas pela poeira.

Os pesquisadores seguiram também estrelas com hipervelocidade, ou seja, estrelas em movimento rápido catapultadas da região central da Via Láctea após um encontro próximo com o buraco negro supermassivo que aí se enconde. 

O novo mapa contém dados recolhidos no âmbito do rastreio VVV (VISTA Variables in the Vía Láctea) e do seu projeto complementar, o rastreio VVVX (VVV eXtended). Os rastreios VVV e VVVX já deram origem a mais de 300 artigos científicos. Com os rastreios agora concluídos, a exploração científica dos dados recolhidos continuará ainda durante as próximas décadas. Entretanto, o Observatório do Paranal do ESO está sendo preparado para o futuro: o VISTA será atualizado com o novo instrumento 4MOST e o Very Large Telescope (VLT) do ESO receberá o instrumento MOONS. Juntos, estes instrumentos fornecerão espectros de milhões dos objetos aqui estudados, sendo de esperar inúmeras descobertas.

Este trabalho foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics.

Fonte: ESO

terça-feira, 24 de setembro de 2024

Os maiores jatos de um buraco negro

Os astrônomos descobriram o maior par de jatos de um buraco negro alguma vez vistos, com um comprimento total de 23 milhões de anos-luz. Isto equivale a alinhar 140 Vias Lácteas, uma atrás da outra.

© IllustrisTNG (ilustração do mais longo sistema de jatos de um buraco negro)

A megaestrutura dos jatos, apelidada de Porfírio em homenagem a um gigante da mitologia grega, data de uma época em que o nosso Universo tinha 6,3 bilhões de anos, ou seja, menos de metade da sua idade atual de 13,8 bilhões de anos. Estes fluxos ferozes, com uma potência total equivalente a trilhões de sóis, são disparados para cima e para baixo de um buraco negro supermassivo no núcleo de uma galáxia remota.

Antes da descoberta de Porfírio, o maior sistema de jatos confirmado era Alcioneu, também com o nome de um gigante da mitologia grega. Alcioneu, que foi descoberto em 2022 pela mesma equipe que encontrou Porfírio, abrange o equivalente a cerca de 100 Vias Lácteas. Para comparação, o conhecido sistema de jatos Centaurus A, o mais próximo da Terra, estende-se por 10 Vias Lácteas. 

Esta descoberta mais recente sugere que os sistemas de jatos gigantes podem ter tido uma influência maior na formação de galáxias no Universo jovem do que se pensava. Porfírio existiu durante uma época inicial em que os filamentos finos que ligam e alimentam as galáxias, conhecidos como a teia cósmica, estavam mais próximos uns dos outros do que estão agora. Isto significa que enormes jatos como Porfírio se estendiam por uma maior porção da teia cósmica, em comparação com os jatos no Universo local.

As galáxias e os seus buracos negros centrais coevoluem, e um aspecto importante disto é que os jatos podem espalhar enormes quantidades de energia que afetam o crescimento das suas galáxias hospedeiras e de outras galáxias próximas. 

O sistema de jatos Porfírio é o maior encontrado até agora durante um levantamento do céu que revelou um número chocante de megaestruturas tênues: mais de 10.000. Esta enorme população de jatos gigantescos foi encontrada utilizando o radiotelescópio europeu LOFAR (LOw Frequency ARray). Embora se conhecessem centenas de grandes sistemas de jatos antes das observações do LOFAR, pensava-se que eram raros e, em média, de menor dimensão do que os milhares de sistemas descobertos pelo radiotelescópio.

Para procurar sistematicamente mais jatos ocultos, a equipe inspecionou as imagens de rádio a olho nu, utilizou ferramentas de aprendizagem de máquina para analisar as imagens em busca de sinais dos jatos à "espreita" e recorreu à ajuda de cientistas cidadãos de todo o mundo para melhor analisar as imagens. Para encontrar a galáxia que deu origem a Porfírio, a equipe utilizou o GMRT (Giant Metrewave Radio Telescope), na Índia, juntamente com dados auxiliares de um projeto chamado DESI (Dark Energy Spectroscopic Instrument), que opera a partir do Observatório Nacional de Kitt Peak, nos EUA. 

As observações permitiram identificar o local de origem dos jatos, uma galáxia robusta, cerca de 10 vezes mais massiva do que a Via Láctea. Foi utilizado também o Observatório W. M. Keck, no Havaí, para mostrar que Porfírio está a 7,5 bilhões de anos-luz da Terra. 

As observações do Keck revelaram também que Porfírio emergiu daquilo a que se chama um buraco negro ativo em modo radiativo, por oposição a um que está em modo de jato. Quando os buracos negros supermassivos se tornam ativos, ou seja, quando as suas imensas forças da gravidade puxam e aquecem o material circundante, pensa-se que emitem energia sob a forma de radiação ou de jatos. Os buracos negros em modo radiativo eram mais comuns no Universo jovem, ou distante, enquanto os em modo jato são mais comuns no Universo atual.

Ainda não se sabe como é que os jatos se podem estender tão longe das galáxias que os acolhem sem se desestabilizarem. Os jatos espalham raios cósmicos, calor, átomos pesados e campos magnéticos pelo espaço entre galáxias.

Um artigo foi publicado na revista Nature e outro aceito para publicação no periódico Astronomy & Astrophysics.

Fonte: W. M. Keck Observatory

Os arredores de um buraco negro e de um remanescente de supernova

O XRISM (X-Ray Imaging and Spectroscopy Mission) revelou a estrutura, o movimento e a temperatura do material em torno de um buraco negro supermassivo e num remanescente de supernova com um pormenor sem precedentes.

© JAXA (ilustração da região central de um núcleo galáctico ativo)

Os astrônomos apresentaram os primeiros resultados científicos do novo telescópio de raios X menos de um ano após o seu lançamento. 

O que é que um buraco negro gigantesco e os restos de uma estrela massiva que explodiu têm em comum? São ambos fenômenos celestes dramáticos em que um gás extremamente quente produz raios X altamente energéticos que o XRISM consegue ver. Nos seus primeiros resultados, a missão liderada pela JAXA (Japan Aerospace Exploration Agency), com a participação da ESA (European Space Agency), mostra as suas capacidades únicas para revelar a velocidade e a temperatura do gás quente, chamado plasma, e as estruturas tridimensionais do material que rodeia um buraco negro e uma explosão estelar. 

Numa das suas observações de "primeira luz", o XRISM focou-se no remanescente de supernova N132D, localizado na Grande Nuvem de Magalhães a cerca de 160.000 anos-luz da Terra. Esta "bolha" interestelar de gás quente foi expelida pela explosão de uma estrela muito massiva há cerca de 3.000 anos. Usando o seu instrumento Resolve, o XRISM desvendou a estrutura em torno de N132D com grande pormenor. 

Contrariamente às suposições anteriores de uma simples concha esférica, os cientistas descobriram que o N132D tem a forma de uma rosquinha. Usando o efeito Doppler, mediram a velocidade a que o plasma quente no remanescente se move em direção a nós ou para longe de nós, e estabeleceram que este está se expandindo a uma velocidade aparente de cerca de 1.200 km/s.

© JAXA (gráfico da temperatura e energia do remanescente N132D)

Esta imagem mostra a observação do telescópio de raios X XRISM da JAXA do remanescente de supernova N132D. No topo da imagem, o remanescente de supernova é visto em raios X. O círculo amarelo representa a área onde o instrumento Resolve do XRISM revelou que o remanescente contém ferro extremamente quente (10 bilhões Kelvin). A linha rosa mostra a borda do remanescente, onde a onda de explosão interage com o meio interestelar, e o gás quente (plasma) é mais frio (cerca de 10 milhões Kelvin).

O espectro mostra muitos elementos químicos que estão presentes no remanescente de supernova N132D. O XRISM pode identificar cada elemento medindo a energia do fóton de raios X específico dos diferentes átomos.

Os átomos de ferro foram aquecidos durante a explosão de supernova através de violentas ondas de choque que se propagam para o interior, um fenômeno que tinha sido previsto pela teoria, mas nunca antes observado. Os remanescentes de supernova como N132D contêm pistas importantes sobre a forma como as estrelas evoluem e como elementos (pesados) essenciais à nossa vida, como o ferro, são gerados e espalhados para o espaço interestelar.

No entanto, os anteriores observatórios de raios X tiveram sempre dificuldade em revelar a forma como a velocidade e a temperatura do plasma eram distribuídas. O XRISM também forneceu aspectos da misteriosa estrutura que rodeia um buraco negro supermassivo.

Apontando para a galáxia espiral NGC 4151, localizada a 62 milhões de anos-luz, as observações do XRISM oferecem uma visão sem precedentes do material muito próximo do buraco negro central da galáxia, que tem uma massa 30 milhões de vezes superior à do Sol. O XRISM captou a distribuição da matéria que circula e que eventualmente cai no buraco negro ao longo de um raio alargado, que vai de 0,001 a 0,1 anos-luz, ou seja, desde uma distância comparável à separação Sol-Úrano até 100 vezes essa distância.

Ao determinar os movimentos dos átomos de ferro a partir da sua assinatura de raios X, os cientistas mapearam uma sequência de estruturas em torno do buraco negro gigante: desde o disco que "alimenta" o buraco negro até ao toro em forma de rosquinha. 

Embora as observações de rádio e no infravermelho tenham revelado a presença de um toro em forma de rosquinha em volta de buracos negros em outras galáxias, a técnica espectroscópica do XRISM é a primeira, e atualmente a única, forma de descobrir como o gás perto do buraco negro central é formado e se move. 

As observações feitas com o XRISM complementarão as do telescópio de raios X XMM-Newton da ESA e constituirão uma excelente base para as observações planejadas com a futura missão de grande porte NewAthena da ESA. Esta última está sendo concebida para exceder significativamente o desempenho científico dos atuais observatórios de raios X espectroscópicos e de levantamento.

Fonte: Japan Aerospace Exploration Agency

Nova imagem melhorada da galáxia IC 1954

A galáxia espiral IC 1954, localizada a 45 milhões de anos-luz da Terra na constelação Horologium, é a estrela nesta imagem telescópio espacial Hubble.

© Hubble (IC 1954)

Ela ostenta uma barra brilhante em seu núcleo, dois braços espirais principais majestosamente sinuosos e nuvens de poeira escura sobre ela. Uma imagem desta galáxia foi lançada anteriormente em 2021; a imagem atual é totalmente nova e agora inclui dados H-alfa.

A cobertura aprimorada de nebulosas formadoras de estrelas, que são emissoras proeminentes da luz vermelha H-alfa, pode ser vista nas numerosas manchas brilhantes e rosadas no disco da galáxia. Curiosamente, alguns astrônomos postulam que a "barra" da galáxia é, na verdade, uma região energética de formação de estrelas que por acaso fica sobre o centro galáctico. 

Os novos dados apresentados nesta imagem vêm de um programa para estender a cooperação entre vários observatórios: o telescópio espacial Hubble, o telescópio espacial infravermelho James Webb e o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array, um radiotelescópio terrestre. 

Ao pesquisar a IC 1954 e mais de cinquenta outras galáxias próximas em luz de rádio, infravermelha, óptica e ultravioleta, os astrônomos pretendem rastrear e reconstruir completamente o caminho que a matéria percorre através das estrelas e do gás e poeira interestelar em cada galáxia.

As capacidades de observação do Hubble formam uma parte importante desta pesquisa: ele pode captar estrelas mais jovens e aglomerados de estrelas quando eles são mais brilhantes em comprimentos de onda ultravioleta e ópticos, e seu filtro H-alfa rastreia efetivamente a emissão de nebulosas. O conjunto de dados resultante formará um tesouro de pesquisas sobre a evolução de estrelas em galáxias, que o Webb desenvolverá à medida que continua suas operações científicas no futuro.

Fonte: ESA